Anteontem, ao entrar no Pavilhão de Portugal, a anteceder o espetacular “barulho das luzes” a que depois assisti no Pavilhão Atlântico, na final da Eurovisão, recuei 20 anos, lembrando-me da imensa aventura que por ali foi a Expo98.
Por um instante, com toda aquela genta à volta, recordei o banho de entusiasmo desses tempos, a romaria nacional e internacional em que tudo se transformou, a impressionante recuperação que o projeto operou numa zona degradada da cidade - embora nos possamos perguntar se não houve muito de especulativo na volumetria de construção que foi permitida após o evento.
Mas esta nota destina-se apenas a fixar aqui, duas décadas depois, uma memória grata às pessoas que tiveram ideia da Expo: Vasco da Graça Moura e António Mega Ferreira, duas figuras intelectuais de exceção que, um dia, numa mesa do Martinho da Arcada, gizaram um projeto cuja concretização o tempo europeu de “vacas gordas” viria a permitir. O primeiro já não está entre nós, o segundo permanece uma figura ativa e criativa na nossa vida cultural. É justo não os esquecermos.
Ontem também recordei, numa das minhas várias idas oficiosas à Expo (quase dezena e meia, pelas minhas contas, para acompanhar governantes estrangeiros, nos seus dias nacionais), ter passado por um grupo onde uma senhora de aldeia, em alta bem voz, se mostrava renitente em atravessar o espaço do Pavilhão de Portugal, interrogando-se: “Ó filha! E se aquilo nos cai na cabeça?” No fundo, as dúvidas sobre a fiabilidade da obra de Siza Vieira não eram muito diferentes das que, no século XV, questionavam a arte de Afonso Domingues, no Mosteiro da Batalha.
13 comentários:
A pala não caiu, a pala não cairá!!!!
I. Azevedo
Até o Siza admite demolir a construção por falta de função!
Quando tomam a Arquitetura (como por ignorância, o Marcelo) pelo desenho do desenhador é o que dá!... e tem dado...
Siza apenas teve a ideia. Quem tornou aquilo possível foi Segadães Tavares, ilustre engenheiro.
Embora o problema da pala seja o mesmo que o problema do mosteiro, há uma diferença substancial entre os dois: enquanto que o mosteiro serve para alguma coisa (quanto mais não seja, a malta pode-se abrigar do mau tempo dentro dele), a pala não serve para nada.
Assim se distingue a boa arquitetura de Afonso Domingues da má arquitetura: enquanto que a primeira faz coisas arrojadas e úteis, a segunda faz coisas arrojadas mas inúteis - e, não raras vezes, positivamente prejudiciais.
Edifício lindo e, que se saiba, totalmente desaproveitado... Podia passar a ser um local fora de série, para portugueses e estrangeiros de bom gosto. Nem sei a quem pertence hoje em dia, porque vieram em tempos notícias nos jornais de que teria sido vendido... Para estar normalmente sem uso?
Chegou a fazer-se lá o evento do Peixe vários anos. Por ali se estava a provar os petiscos dos nossos chefs e depois, naquela varanda espantosa sobre o rio, até ao fim da tarde, linda, porque não apetecia mesmo ir embora. Transferiram o Peixe para o Páteo da Galé, onde é horrível, sem espaço nem «respiro», como diz um escultor e pintor conhecido.
Se fosse humanamente possível fazer as contas ao desperdício desmersurado e irresponsável, quer financeiro, quer arquitectónico, em 96,97 e 98, com aquelas construções "à lista"quem ia para prisão perpétua era Cavaco que iniciou e Guterres que terminou.
Aquela obra faraónica deve ter inspirado gente como Sócrates e grandes empreiteiros e banqueiros.
A segurança da pala deve ser creditada ao Eng. António Segadães Tavares, responsável pelo seu projecto de engenharia, creio eu.
O que não significa qualquer menor apreço pelos méritos do arquitecto.
Cumprimentos
antónio m fernandes
Estes "prolongamentos" de edifícios que são caros e não têm utilidade mas servem para satisfazer a vaidade e o exibicionismo provocam-me urticária. Posteriormente surgiram mais casos em Lisboa, como na EDP da 24 de Julho e no MAAT em Belém. Talvez também se possa incluir nesta doença o acrescento feito no Caleidoscópio, ao Campo Grande. Tanto barulho para nada, perdão, tanto cimento para nada.
Reaça
Se fosse humanamente possível fazer as contas ao desperdício desmersurado e irresponsável, quer financeiro, quer arquitectónico, em 96,97 e 98, com aquelas construções "à lista"quem ia para prisão perpétua era Cavaco que iniciou e Guterres que terminou.
Muito bem. Subscrevo.
A pala do Pavilhão de Portugal é um desperdício horroroso. Pior ainda é a estação de metropolitano das Olaias, que serve pouquíssimos passageiros mas é uma espécie de catedral subterrânea. O dinheiro que aquilo deve ter custado ao erário público (sobretudo aos contribuintes da UE) para um benefício minúsculo, é pura e simplesmete criminoso.
Andar a embirrar com o desperdício da pala é próprio das pessoas para quem qualquer coisa serve, que não têm qualquer tipo de sensibilidade para com a beleza, para com a noção de espaço, de património, etc. Gostaria de saber se essa gente se vira para as respetivas caras metade e lhes diz "Mudaste de roupa? Pintaste-te? Que desperdício! Só interessas é nua!" - é o mesmo tipo de mentalidadezinha.
Pronto, ainda que não sirva para grande coisa, em termos funcionais, chamemos-lhe um "monumento ao engenho humano" ;) Já agora, o engenho não é o risco do arquitecto, mas o cálculo de engenharia da estrutura, portanto a louvação deve ser para o engenheiro.
Mas ninguém é sequer obrigado a arriscar a vida debaixo da pala, se o medo é esse (injustificado). Ponham antes os olhos na Gare do Oriente, ali ao lado, onde as pessoas são obrigadas a esperar o comboio num local absolutamente desagradável, ao frio, à chuva e ao vento, ou no Estádio do Braga, que parece projetado por quem nunca pôs os pés num jogo de futebol.
Mas que conversa quadradona que para aqui vai, que cinzentinhos...
Viva a pala do Pavilhão de Portugal e toda a expressão criativa!
Os “artistas” têm a “arte” de chamar quadrados ao povo para continuarem o embuste, designando por arte o que não é, nomeadamente a arquitetura!
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