quarta-feira, julho 31, 2024

"Vocência"


As comissões parlamentares, particularmente quando não têm imprensa presente, podem tornar-se num local útil de debate e de esclarecimento. Nos idos de 90, passei nelas muitas horas, na Assembleia da República, a responder a questões no âmbito da União Europeia. 

Vivia-se um tempo em que crescia o interesse parlamentar sobre o tema e, para quem estava no governo, era muito curioso aferir do grau de conhecimento dos nossos deputados sobre tais assuntos: salvo algumas exceções, o panorama não era então brilhante, tendo contudo vindo a melhorar imenso com o tempo.

Recordo-me de ter tido "bate-bolas" muito interessantes, com bastante picardia à mistura, com figuras como Silva Marques, do PSD, Paulo Portas, do CDS, e Lino de Carvalho, do PCP. Medeiros Ferreira, do PS, também era de grande exigência para o governo, diga-se. A grande distância, fui, ao longo de mais de cinco anos (1995-2001), o membro do governo com mais regular presença por ali, quer na área dos Assuntos Europeus, quer por vezes no âmbito dos Negócios Estrangeiros e Cooperação. Hoje posso confessar que fazia aqueles exercícios com prazer e, com a experiência entretanto adquirida, com grande facilidade.

Tendo saído de ministro da Justiça a seu pedido, no termo do primeiro governo de António Guterres, o meu amigo José Vera Jardim regressou em 1999 à Assembleia da República, retomando o seu lugar de deputado do Partido Socialista. E logo surgiu na Comissão Parlamentar de Assuntos Europeus. E aí deu mostra de como a Europa lhe era um tema caro.

Eu e o Zé tratamo-nos por tu mas, como é óbvio, a regra de tratamento parlamentar obrigava a que nos dirigíssemos um ao outro por "senhor": senhor deputado para cá, senhor secretário de Estado para lá. Só que o Zé Vera decidiu "gongorizar" o tratamento e, para minha grande surpresa, começou a tratar-me por "Vocência"! Devo dizer que a primeira vez que, do fundo da mesa, ouvi José Vera Jardim a usar essa expressão de "fusão" das palavras "Vossa Excelência", me deu um ataque de riso. "Vocência" é uma fórmula elegante, mas, ao ouvi-la, senti-me como que num debate do tempo do Estado Novo. Mas, afinal, ao que vim a saber, aquela era uma expressão muito utilizadaa nos tribunais, terreno onde o Zé se move como peixe na água.

Há pouco, numa conversa de verão, veio o "Vocência" à baila, pelo que aproveito para aqui evocar o meu amigo José Vera Jardim, a quem as consequências de uma queda chata e inoportuna está a obrigar a um trabalho de recuperação física que lhe tem garantido "falta justificada" na tertúlia da Mesa Dois do Procópio. Com a chegada da "rentrée", o José Vera Jardim vai voltar às lides tertulianas, que também incluem um outro grupo almoçante no Páteo Bagatela, que o outono seguramente reativará.

Até lá, aqui fica o meu voto de rápido restabelecimento, caríssimo Zé. "Vocência" faz muita falta aos seus amigos.

4 comentários:

Luís Lavoura disse...

as consequências de uma queda chata e inoportuna está a obrigar a um trabalho de recuperação física

Pois. As quedas são um enorme desastre que afeta muitas pessoas idosas e não tão idosas. Todo o cuidado é pouco contra elas. E muitas pessoas são muito descuidadas.

Unknown disse...

"Vocelência" já ouvi. "Vocência"é a primeira vez.

Francisco de Sousa Rodrigues disse...

Votos de boa recuperação ao Dr. Vera Jardim.

Anónimo disse...

Se algum biltre me chamar “idoso” leva com uma cadeira em cima. “Velho” é o termo

Tarde do dia de Consoada