quarta-feira, maio 06, 2009

Tratado de Lisboa

A aprovação pelo Senado da República Checa do Tratado de Lisboa, que ontem teve lugar, representa um passo importante no caminho para a estabilização institucional da Europa. Para a entrada em vigor do Tratado, restam agora - o que não é de somenos, diga-se - a assinatura do presidente checo e um desfecho positivo do referendo irlandês. Mas é obvio que esta foi uma etapa muito importante no caminho para a sua plena aprovação.

O Tratado de Lisboa, como todos os documentos de natureza multilateral, foi o resultado possível de um compromisso laborioso entre interesses de diversa natureza, por vezes mesmo algo divergentes. Talvez nenhum dos países signatários se reveja, em absoluto, no texto que foi assinado. Mas essa é, talvez, a prova de que o Tratado representa hoje o denominador comum possível, numa Europa mais heterogénea do que nunca.

Já bem depois do Tratado ter sido assinado, o mundo entrou numa séria convulsão, com uma crise económica de uma dimensão quase sem precedentes, que obriga a respostas rápidas e, essencialmente, a formas coordenadas de actuação, em especial nos fóruns internacionais onde se repercutem os efeitos dessa mesma crise. E tal como um país não deve demonstrar uma fragilidade das suas instituições quando é sacudido por instabilidades internas, também a União Europeia só pode estar à altura das responsabilidades que o seu potencial económico impõe quando conseguir apresentar um processo interinstitucional consensual, nomeadamente em tudo quanto se reflicta na definição das posições gerais que marcam os seus quadros interno e de relações externas. Essa é, aliás, a melhor forma de evitar a tentação de recurso a soluções de raiz nacional, porventura populares mas perigosas para os compromissos colectivos já assumidos, que podem colocar em causa o próprio tecido de relações contratuais construído ao longo de mais de meio século.

Acresce que a situação actual, para além da instabilidade económica que atravessa o mundo, apresenta outros graves riscos de natureza estratégica e de segurança, face aos quais a Europa tem obrigação de definir uma posição sólida e coerente. Isto é tanto mais importante quando o surgimento de uma nova administração americana, aparentemente aberta à reconsideração de certas políticas e à redefinição de importantes equilíbrios à escala global, parece oferecer-nos uma janela de oportunidade para a fixação de uma nova parceria transatlântica, susceptível de sustentar um tempo de paz e estabilidade.

O Tratado de Lisboa, para além das legítimas interrogações que algumas das soluções que prevê possam suscitar, parece ser hoje o lugar geométrico possível da esperança numa Europa mais sólida. E, para um país como Portugal, o futuro passa, cada vez mais, por essa mesma Europa.

2 comentários:

Anónimo disse...

Bom dia

Alguns simples comentarios :

"e um desfecho positivo do referendo irlandês". Para uma melhor compreensao e essencialmente para o destaque da verdade, deveria-se dizer "e outra tentativa de obrigar o povo irlandês a aceitar por força o dito tratado".


"O Tratado de Lisboa, como todos os documentos de natureza multilateral, foi o resultado possível de um compromisso laborioso" :

Nem por isso. Porque bastou fazer às escondidas uma simples transformaçao da constituiçao negada democraticamente pelos franceses e os holandeses. O mais complicado foi a batota, ou seja, tornar ilisivel e incompreensivel para o povo a dita constituiçao, afim de se lhe dar o nome de tratado de Lisboa.



"O Tratado de Lisboa (...) foi o resultado possível de um compromisso (...) entre interesses de diversa natureza, por vezes mesmo algo divergentes" :

Desde que haja interesses realmente divergentes, nunca um acordo, seja qual for a sua forma e perfil, poderà por natureza ter "chances" de um futuro harmonioso.

Isso é uma coisa geralmente desconhecida dos politicos, sendo no entanto uma teoria basica em varios sectores como a economia geral, o marketing ou o comercio...

So quando os principais interesses sao comuns é que se torna aceitavel, e realmente viavel a longo prazo um contrato com bases solidas.

O que significa o inevitavel futuro fracasso de um acordo destes, (aliàs jà bem presente com os textos e as bases actuais). Nao é preciso ser bruxo para compreender "o porquê" da impossibilidade até agora de harmonias europeias maiores, nem para perceber com logica e objectividade, que uma europa baseada em tantas divergencias, nunca poderà atinjir qualquer meta que seja (excluindo evidentemente metas sem importancia anunciadas mediaticamente por metodos populistas :-)


"Talvez nenhum dos países signatários se reveja, em absoluto, no texto que foi assinado"

Se os paises nao se reveem, ( o que é logico)... dos cidadaos entao nem se diz nada !
Visto que nenhum deles se pode rever numa constituiçao maquilhada em tratado, que como a actual Europa em si, nao foi feito nem discutido por (e para) eles, mas unicamente por e para os financeiros e alguns lobbies.

Ninguem aliàs se pode "ver" num texto no qual nao teve a minima palavra a dizer, e que so se consegue manter em vida com "trafulhices", batotas, recusos de votos democraticos, etc...

Com bases dessas, ninguem se pode rever numa tal absurdidade que tambem foi uma das causas do fracasso da economia, ou pelo menos da sua dimensao atinjida na maior parte dos paises que compoem esta europa.


"Essa é, aliás, a melhor forma de evitar a tentação de recurso a soluções de raiz nacional"

Curiosamente, o constato na realidade é outro. Ao contrario, esse nacionalismo é cada vez mais presente conforme a europa se distancia na percepçao dos cidadaos. Basta se ver o renascimento das tendencias nacionalistas em Portugal como em outros paises da Europa.

(Ex : O salazar nunca esteve tao presente. Ora se esse factor se explica em grande parte pela decepçao das democracias e da maneira como sao levadas pelos politicos (e politicas) actuais, esse unico factor nao é uma justificaçao suficiente).


A falta de vista do horizonte torna sempre a incerteza em perigo potencial. Ora nao hà nada que induza menos vista do horizonte, que esta europa cega, distanciada, e burocratica, que desde do inicio, quiz excluir os cidadaos do seio seio, e que é vista (e ressentida), nao como uma "entidade" que abre, reune, respeita e escuta; mas como uma entidade "forçada" que exclue, nao houve, faz batota, e proibe !

Inevitavelmente, esses factores so podem psicologicamente induzir petextos para todos os tipos de nacionalismo, que se tornam assim (falsamente) protectores, e que parecem trazer a resposta ao pergigo (imaginario) potencial.

Em outras palavras, quanto mais a europa for distante e ficar na obscuridao, mais as tendencias nacionalistas irao acordar. Mas quem sabe se afinal nao é esse um dos objectivos. :-)


"Acresce que a situação actual, para além da instabilidade económica que atravessa o mundo, apresenta outros graves riscos de natureza estratégica e de segurança, face aos quais a Europa tem obrigação de definir uma posição sólida e coerente."

Faz-me lembrar a cançao eterna : Olha o bicho, olha o bicho ! :-)

Penso que é preferivel nao se utilizar mais esta cançao que hoje jà nao tem impacto. Francamente. :-)


"...oportunidade para a fixação de uma nova parceria transatlântica"

Ups. Factor de altissimo risco. Tudo depende o que se entende por "parceria".


"E, para um país como Portugal, o futuro passa, cada vez mais, por essa mesma Europa."

Sim, as evidencias sao evidencias. Mas tem de se saber de qual europa se trata. Esta, a europa da escuridao e das tretas ?

...ou uma outra Europa que queira enfim integrar os cidadaos como uma das componentes principais ?

é essa a resposta que esta europa nunca quiz nem quer dar aos cidadaos que a compoem.


Fim dos comentarios.


Nota : Muitos parabens por este blog, nao so pela abordagem de temas gerais, variados e interessantes, mas tambem, e talvez sobretudo, pelo proprio principio da vontade de comunicaçao - e finalmente de um certo risco - demonstrado pelo Embaixador, o que até agora nao tem sido comum, e que é portanto de realçar e de... louvar ! :-)

Cumprimentos
Mario

Anónimo disse...

Um comentário muito pertinente, este de “Anónimo” Mário. Bem a propósito, a menção à anterior atitude de franceses e holandeses! E faço minhas as palavras finais na Nota.
“Anselmo”!
PS: haverá “réplica” do Embaixador? Sobre este tema (e outros), leio com a maior atenção o que diz e escreve!

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...