Ontem, surgiu a notícia de que Ariel Sharon, o antigo primeiro-ministro de Israel, há cerca de quatro anos nuna situação comatosa, regressou a sua casa.
O mundo quase se havia esquecido dessa figura intransigente da direita israelita, celebrada pela arrojada travessia militar do canal do Suez, na guerra do Yon Kippur, em 1973, e, mais tarde, por fortes responsabilidades no massacre de Saabra e Chatila, no Líbano, em 1982. Deve-se ainda a Sharon, no entender de muitos observadores, a deliberada "provocação" que deu origem à segunda Intifada, após a sua ostensiva visita à esplanada das mesquitas, em 2000.
Ao ver ontem, na televisão, a ambulância que transportava Sharon chegar à sua residência, recordei os dias em que, em 1978, acompanhando o então ministro da Agricultura e Pescas português, Luis Saias, visitei o seu "bunker" na propriedade familiar que tinha no deserto do Negev. Sharon era, então, ministro da Agricultura do seu país. Guardo fotografias desse momento.
Sharon era uma figura rotunda, com um ar um tanto "patronizing" mas com alguma cordialidade, de onde transparecia uma autoridade natural que advinha, sem dúvida, dos seus tempos militares. Na lógica tradicional da composição dos governos israelitas, cujo sistema eleitoral "balcaniza" o executivo por uma imensidão de partidos, a Sharon calhara a Agricultura, como mais tarde iria caber a Habitação. A importante dimensão político-estratégica destes cargos ia, porém, muito para além da tecnicidade do lugar, pelo que as conversas com o seu homólogo português - cuja especialização era, aliás, também limitada - não passaram de vagas generalidades.
A visita correu bem, com demonstrações de simpatia pessoal de parte a parte, com alguns projetos de cooperação técnica assinados. No seu termo, Luis Saias informou-me que decidira convidar aquele seu homólogo a visitar Portugal. A seu ver, a amabilidade com que este o recebera tinha de ser recompensada. Expliquei então ao nosso ministro que, como diplomata e representante do Ministério dos Negócios Estrangeiros na delegação, desaconselhava vivamente que convidasse Sharon a ir a Lisboa. A posição portuguesa no delicado equilíbrio da questão do Médio Oriente era muito cautelosa e o MNE nunca viria a aceitar dar "luz verde", naquela conjuntura, à concretização do convite.
(Antes da nossa partida para Israel, como já relatei aqui há tempos, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Sá Machado, havia-me transmitido pessoalmente as linhas "limite" de enquadramento desta visita técnico-política. Um convite para uma visita de Sharon a Lisboa ia, claramente, muito para além dessas instruções).
(Antes da nossa partida para Israel, como já relatei aqui há tempos, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Sá Machado, havia-me transmitido pessoalmente as linhas "limite" de enquadramento desta visita técnico-política. Um convite para uma visita de Sharon a Lisboa ia, claramente, muito para além dessas instruções).
Luis Saias não teve minimamente em conta as minhas objeções e, na conferência de imprensa final (em que eu tive de traduzir o que disse...), deixou expresso o convite para Ariel Sharon visitar Portugal.
Saias deixaria de ser ministro tempos depois, com o fim do governo PS-CDS. Para a História, Sharon não foi a Portugal.
Saias deixaria de ser ministro tempos depois, com o fim do governo PS-CDS. Para a História, Sharon não foi a Portugal.
6 comentários:
LUÍS SAIAS!
Sr Embaixador, não vale a pena dizer ao humilde comentador que eu sou o que é feito desse senhor, pois não?
Era só para perceber como se chega a Ministro e depois se dá a evaporação inexorável de cetas criaturas...
Ainda Bem...
Isabel Seixas
O antigo primeiro-ministro israelita Ariel Sharon , em coma há quase cinco anos, já regressou ao hospital e tratou-se apenas de um primeiro teste de equipamentos, tendo em conta que é intenção da família transferi-lo definitivamente para casa.
Fiquei um pouco chocada... A notícia que li estava acompanhada de uma fotografia do Ariel Sharon no seu estado actual.
Após sofrer um derrame cerebral, os filhos decidiram mantê-lo vivo com assistência médica.
Trata-se de um assunto complexo que gera ampla discussão em termos éticos. Será legítimo manter seres humanos em estado vegetativo sem a concordância dos próprios (e muitas vezes com prognósticos irreversíveis)?
Senhor Embaixador, muito obrigada por partilhar mais um episódio da política nacional. São estes factos que nos ajudam a compreender um pouco mais a História Contemporânea.
IBP
Faço minhas as palavras de Isabel Seixas!
P.Rufino
Ha palavras que têm sonoridades que gosto, por exemplo:
Gosto de SHALOM (שלום), mas nao gosto de SHARON, va-se la saber porquê... ; )
Por mais que leiamos os jonais de referência e vejamos/oiçamos os telejornais, o acontecimento está aqui.
Vale mais um apontamento deste "blog" do que cinquenta mil debates.
Será um processo maiêutico compará vel ao do grande pensador a quem só a cicuta eliminou?...
Enviar um comentário