sábado, julho 10, 2010

Pausa (1)

Voos

A história vem hoje no Le Figaro. Um casal de italianos comprou uma viagem de sonho para a Austrália, onde iriam começar as férias pelas praias de Sydney. A aproximação, pelas janelas do avião, a um cenário de casas de madeira e motos-de-neve levou-os a comentar como eram bizarras as escalas escolhidas pela agência, para tornar o voo mais barato. Mas não, esse era mesmo o destino: Sidney, no Canadá, na província da Nova Escócia. Segundo os locais, já não será a primeira vez que um equívoco destes tem lugar.

Menos longe foi, há anos, uma conhecida figura da nossa televisão, quando noticiou a abertura do festival musical de Bayreuth, acrescentando, num daqueles comentários meio soltos e pessoais com que essas figuras às vezes nos brindam ao fechar do telejornal, que era impressionante que a capital do Líbano, se bem que em guerra civil, continuasse a insistir em manter uma vida cultural intensa...

sexta-feira, julho 09, 2010

Glienicke

Hoje de manhã, no aeroporto de Viena, russos e americanos trocaram espiões. A capital austríaca recuperou um pouco do seu histórico papel de reino das "sombras", esse mundo de charneira este-oeste que fez as delícias, a preto-e-branco, da  mitologia da "intelligence", durante a Guerra Fria, como o "Terceiro Homem" bem documentou. A triste aerogare de Schwechat terá tido, assim, um momento póstumo de glória. 

É, porém, nestes dias que convém deixar a imagem da ponte de Glienicke, entre Potsdam e Berlim, onde, quando as coisas eram verdadeiramente a sério, se trocavam os grandes espiões.

Percebe-se o "frisson" que terá acometido alguns vienenses ao verem hoje chegar, a caminho de Moscovo, Anna Chapman, "from New York, with love". Mas, sejamos justos!, nada se equipara à troca do Coronel Abel por Francis Powers, em Glienicke, naquela manhã brumosa de 1962.

Como diz um amigo meu, a propósito de alguns restaurantes, isto já não é o que era...

Rádio Clube

Um dos grandes testes ao envelhecimento parece ser a capacidade de resistir à nostalgia. Ontem falhei no teste, ao ler que o Rádio Clube Português vai fechar.

O Rádio Clube teve um papel importante na vida de quantos são dos "dias da rádio".  No meu caso, das noites. Na juventude, em Vila Real, o Rádio Clube, a par de algumas rádios estrangeiras (Radio Caroline, Radio London, Radio Andorra) e da "23ª hora" da Renascença, era uma companhia noturna regular, com os programas da madrugada, em especial o "Meia Noite" e, mais tarde, o efémero "Europa", de Vitor Espadinha, a trazerem alguma da música que fez a nossa geração. (Na província, sem FM, apenas com Onda Média, não chegávamos ao lisboeta "Em Órbita")

Em meados dos anos 60, com a ousadia dos meus 18 anos, fui-me apresentar nos seus estúdios do Porto, na rua de Ceuta, onde pedi "emprego", ao tempo em que fingia estudar Engenharia. O Alfredo Alvela abriu-me então as portas do seu "Clube da Juventude," onde realizei, durante alguns meses, o meu "Tempo de Teatro", com textos do João Guedes e um "gingle" com efeito de eco, feito no vão do elevador do prédio, numa ideia louca, creio que do Jaime Valverde. Às vezes, pela noite dentro, o Rui de Melo entregava-me a emissão do "Onda Nocturna" e eu ficava por lá a "pôr discos" e a dizer banalidades serenas, no tom que o programa exigia. Numa manhã, saído tarde do Rádio Clube com o Humberto Branco, lembro-me de um belo nascer-do-sol a atravessar as janelas do "Transmontano", que o Alvela teimava em qualificar como o único restaurante "ível" (onde se podia ir...) na noite portuense.

Depois, já em Lisboa, o Rádio Clube era, para mim, a audição regular do PBX e, depois, do "Tempo Zip", companhias noturnas indispensáveis, entremeadas pela informação da maior escola de jornalismo radiofónico do país, dirigida por Luis Filipe Costa. Só entrei nos seus estúdios de Lisboa, à Sampaio e Pina, já depois do Rádio Clube ter estado no centro do 25 de abril. Após essa data, por lá andei em várias noites de conversa, levado pelos autores do "golpe de mão" que o havia tornado no "posto de comando do Movimento das Forças Armadas", o (agora general) Costa Neves, o Santos Coelho e o João Sobral Costa.

O fim do Rádio Clube será, julgo eu, sentido por muitos portugueses. Até por alguns saudosos salazaristas, que lembrarão os tempos em que a estação, nas mãos dos irmãos Botelho Moniz, serviu de alento aos "viriatos" portugueses que lutaram ao lado dos franquistas na guerra civil espanhola.

O Rádio Clube já não vai estar "sempre no ar, sempre consigo". E tu, João Paulo Guerra, como sentes este dia?

quinta-feira, julho 08, 2010

Mundial

É muito curioso observar as preferências dos portugueses, à nossa volta, neste tempo do Mundial de futebol, em especial a partir do momento em que o nosso país dele foi afastado.

Ontem, um grupo de espetadores do Alemanha-Espanha dividia-se imenso. Nuns, o sentimento anti-espanhol, ainda identitário em algumas camadas portuguesas mais tradicionais, somava-se a algum fascínio pela (até aí) eficácia simples da equipa alemã. Noutros, ao gosto por ver perder a "grande potência" europeia juntava-se uma manifesta simpatia pelo país vizinho, com quem Portugal tinha perdido (e bem) de forma "honorable". Tudo isto de forma matizada, não excessivamente radicalizada.

O tema dos nossos afetos em relação ao estrangeiro é um domínio muito interessante. Torna-se impressionante notar o modo como os portugueses evoluíram, extraindo-se de algumas antigas posições caricaturais para um mundo de uma grande diversidade de atitudes, mobilizadas por sentimentos com uma génese bastante mais complexa. Em tudo isto, fica claro que o fim do império, a integração europeia e alguma atenuação dos confrontos ideológicos tiveram um papel decisivo.
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quarta-feira, julho 07, 2010

Jorge Fagundes (1936-2010)

À hora de almoço, chegou-me a notícia: morreu o Jorge Fagundes.

A última vez que estivemos juntos foi há quase um ano, com o seu grande amigo José Vera Jardim e o Eduardo Graça, à volta de umas cervejas, numa esplanada, numa tarde quente do fim de Julho de 2009, depois do funeral de Palma Inácio. Em Dezembro, porque tinha acabado de sair do hospital, já o não consegui "convocar" para o jantar anual do Procópio, lugar onde era visitante cada vez mais incerto, mas sempre muito saudado.

O Jorge Fagundes era um "bom gigante", uma figura amável e bem disposta, que conheci através do Nuno Brederode de Santos, com quem sempre o ouvi cruzar velhas e divertidas histórias de Campo de Ourique. Advogado de causas, defendeu presos políticos durante a ditadura, como Saldanha Sanches, Carlos Antunes ou Isabel do Carmo. Pertenceu à CDE de Lisboa, nas eleições de 1969. Após abril, veio a andar por áreas políticas bem à esquerda, tendo sido diretor do jornal "Página Um", uma publicação próxima do PRP.  Acabo de saber que também foi fundador e candidato autárquico do Bloco de Esquerda.

Sportinguista sem quaisquer limites de tolerância, foi presidente da Federação Portuguesa de Futebol, numa direção a que, se não me engano, pertenceu também Marcelo Rebelo de Sousa. Não esqueço uma chamada telefónica de solidariedade que dele recebi, num momento especial da minha vida.

Um abraço, Jorge!

terça-feira, julho 06, 2010

Clube da tolerância

Há em França uma estrutura de debate, chamada Club Vauban, que alimenta uma agenda singular. Fundado há mais de 30 anos, o clube tem como objetivo favorecer o debate entre todos quantos - de direita, do centro ou de esquerda - têm a seu cargo a preservação do interesse público. Autodefinido como uma "cooperativa de reflexão", congrega diferentes opiniões políticas e sociais, distintas referências ideológicas e convicções político-partidárias, sendo que todos os seus componentes devem ter em comum ser favoráveis à economia social de mercado e à construção europeia.

Há dois dias, o antigo PM socialista, Michel Rocard, e a antiga ministra centrista, Simone Veil, vieram a terreiro, em nome do clube, indignar-se com a onda de acusações que têm vindo a surgir contra um determinado membro do governo francês. E, no quadro desta sua reação, escreveram: "Debater é uma coisa, querer a todo o preço abater o adversário é outra. Atacar ad hominem, estafar sem descanso, denunciar sem provas, de um lado como do outro, não é uma forma de contribuir para o debate, é prejudicar a democracia, enfraquecê-la e, finalmente, debilitá-la em nome dos próprios princípios com que julgamos defendê-la. É atentar contra a dignidade da pessoa, é atacar a política e a República".

Julgo que quem, em Portugal, numa coluna ou num blogue, tivesse a ingenuidade de escrever isto, receberia uma resposta tipo "Gato Fedorento": "o que tu queres sei eu!"...

Por isso, estamos muito longe de poder ter no nosso país um Club Vauban. E, também, estamos a anos-luz do que a sua própria existência significa.

França-Portugal

A importância da comunidade de origem portuguesa em França mede-se de várias maneiras. Uma delas é a relevância na vida parlamentar francesa.

Nos "grupos de amizade" França-Portugal, no Senado e na Assembleia Nacional franceses, têm assento personalidades que, na grande maioria dos casos, representam regiões onde há um número significativo de cidadãos de origem portuguesa. Em alguns casos, além de deputados e senadores, esses mesmos eleitos são também "maires" de localidades da região.

Hoje e na passada semana, reuni, respetivamente, com os "grupos de amizade" da Assembleia e do Senado. Foram algumas horas de útil troca de impressões, em que se falou naturalmente da situação político-económica em Portugal, mas, maioritariamente, sobre problemas concretos que se ligam aos interesses dos portugueses ou luso-descendentes dessas regiões - intercâmbios municipais, ensino da língua portuguesa, reforço das relações económicas e culturais, etc

segunda-feira, julho 05, 2010

O panorama de Gulbenkian

Na passado sábado, estive em Enclos, perto de Deauville, a acompanhar o presidente da Fundação Gulbenkian, Emílio Rui Vilar, na inauguração do Parque Gulbenkian, a formalização da doação à região de um espaço natural adquirido por Calouste Gulbenkian, em 1937. Trata-se de uma mistura imaginativa de jardins, prados e bosques, um projeto que revela uma sensibilidade que talvez nos ajude a "ler" melhor a mentalidade do filantropo. A presença do Coro Gulbenkian, vindo expressamente de Lisboa, trouxe uma nota de grande beleza à cerimónia.

A certo ponto da visita, e apontando-me um panorama soberbo que Gulbenkian criara deliberadamente, como linha de harmonia entre duas alas de verde - de imensos e diferentes verdes, que nos ajudam a perceber melhor alguma pintura impressionista -, o delegado local do Ministério francês da Cultura explicou-me que esse panorama, até ao infinito onde é visível, está hoje protegido por lei, sendo insuscetível de ser palco de qualquer construção ou mesmo de um mero rearranjo arbóreo, sem autorização legal, sob pena de procedimento criminal.

"Pobre" país este, a França, cuja paisagem não pode ser beneficiada com a instalação de um qualquer barracão de zinco de cores berrantes, com a graça de uma pedreira a céu aberto ou o girassólico romantismo de uma eólica!

O jogo das palavras

Hoje, num almoço com os embaixadores da União Europeia, a ministra francesa da Economia, com muita graça e algum detalhe, explicou-nos a lógica subjacente ao neologismo que criou e que fez as primeiras páginas dos jornais de fim-de-semana: a palavra "rilance"

O conceito é uma amálgama da expressão "rigueur" com "relance", querendo com isto significar que é possível ligar a adoção de medidas de rigor orçamental com políticas de relançamento do crescimento económico, sendo que, na perspetiva da governante, e contrariamente a algumas teorias, as primeiras podem mesmo facilitar as segundas.

O jogo das palavras é um mundo fascinante. No "L'Express", Jacques Attali interroga-se sobre se, afinal, o "G 20" não será um "G vain"...

Acordo ortográfico

O "Expresso" desta semana passou já a usar as normas do novo Acordo Ortográfico.

O mesmo já acontecia com a única agência noticiosa portuguesa - a "Lusa" -, bem como com o semanário "Visão" e o jornal desportivo "Record".

Acaba, entretanto, de ser anunciado que, a partir de Janeiro de 2011, os manuais escolares irão aparecer sob a nova ortografia, embora haja um período de transição.

domingo, julho 04, 2010

Hinos e heróis

Numa concorrida audição, à porta fechada, o demissionário presidente da Federação Francesa de Futebol, acompanhado do selecionador cessante, foram convocados, na passada 4ª feira, a uma comissão parlamentar. O "compte rendu" do encontro já caiu no domínio público. Entre algumas revelações no âmbito daquilo que a teorização desportivo-mediática portuguesa qualifica, sem se rir, de "cultura de balneário", ficou-se a saber que, se o selecionador francês tivesse de excluir jogadores da equipa por não saberem cantar "La Marseillaise", ficava só com quatro (entre 23!).

Em Portugal, não sei quantos dos selecionados sabem o nosso hino. Pareceram-me alguns mais (uma evolução face a outros anos), embora ficasse claro, pelas imagens, que a concentração pré-jogos de Ronaldo se revelou sempre incompatível com o debitar oral de "A Portuguesa".

Entre o modo como Portugal e a França trataram o "problema" das suas seleções houve outras diferenças. Verdade seja que, no caso francês, teve lugar uma rebelião; no nosso caso, houve apenas flagrante incompetência tática. Mas, claro está!, entre nós ninguém se demitiu... Era só o que faltava! Então não ganhámos 7-0 à Coreia do Norte?!

"Tour de France"

Hoje, acabada que foi (e em que bizarras condições!) a primeira etapa do "Tour de France", a maior prova ciclística do mundo, aparece-me recordar uma histórica figura desta competição, uma pessoa felizmente ainda viva: Raymond Poulidor.

Confesso o meu fascínio por alguém que acabou sempre por ser derrotado na luta pela vitória final no "Tour", não tendo nunca sequer vestido a "camisola amarela", embora sendo vencedor de várias etapas. No que me toca, recordo-me de ter sido sempre um "poulidorien" ferrenho, em toda a minha juventude. Aqui em França, não deve haver nenhum seu compatriota da sua geração que o não conheça, muitas vezes pelo carinhoso "petit nom" de "Poupou".

Poulidor teve uma longa e brilhante carreira, vencendo diversas provas, entre as quais uma "Vuelta a España". No "Tour", partilhou o pelotão com figuras da estirpe de Louison Bobet, Jacques Anquetil, Eddy Merckx e Bernard Hinaut. Foi com Anquetil que a sua disputa foi mais dura, embora também nos tempos do belga Merckx tivesse estado muito próximo da vitória. Esteve oito vezes no pódio final - três vezes como 2º e cinco vezes como 3º classificado.

Vale a pena também recordar que o "nosso" Joaquim Agostinho foi 3º classificado nas edições de 1978 e 1979 do "Tour", correndo com Poulidor entre 1969 e 1976, ano em que este último disputou a prova pela derradeira vez.

Em Portugal, também tivemos uma espécie de "Poulidor": foi Jorge Corvo, um ciclista do Ginásio de Tavira, que obteve três 2ºs lugares e em 3º lugar na Volta a Portugal. Mas, deste, muito poucos se lembrarão. 

sexta-feira, julho 02, 2010

Nicole Fontaine

Nicole Fontaine é uma mulher política francesa, com grande experiência nas lides europeias. Foi ministra da Indústria, no governo Raffarin. Em 1999, protagonizou uma acesa competição com Mário Soares, ganhando-lhe na disputa pela presidência do Parlamento Europeu. O modo atípico como as coisas então se passaram prenunciava um futuro complexo para o seu relacionamento com Portugal. Recordo-me de a ter visitado, no seu gabinete de Estrasburgo, poucos dias depois da sua entrada em funções. Portugal seria o primeiro país a ser visitado por Nicole Fontaine. O seu entendimento conosco foi sempre impecável.

Na passada sexta-feira, fui um dos seus convidados pessoais na cerimónia em que a ministra da Economia, Christine Lagarde, lhe fez entrega de uma alta condecoração francesa. Fiquei satisfeito ao ouvi-la testemunhar o grande apreço que mantém pelo nosso país.

LusoJornal

Há dias tristes. Este é um deles. O LusoJornal, uma aventura de comunicação social independente, titulada pelo jornalista Carlos Pereira, acaba de chegar ao seu fim, por decisão judicial.

O LusoJornal fazia já parte do panorama dos locais portugueses em França, onde era distribuído gratuitamente. Com uma expansão nacional bastante forte, que garantia a sua auto-sustentação, acabou por sofrer o impacto indireto de outro tipo de problemas que afetaram a empresa sua proprietária.

Com o fim do LusoJornal perde-se um importante espaço de apresentação da vida associativa e cultural portuguesa em França. Não tenho a menor dúvida em afirmar que a comunidade portuguesa e luso-descendente fica mais pobre sem o LusoJornal.

Neste dia triste, aqui deixo um abraço de solidariedade ao Carlos Pereira.

Os diplomatas

Não diria que somos uma profissão de mal-amados, mas vivemos frequentemente presos a uma caricatura difícil de descolar da nossa pele. Nós, os diplomatas, estamos muito habituados a que nos tracem um rosto de vacuidade, a que colem a nossa existência a um dia-a-dia fútil, a que alguns se interroguem em público sobre a real valia dos gastos do erário que sustentam a nossa ação. No que me toca, e com o tempo, passei a preocupar-me muito pouco com isso e a cuidar muito mais em estar de bem comigo mesmo, em termos da contribuição que dou ao serviço público que escolhi como destino de vida.

Não deixa, contudo, de ser gratificante quando observamos que alguém reflete, de forma positiva, sobre esta profissão que escolhemos e que nos escolheu para ocupar alguns lugares em que representamos Portugal, quando vemos o nosso trabalho e as dificuldades em que por vezes ele se processa destacados por uma jornalista que tem andado por esse mundo a olhar o que fazemos.

Foi esse o caso, ontem, de Maria João Avillez, na sua coluna "Dia sim, dia não", na revista ´"Sábado". Obrigado, Maria João.

quinta-feira, julho 01, 2010

Vivo

Um dia, quando for contada a história da presença portuguesa na economia brasileira, o caso da Portugal Telecom (PT), e da sua parceria com a Telefónica de Espanha, na empresa Vivo, líder do mercado de telefones portáteis, fará parte de um capítulo principal. É uma história complexa, como o são todas as sagas em que o dinheiro está no posto de comando das decisões. É uma história de ambições, de rivalidades e de estratégias cruzadas. É também uma história através da qual o Brasil talvez venha a perceber, finalmente, que perdeu a hipótese de se colocar, com a PT, na liderança de um grande projeto no quadro da lusofonia, com a África incluída. Uma história que, repito, há-de ser bem contada. Um dia.

Da pequena história dessa história faz parte a Assembleia Geral da PT, ontem, onde o Estado português, através da sua "golden share", rejeitou a proposta de compra da parte que a PT tem dentro da Vivo, numa demonstração de grande coerência com a linha que sempre seguiu, no sentido de manter a PT como um instrumento de afirmação empresarial estratégica à escala global. O voto do restante capital dito nacional foi também imensamente coerente: com o lucro. 

Espanha europeia

Terminou ontem a presidência espanhola da União Europeia, no primeiro semestre de 2010. Tratou-se de um exercício da maior complexidade, porque teve lugar num dos períodos mais turbulentos da vida comunitária. Não cabe aqui fazer o balanço desta presidência, mas é importante referi-la como de grande empenhamento e dedicação à causa europeia.

Esta presidência coincidiu com a entrada em vigor do Tratado de Lisboa, o mesmo é dizer, com a afirmação pública das novas figuras que, por virtude desse tratado, ingressaram no firmamento europeu: o presidente fixo do Conselho Europeu e a Alta-Representante para a acção externa. Acomodar o papel da presidência rotativa com essas novas titularidades não deve ter sido tarefa fácil. Como não foi fácil deixar estabelecidas, com os equilíbrios possíveis, as bases do futuro Serviço Europeu de Ação Externa.

Para além destas mudanças institucionais, importa notar que, no período da presidência espanhola, ocorreu a maior crise de que há memória nas finanças europeias, com alguns países da UE (entre os quais a própria Espanha) a sofrerem uma pressão inusitado dos mercados mundiais. A tendência registada para uma gestão intergovernamental desta crise não deixou de afetar a própria imagem da União Europeia, enquando sede de decisões tomadas na observância de certas regras.   

Por estas e por outras razões, a muitas das quais foi alheia, a Espanha não pôde levar à prática todo o seu excelente programa de trabalho e, em muitos casos, foi obrigada a jogar com a conjuntura e a adaptar-se a ela. Fê-lo com a qualidade a que sempre, no passado, a excelente diplomacia espanhola nos habituou na Europa. Nesta hora da despedida da sua presidência, creio que é de elementar justiça deixar uma menção de grande simpatia à Espanha pelo modo como, sob ventos e marés, conseguiu desenvolver estes seus muito difíceis meses de trabalho europeu. Foi patente o modo como Madrid tentou ser fiel a alguns princípios essenciais, sem os quais o próprio projecto europeu, a que, com Portugal, aderiu precisamente há um quarto de século, deixa de ter algum sentido.

PGR (3)

Seria importante o parlamento revisitar a questão da composição do Conselho Superior do Ministério Público, bastando para tal que o PSD recu...