segunda-feira, maio 11, 2009

Voto


Este blogue, por razões que eu julgava óbvias mas que, pelos vistos, não o são assim tanto para alguns dos seus leitores, tem por opção própria não tratar de questões de política interna portuguesa contemporânea.

Porém, porque estamos num ano em que haverá várias eleições em Portugal, que alguns dos nossos leitores de França têm natural interesse em seguir, recomendo o blogue Margens de Erro, um excelente e muito equilibrado repositório analítico das várias sondagens que vão sendo produzidas no nosso país.

domingo, maio 10, 2009

"Isto anda tudo ligado"

Um saudoso jornalista e poeta, Eduardo Guerra Carneiro, escreveu um dia um livro com o título deste post. É bem verdade que tudo anda ligado. Os portugueses que vivem em França foram e, por vezes, continuam a ser testemunhas de violências urbanas bem similares às que agora estão a ocorrer no bairro da Boa Vista, em Setúbal. E sabem que esses eventos são o somatório trágico das tensões culturais, da exclusão social, das rupturas do tecido familiar, dos problemas económicos e da quebra da autoridade de um Estado com o qual os jovens envolvidos não sentem qualquer solidariedade. Mas eles também sabem que, sem segurança e sem o pleno apoio a quem a exerce democraticamente, as sociedades não se sustentam e a vida quotidiana se torna num inferno.

Portugal é um país que, nas últimas décadas, passou por um processo acelerado de integração dos seus imigrantes, que são hoje mais de 5% da sua população. A grande maioria desses imigrantes, oriundos de países muito diversos, tem como simples projecto a melhoria das suas condições de vida, pelo que não deve ser confundida com uma minoria que tende a envolver-se em acções criminosas, a qual deve ser reprimida, como quaisquer outros delinquentes, portugueses ou não.

Mas o nosso país, que tem um histórico de presença externa no mundo das migrações que o obriga a alimentar uma forte cultura de integração, tem a obrigação de estar bem vigilante face à emergência de pulsões populistas, de natureza xenófoba ou racista, que, como se tem visto em todo o mundo, sempre partindo de muito legítimas preocupações securitárias, rapidamente podem descambar em demagógicas campanhas de intolerância. E uma coisa tenho por certo: temos de ser radicalmente intolerantes perante a intolerância.

Da Costa

Está ainda muito longe da fama de Joaquim Agostinho, mas a vitória que o português Rui Costa - por aqui chamado Da Costa - obteve na importante prova "4 Dias de Dunkerque" abre um tempo novo na imagem do ciclismo português em terras de França.

E, por uma qualquer razão que me escapa, confesso que me agrada ver este nome num podium francês...

sábado, maio 09, 2009

Amigo de Alex

Alexander Ellis é o jovem e brilhante embaixador do Reino Unido em Portugal. Conheci-o há cerca de 15 anos, quando era visita frequente do Palácio da Cova da Moura, onde "arrastava a asa" àquela que é hoje a sua mulher e, à época, era uma diplomata colocada na Secretaria de Estado dos Assuntos Europeus. Depois disso, cruzámo-nos algumas vezes pelo mundo, a última das quais no Brasil, quando por aí passou nas suas errâncias comunitárias.

Porque falo do meu amigo Alex? Porque a "Sábado" me recordou que tem um blogue em português, aliás criado bem antes do meu, com comentários muito interessantes em que, nomeadamente, reflecte um olhar britânico sobre algumas coisas portuguesas. E um dos posts mais recentes fala dos embaixadores do seu país que têm um blogue. Leia aqui.

No "Le Canard Enchaîné"

Tendo sido anunciado que a Fiat vai salvar a Chrysler, será que a Solex vai acabar por ajudar a Harley-Davidson?

sexta-feira, maio 08, 2009

O Hino da Liberdade

Neste dia em que se comemora a vitória dos Aliados sobre a barbárie nazi, nada melhor do que rever este emocionante extracto do filme "Casablanca". Nele se nota que "La Marseillaise" era então o outro nome da Liberdade.

Gendarmes

Uma deslocação oficial, por algumas horas, à Côte de Azur, fez-me hoje deparar com alguns gendarmes à borda das praias mediterrânicas.

Apesar da seriedade da cerimónia - uma muito digna e bem organizada comemoração da vitória aliada na 2ª Guerra Mundial -, confesso que, no local, não consegui deixar de lembrar-me de Louis de Funès e dos seus garbosos ajudantes...

quinta-feira, maio 07, 2009

A senhora dona

Foi no Maputo, há já uns anos.

A lista dos condecorados era longa e o respectivo leitor, de nacionalidade portuguesa, era, manifestamente, uma pessoa pouco sensível às letras moçambicanas. Assim, sem hesitação, anunciou a certa altura da solenidade: "E agora, vai receber a ordem X a Senhora Dona Mia Couto".

Um frémito de embaraço e riso sacudiu a audiência. Mia Couto, o excelente escritor de Moçambique, afivelou um sorriso por detrás dos óculos e da barba, encaminhando-se para o palco onde o presidente português o aguardava, claramente um pouco incomodado com a inesperada feminização do agraciado.

Um colega meu, de graça rápida, logo deixou cair, baixo: "Ainda bem que hoje não é condecorada a Senhora Dona Sara ... mago!".

i agora

O grande profissionalismo de Martim Avillez Figueiredo e a coragem do grupo económico Lena juntaram-se para lançar hoje, no meio de um tempo de crise, um novo jornal, o "i". Prometem um estilo directo e novo. Só se lhes pode desejar todo o sucesso. Leia a sua edição online aqui.

quarta-feira, maio 06, 2009

Tratado de Lisboa

A aprovação pelo Senado da República Checa do Tratado de Lisboa, que ontem teve lugar, representa um passo importante no caminho para a estabilização institucional da Europa. Para a entrada em vigor do Tratado, restam agora - o que não é de somenos, diga-se - a assinatura do presidente checo e um desfecho positivo do referendo irlandês. Mas é obvio que esta foi uma etapa muito importante no caminho para a sua plena aprovação.

O Tratado de Lisboa, como todos os documentos de natureza multilateral, foi o resultado possível de um compromisso laborioso entre interesses de diversa natureza, por vezes mesmo algo divergentes. Talvez nenhum dos países signatários se reveja, em absoluto, no texto que foi assinado. Mas essa é, talvez, a prova de que o Tratado representa hoje o denominador comum possível, numa Europa mais heterogénea do que nunca.

Já bem depois do Tratado ter sido assinado, o mundo entrou numa séria convulsão, com uma crise económica de uma dimensão quase sem precedentes, que obriga a respostas rápidas e, essencialmente, a formas coordenadas de actuação, em especial nos fóruns internacionais onde se repercutem os efeitos dessa mesma crise. E tal como um país não deve demonstrar uma fragilidade das suas instituições quando é sacudido por instabilidades internas, também a União Europeia só pode estar à altura das responsabilidades que o seu potencial económico impõe quando conseguir apresentar um processo interinstitucional consensual, nomeadamente em tudo quanto se reflicta na definição das posições gerais que marcam os seus quadros interno e de relações externas. Essa é, aliás, a melhor forma de evitar a tentação de recurso a soluções de raiz nacional, porventura populares mas perigosas para os compromissos colectivos já assumidos, que podem colocar em causa o próprio tecido de relações contratuais construído ao longo de mais de meio século.

Acresce que a situação actual, para além da instabilidade económica que atravessa o mundo, apresenta outros graves riscos de natureza estratégica e de segurança, face aos quais a Europa tem obrigação de definir uma posição sólida e coerente. Isto é tanto mais importante quando o surgimento de uma nova administração americana, aparentemente aberta à reconsideração de certas políticas e à redefinição de importantes equilíbrios à escala global, parece oferecer-nos uma janela de oportunidade para a fixação de uma nova parceria transatlântica, susceptível de sustentar um tempo de paz e estabilidade.

O Tratado de Lisboa, para além das legítimas interrogações que algumas das soluções que prevê possam suscitar, parece ser hoje o lugar geométrico possível da esperança numa Europa mais sólida. E, para um país como Portugal, o futuro passa, cada vez mais, por essa mesma Europa.

terça-feira, maio 05, 2009

Vasco Granja (1925-2009)

Uma dia, numa conversa casual em Lisboa, apresentados por um amigo comum, Vasco Granja revelou-me ter sido ele a pessoa que respondia às cartas de quem, como eu, era fiel e activo leitor da revista portuguesa de banda desenhada "Tintin", nos anos 60 do século passado.

Homem do cine-clubismo e apaixonado pela banda desenhada, Vasco Granja era uma figura serena, que trouxe à televisão portuguesa um "outro" cinema de animação, diferente do que então conhecíamos e, naturalmente, muito distante daquele que hoje se produz. Era um apaixonado por uma escola serena da animação cinematográfica, mais pedagógica e nada violenta, trazendo-nos nomes estranhos de autores desconhecidos do Centro e do Leste da Europa e, em especial, de um génio que descobrimos pela sua mão, o canadiano Norman McLaren.

Faleceu aos 84 anos. Como homenagem, deixo a imagem de um dos seus heróis de estimação, a figura criada por Hugo Pratt, Corto Maltese.

segunda-feira, maio 04, 2009

"Les Portugais"

A memória dos tempos mais duros da emigração portuguesa para França pode ser ainda penosa para uns, mas é honrosa para todos. E faz e fará sempre parte do nosso património histórico colectivo.

Nesse outro tempo de 1971, Joe Dassin era uma voz que trazia o modo como a França via os portugueses. Ouçam o "Les Portugais" aqui.

"Arquipélago da Palestina"

Vale a pena atentar naquilo em que hoje se transformou a terra dos palestinianos, a que o Le Monde Diplomatique chama, com graça amarga, o "Arquipélago da Palestina Oriental". Clique no mapa para ver melhor.

domingo, maio 03, 2009

Rigoroso inquérito

Há uma conhecida e vetusta instituição que, em Portugal, assume o título ritual de “rigoroso inquérito”.


Depois de um acidente ou incidente grave, de uma vigarice com impacto ou de uma qualquer disfunção pública relevante, desde que com expressão mediática, aparece quase sempre a rassurante declaração de que as "entidades competentes" (privadas ou públicas) decidiram “instaurar”, sobre o assunto, um “rigoroso inquérito”. Mas não se pense que se trata de um inquérito de rotina: é sempre um estudo que tem de ser qualificado de “rigoroso”, com o objectivo de sossegar as consciências, no sentido de que nada ficará por investigar e de que ninguém ficará impune. Se se ler bem a comunicação social, verificarão que, quase todas as semanas, surge o anúncio de um “rigoroso inquérito” que foi instaurado, deduz-se que com gente a arregaçar de imediato as mangas na investigação, com limites temporais para apresentar os resultados, com a ameaça de uma espada de Dâmocles sobre os responsáveis a punir.


Passam dias, semanas, meses e que acontece? Na esmagadora maioria das vezes nada se sabe, muitos destes inquéritos devem ser arquivados, outros terão ido avante, mas a emoção já passou, a comunicação social já está noutra, ninguém pergunta por eles.


É pena que não haja alguém que tenha tempo para fazer o registo e o acompanhamento regular, aí de três em três meses, com alarde público, por exemplo num blogue ou num site, com os resultados práticos e as conclusões de tais inquirições, assinaladas as respectivas responsabilidades nominativas. Que se saudassem os resultados, quando os houver, até como exemplo positivo a apontar. E que denunciassem, bem alto, os casos em que nada se passa, em que a montanha nem um rato pariu. Teria imensa graça e, estou certo, certos “responsáveis” passariam a ter mais cuidado para que ninguém sorrisse quando anunciassem o próximo “rigoroso inquérito”.

Fitas

É o retrato lamentável de um certo Portugal contemporâneo o espectáculo anual que nos é dado pela Queima das Fitas, começando em Coimbra mas espalhando-se um pouco por todo o país, que enche os serviços de urgência dos hospitais com estudantes a cair de bêbados. Os serviços públicos de saúde têm mais que fazer do que estar a gastar recursos com quem, pelos vistos, reserva para o álcool o dinheiro que diz não ter para pagar propinas. E é especialmente cínica a "cooperação" das empresas cervejeiras no evento, disfarçando a sua cumplicidade com anúncios rebuscadamente "soft", onde a lei do politicamente correcto as leva a inserir envergonhados apelos à moderação nos consumos.

Significativo não deixa de ser o facto de, à parte alguns comentários de circunstância, tidos à conta de uma leitura retrógrada da vida, ninguém parecer preocupar-se muito com isto, desde os pais às autoridades académicas, como se fosse já inelutável este estado de coisas - e, naturalmente, como se combatê-lo pudesse representar um inqualificável atentado aos sagrados "direitos dos estudantes".

sábado, maio 02, 2009

Blogue

Há três meses, dia por dia, foi iniciado este blogue. O objectivo pretendido, definido no primeiro "post", foi globalmente conseguido, embora confesse que gostaria que a percentagem dos visitantes oriundos de França fosse ligeiramente maior.

Como se poderá verificar, clicando o "sitemeter", à direita da página, houve diariamente cerca de 250 pessoas a consultar o blogue, o que faz com que, desde 2 de Fevereiro, mais de 20 mil consultas individualizadas tivessem sido feitas, se bem que as consultas a páginas, em grande parte através dos motores de busca da internet, ultrapassassem 50 mil. Atendendo às características dos textos do blogue, nomeadamente à diversidade dos seus "posts" - cerca de 200, desde o início -, considero surpreendente o nível de leitura média diária atingida. Uma palavra particular de apreço aos 62 leitores habituais que, até à data, se increveram no blogue.

E, por hoje, na ressaca do Dia do Trabalhador, em que poderíamos ter desfilado como na imagem, o blogue fica-se por aqui.

sexta-feira, maio 01, 2009

Cleonice

Foi uma hora e quarenta minutos de exposição. Mas, para as dezenas de pessoas presentes, ao final da tarde de ontem, na Fundação Gulbenkian, em Paris, pareceram escassos os minutos que demorou a palestra da Professora Cleonice Berardinelli, apresentando a sua visão sobre Camões, nas suas dimensões lírica e épica.

Num francês magnífico, servido por uma dicção soberba, por uma memória privilegiada, do alto dos seus inacreditáveis quase 93 anos, a decana dos estudos de língua e cultura portuguesa no Brasil - e, provavelmente, em todo o mundo - revisitou a poesia camoneana, com arte e profundidade, numa viagem interessantíssima, da qual a generalidade dos presentes terá saído com vontade de reler rapidamente Camões.

É muito graças ao esforço e dedicação destes lusófilos que as grandes figuras da história da cultura portuguesa permanecem na agenda académica, por esse mundo fora.

quinta-feira, abril 30, 2009

1º de Maio de 1974


Imagem de Portugal

Durante o debate que se seguiu a uma palestra que proferi ontem na Cidade Universitária de Paris, e cuja tradução se pode ler aqui, uma estudante perguntava-me sobre o modo como Portugal era, nos dias de hoje, visto do exterior, passados que foram 35 anos desde o 25 de Abril.

É sempre muito complexo tentar sintetizar, em poucas e sempre subjectivas palavras, um olhar que é, por definição, plural e não unívoco. Mas é meu entendimento que a imagem internacional de Portugal sofreu bastante durante o período do Estado Novo, em especial quando se opôs ao movimento descolonizador, ao mesmo tempo que teimava na manutenção de um regime cerceador das liberdades. Além disso, um país que obriga à emigração dos seus cidadãos é um país que não se prestigia: por regra, cada um deve poder encontrar, na terra que o viu nascer, a forma de sustentação e de desenvolvimento da sua vida. A emigração pode ser uma opção, não deve ser nunca um destino. E, em Portugal, foi-o por quase dos séculos. E a nossa imagem colectiva não deixou de sofrer com isso.

Com a recuperação da democracia, em 1974, uma onda de boa-vontade espalhou-se sobre Portugal, recebido de braços abertos pela comunidade internacional, em especial nos organismos multilaterais, com os quais o novo regime procurou, desde o primeiro momento, trabalhar de forma altamente colaborante. Portugal conseguiu então captar a simpatia de muitos países e sectores de que estivera alheado. E, sem dúvida, a imagem internacional do país reforçou-se muito com a institucionalização democrática, com a integração europeia, com a adesão a objectivos respeitáveis na ordem externa - de que o caso da autodeterminação timorense é talvez o melhor exemplo.

Ao longo dos últimos 35 anos, a diplomacia portuguesa soube projectar a imagem de um país com uma grande capacidade de diálogo, empenhado nas grandes causas da modernidade e da ética internacionais, com posições quase sempre de grande equilíbrio e sentido de compromisso, com uma leitura serena das grandes questões mundiais - enfim, uma "diplomacia previsível", que creio ser uma das grandes armas para afirmar a credibilidade de qualquer Estado moderno. A política externa do Portugal democrático - independentemente dos governos, apenas com pontuais rupturas do consenso - constitui hoje um dos pilares mais sólidos da imagem do país, para a qual também contribui, no mesmo âmbito, o empenhamento das nossas Forças Armadas em importantes cenários de preservação da paz.

Porém, na minha resposta à estudante não disse algo que acho importante referir. Falta ainda a Portugal atingir um patamar que é condição essencial para uma imagem internacional completamente sólida: um amplo bem-estar colectivo. Lá chegaremos um dia!

Descolonização

Texto de um "take" da Agência Lusa de hoje: O embaixador de Portugal em Paris, Francisco Seixas da Costa, opinou quarta-feira, em Paris, que no seu "ponto de vista pessoal", a descolonização "foi uma tragédia, tal como foi a colonização, mas não era possível fazer de outra maneira."

A expressão, em rigor, foi esta: "A descolonização foi uma trágédia, da mesma maneira que a colonização foi uma tragédia. Esta é uma frase de Melo Antunes que eu subscrevo". Mais adiante referi: "A descolonização foi feita da forma que foi porque o estado a que o regime anterior tinha conduzido a situação nas colónias não possibilitou outra solução", tendo também referido que uma solução negociada teria sido possível, se para tal houvesse vontade política, nos anos 50, e tendo ainda detalhado as muito difíceis condições político-militares nas colónias com que o novo poder se viu confrontado e que impediam que se seguissem outras vias.

As sínteses têm sempre riscos, o principal dos quais é a imprecisão.

Ponto

A ver se nos entendemos. O presidente da AR, pelo regimento, não pode impedir um deputado de dizer dislates. Mas, pela ética e pela decência...