sábado, setembro 30, 2023

Toponímia política

Quem se dedica às questões internacionais sabia que a capital do Nagorno-Karabakh se chamava Stepanakert. Convém que se desabituem: os azéris, novos donos da casa, chamar-lhe-ão Khankendi. Tal como os russos sonham poder chamar eternamente Artmovsk a Bakhmut.

5 comentários:

J. Carvalho disse...

Maputo, antes de lhe chamarmos Maputo, era Lourenço Marques. Qual dos dois nomes nasceu primeiro?

Nuno Figueiredo disse...

Gulbenkian...?

Carlos Antunes disse...

J. Carvalho
A propósito do que afirmou, a minha reflexão histórica sobre a origem dos nomes de Maputo e Lourenço Marques (que esta última pré-existiu a Maputo parece não haver dúvidas!)
Origem da designação da “cidade de Lourenço Marques”
O português de nome Lourenço Marques foi um explorador e comerciante que, acompanhado por António Caldeira, e a mando do Capitão de Sofala e Moçambique, João de Sepúlveda, comandou em meados do séc. XVI expedições na costa de Moçambique, tendo na navegação para sul, aportado em 1544 à Baía que denominaram “Da Lagoa” por acreditarem que os vários rios que nela desaguavam provinham de uma grande lagoa existente no interior.
A notícia da descoberta da Baía foi trazida por D. João de Castro ao Rei D. João III de Portugal, que por ordem do Rei recebeu o nome de “Baía de Lourenço Marques” em homenagem àquele explorador a quem incumbiu de levantar uma “feitoria”.
Ao contrário do que afirma JC, não me parece defensável que o entreposto da feitoria se tenha sediado na «Ponta Madhona (Catembe - terra dos Tembes)», por duas ordens de razões: primeiro, porque as feitorias eram entrepostos comerciais temporários que não ocupavam necessariamente um determinado espaço territorial; em segundo, porque o local referido por JC era ocupado pelo mais poderoso reino da baía, o Reino dos Tembes que segundo documentação holandesa da época «se dividia em vinte e sete distritos, controlava cinquenta léguas da costa e cem léguas do interior».
As explorações foram realizadas pelo comerciante Lourenço Marques ao redor da baía e territórios adjacentes – há quem defenda que tenha assentado os arrais da navegação numa das ilhas da baía, ainda hoje conhecida por “ilha dos Portugueses”, próxima da ilha da Inhaca, cujo reino chefiado por Inhaca Manganheira ou Machavene terá tido o apoio dos portugueses nas suas lutas de resistência ao seu poderoso vizinho ocidental, o reino dos Tembes – a partir da qual estabeleceu contactos e negócios (principalmente, de marfim) com os reinos localizados nos limítrofes e interior da baía (reinos de Mpfumo, Matcholo, mais tarde popularizado por Matola, Mazuaia e Manhiça). (1)
Há contudo, uma certeza histórica é de que a feitoria constituída em 1546 pelo comerciante Lourenço Marques, nunca foi erigida no local onde viria a nascer a futura “cidade de Lourenço Marques”, no reino do clã Mafumo (ou Ka-Mpfumo na língua ronga).
Isto porque se sabe que Lourenço Marques abandonou Moçambique em 1557, tendo partido para a Índia, em virtude de ter recebido como recompensa, a nomeação para o cargo de escrivão da feitoria de Cochim, muitos anos antes de ter sido edificada por Joaquim de Araújo, em 1781, a pequena “fortificação” (Forte da Nossa Senhora da Conceição, onde actualmente se encontra instalado o Museu da História Militar) e destinada à protecção da futura povoação de Lourenço Marques (2), fundada no ano seguinte (1782).

Carlos Antunes disse...

Origem do nome de “Maputo”
João Craveirinha associa o nome de Maputo a «uma bebida tradicional "UPUTSO" ainda hoje celebrada em cerimónias tradicionais na zona de Matutuíne (Bela Vista) região dos Tembes, nada tendo a ver com Portugal como algumas pessoas pouco esclarecidas pretendem justificar a origem do termo».
Não ponho em causa a afirmação de JC, mas trata-se, a meu ver, de uma argumentação simples demais para estar na origem do termo “Maputo” dado ao reino dos Maputos situado na extremidade sul da baía.
A tese defendida por alguns de que a expressão “Maputo” quer dizer Portugal, tem por base factos históricos. Atente-se, por exemplo, no relato (3) da passagem do explorador inglês Stanley pelo alto Zaire, em que este perguntando aos nativos de onde vieram as espingardas que possuíam estes responderam-lhe: «do “Puto” (que queriam dizer Portugal) e que o sr. Stanley traduziu: da costa.
«E d’onde te veio esta linda fazenda que trazes?
Respondiam-lhe: do “Puto”.
E este arame de latão que faz tão bem realçar a beleza da vossa pelle de uma côr clara?
Do “Puto”, respondeu cada vez mais encantado; tudo o que possuímos é do “Puto”.
Mesmo o vinho? Sim».
Dizia o sr. Stanley que os negros do Congo dão ao mar, à costa e ao longo da costa o nome de “Puto”, escondendo, por motivos óbvios, o verdadeiro sentido da palavra que os nativos lhe atribuíam: que o mar e toda a costa, pertencia por direito de soberania ao “Mueni-Puto”, que queria dizer ao rei ou senhor de Portugal, “Mueni-Congo” era o rei ou senhor do Congo, e “M’Puto” a corruptela de Portugal».
Ora, os povos que invadiram e se fixaram nos territórios do Moçambique pré-colonial pertencem ao mesmo grupo étnico bantu (do reino do Congo/Angola), que localizado principalmente na África subsariana, englobava cerca de 400 grupos étnicos diferentes, mas cuja unidade mais clara surge no âmbito linguístico em que essas centenas de grupos e subgrupos têm, como língua materna, uma língua da “família bantu”.
Faz, por isso, sentido que o prefixo bantu “ma (os de)”, constante das expressões M’Puto (usada no reino do Congo/Angola), Maputo (sul de Moçambique) e Maputokezi (norte de Moçambique), possam ter um significado comum e queiram dizer “os de Portugal”.

Francisco F disse...

Já agora...

A mudança generalizada de nomes de cidades em África contrasta com a manutenção de topónimos na América. Reparem como os Estados Unidos estão cheios de topónimos espanhóis, no que só pode ser visto como uma demonstração de maturidade e tolerância impossível de verificar em África.

Ou vejam como em França há localidades com nomes "alemães".

Os americanos conquistaram aos mexicanos territórios imensos mas, apesar do contexto de guerra - com tudo o que isso traz, nomeadamente em termos de ódio pelo outro e sua cultura -, não lhes passou pela cabeça renomear Los Angeles, Santa Fe, San Francisco e tantos, tantos outros lugares. Pelo contrário: ainda inventaram um nome espanhol para um estado onde os colonizadores hispânicos nunca puseram o pé: Montana!

Em Angola e Moçambique tudo se alterou, de modo a alimentar um nacionalismo sem verdadeiras bases para se sustentar. Qual era o problema com "Nova Lisboa", por exemplo? Restaurar os nomes originais das cidades por nós fundadas onde nada havia: eis o que seria um verdadeiro exemplo de crescimento civilizacional naquelas paragens.

Isto é verdade?