domingo, novembro 07, 2010

Rouen

A atenção que, nas últimas semanas, tem vindo a ser concedida aos políticos "centristas" na vida política francesa, por virtude da "contabilidade" da sua importância potencial no caminho para as eleições presidenciais de 2012, levou-me a recordar, numa visita de trabalho que fiz a Rouen, na passada sexta-feira, a figura de Jean Lecanuet (na foto), que foi "maire" da cidade durante um quarto de século. Lecanuet morreu em 1993.

Lecanuet foi uma figura importante na vida política francesa, em especial nas tentativas, quase sempre frustradas a prazo, de criar em França uma dinâmica centrista que pudesse abalar decisivamente a bipolarização esquerda-direita. Nesse esforço, logo no pós-guerra, desempenhou um papel relevante no democrata-cristão MRP (Mouvement Républicain Populaire), tendo obtido, como candidato presidencial, mais de 15% nas eleições de 1965, obrigando de Gaulle a uma segunda volta contra François Mittérrand. Aliás, este último político disse um dia (e cito de cor) que "o centro, em França, ou está à direita, ou está...à direita". Verdade seja que, com certas escassas exceções históricas (algumas das quais o beneficiariam), o líder socialista teve, as mais das vezes, razão nesta sua avaliação. Lecanuet fundou depois o Centre Democrate e, mais tarde, ajudou Giscard d'Estaing a chegar ao poder, tendo presidido à UDF (Union pour la Démocracie Française) que apoiava a ação presidencial. Foi ainda ministro, senador e deputado.

Nos contactos locais que tive, tentei perceber o que resta da memória de Lecanuet no imaginário de Rouen. Acabei por ser apresentado a um seu antigo colaborador que, emocionado, me disse que Lecanuet está para Rouen como Chaban-Delmas estava para Bordeaux.  Deve ter razão, embora as figuras não possam ser comparáveis, na sua respetiva dimensão nacional.

No almoço que tive com a dinâmica "maire" da cidade, Valérie Fourneyron, num restaurante dirigido por um chefe português com grande expressão na região (o coimbrão José Rato, do restaurante "Reverbère"), ouvi - como sempre - palavras de grande apreço pela Comunidade portuguesa, da qual  encontrei uma dezenas de pessoas mais tarde, num convívio organizado pelo nosso Cônsul Honorário local. Na região normanda de Rouen temos vários empresários de sucesso e algumas associações bastante ativas. Prometi interessar-me pelo ensino de português na Universidade local e colocar a AICEP na rota comercial da região, com cuja Câmara do Comércio também reuni.

Uma das angústias com que, muitas vezes, saio deste tipo de visitas é a dificuldade em conseguir dar uma sequência operativa eficaz a coisas promissoras que "ficam no ar". Não chegamos para tudo...

10 comentários:

cunha ribeiro disse...

Depois de me ter permitido, sem esforço, conhecer um pouco da história política contemporânea, permita-me congratulá-lo, Sr Embaixador, pelo interesse demonstrado na contínua expansão da nossa língua nesse magnífico país que é a França. Pena que quem tem a responsabilidade de escolher os protagonistas ( Instituto Camões)não seleccione pessoas que não apenas dominem a língua de Torga, mas também saibam e amem a língua de Baudelaire.

Anónimo disse...

"Sequência operativa eficaz"
(FSC:2010)

Vou adotar estas três palavras como mote para ação a esta semana de trabalho,obrigada.
Isabel Seixas

Anónimo disse...

Senhor Embaixador, não chegamos para tudo e muitos já desistiram. Seria bem mais fácil se as instituições responsáveis pela promoção de Portugal trabalhassem exactamente nisso: promover Portugal no plano do investimento, economia, cultura e turismo. Infelizmente essas instituições ocupam-se a trabalhar para "dentro" e a gerir egos de pessoas que fazem uso delas para fins pessoais....

Manuel Antunes da Cunha disse...

J. Lecanuet também ficou na história da comunicação política, utilizando, por ex., para a sua campanha preisidencial o que hoje se chama teasing na publicidade (chamar a atenção em várias etapas). Aliás essa sua inovação vale-lhe hoje um lugar ao lado de Kennedy (mutatis mutandis, é claro) nas obras francesas de comunicação política.

Manuel Antunes da Cunha

Helena Sacadura Cabral disse...

Mais uma vez, faço minhas as palavras de Cunha Ribeiro.

Anónimo disse...

Compreendo que se preocupe com os "anúncios" de circunstancia e o que será a realidade.

"Les promesses des hommes politiques n'engagent que ceux qui les reçoivent. Charles Pasqua"

C.Falcão

Julia Macias-Valet disse...

Cunha Ribeiro...tirou-me as palavras da boca !

Cunha Ribeiro disse...

Júlia,

Nuito me sensibiliza constatá-lo. Será a Júlia mais uma apaixonada pela cultura francesa, tal como eu?

Julia Macias-Valet disse...

Caro Cunha Ribeiro, para podermos comunicar e establecer laços é necessario conhecer o outro...a sua historia e a sua cultura.

Julia Macias-Valet disse...

"...é a dificuldade em dar uma sequência operativa eficaz..."

Infelizmente constato desde ha alguns anos essa dificuldade em dar uma sequência operativa no que diz respeito ao ensino da lingua portuguesa e a falta de uma rede coesa e forte no terreno.
No final de cada ano civil os directores das escolas elementares francesas sao contactados pela Coordenaçao do Ensino da Lingua Portuguesa em França no intuito de introduzirem nos cadernos de todos os alunos da sua escola (sejam eles franceses ou de outras origens) uma ficha de informaçao e inscriçao às aulas de português que serao leccionadas (gratuitamente) numa escola do bairro onde serao agrupados todos os alunos desse bairro no inicio do seguinte ano lectivo (isto no caso de Paris).

Dito assim, a coisa parece simples...mas nao é.
Os directores nao estao para estar a fazer 200 ou 300 fotocopias porque isso "ce n'est pas leurs oignons".

E de ano para ano ha cada vez menos alunos inscritos nas aulas leccionadas. Este ano na escola da minha filha uma classe de português foi fechada por falta de alunos. Mas nao por falta de interessados, so que a informaçao nao circula.

É pena !

Entao este ano decidi utilizar a minha rede de contactos e na qualidade de presidente da associaçao de pais da escola da minha filha estabelecerei contacto com as outras presidentes das associaçoes de pais das outras escolas do bairro para que seja feito um "forcing" na difusao da informaçao.

"On croise les doigts !"

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...