terça-feira, dezembro 01, 2020

Em Paris, com Eduardo Lourenço (2)


Tenho boa memória, mas não a suficiente para me lembrar do nome do intelectual caribenho que, num final de tarde, na casa antiga da Fundação Calouste Gulbenkian, na avenue d’Iéna, em Paris, fez parelha com Eduardo Lourenço, num debate sobre uma determinada temática, organizado pelo diretor da Delegação, João Pedro Garcia. 

A sala estava cheia, quer pelo interesse no intelectual francófono, um homem já idoso, com voz forte e presença imponente, mas também para ouvir Lourenço, que os portugueses “viciados” nas sessões da Gulbenkian e muitos “lusófilos” muito apreciavam. Prometia ser uma bela sessão.

Começou o homem do Caribe. E fê-lo lindamente, de improviso, arrebatando a sala. Passou mesmo o limite de tempo que lhe era destinado. A seu lado, Eduardo Lourenço ouvia-o com visível interesse. Sentado em frente a ambos, na primeira fila (alguma vantagem haveria em ser embaixador...), notei que Lourenço passou os dedos, por mais de uma vez, por algumas folhas que tinha diante de si.

E chegou o momento de Eduardo Lourenço falar. Começou por referir-se ao que tinha acabado de ouvir, citando dois livros do orador, elogiando a sua notável prestação. E, depois, no excelente francês que era o seu, disse mais ou menos isto: “Eu tinha-me preparado para vos falar sobre o tema que, a ambos, hoje aqui nos convocou. Tinha mesmo escrito um texto, para vos ler. Mas ao ouvir o que, de magnífico, nos trouxe o meu colega de painel, surgiram-me novas ideias e decidi dispensar a leitura desse texto. E, tal como ele fez, vou-vos falar livremente sobre o assunto.”

E falou. Durante bem mais de meia hora, de improviso, num francês de estilo, a que o sotaque beirão dava uma nota curiosa, Eduardo Lourenço encheu a sala de erudição e encheu-nos, a todos os portugueses que por ali tinham o privilégio de estar, de um imenso orgulho por termos como compatriota uma figura daquele calibre. 

2 comentários:

Anónimo disse...

Meu caro Francisco,

Tratava-se de Edouard Glissant, escritor da Martinica que, em 1958, ganhou o Prix Renaudot, agora tão falado. Uma sessão organizada por Maria Graciete Besse. E foi exactamente como escreve.

Um abraço.

JPGarcia

Francisco Seixas da Costa disse...

Obrigado, João Pedro. E recordo um almoço em vossa casa, em Lisboa, com Eduardo Lourenço e Cleodonice Berardinelli. Forte abraço

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