Há dias, num quiosque na praça da República, em Viana do Castelo, comprei uma revista francesa, apenas porque trazia na capa o anúncio de que vem aí, daqui a poucos meses, uma nova aventura do "Blake & Mortimer".
Claro que a autoria destes novos episódios já não pertence ao traço genial de Edgar P. Jacobs, mas, com altos e baixos, estas sequelas continuam a ter a sua graça. E eu, sem falha, continuo a comprá-las.
Sou fã, desde sempre, desta série de banda desenhada. Considero mesmo que "O Mistério da Grande Pirâmide" é talvez o melhor album de BD de sempre - mas aqui sei que estou a entrar num terreno que se presta ao debate. Os "tintinófilos", os admiradores de Astérix e Lucky Luke e, principalmente, os fanáticos do Corto Maltese não me perdoarão, eu sei! Como me dizia, há semanas, olímpico, um destes últimos: "Pratt é ouro!"
Este texto, contudo, não busca a polémica, embora talvez lhe não escape.
Como qualquer pessoa, quando estou a ler, pela noite, um livro que me interessa muito, deixo-me por vezes ficar, por horas perdidas, com a luz acesa. Detesto contrariar o meu "vício" de leitura, mesmo que isso se note em olheiras posteriores.
Em criança, lembro-me de que o "apaga a luz!" era a inevitável e indesejada palavra de ordem. E porque a banda desenhada era, a par dos Salgari e dos Verne, o meu regular alimento noturno, os meus pais cometiam, noite após noite, esse imperdoável "crime" que é interromper uma aventura imaginária juvenil.
Um dia, numa das minhas férias anuais em Viana do Castelo, olhei para uma cómoda em casa da minha avó e descortinei sobre ela uma pequena estatueta de Nossa Senhora, presumo que de Fátima. Era daqueles modelos fluorescentes que, depois de apagada a luz ambiente, refletem, por minutos, uma declinante claridade. Já estão a imaginar, não estão? A partir daí, havia alguns minutos de "prolongamento", de leitura sob os lençóis.
Difícil foi justificar perante os meus pais aquela súbita "fé" em Nossa Senhora, que me levava a "requisitá-la" para a minha mesa de cabeceira. Só anos mais tarde lhes revelei a utilidade marginal que descortinei para aquele símbolo de uma religião com a qual, na vida, nem ao de leve me encontrei.