Foi há pouco mais de um mês, no empedrado de Andorra-a-Velha, que o presidente da República desabafou para os jornalistas: “Quando viro à direita, em Portugal, a direita não nota”. Era uma óbvia mensagem, que alguns entenderam algo precipitada, para tentar responder à orfandade que se sabia atravessar uma parte do país político, desiludida com aquilo que lhe parecia ser um conúbio entre Marcelo Rebelo de Sousa e o governo de António Costa.
Ao longo de mais de um ano, esse setor político viveu num desespero quase patético. Das ironias iniciais que se ouviam ou liam contra o presidente que lhe não tinha ficado a dever quase nada na eleição de janeiro de 2016, a direita portuguesa tinha já entretanto desembestado contra Marcelo Rebelo de Sousa. Esse barómetro do radicalismo conservador que é a “opinião” de um jornal informático, somado a certos opinadores e a espaços conhecidos nas redes sociais, reclamava diariamente pela simpatia que o chefe de Estado parecia destilar em favor do governo. Alguns já nem estranhavam: “É o Marcelo, pronto, que se há-de fazer!” Houve mesmo quem dissesse que o avanço de Santana Lopes se tinha destinado a colocá-lo como alternativa potencial a um presidente que, não obstante a sua esmagadora popularidade, se tinha deslocado demasiado da sua base natural de apoio.
O discurso de Oliveira do Hospital tudo mudou. Críticos ácidos do presidente sentiram-se subitamente confortados com a severidade inequívoca de Marcelo para com o governo, com a distância marcada face a António Costa, com a afirmação de uma “magistratura de interferência”, que acentua claramente uma das leituras do nosso semi-presidencialismo.
Ao dizer o que disse, em palavras escritas para serem lidas ao microscópio, Marcelo Rebelo de Sousa sabia duas coisas: que estava em básica sintonia com o sentimento maioritário prevalecente no país e que, a partir daquele momento, algo iria mudar na sua relação com o governo. Ao ter encostado António Costa “às cordas” políticas, obrigando-o abertamente a uma remodelação e sujeitando-o a um indiscutível “ralhete” público, o presidente tinha plena consciência de que estava aberta uma ferida na “lua-de-mel” que vivia com a maioria, por muito que esta agora possa ser tentada a assobiar para o ar.
A direita parece hoje reconciliada com Marcelo, fazendo figas para que o discurso de Oliveira do Hospital seja o início de uma viragem drástica no relacionamento entre Belém e S. Bento. Julgando conhecer as personagens principais no terreno, quero crer que nem o presidente, a partir de agora, vai ser tentado a forçar excessivamente a mão ao primeiro-ministro, nem este vai ceder à tentação de exteriorizar qualquer acrimónia institucional. Mas uma certeza tenho: nada será igual daqui para a frente, embora ninguém saiba o que, de facto, o futuro nos vai trazer de diferente.
(Artigo hoje publicado no “Jornal de Notícias”)
5 comentários:
Um grande Presidente. Mas nunca acreditei na foto do guarda chuva, todo sorrisos, com Costa. Abraço quando corre bem, duas badaladas e meia pa de cal quando corre mal. Socrates não se demitiu quando Cavaco o admoestou. Costa, sei não...
Antonio Costa e OS PENDURAS DO ESTADO.
E o que acontece, quando OS desenhadores da constituicao se inspiram nos manientos franceses. Devem se inspirar na Suissa, Australia ou USA. Onde o povo mantem o control permanente.
Assim vai o reino da lingua portuguesa .
Em Timor ou no rectangulo europeu nao quer ou nao sabe ultrapassar OS problemas de democracia jacobina.
Foi preciso tanta desgraça para o país acordar, e ver a "fantasia governamental"que se apoderou do Terreiro do Paço.
E passado tanto tempo após o início dos grandes incêndios, a geringonça continua completamente entorpecida, sentada de braços cruzados, a sonhar com o sucesso do déficit, com as vitórias matrimoniais do bloco, e com as promoções comunistas da função pública.
E o sono é tão profundo, que nem a Ministra a pedir que a tirassem dali a escutavam, foi preciso o Presidente gritar a plenos pulmões, e mesmo assim continuam estremunhados.
Coitado do país e do futuro, se não aparecer um "salvador", o que não vai ser fácil aparecer alguém à altura.
Vou em romaria a Santa Comba e a Pombal.
Radicalismo conservador para quem tem, não digo opiniões radicais de esquerda mas sentimentos radicais envergonhados de esquerda, porque para as pessoas de direita são apenas opiniões razoáveis, umas melhores e outras piores. A característica fundamental dos esquerdistas ou ex esquerdistas é de nunca se esquecerem de desclassificar as opiniões dos outros : ou são radicais ou fascistas ou racistas etc etc. Quarenta e tal anos depois da revolução! Já as novas gerações são incapazes de identificar Marcelo ou Salazar e a lenda lenta continua como se nada se tivesse passado entretanto!
João Vieira
Costa ocupa simultaneamente dois cargos:
- Sócio-gerente da EP Geringonça.
-PM de Portugal.
Enviar um comentário