quarta-feira, março 18, 2009

Palestina

Pela voz do seu ministro dos Negócios Estrangeiros, Portugal entende que a União Europeia poderá ter de reavaliar as suas relações com Israel, se este país não terminar com a expansão dos colonatos judaicos nos territórios atribuídos à Autoridade Palestiniana e se não demonstrar "um claro compromisso para com o processo de paz".

Para Luis Amado, "isto tem de ser dito claramente aos nossos amigos israelitas", segundo uma carta que recentemente enviou a todos os seus homólogos europeus, na qual refere que “a política do futuro Governo israelita quanto ao processo de paz ainda não é clara. Precisamente por este motivo, creio que necessitamos passar agora uma forte mensagem quanto ao que são as nossas expectativas".

Para o chefe da diplomacia portuguesa, durante 2008 não se assistiu a um grande progresso quanto a assuntos tão críticos como os colonatos judaicos em território palestiniano, referindo que “esta situação não pode durar mais, pois arriscamo-nos a perder o campo árabe moderado".

Portugal é um país que, ao longo dos anos, tem mantido uma atitude de consistente apoio ao processo tendente à paz no Próximo Oriente, que permita consolidar o legítimo direito de Israel a se manter com fronteiras seguras e respeitadas, lado a lado com um Estado palestiniano com pleno reconhecimento por parte da comunidade internacional e, em especial, dos seus vizinhos da região, a começar por Israel.

Para o nosso país, a União Europeia deve demonstrar um forte empenhamento na regularização desta difícil zona de tensão, contribuindo com apoio económico para ultrapassar os problemas de desenvolvimento que hoje afectam a população palestiniana. Portugal está igualmente esperançado na determinação da nova administração americana, com vista a dar um sensível impulso à resolução de uma das situações que mais têm afectado e potenciado as clivagens à escala global.

terça-feira, março 17, 2009

Eduardo

Encerra hoje o Salon du Livre, uma magnífica mostra da edição francesa, que teve este ano o México como país convidado.

Em 2000, Portugal foi o país em foco, num belo stand encimado pela frase de Virgílio Ferreira “Da minha língua vê-se o mar”, a cuja inauguração assisti.

Mas esta é também uma oportunidade para lembrar a figura do então Conselheiro Cultural da Embaixada de Portugal em Paris, Eduardo Prado Coelho, figura de relevo na preparação da nossa excelente participação naquele evento.

Conheci o Eduardo num momento curioso: no final dos anos 60, um grupo de estudantes, representantes do movimento associativo universitário, entre os quais estava aquele que viria a ser o seu sucessor em Paris, Nuno Júdice, irrompeu por uma sua aula na Faculdade de Letras de Lisboa, num protesto académico ditado por uma razão que já me escapou. Lembro-me de ter tomado a palavra e, para sua irritação, “decretar” que a aula estava suspensa, a fim de informarmos os estudantes (essencialmente, as estudantes, lembro-me) da seguramente magna questão que ali nos levava.

Anos depois, fui seu aluno num curso de Semiologia (estava na moda!) no Centro Nacional de Cultura, tendo, mais tarde, convivido um pouco mais com ele em noites lisboetas, na Grã-fina e no Montecarlo. Era uma figura com uma intensa curiosidade intelectual, que tudo lia, que nos ia revelando, com erudição, as novidades recém-chegadas desta Paris que sempre o fascinou.

Eduardo Prado Coelho teve um percurso político e público por vezes controverso, mas é, incontestavelmente, uma figura a quem Portugal muito deve. Crítico e divulgador, descobriu e promoveu talentos em diversas áreas culturais, em especial na literatura, onde era um reconhecido especialista. Muitas das ideias que marcaram a modernidade nas últimas cinco décadas chegaram a Portugal pela sua mão, tendo essa sua intensa e dispersa actividade prejudicado, talvez, uma carreira académica na qual estaria vocacionado a ter sucesso. Nos últimos anos, dedicou-se à análise do quotidiano nas colunas da imprensa, tornando-se a sua leitura um vício para muitos, entre os quais eu me contava.

Em Paris, onde me recordo de o ter visitado nos anos 80 na sua casa no Marais, foi um entusiasmado militante da promoção cultural portuguesa, com um indiscutível êxito, como ainda hoje por aqui se recorda.

Por ocasião da sua morte prematura, em 2007, fiquei com a sensação de que o nosso país lhe prestou um tributo que ficou muito aquém do que ele verdadeiramente merecia. É pena.

Bandeiras do passado

A utilização da bandeira nacional portuguesa em tudo o que era janela ou varanda, durante o Euro 2004, representou uma saudável banalização do nosso símbolo nacional, uma espécie de apropriação popular de algo com que todos patrioticamente nos identificamos, mas com o qual vivíamos uma incompreensível cerimónia. Foi um movimento inédito em Portugal, curiosamente mobilizado por um brasileiro - e creio que nenhum outro estrangeiro, para além de um cidadão brasileiro, poderia ser "autorizado" a lembrar-nos o orgulho que devemos ter na nossa bandeira.

Mas Portugal tem sempre, infelizmente, um "outro lado". Hoje, vêem-se, em imensas casas do nosso país, bandeiras ainda desse tempo, rasgadas, desbotadas, esfiapadas, indignas de serem desfraldadas. Será preciso lançar um outro movimento nacional para as recolher?

E, de passagem, não se poderiam mandar retirar as placas "Expo 98", que ainda subsistem pela zona oriental de Lisboa? Com os diabos! Já lá vão mais de 10 anos...

Mas, neste involuntário culto passadista, fruto do luso descuido, quero deixar claro que não incluo o repintar de uma parede da minha rua, em Lisboa, onde subsiste, com subversivo romantismo, "Vota Octávio Pato"...

Bijagós... nazis!

Num artigo a propósito da Guiné-Bissau, o "Figaro" de hoje traz a seguinte pérola de jornalismo, referindo-se às ilhas Bijagós:

"Le chapelet d'îles dispose des pistes d'avion de fortune construites par les Portugais pour les nazis pendant la Seconde Guerre mondiale."

A imaginação não tem limites...

segunda-feira, março 16, 2009

Loulé em Lomé

Ao ler a notícia de que o Presidente da República portuguesa foi há dias recebido, na Alemanha, ao som do "Tia Anica de Loulé", veio-me à memória um episódio passado há quase 20 anos, em finais de 1989, em Lomé.

Estávamos no acto formal da assinatura da 4ª Convenção de Lomé, estabelecida entre a Europa e 69 países espalhados pela África, pelas Caraíbas e pelo Pacífico. Foi uma cerimónia interminável, com imensos discursos e com os representantes de cada país a serem chamados, um por um, a assinar o texto, no palco de um grande auditório da capital do Togo. Logo que o nome de um país era mencionado nos altifalantes, e enquanto se processava a deslocação do respectivo dignitário para a mesa da assinatura, desciam, pelas escadarias laterais do anfiteatro, coloridos grupos de dançarinos, ao som de uma música alusiva ao país em causa, levando à frente a bandeira e um cartaz com uma grande fotografia do respectivo chefe de Estado (descobri esta imagem da cerimónia no Google).

Já me não recordo da música que foi escolhida para Portugal, mas lembro-me bem do grande espanto de toda a nossa delegação ao verificar que, sempre que eram chamados os ministros de cada um dos cinco países de língua portuguesa (Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e S. Tomé e Príncipe"), a música utilizada era, invariavelmente, ... a "Tia Anica de Loulé"!

Imagino que alguns, com resquícios de radicalismo, pudessem ter pensado que se tratava de uma forma encapotada de neo-colonialismo musical, muito embora a organização do evento fosse africana. Pelo sim pelo não, acho que não suscitámos a questão junto dos nossos amigos dos PALOP...

O que cada vez mais fica provado é que a "Tia Anica de Loulé" tem uma misteriosa mas forte expressão internacional. Vá-se lá saber porquê!

Lídia Jorge

Não pudemos ter Lídia Jorge em Paris, mas o Salon du Livre foi o local escolhido para a homenagem que lhe foi prestada, no sábado, com a entrega do Prémio da Associação Francesa de Psiquiatria, pela versão francesa da sua obra "Nós combateremos a sombra", destinado a galardoar trabalhos que "evocam e aprofundam a problemática humana e que respeitem a verdade dessa problemática".

Um orgulho para a cultura portuguesa.

Manuel Alvess (1930-2009)


Morreu Domingo, em Paris, Manuel Alvess, aquele a quem Daniel Ribeiro (num sentido artigo publicado no site do Expresso, que aqui se reproduz, com a devida vénia) chamou "o mais secreto dos pintores portugueses":

"Cultivava o que os franceses chamam um humor "décalé". Solitário, vivia num mundo à parte, parecia uma pessoa fria, mas não era. Habitava num pequeno estúdio no bairro da Bastilha, em Paris, e era o que o que se poderia chamar um "tipo extraordinário". Mostrava aí as suas obras aos amigos com entusiasmo e, sempre, com um sorriso irónico. A ironia era um sinónimo dele próprio e também da sua obra. Gostava de chapéus de abas e adorava Fernando Pessoa, com quem aliás se parecia fisicamente. A Fundação Serralves tirou-o do anonimato há cerca de um ano com um retrospectiva da sua obra que surpreendeu o mundo da arte em Portugal. Era um intelectual. Natural de Viseu, disse um dia a este correspondente que fazia um trabalho burocrático de contabilista. Fazia muito mais do que isso, evidentemente. Trabalhou sobre o papel selado da sua infância, sobre os pesos e medidas, perfurou minuciosamente telas, jogou com as matérias, o vazio, as cores, os pincéis e os objectos. Deixou uma obra de rara originalidade, longe, muito longe das modas e do mundo VIP da pintura. Foi amigo dos colegas Lourdes Castro e René Bertholo, que já viviam em Paris quando ele aí desceu, em 1963, do famoso comboio dos emigrantes portugueses - o Sud-Expresso, na estação de Austerlitz. Até ao fim, esta manhã, às 9 horas, manteve uma relação especial com outro pintor português, igualmente residente em Paris - José David. Encontrámo-nos diversas vezes no ateliê deste último, em Montparnasse, onde Zé David nos servia carinhosamente os melhores pratos de bacalhau cozido e frango com gengibre do mundo. Foi José David que me deu a notícia, a chorar, da morte de Alvess. "Era um irmão, um amigo, mais do que isso", disse. Muito afectado pelo seu desaparecimento, não quis acrescentar mais nada. Alvess, o solitário, adorava esses encontros no ateliê do amigo. Era de uma inteligência rara e, por vezes, parecia até um pouco extravagante. Viveu livre e procurou a sorte de conseguir ter tido uma vida vertical e digna, como uma obra de arte. Sempre com dificuldades financeiras, sem compromissos com críticos ou galerias - raramente vendeu um quadro antes da exposição em Serralves - foi feliz. O trabalho dele foi a arte. Viveu para ela e confundia-se com o seu trabalho - algumas das suas mais belas telas são soberbos e inconfundíveis auto-retratos. Nunca se preocupou por vender pouco ou nada. Foi um ser humano e habituou-se a reduzir as necessidades que a vida impõe. Pôde, assim, ser independente e viver em paz. Acrescentara um S ao nome de família. Manuel Nogueira Alves contou-me um dia a historia desse S a mais no apelido. Foi mais uma das suas ironias: os franceses teimavam em acentuar a ultima sílaba do seu nome, e ele fez-lhes a vontade, para acabar com as confusões. Fez "performances" que chocaram Paris. O jornal conservador, le Fígaro, não gostou de um dos seus primeiros happenings na capital francesa, nos anos 60 - à porta do Museu de Arte Moderna, o português despejava e limpava lixo, mecanicamente, horas a fio, como os seus compatriotas, emigrantes miseráveis, faziam, na época, durante todo o dia. O jornal reprovou a ironia do artista. Alvess foi mais do que um pintor. Na realidade foi um artista completo. Uma outra vez, noutra "performance", criou a "primeira imagem": fabricava em público um espelho e depois chamava alguém da assistência para ver o trabalho. O espectador via-se ao espelho e ele oferecia-lhe o objecto, cuja primeira imagem fora a do seu feliz primeiro proprietário. Construiu uma obra ao longo de décadas, repito, de singular originalidade. Exactamente à sua imagem de homem sincero, cheio de humor, a um tempo extremamente inteligente, simples e tímido. Paris e sobretudo os bairros da Bastilha, de Saint-Germain de Prés e de Montparnasse, onde adorava passear, não serão mais os mesmos. Vai faltar-lhe a figura fugidia de um artista português, um verdadeiro parisiense vindo da Beira Alta que aí viveu como uma sombra, mas que, no convívio como os amigos, ria com um sorriso luminoso e gargalhadas francas. Manuel Alvess foi um grande pintor e um homem sem nada na manga. "Tive sorte, vivi como um artista", disse há poucos dias, a um dos seus últimos visitantes. Nem o cancro que o vitimou lhe conseguiu apagar a ironia."

Ainda o Tibete

Afinal, está esclarecido o mistério do nosso leitor no Tibet. Pelos vistos, é poeta - e dos bons - e até tem blogue. Aqui fica a sua imagem, com conhecidos locais.

O "16 de Março"

Foi um tempo confuso, revelador de que o “movimento dos capitães”, formado no final de 1973 com finalidades de reivindicação corporativa mas que evoluíra já para um projecto político que tinha como principal objectivo o derrube do regime, ainda tinha dentro de si algumas significativas contradições, fragilidades e hesitações.

A demissão do general António de Spínola do cargo de vice-chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, na sequência da publicação do seu livro “Portugal e o Futuro”, lançou uma forte perturbação no seio dos seus apoiantes. Na sua sequência, em 16 de Março de 1974, um grupo “spinolista” tomou conta do regimento de Infantaria das Caldas da Rainha, numa acção que, supostamente, era destinada a provocar o levantamento de outras unidades militares, finalizando com uma marcha sobre Lisboa. Por razões que ficaram deficientemente explicadas, essa movimentação militar havia sido mal planeada e não teve qualquer eco. O regime reagiu, embora com cuidada moderação repressiva, e deteve os revoltosos na prisão militar da Trafaria.

O que terá levado os “spinolistas” a esta aventura? O próprio Spínola tê-los-á estimulado? O desejo de tomarem a liderança de uma revolução que talvez pressentissem que, sem essa atitude vanguardista, escaparia ao seu controlo, como viria, de facto, a acontecer?

Para quem planeava a queda militar do regime, o “16 de Março” terá tido a grande virtualidade de mostrar as cartas de que o Governo dispunha, a sua capacidade de reacção e as forças militares com que podia contar.

Na unidade militar em que eu prestava serviço, como oficial miliciano, serviu claramente para “contar espingardas” e para perceber quem, chegado o momento da verdade, estava ou não disposto a arriscar-se a lutar. E, do mesmo modo, a identificar quem teria de ser neutralizado.

Há precisamente 35 anos, o “16 de Março” foi já o prenúncio do 25 de Abril.

domingo, março 15, 2009

O esquema

O António era um conquistador “nato” ou, como ele dizia, com graça e referindo-se às suas tendências esquerdistas, menos “Nato” e mais “Pacto de Varsóvia”.

Conheci-o em Paris, nos anos 60, onde estudava sociologia e levava uma bela vida, hospedado da cidade universitária, com um cheque mensal enviado pelo pai, um militar da Marinha que a Revolução havia de alcandorar na hierarquia. Vestia-se sempre impecavelmente, tinha um MGB GT que era a inveja de muitos, abancava com nocturna regularidade na barra do Gambrinus, onde espalhava a sua imensa simpatia e charme.

É claro que o facto de ser casado lhe limitava, naturalmente, o espaço de manobra para as aventuras, pelo que necessitava de montar alguns estratagemas para as levar a cabo. O que quase sempre conseguia.

Naquele mês de Março de 1974, ambos estávamos a prestar serviço como oficiais milicianos na EPAM (Escola Prática de Administração Militar), na Alameda das Linhas de Torres, no Lumiar. Um dia, o António pediu a minha ajuda para uma “operação”: telefonar à mulher dele, a meio da manhã, informando-a de que, inesperadamente, tinha ocorrido uma emergência e que ele fora enviado, com outros colegas, para um “exercício militar”, pelo que estaria incomunicável durante 48 horas. Devia acrescentar que era apenas um treino, pelo que não havia qualquer razão para ela se preocupar. Na lógica de uma velha (ainda que contestável, eu sei!) solidariedade masculina, prontifiquei-me a fazer a chamada telefónica.

O plano do António era arrancar cedo para a Ericeira, acompanhado de uma bela pequena, impante no seu MGB. Havia já assegurado, antecipadamente, uma folga no serviço, para que tudo corresse sem falhas. No seu caminho para a Ericeira, passou na Alameda das Linhas de Torres e do que se lembrou? De ir atestar o depósito de gasolina na unidade militar, onde o preço era muito mais barato. Esse era um dos privilégios que ninguém deixava de utilizar.

À chegada à EPAM, um complexo situado onde hoje é uma universidade, o António estranhou ao ver que os grandes portões de entrada estavam fechados, contrariamente ao que era habitual. Buzinou, aparecendo pela guarita a cabeça do sargento-de-guarda, o qual, reconhecendo-o, deixou entrar o MGB.

Só que a vida tem destas surpresas: estávamos precisamente no dia 16 de Março, as tropas fiéis ao general Spínola tinham-se amotinado na noite anterior nas Caldas da Rainha e a EPAM, como todas as unidades militares, estava, desde há horas, de rigorosa prevenção. Como era de regra nestes casos, todos os militares ficavam obrigatoriamente retidos em serviço.

O António já não foi autorizado a abandonar a unidade, recordo-me da sua fúria e do imenso gozo com que alguns de nós, conhecedores do “esquema” que acabara de se esboroar, vimos a pobre e bela amiga do António a ter de sair da EPAM, a pé, com um saco na mão, em busca de um táxi ou de um autocarro.

Por mim, livrei-me de ter de dizer uma mentira à mulher do António. Ele tinha agora um álibi imbatível.

Hardy

Quando surgiu, e para a minha geração, Françoise Hardy representava um modelo muito particular na música francesa, ao tempo marcada por ritmos bastante mais vibrantes e sonoros. Aquela imagem "modiglianica", de cabelos longos, a tocar viola e a cantar, em tom sereno, coisas algo inocentes, dizia bem com a nostalgia de alguma juventude portuguesa dos final dos anos 60. Quem, à época, não terá ficado marcado pelo "Je suis d'accord" ou o "Ton meilleur ami"? Quase que pode dizer-se que Carla Bruni segue hoje muito do seu antigo registo musical.

Perdi-a de vista, por muito tempo. Às vezes ouvia uma sua nova canção, mas, confesso, o estilo deixou de me despertar curiosidade. Ou melhor, só fiquei mais atento quando um dia constou que teria apoiado ideias racistas de Jean-Marie Le Pen, o líder de extrema-direita francesa. Posteriormente, ouvi-a recuar dessa atitude, num discurso um tanto embrulhado, de quem terá sempre grande vantagem em não andar muito pela política.

Li, há dias, as suas memórias, "Le désespoir des singes et autres bagatelles". Um livro bem escrito e bem articulado, que dá mostras de que percebeu a vida.

E ontem lá esteve, no Salon du Livre, a dar autógrafos. Não a vi, mas dizem-me que está como a foto acima a mostra, com o mesmo ar sereno, com os cabelos brancos. Acontece a muitos...

sábado, março 14, 2009

Portugal em Paris

"Les Portugais à Paris - au fil des siècles & des arrondissements" passa a ser uma bíblia para quem, como eu, tenta hoje descobrir na capital francesa as marcas da passagem dos portugueses. Com humor, de uma forma leve e numa escrita agradável, lá está tudo quanto de português deixou alguma marca por Paris.

Este trabalho de Agnès Pellerin, em que colaboraram Anne Lima e Xavier de Castro, tem gravuras de Irène Bonacina, onde, com grande imaginação, dom Sebastião, Vasco da Gama e Eça de Queirós se cruzam com gentes de hoje. E uma capa onde Paris passa a um azulejo português.

Fizemos ontem o pré-lançamento de mais esta edição de Michel Chandeigne no Salon du Livre, com vinho português e boa disposição.

sexta-feira, março 13, 2009

Alto Volta

A história (verdadeira) passou-se no Ministério dos Negócios Estrangeiros, nos anos 70.

Num dossiê levado ao ministro, seguia o texto de uma qualquer convenção estabelecida no âmbito das Nações Unidas, o qual era acompanhado de um anexo, com a lista dos países subscritores que já a haviam ratificado. Estranhamente, porém, a lista dos países incluída no anexo tinha uma primeira página apenas com a referência a dois países, seguida de uma outra com mais de 80. Tudo por ordem alfabética.

O ministro perguntou, um pouco intrigado, a razão pela qual se faz essa separação. Ninguém soube responder. Um lapso, pela certa. Nada de importante, contudo.

Aborrecido com o incidente, e logo que regressou ao seu serviço, o responsável chamou o jovem funcionário diplomático que preparara o dossiê. A mesma perplexidade: ele também não vira a lista antes .

Para tentar acabar com o mistério, chamou-se a dactilógrafa, para que explicasse a razão por que tinha feito as coisas dessa forma. Com a maior calma, ela elucidou: "Por que razão só coloquei dois países numa página e os restantes noutra? É muito simples: porque depois do segundo país estava lá escrito... Alto Volta. E eu mudei de página, claro!".

O erro não se repetirá. O Alto Volta mudou entretanto de nome, para Burkina Faso. Deve ter sido para evitar confusões destas...

Citações III

... e este blogue foi também citado no Fio de Prumo, o que muito agradece.

O problemas destas referências é que são "apanhadas" no "Google Blog Search", cuja fiabilidade é discutível.

Afropessimismo?

A descrença na eficácia do desenvolvimento africano, provocada por inúmeros insucessos e recuos, nos processos políticos e de crescimento de muitos dos seus países, gerou, já há bastante tempo, o cínico conceito de "afropessismismo".

O caso de Cabo Verde, onde hoje está em visita oficial o primeiro-ministro português, é um bom exemplo de um Estado africano que evoluiu de um modo extremamente positivo, uma experiência política que a comunidade intenacional tem obrigação de apoiar e de incentivar, cada vez mais. Com uma natureza hostil e escassos recursos materiais, mas com uma determinação humana muito forte, Cabo Verde tem dado ao mundo uma lição de como é possível estruturar uma sólida democracia, com respeito pela alternância e pela plena preservação do Estado de direito. Daí o respeito que o país recolhe hoje no mundo, serviço por uma diplomacia de qualidade, que não descura a promoção da riqueza cultural que projecta.

Julgo que os portugueses se sentem hoje felizes por constatarem que o seu país mantém com Cabo Verde, desde há vários anos, uma relação de frutuosa cooperação, em todos os domínios, um sólido entendimento e amizade, que sempre foi muito para além das orientações dos conjunturais governos, de um lado ou do outro. E isto não é apenas "langue de bois" diplomática, é a pura realidade.

Cabo Verde é a prova provada que o "afropessimismo" não tem razão de ser.

quinta-feira, março 12, 2009

Camarote

Ainda o futebol.

Confirmei ontem à noite, no Parque dos Príncipes, o meu tradicional incómodo em ver jogos de futebol nos camarotes, com os presidentes dos clubes e convidados.

Irrita-me ficar limitado na minha capacidade de poder dar um grito, de poder exteriorizar a minha decepção ou contentamento por uma jogada, de lançar uma "farpa" verbal ao árbitro ou ao "bandeirinha", de protestar por um fora de jogo mal assinalado. Há uma contenção hipócrita em todos os camarotes dos estádios. Confesso que prefiro a bancada simples, ficar entre "os meus", ter a liberdade de dizer alto o que me vai na alma.

Ontem, no PSG-Braga, numa bela noite de bom futebol português, lá estive a "fazer de embaixador"...

Porto de honra

Pode gostar-se, ou não, do clube. Pode admirar-se, ou não, a respectiva gestão e os seus métodos. O que ninguém pode negar, com honestidade, é que o Futebol Clube do Porto é, nos tempos actuais, a face mais prestigiada do futebol português no exterior.

Citações II

Mais alguns blogues tiveram a simpatia de nos citar ou referir.
Aqui fica a respectiva lista:

O Cigarrilha
Puxa Palavra
S/a pálpebra da Página
A barbearia do senhor Luís
Lino Braga
Bicho Carpinteiro
Memória Virtual
Carlos Alberto
NRP Cacine
Estado Sentido
O Sinaleiro da Areosa
Cogitar
Mundos Paralelos
Delito de Opinião
Leandro on the Road
Tomar Partido
Café História
Contra Capa
Francisco del Mundo

Angola

JustifierFoi um caminho longo, muito longo. Dos traumas da guerra às crises pós-independência, das andanças da UNITA por Lisboa aos acordos de Bicesse, das tensões diplomáticas pontuais à recuperação da confiança.

As relações luso-angolanas parece terem encontrado, nos últimos anos, um ponto de estabilidade favorável aos interesses dos dois países. Ainda bem que assim sucede. E todos esperamos que assim continuem, agora que a nova prosperidade angolana lhe permite um cruzamento de interesses financeiros com Portugal.

Vivi em Angola, entre 1982 e 1986, num dos períodos turbulentos que marcaram as relações entre os dois países. Era um tempo de guerra civil, com Luanda quase sitiada, com recolher obrigatório e montras e lojas desertas. Às vezes não havia água, às vezes faltava a luz, dias havia em que, no Hotel Trópico, o menu era peixe frito com arroz ao almoço e arroz com peixe frito ao jantar. Salvavam-se os fins de semana na ilha ou no Mussulo, as lagostas do Mário em Cabo Ledo, os muitos amigos e a imensa simpatia de um povo sofrido e cansado.

No plano político-diplomático, foram momentos muito complexos para as relações bilaterais, anos de trabalho paciente e delicado. Espero que esse esforço possa ter contribuído para alguma coisa do que, posteriormente, se construiu.

A Angola de hoje - dizem-me - é algo diferente, mais cosmopolita e movimentada, com negócios a emergir por todo o lado, com uma presença portuguesa mais actuante e bem aceite. Mas, em especial, agrada-me pensar que os sorrisos largos e francos das quitandeiras dos mercados de Luanda podem agora reluzir, mais felizes. Bem o merecem!

quarta-feira, março 11, 2009

Duas Igrejas

O actual arcebispo de Olinda e Recife, José Sobrinho, lançou uma "excomunhão" sobre a mãe e os médicos que fizeram abortar uma criança de nove anos, estuprada pelo padrastro. Não me pronuncio sobre a eficácia punitiva do acto, mas julgo ser de registá-lo, no mundo do século XXI.

E talvez valha a pena utilizar o pretexto para evocar a figura de Helder da Câmara, um antecessor do actual arcebispo na mesma diocese, figura ímpar de dignidade e coragem na vida cívica do Brasil, um referente dos valores da democracia e dos Direitos Humanos, em tempos nada fáceis.

Já agora, lembro também um facto que por muitos é desconhecido: quando, em 1960, o cardeal Cerejeira celebrou missa na inauguração de Brasília, foi o então bispo Helder da Câmara quem o coadjuvou.

Uma vez mais, duas igrejas, lado a lado.

O outro 25

Se a manifestação dos 50 anos do 25 de Abril foi o que foi, nem quero pensar o que vai ser a enchente na Avenida da Liberdade no 25 de novem...