quinta-feira, outubro 15, 2009

Votações diplomáticas

A pretexto da despedida oficial de um amigo comum, tive a jantar na residência a nova directora-geral da UNESCO, a bulgara Irina Bukova.

Irina é uma amiga pessoal de há quase 15 anos. Foi secretária de Estado dos Assuntos Europeus e ministra dos Negócios Estrangeiros do seu país e era, até há pouco, embaixadora da Bulgária em França. Temo-nos encontrado frequentemente pelo mundo e, a título pessoal, fiquei muito satisfeito pelo facto dela ter ascendido ao posto mais elevado desta agência especializada da ONU.

Irina Bukova sabe e entende que Portugal não pôde votar na sua candidatura, por ter anteriores compromissos assumidos que relevavam de outros equilíbrios que não interessa aqui analisar, até porque se trata de temas fora da minha área de competência. E ela sabe, em especial, que Portugal é um país que honra sempre, com o maior rigor, os compromissos que assume no plano internacional - que um voto comprometido é, pela nossa parte, um voto garantido. Não são muitos os Estados que têm esta imagem na vida multilateral. Nós têmo-la, tal como temos a obrigação de mantê-la. Por isso, não obstante alguma polémica que envolveu, mesmo entre nós, o processo da eleição do novo director-geral da UNESCO, Portugal procedeu de forma perfeitamente consonante com os compromissos que, em tempo oportuno, havia assumido.

Na minha conversa com Irina Bukova, ao referirmos o facto de quase metade dos países membros da UNESCO não terem votado nela, recordei-lhe uma lição que recebi de Jaime Gama, no termo da nossa eleição, em 1996, para o Conselho de Segurança da ONU. Na altura, eu manifestava-me abertamente desagradado e disposto a tirar algumas consequências futuras do facto de alguns dos nossos aliados tradicionais nos terem abandonado, num momento em que necessitavamos deles, o que, contudo, não impediu a nossa vitória. Gama foi mais ponderado e recomendou-me que rectificasse a minha atitude: "Não se constrói uma política externa com base em ressentimentos". Tinha toda a razão.

Estou certo que a inteligência, simpatia e sentido de compromisso de Irina Bukova a farão caminhar no sentido da união de todos os países que compõem a UNESCO. E nós estaremos, ao seu lado, para a ajudar a dar vitalidade a uma organização a cuja actividade atribuímos a maior importância.

quarta-feira, outubro 14, 2009

Palhaçadas

Nos últimos dias, a internet foi inundada por um vídeo no qual a actriz brasileira Maitê Proença revela ideias fortemente preconceituosas em relação aos portugueses. Trata-se de graçolas de quem, finalmente, tornou clara uma lusofobia que, com inegável sucesso, há anos que vinha a disfarçar bastante bem. Entretanto, fez já um acto de contrição, porque, afinal, o mercado português sempre lhe dá regular jeito à conta bancária.

Quando fui embaixador no Brasil, defrontei-me, por mais de uma ocasião, com situações idênticas. Algumas vezes em que achei oportuno, respondi a esses comentários. Outras, optei por não reagir.

Este é um problema que se coloca, de forma recorrente, a muitos embaixadores: avaliar se devem ou não actuar, em face de ataques públicos ao seu país ou aos seus cidadãos. Há que ponderar se tal reacção não acabará por ter um efeito desproporcionado, isto é, se não ajudará a chamar mais atenção para a questão, do que aquela que ela teve no momento em que ocorreu. E, depois, nos casos em que decidirmos intervir, há que ainda que escolher e medir o tom que essa intervenção deve ter. Podem crer que é uma questão nada fácil.

Também aqui em França, o problema se coloca. Um conhecido cómico de "stand-up comedy", Patrick Timsit, tem feito, num espectáculo público em exibição em Paris, comentários desagradáveis sobre os portugueses. Vários compatriotas sugeriram uma reacção a esse "sketch". Também acho que devemos tê-la: rir dele. Não é isso que os palhaços querem?

Ainda a solidão

A tragédia do cidadão português cujo cadáver foi descoberto, aqui em França, apenas dois anos após a sua morte, foi objecto de um artigo que hoje publico no "Correio da Manhã".

Pode ser lido aqui.

Madeira

Ontem, a Embaixada de Portugal em Paris encheu-se de "experts", para apreciarem a fantástica variedade dos nossos excelentes Vinhos da Madeira.

Quase duas centenas de escanções, enólogos, "restaurateurs" (detesto o português "restauradores", que, para além da praça, me faz sempre lembrar mobiliário), importadores, distribuidores, responsáveis por lojas "gourmet" e muitos jornalistas especializados andaram pelos nossos salões, tendo tido também o ensejo de petiscar algumas especialidades portuguesas da casa Canelas (passe a merecida publicidade).

Uma agenda de trabalho alternativa impediu-me, infelizmente, de partilhar os prazeres do Verdelho, do Malvasia ou do Sercial. Mas diz-me quem esteve presente que o êxito desta degustação foi bastante grande. Agora, só esperemos que as encomendas correspondam.

Em tempo: leia o que escreve a Radio du Goût.

terça-feira, outubro 13, 2009

Solidão

O corpo de um cidadão português de 62 anos foi ontem encontrado, numa casa, nos arredores de Paris, dois anos após a sua morte natural. Nenhum familiar, amigo, conhecido ou vizinho deu, entretanto, pela sua falta.

Pode haver algo mais triste do que isto?

Prós e Contras

O debate que ontem teve lugar no programa "Prós e Contras", que a RTP Internacional nos proporcionou, constituiu um interessante momento para a aferição de diferentes leituras sobre conceitos deontológicos da profissão de jornalista em Portugal.

Porque é muito raro ver aquela classe profissional dar-nos o privilégio de ver contrapostas tal diversidade de posições, afastando-se do monolitismo de defesa corporativa que parece ser uma sua endémica e sacrossanta regra, todos ganhámos muito com o que ouvimos. Nalguns casos, por razões bem alheias à vontade dos intervenientes. Foi um favor que ficamos a dever a Fátima Campos Ferreira.

Turquia

Está este ano a ter lugar a "Saison de la Turquie en France", uma iniciativa de cariz cultural que permitirá à sociedade francesa ter um olhar sobre a realidade turca que vá para além da caricatura com que a questão da aproximação deste país à União Europeia tem vindo a ser abordada, nos últimos anos, por vários sectores da opinião pública.

Este é um tema que sabemos não ser nada fácil em França e que aqui continua a suscitar fortes reacções e polémicas, com natural projecção nos agentes políticos. Por essa razão, considero ser muito saudável encontrar, no seio da opinião pública francesa, figuras de prestígio que, aproveitando estes eventos culturais, tentam recolocar o debate num ambiente de serenidade e maior racionalidade.

A carta que, no jornal "Le Monde" de hoje, surge assinada por figuras como Michel Rocard, Jacques Delors, Luc Ferry, Edgar Morin e Alain Touraine é um verdadeiro manifesto de responsabilidade cívica e um alerta para o erro que constitui a criação de uma espécie de "muro" civilizacional, que alguns parece pretenderem erigir entre o processo integrador europeu e a Turquia. Leia aqui o texto.

Vale a pena recordar que a Turquia foi convidada a ingressar nas então Comunidades Europeias ainda antes da Grécia e que foi plenamente reconhecido que aquele país preenche os chamados "critérios de Copenhague", que definem as bases para uma candidatura de qualquer Estado ao "clube" europeu. E também é interessante notar que o actual primeiro-ministro grego, Georgios Papandreou, se revelou um defensor da adesão turca à União Europeia, não obstante persistirem alguns temas de sensível conflitualidade entre os dois Estados.

Naturalmente que não podemos deixar de ter em conta a sensibilidade negativa que se sabe continuar a existir em vários países europeus, em face de uma futura adesão da Turquia. Por isso, compete-nos respeitar a dificuldade com que dirigentes de alguns desses Estados se defrontam. O que não nos parece aceitável é que se anuncie que se fecham as portas à Turquia à luz de preconceitos civilizacionais, assumindo uma espécie de fronteira religiosa, esquecendo o efeito deletério que isso pode ter na evolução da própria sociedade turca, assim potenciando o seu caminho num sentido que, a prazo, pode vir a revelar-se estrategicamente trágico para a Europa.

Como lembrou, há meses, o ministro português dos Negócios Estrangeiros, num artigo divulgado pelo jornal "Público", os europeus continuam a ter reflexos em torno das suas questões de segurança à luz de uma lógica que ainda é meramente tributária dos tempos da Guerra Fria, não entendendo a urgência de redimensionar essa mesma perspectiva estratégica sob o prisma de um mundo onde, entretanto, teve lugar a tragédia do 11 de Setembro. Não perceber as consequências de natureza cultural e civilizacional que este novo tempo acarreta constituiu uma cegueira que é indigna de um projecto que se pretende com ambições de projecção à escala global.

Portugal é um país que, em face dos processos de alargamento da União Europeia, esteve e está, desde sempre, muito à vontade. Para surpresa de muitos, nunca nos colocámos na postura egoísta que alguns de nós esperariam, como reflexo defensivo face à necessidade de partilha das vantagens financeiras que disfrutávamos desde a nossa própria adesão. Porque sempre assumimos esse mesmo projecto de abrangência como um esforço de reconciliação da Europa consigo própria.

Por isso, e tal como o presidente da República portuguesa claramente deixou definido na sua recente visita oficial à Turquia, encaramos de forma muito positiva o processo de aproximação de Ancara das instituições europeias e tudo faremos para, no âmbito da União, manter o nosso compromisso de solidariedade e responsabilidade assumido para com a nação turca.

segunda-feira, outubro 12, 2009

Romance

A imprensa francesa, e não só, tem especulado muito sobre o livro de ficção que o antigo presidente da República, Valéry Giscard d'Estaing, acaba de publicar, no qual desenha um "affaire" entre um chefe de Estado francês e uma infeliz princesa britânica. A proximidade entre os perfis das personagens retratadas e as do autor do livro e da falecida princesa Diana têm alimentado imensos comentários.

Porque este género de literatura também faz parte da vida, decidi-me a ler o livro. Cheguei a duas conclusões. A primeira é que, não obstante ser membro titular da Academia Francesa, Giscard d'Estaing dificilmente será prémio Nobel da literatura. A segunda é que a obra pode ajudar a que, um destes dias, ainda possamos ter uma boa tradução gaulesa da expressão "wishful thinking".

domingo, outubro 11, 2009

Acabou!

O facto da sociedade portuguesa estar, desde há mais de meio ano, retida numa contínua campanha eleitoral, em especial num ano de crise económica, não terá sido uma coincidência muito feliz. Este é, contudo, o preço da democracia de que usufruímos e devemos felicitar-nos pelo facto de, neste tempo complexo da vida portuguesa, ter sido possível confrontar ideias e projectos.

Agora, desculpem lá!, é tempo de voltar ao trabalho!

Em tempo: não deixa de ser profundamente estranho que um país com menos de 10 milhões de habitantes demore longas horas para apurar os seus resultados eleitorais e o Brasil, com uma população quase vinte vezes superior, consiga ter os dados definidos pouco mais de uma hora depois do encerramento das urnas. Será que não poderíamos utilizar um sistema electrónico similiar ao brasileiro, que hoje não sofre qualquer contestação significativa?

Vote bem!

sábado, outubro 10, 2009

Castanhas

Há duas semanas, saído de uma mesa de voto, soube-me bem sujar as mãos com castanhas assadas, embrulhadas num papel de jornal que não "passava" num teste da Asae...

Comer castanhas pelas ruas, especialmente no Outono, é um hábito comum em cidades de vários países do mundo, como é o caso de Paris, mas, não sei bem porquê, tem sempre um especial gosto em Lisboa.

E, já agora, ouçam isto.

sexta-feira, outubro 09, 2009

Correio

A propósito da polémica que aqui em França prossegue sobre a intenção de abrir ao capital privado o serviço dos correios, apeteceu-me relembrar uma música que sei que dirá alguma coisa a uma certa geração portuguesa. Ouçam-na aqui.

Abstenção nas Comunidades

O Portugal Digital, uma interessante plataforma informática luso-brasileira, muito atenta às questões económicas e sociais, dá hoje conta da subida da abstenção entre os votantes, no Brasil, nas recentes eleições legislativas.

Nos últimos anos, correspondendo a um imperativo cívico mas, igualmente, a apelos públicos de várias origens, os consulados portugueses estimulam os cidadãos nacionais, no momento em que fazem a sua inscrição ou praticam actos consulares, a promoverem simultaneamente o seu registo no recenseamento eleitoral.

Os números do recenseamento, se bem que em dimensões geograficamente diferenciadas, mostram bem o êxito desse esforço. Porém, há um outro "lado" desta realidade: muitos desses cidadãos, não obstante terem acedido ao convite para se recensearem, mantêm-se, na prática, completamente alheios à realidade política em Portugal, pelo que, chegado que seja o momento das eleições, ficam alheios a elas e não votam.

Esta é uma importante razão que não pode ser esquecida, ao fazer-se a leitura deste aumento da abstenção. E é também um alerta para a necessidade das forças políticas portuguesas não se lembrarem dos cidadãos nos estrangeiros apenas na ocasião das eleições, importando manter com eles um continuado esforço de informação ao longo do tempo.

Klaus

O presidente da República Checa, Vaclav Klaus, um eurocéptico que mantém o Tratado de Lisboa como refém, é uma personalidade polémica, com que muitos não concordam, mas cuja coragem e frontalidade ninguém pode contestar. Agora, num gesto que está a embaraçar de novo os círculos europeus, quer colocar uma adenda ao Tratado, como condição imperativa para o assinar. Posso estar enganado, mas acho que acabará por fazê-lo.

Klaus é uma figura histórica importante do período subsequente à queda do muro de Berlim. Com o então líder eslovaco, Vladimir Meciar, é considerado um dos "culpados" pela divisão da antiga Checoslováquia, uma decisão à época muito discutida, mas que hoje parece já consensual.

A acompanhar o primeiro-ministro António Guterres, estive no seu gabinete de presidente do parlamento checo, em 1999. As suas reticências sobre o curso do processo europeu eram muito evidentes e, já à época, abertamente contrastantes com as ideias do então presidente da República, Vaclav Havel, com quem também tínhamos falado. Desde sempre, a República Checa viveu nessa polarização face ao processo integrador, muito por motivo da posição crítica de Vaclav Klaus.

Klaus veio a Lisboa, algures no primeiro semestre de 2000, a título privado, no âmbito de um "think tank" conservador que dá pelo nome de "Le Cercle", que tem como representante em Portugal - o que não será uma surpresa para ninguém! - o meu amigo Jaime Nogueira Pinto. Um jantar do grupo no "Ritz", que reunia umas centenas de membros, oriundos de vários países, tinha como convidado Jaime Gama, ao tempo ministro dos Negócios Estrangeiros, que nele deveria falar sobre a presidência portuguesa da União Europeia, então em curso. À última hora, fui escalado para substituir o ministro na tarefa e, confesso, estava longe de presumir no que me ia meter.

O tempo político estava então dominado pela chamada "questão austríaca", uma espécie de quarentena que os restantes 14 membros da União tinham decidido impor a Viena, como "punição" pela entrada no respectivo governo de um partido de extrema-direita, acusado de propósitos racistas e de simpatias pelo passado nazi. O governo português titulava essa posição de rejeição por parte dos "quatorze" e, por essa razão, era o alvo favorito das fortes críticas que se faziam sentir em meios conservadores europeus. Noutra ocasião, já aqui referi o que ouvi de Jean-Marie Le Pen, no Parlamento Europeu, por virtude dessa mesma atitude.

Apresentado no final do jantar pelo antigo ministro das Finanças britânico, Norman Lamont, a minha prestação correu com normalidade, até que chegou o tempo das perguntas. Sem surpresas, elas foram quase exclusivamente centradas no tema austríaco. E foi Vaclav Klaus quem tomou a liderança do ataque à posição portuguesa e dos parceiros europeus que nós representávamos. Durante bastante tempo, envolvemo-nos num aceso debate de razões cruzadas, sob o olhar deliciado, mas nada simpático para os meus argumentos, de um auditório que oscilava entre um forte conservadorismo e um reaccionarismo quase primário. Vaclav Klaus acabou por ser a "estrela" da noite, acolitado por outras figuras que aproveitaram para, por meu intermédio, "malhar" na Europa que se mostrava crítica da Áustria.

Quando a sessão terminou, confesso que fiquei aliviado. Mas ainda não perdoei totalmente ao Jaime Gama e ao Jaime Nogueira Pinto o "assado" em que me meteram...

A Paz no Nobel

quinta-feira, outubro 08, 2009

Cerâmica portuguesa

Chamam-se Sofia Beça, Heitor Figueiredo e Mário Reis (na imagem) - e são os ceramistas portugueses contemporâneos seleccionados para exporem no Céramique 14 Paris.

Este ano, Portugal é o país convidado do certame, cuja inauguração teve lugar ao final da tarde de ontem e na qual intervim a convite do "maire" Pascal Cherki, que tem como seu conselheiro uma figura proeminente da comunidade de origem portuguesa em França, Hermano Sanches Ruivo.

A grande surpresa desta exposição foi, porém, a presença paralela, num espaço próprio, de um surpreendente e criativo conjunto de peças oriundas da tradicional "escola" de cerâmica de Barcelos, dos herdeiros artísticos de Rosa Ramalho.

Leia também aqui.

Copé

Foi muito interessante o almoço que o meu colega sueco hoje promoveu com o líder parlamentar do partido da maioria UMP, Jean-François Copé, uma figura em ascensão na vida política francesa, que corajosamente recusa a "langue de bois" e que tem uma afirmação pública cada vez mais forte.

Porque o papel de um embaixador também exige a assunção da frontalidade, tive com ele um "bate-bola" franco, embora muito cordial, sobre a Política Agrícola Comum (PAC) e os fundos estruturais.

As regras destas conversas exigem que não revelemos o que os nossos convidados dizem. Mas nada me impede de deixar aqui expresso o que eu próprio disse: refutei a "racionalidade" da actual PAC, tão cara à França e tão "cara" a todos nós, afirmando que estaríamos preparados para rediscutir os seus actuais desequilíbrios e trabalhar, se para tal houvesse um dia vontade colectiva, para uma sua futura reorientação em favor das produções "do Sul" da Europa. E não deixei de lembrar uma realidade escondida: Portugal é "contribuinte líquido" desta política, isto é, paga para ela mais do que recebe.

Sobre os fundos estruturais, que a Europa mais rica regularmente nos atira à cara como uma espécie de resultante de uma sua suposta boa vontade histórica, deixei claro que o nosso desenvolvimento e o nosso consequente maior consumo faz com que as prateleiras das nossas lojas estejam hoje cheias de produtos produzidos noutros lugares da Europa e que as grandes empresas comunitárias sejam tão livres como as portuguesas de usufruir de tais fundos, obtendo por isso um considerável retorno. E não perdi a oportunidade de lembrar uma coisa que a maioria das pessoas teima esquecer: o maior volume de fundos estruturais, contrariamente a um velho mito, não vai para os países mais pobres da União mas sim para as regiões mais pobres dos países mais ricos.

Vale sempre a pena ter uma bela discussão e Jean-François Copé foi, neste almoço, um debatedor admirável, tanto mais que muito nos elucidou depois sobre a vida política interna francesa.

quarta-feira, outubro 07, 2009

Debate

Foi apresentado e discutido nos salões da Embaixada, da autoria de Felipe Cammaert, o livro "L'écriture de la mémoire dans l'oeuvre d'António Lobo Antunes et de Claude Simon". O prefácio de Maria Alzira Seixo introduz este trabalho comparativo de dois autores que, em algumas obras, percorreram temáticas comuns que o autor explora.

As dezenas de atentos espectadores ontem presentes à sessão mostraram-se muito interessadas no debate que esta obra suscitou e deram-nos mais razões para continuar, no futuro, a abrir as nossas portas a iniciativas culturais congéneres.

Devo confessar que me causa uma certa tristeza que, à parte as magníficas iniciativas do Centro da Fundação Calouste Gulbenkian em Paris, Portugal não disponha, na capital do país onde tem a sua maior comunidade no estrangeiro, de instalações adequadas e especificamente dedicadas a exposições e debates sobre a nossa cultura, bem como para a promoção regular da nossa economia.

Mas se há uma atitude com a qual não podem contar da minha parte é a resignação. Por isso, continuaremos a "travestir" a nossa Embaixada numa espécie de centro de divulgação português improvisado...

RIA

Para quem não saiba, a expressão RIA significava em Portugal, ao tempo das lutas académicas dos anos 60 e 70, "Reunião Inter-Associações", isto é, encontros de dirigentes estudantis de várias faculdades, normalmente para discussão das "novas formas de luta", nos tempos áureos em que os universitários se uniam em torno de reivindicações que iam bastante para além das propinas e das praxes.

Lembrei-me do ambiente das RIA ao ler alguns comentários deixados no post "Ainda uma gravata", que aconselho que consultem. Aí aparecem citadas figuras que vieram a ser conhecidas em diversos sectores da vida portuguesa, para além de outras que optaram pela sábia serenidade de uma existência sem paragonas.

Neste contexto de luta académica, há um nome que não resisto a trazer à memória, uma figura de dirigente associativo que marcou muito a minha geração e que, infelizmente, já desapareceu: João Crisóstomo. Era uma voz forte e tonitruante que saía daquela bigodaça farfalhuda, sempre marcada por expressões que, as mais das vezes, se colocavam à margem da linguagem estereotipada que caracterizava os nossos discursos associativos. Ouvir o João era uma delícia!

A primeira vez que o conheci, e perante um comentário que terei feito, talvez sugerindo uma qualquer acção, arrumou-me com um definitivo: "Deixa-te disso! Essa questão já foi discutida no 4º seminário!". A timidez de novato impediu-me de perguntar o que era o "4º seminário" e, ao que recordo, andei uns dias, por caminhos ínvios e que não amesquinhassem mais a minha ignorância, a tentar perceber de que se tratava. Lá vim, finalmente, a saber que se estava a referir ao 4º Seminário de Estudos Associativos, iniciativa cujas conclusões obtive e que, deduzo, terá sido antecedida de três outros "seminários" cujo rasto, confesso, nunca encontrei. Pode ser que, agora, algum comentador me possa esclarecer.

O João Crisóstomo era uma verdadeira enciclopédia associativa. Falava de pormenores das lutas académicas anteriores com imensa certeza e conhecimento, citando, com inesperada precisão, factos muito antigos, a que manifestamente nunca podia ter assistido, dada a sua idade. Por essa razão, uma madrugada, numa sala de Económicas, no Quelhas, no auge de uma RIA, que viria a acabar, horas mais tarde, connosco a fugir pelas janelas e a saltar os muros, devido a um cerco da polícia, alguém lhe lançou uma questão provocatória: "Ó João, esclarece lá uma coisa: tu afinal estiveste ou não na greve de 1907, antes da implantação da República?". O João Crisóstomo, já de si sempre propenso a reacções fortes, "passou-se"! E iam voando dossiês!

Homenagem

Por assumida opção, não é meu costume citar outros blogues, muito simplesmente porque, por falta de tempo, é muito raro "passear" pela blogosfera. Mas alguém me chamou a atenção para um "post" e verifiquei que nele se dizia uma coisa que eu gostaria de ter dito. Por isso, reitero aqui a devida homenagem feita a uma grande Senhora que tenho tido a sorte de ter como leitora bem disposta e atenta destas "Duas ou Três Coisas", com que procuro amenizar os meus dias e os de quem acha que, às vezes, vale a pena olhar para o que escrevo: Helena Sacadura Cabral.

O outro 25

Se a manifestação dos 50 anos do 25 de Abril foi o que foi, nem quero pensar o que vai ser a enchente na Avenida da Liberdade no 25 de novem...