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terça-feira, maio 31, 2011

Portugal na Finisterra

A cultura portuguesa é trabalhada em França em muitos, e às vezes remotos, locais. Em Pont-Aven, no extremo da Bretanha, Cristina Isabel de Melo, de quem já aqui falámos há tempos, desenvolve um louvável esforço de difusão, através das Edições Vagamundo

A Vagamundo editou agora, de Nuno Júdice, com tradução da própria Cristina Isabel de Melo, a "Geométrie variable".

quarta-feira, maio 25, 2011

Lobo Antunes

Há um notório fascínio, em França, pela escrita de António Lobo Antunes. Com exceção de dois dos seus livros, toda a obra do escritor português está já traduzida em francês. Ontem, no centro cultural da Gulbenkian - que estás prestes a mudar de endereço, aqui em Paris - Lobo Antunes falou, para umas largas dezenas de atentos ouvintes, sobre o modo como um livro nasce.

Na sua exposição solta, de mais de uma hora, deu exemplos curiosos sobre a experiência de alguns autores e, com grande franqueza, não se eximiu a expor a sua (às vezes chocante) hierarquia de preferências literárias, dando também notas sobre o modo como avalia o estado atual da literatura em diversos países. Na resposta a uma pergunta, referiu que talvez nunca viesse a escrever "o" livro, considerando que a consumação de uma obra, para um escritor, seria o "encadernar da vida". E, citando John dos Passos, concluiu que escrever é, no fundo, "passear pela rua".

A contrastar com a cruel ironia que marcou muito da sua palestra, pude observar, horas depois, toda a frágil sensibilidade do escritor exposta na emoção com que evocou, num pequeno grupo, a saudade do seu íntimo amigo Ernesto Melo Antunes.  

quarta-feira, maio 11, 2011

Nuno Júdice

Nuno Júdice é um dos mais importantes poetas portugueses contemporâneos. Já aqui falámos dele, também a propósito do facto de, há alguns anos, ter sido conselheiro cultural na embaixada em Paris.

Desde a passada semana, numa merecida homenagem, uma sala do Consulado-Geral português em Paris passou a ter o seu nome. 

No dia 9 de maio, no centro cultural Gulbenkian, em Paris, o espetáculo "Le mouvement du monde", sob a responsabilidade de Jacqueline Corado da Silva, desenhou uma curiosa viagem pelas palavras de Nuno Júdice, traduzidas por Michel Chandeigne.

domingo, dezembro 05, 2010

Carta de Paris

1.
Eu penso em você, minha filha. Aqui lágrimas fracas, dores mínimas, chuvas outonais apenas esboçando a majestade de um choro de viúva, águas mentirosas fecundando campos de melancolia,

tudo isso de repente iluminou minha memória quando cruzei a ponte sobre o Sena. A velha Paris já terminou. As cidades mudam mas meu coração está perdido, e é apenas em delírio que vejo

campos de batalha, museus abandonados, barricadas, avenida ocupada por bandeiras, muros com a palavra, palavras de ordem desgarradas; apenas em delírio vejo

Anaïs de capa negra bebendo como Henry no café, Jean à la garçonne cruzando com Jean Paul nos Elysées, Gene dançando à meia luz com Leslie fazendo de francesa, e Charles que flana e desespera e volta para casa com frio da manhã e pensa na Força de trabalho que desperta,

na fuga da gaiola, na sede no deserto, na dor que toma conta, lama dura, pó, poeira, calor inesperado na cidade, garganta ressecada,

talvez bichos que falam, ou exilados com sede que num instante esquecem que esqueceram e escapam do mito estranho e fatal da terra amada, onde há tempestades, e olham de viés

o céu gelado, e passam sem reproches, ainda sem poderem dizer que voltar é impreciso, desejo inacabado, ficar, deixar, cruzar a ponte sobre o rio.

2.
Paris muda! mas minha melancolia não se move. Beaubourg, Forum des Halles, metrô profundo, ponte impossível sobre o rio, tudo vira alegoria: minha paixão pesa como pedra.

Diante da catedral vazia a dor de sempre me alimenta. Penso no meu Charles, com seus gestos loucos e nos profissionais do não retorno, que desejam Paris sublime para sempre, sem trégua, e penso em você,

minha filha viúva para sempre, prostituta, travesti, bagagem do disk jockey que te acorda no meio da manhã, e não paga adiantado, e desperta teus sonhos de noiva protegida, e penso em você,

amante sedutora, mãe de todos nós perdidos em Paris, atravessando pontes, espalhando o medo de voltar para as luzes trêmulas dos trópicos, o fim dos sonhos deste exílio, as aves que aqui gorjeiam, e penso enfim, do nevoeiro,

em alguém que perdeu o jogo para sempre, e para sempre procura as tetas da Dor que amamenta a nossa fome e embala a orfandade esquecida nesta ilha, neste parque

onde me perco e me exilo na memória; e penso em Paris que enfim me rende, na bandeira branca desfraldada, navegantes esquecidos numa balsa, cativos, vencidos, afogados... e em outros mais ainda!

(Poema de Ana Cristina César (1952-1983), poeta brasileira)

terça-feira, outubro 05, 2010

Poema Republicano

A propósito do meu anterior post "Nascimento da República", um comentador que se assina Alcipe teve a amabilidade de deixar o seguinte poema, que não resisto a transcrever, na data em que se comemora aquele que foi o primeiro dia da nossa República:

POEMA REPUBLICANO

Feliz quem tem uma terra
e nessa terra uma casa
e nessa casa
a memória de uma esperança.

Do meu avô maçon eu pouco sei,
do meu avô monárquico pouco lembro:
mas eu não tenho terra natal
nem casa de família,
nem sei onde conspirava o maçon
(o avental
foi entregue no velório,
para surpresa da família)
nem onde tertuliava o monárquico
(admirador de Salazar, mesmo assim)
só ouvi falar meus pais
do MUD Juvenil,
de Soares, Zenha e Maria Barroso
e isso era a República para mim!

Por isso toda a memória
para mim não tem lugar nem morada.

Saúde e fraternidade, meu amigo!

Alcipe

segunda-feira, agosto 23, 2010

Brecht

Primeiro levaram os negros
Mas não me importei com isso
Eu não era negro

Em seguida levaram alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário

Depois prenderam os miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável

Depois agarraram uns desempregados
Mas como tenho o meu emprego
Também não me importei

Agora estão a levar-me a mim
Mas já é tarde

Como eu não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo


Poema de Bertolt Brecht, por amabilidade de Gil

sexta-feira, agosto 20, 2010

Diplomacia e poesia

Não percam, no Tim Tim no Tibete, um excelente poema sobre os diplomatas, os poetas e os poetas diplomatas ou vice-versa.

quinta-feira, agosto 19, 2010

Eça no Panteão

A sugestão que fiz no post anterior, no sentido de ser lançado um movimento para a trasladação dos restos mortais de Eça de Queiroz para o Panteão Nacional, mereceu vários e gratificantes apoios.

Que fique claro que essa ideia partiu da nota que esse ímpar queiroziano que é Luis Santos Ferro deixou num comentário a um anterior post. O seu a seu dono!

Como não tenho o "know how" informático para colocar uma petição naquele sentido, desafio quem o saiba a que o faça. Pelo que me toca, procurarei apenas tentar gerar um apoio parlamentar alargado à ideia, desde que pressinta que ela pode ter pernas para andar.

quarta-feira, agosto 18, 2010

Vinicius e Eça

Com a graduação formal à categoria de embaixador, agora decidida pelo presidente Lula, o diplomata, escritor e compositor Vinicius de Moraes recuperou, postumamente, um estatuto a que poderia ter ascendido se a ditadura militar o não tivesse afastado prematuramente da carreira diplomática brasileira, numa decisão tomada à luz do odioso Ato Institucional nº 5.

Vinicius é uma daquelas figuras que - tal como Eça de Queiroz - teve a carreira diplomática como cenário de parte da sua existência mas cuja razão de vida foi uma obra literária magistral. 

Como seria a música e a poesia brasileiras sem Vinicius? Como seria a literatura portuguesa sem Eça?

O cônsul-geral José Maria Eça de Queiroz não necessita de ser ascendido a embaixador, mas, em compensação, justificava-se plenamente um movimento para colocar os seus restos mortais no Panteão Nacional. Se aí estão Almeida Garrett, Aquilino Ribeiro e Guerra Junqueiro, porque razão Eça de Queiroz não tem lá o seu túmulo? Quem quer alinhar numa campanha nacional nesse sentido?

segunda-feira, agosto 16, 2010

Eça de Queiroz

Há 110 anos, foi a enterrar Eça de Queirós*. 

Eça de Queirós foi diplomata. Se, como escritor, Eça foi um génio, como diplomata situou-se numa mediania que nem o esforço laudatório de alguns conseguiu disfarçar. Eça utilizou a sua carreira consular para escrever algumas das obras-primas da literatura portuguesa e, só por isso, valeu largamente a pena que o Ministério dos Negócios Estrangeiros lhe tenha pago o salário. O qual, no seu entender, não era suficiente, a crer no que escreve em "Uma Campanha Alegre":

Os diplomatas portugueses passam por agradar no estrangeiro pela sua palidez! Mas não se sabe que a sua palidez vem, não da beleza da raça peninsular, mas da fraqueza de legação mal alimentada. Onde um embaixador português mais se demora, não é diante das instituições estrangeiras com respeito, é diante das lojas de mercearia com inveja! E se eles não podem alcançar bons tratados para o País – é porque andam ocupados em arranjar mais rosbife para o estômago. Se não fossem os jantares da corte e as ceias dos bailes, a posição do diplomata português era insustentável. E ainda veremos os jornais estrangeiros, noticiarem:

“Ontem, na Rua de… caiu inanimado de fome um indivíduo bem trajado. Conduzido para uma botica próxima o infeliz revelou toda a verdade – era o embaixador português. Deram-lhe logo bifes. O desgraçado sorria, com as lágrimas nos olhos.”

Que o país atenda a esta desgraçada situação! Que tenha um movimento generoso e franco! Dê aos seus embaixadores menos títulos e mais bifes! Embora lhes diminua as atribuições, aumente-lhes ao menos a hortaliça. Eles pedem ao seus país uma coisa bem simples: não é um palácio para viver, nem um landau para passear, nem fardas, nem comendas! É carne! Que o País no número do pessoal diplomático – diminua os adidos e aumente os bois.”

*Como refere num comentário, com precisão, Luis Santos Ferro, entre a morte e o funeral de Eça de Queiroz mediou um certo tempo.


terça-feira, julho 13, 2010

Rui Knopfli





Conheci o Rui Knopfli em Londres, em 1990. Conselheiro de imprensa da Embaixada de Portugal desde 1975, era uma figura prematuramente frágil, nos seus 58 anos de então. Vergado e cansado, pendurado num eterno cigarro, tinha o mais caótico gabinete de que tenho memória. Homem de vícios que o foram debilitando, mantinha uma ironia cáustica e, sendo de trato fácil, era de condução diária difícil, pelos corredores da rotina diplomática a que nunca se acomodara verdadeiramente. 

Eternizado em posto em Londres, aposto que olhava para nós, companheiros episódicos, saídos da "carreira", com o olho arguto do artista, estudando-nos para nos sobreviver, até que fôssemos substituídos. Várias vezes "me passei" com os seus descuidos, das tropelias do eterno cão às suas frequentes ausências, para além de algumas teimosas presenças ainda mais complicadas. Mas nunca me zanguei com ele. Ficámos amigos, creio. 

O Rui era um fotógrafo magnífico - vale a pena ver o seu livro sobre a ilha de Moçambique - e tinha um ouvido apurado e atento ao jazz, área onde me deu a conhecer algumas excelentes novidades. Da sua terra moçambicana, contava histórias interessantes e divertidas, tributárias desse mundo que sempre lhe ficou nos genes e na escrita. Como ele próprio dizia: "Ter-se nascido ou vivido em Moçambique é uma doenca incurável, uma virose latente. Mesmo para os que se sentem genuínamente portugueses mascara-se a doenca, ignora-se, ou recalca-se e acreditamo-nos curados e imunizados. A mínima exposição a determinadas circunstâncias desencadeia, porém, inevitáveis recorrências e acabamos por arder na altíssima febre de uma recidiva sem regresso nem apelo".

Rui Knopfli foi um grande poeta, português e moçambicano. A sua "Obra Poética" está publicada pela Imprensa Nacional - Casa da Moeda, com um prefácio magistral do Luis de Sousa Rebelo, há meses desaparecido. Para abrir o apetite à sua leitura, nestes tempos de férias, deixo aqui o seu delicioso (e trágico) "Justerini & Brooks":


Este punhal de veludo,
esta fria estalactite,
esta cicuta tão lenta
e que tão profundamente
fere. Esta lâmina
líquida, doirada,
este filtro parecido ao sol,
este rarefeito odor simultâneo
ao fumo, à água, à pedra.
Este adormecer antes do sono,
só preâmbulo da vigília,
que é o gélido acordar
da imaginação para
as fronteiras dormentes
do horizonte protelado.
Este trajecto subterrâneo e húmido
pelos túneis do infortúnio,
que é o adiar moroso
da morte, no prolongar
silencioso da vida,
lágrimas da noite tornadas
pranto da madrigada,
rumor débil e distante
brandindo já no sangue
o endurecer das artérias.



Rui Kopfli morreu em Lisboa, em 1997.

sexta-feira, junho 18, 2010

José Saramago (1922-2010)

O segundo prémio Nobel português (o cientista Egas Moniz recebeu, "a meias", um Nobel da Medicina, em 1949), ontem falecido, foi sempre um homem polémico. Por razões políticas, muitos não o apreciavam e alguns terão tido motivos pessoais para tal. Na literatura, algumas das suas ousadias estilísticas nunca foram bem aceites em certos meios. No plano pessoal, atitudes suas chocavam algumas pessoas e não ajudaram a consensualizar a sua imagem. Nunca se preocupou muito com isso. Por essa razão, o coro de loas que, na hora da sua morte surge por aí, cheira a muita hipocrisia.

Tive o ensejo pessoal de me cruzar com José Saramago, em diversas circunstâncias e em vários lugares do mundo. Tinha com ele uma relação pessoal de simpatia, extensiva a sua mulher, Pilar del Rio. Com ambos tinha combinado, ainda em 2008, no Rio de Janeiro, o projeto de o levar a Paris, para uma "Marathon de la lecture", ideia que a fragilidade da sua saúde não permitiu concretizar.

Faço parte de quantos gostam muito de algumas das obras de Saramago e, mesmo não gostando tanto de outras, o têm por um dos raros génios da nossa literatura. Alguns dão-se ao luxo lusitano de não concordar com isso, no que estão no seu pleníssimo direito. A esses, porém, convém lembrar que a sua opinião é indiferente ao mundo, que consagrou já José Saramago como um dos nomes portugueses mais prestigiados de sempre.

sábado, junho 05, 2010

O Português

Em Grenoble e em Lyon concluiu-se nos últimos dois dias, um périplo que o embaixador português em França  tem vindo a fazer por todas as Secções Internacionais Portuguesas em liceus franceses, onde se ensina a língua, a cultura, a história e a geografia. Trata-se de núcleos existentes (infelizmente apenas) em algumas instituições de ensino secundário francês, que contam com a colaboração do nosso Instituto Camões e com o empenhamento dos Reitores das respetivas academias.

No diálogo estabelecido com os responsáveis dessas instituições, ficou-me patente a preocupação oficial francesa em garantir um tratamento à diversidade linguística e cultural existente neste país - pelo que, ao lado do português, encontramos o árabe, o espanhol, o italiano, o alemão, etc. Com toda a simpatia que a excelente cultura anglo-saxónica nos deve merecer, creio ser evidente o interesse, comummente partilhado por Portugal e pela França, de apostar no aprofundamento da diversidade linguística à escala europeia e global, de modo a que o inglês se não converta no "template" único, dominante de forma esmagadora na formação das novas gerações.

No simpático acolhimento que um grupo de estudantes fez, em Grenoble, ao embaixador português, teve lugar uma "viagem" pela memória dos descobrimentos, da música e literatura, para além de uma forte atenção às questões ambientais (onde o embaixador português falhou, com garbo, a dois testes a que foi sujeito...). Interessante lição  foi dada pela ligação entre o património das descobertas e o que daí resultou para o mundo, no tocante à medicina, à botânica, às artes e ao olhar moderno sobre si próprio.

Em Lyon, a poesia portuguesa esteve no centro da cuidada apresentação feita pelos alunos, com uma diversidade de escolha muito interessante de poetas. Aproveitei para assinalar que alguns dos autores escolhidos, como Ruy Cinnati e Reinaldo Ferreira, eram, eles próprios tributários de "viagens" de vida que haviam feito, no caso, respetivamente, por Timor e Moçambique. Também assisti - e colaborei brevemente - numa análise ao papel de Portugal no mundo contemporâneo, com os impactos da adesão à União Europeia em debate.

Ao encontrar, em todas as Secções Internacionais Portuguesas que tenho visitado, alunos de origens diversas - da Guiné ao Brasil, de Angola a Cabo Verde - cada vez mais me convenço de que é muito importante começar a trabalhar numa perspetiva lusófona alargada, aliando os autores de língua portuguesa de diversas origens, que reflitam as várias culturas que nela se exprimem. Qualquer "patrioteirismo" a que alguns possam ser tentados, pode ser que sossegue consciências, mas será apenas um mero adiar do futuro - repetindo, em triste registo, aquilo que, no passado, representou a "negação" lusa da realidade colonial. E, neste contexto, goste-se ou não, a utilização de uma matriz de expressão escrita tendencialmente comum - como a que decorre do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa - vai acabar por ser um instrumento indispensável a esta nova forma de olharmos um mundo que nos é comum.

Em tempo: ver aqui e aqui.

terça-feira, junho 01, 2010

Ferreira Gullar

Cheguei a uma idade em que a ignorância já se pode confessar. Até ir viver para o Brasil, desconhecia por completo a obra de Ferreira Gullar, escritor de cujo nome tinha ouvido vagamente falar, mas de quem não tinha lido uma única linha.

Foi o "londrino" Helder Macedo quem, numa noite de conversa num restaurante do Rio, me chamou a atenção para o autor de um livro com um nome bizarro, "Poema Sujo", considerando-o merecedor do prémio Camões, que nesse dia fora atribuído a um outro escritor de língua portuguesa. Por essa "dica", dias mais tarde fui à procura da sua obra e descobri uma vibrante e interessante escrita.

Para quem quiser conhecer a poesia, recomendo que comece pelos "Poemas Escolhidos". Quem pretenda inteirar-se melhor da personagem, leia o "Rabo de foguete - os anos de exílio", uma memória interessante, escrita na primeira pessoa, dos perseguidos da ditadura brasileira e dos respetivos percursos do exílio. Quem tiver curiosidade de visitar toda a sua obra, tem hoje ao dispor a imensa "Poesia completa, teatro e prosa", da Aguilar.

A Ferreira Gullar foi acaba de ser agora atribuído o prémio Camões. Parabéns pela presciência, Helder!

domingo, maio 09, 2010

Joaquim Vital (1948-2010)

Tínhamos a mesma idade, o que descobrimos num agradável e longo almoço a dois, há algumas semanas, aqui em Paris. Escritor, editor, tradutor, personalidade multifacetada de intelectual livre, Joaquim Vital era uma das grandes figuras da cultura portuguesa em França. Faleceu ontem, subitamente, em Lisboa.

Ouvira falar dele, há muito, através de amigos comuns. Ainda antes da minha vinda para França, a Manuela e o Nuno Júdice recomendaram que o procurasse. Só acabámos por conversar, com calma, muito mais tarde, já depois de eu ter lido o seu curioso "Adieu à quelques personnages", como aqui referi em Agosto do ano passado. Há semanas, enviou-me uma cuidada edição da "Ode Marítima" de Fernando Pessoa, sobre quem o tinha ouvido falar na Casa de Portugal, na Cité Universitaire de Paris.

Exilado desde os 18 anos, Joaquim Vital viveu em Paris desde 1973. Aqui fundou as "Editions la Différence", onde publicou traduções de muitos escritores portugueses, algumas das quais da sua própria autoria. Dos editores, escrevia: "Pode dizer-se, parafraseando Fernando Pessoa, que há três espécies de editores: os que publicam os livros de que gostam, os que gostam dos livros que publicam, os que não gostam de livros - e que não são editores. É a esta terceira categoria que pertencem os industriais e financeiros que decidiram, por razões de estratégia empresarial, atacar o mercado do papel impresso".

Joaquim Vital era uma figura que honrava a cultura portuguesa, que muito fez por ela e pelo prestígio do nosso país em França. Oportunamente, a Embaixada de Portugal em Paris irá homenagear a memória de Joaquim Vital.

Em tempo: sobre Joaquim Vital, leia mais aqui, aqui, aqui e aqui.

quarta-feira, maio 05, 2010

Pedro Rosa Mendes

Uns meses após chegar a Paris, alguém me falou no nome do futuro correspondente da agência noticiosa Lusa, que iria ser aqui colocado: Pedro Rosa Mendes. Interroguei-me sobre se seria o escritor do excelente romance "Baía dos Tigres". Era.

O Pedro acaba de publicar a "Peregrinação de Emnanuel Jhesus", onde projeta a sua experiência timorense. É um simpático "luxo" para os portugueses de Paris terem aqui, como correspondente, um escritor já consagrado pela crítica.

segunda-feira, maio 03, 2010

Pina Martins (1920-2010)

Como aqui se tem referido, o Centro Cultural da Fundação Calouste Gulbenkian, em Paris, é, desde 1965, uma das "caras" mais importantes de Portugal na capital francesa. Pela sua direção têm passado figuras ilustres da nossa cultura.

Dei-me agora conta que, há dias, desapareceu o professor José Pina Martins, que durante mais de uma década (1972-1983) dirigiu aquele centro. Pina Martins, que também presidiu à Academia das Ciências de Lisboa e foi professor catedrático da Universidade de Lisboa, era um reputado especialista no período do Renascimento, com uma vasta obra publicada, em Portugal e no estrangeiro.

Há pouco mais de um ano, descobri, quase por acaso, o seu curioso "Histórias de Livros para a História do Livro", uma peregrinação erudita por livros (e não apenas por textos) que o marcaram e sinalizaram a sua vida intelectual.

sábado, abril 24, 2010

Abril (2) - Salazar, por Fernando Pessoa



António de Oliveira Salazar
Três nomes em sequência regular...
António é António.
Oliveira é uma árvore.
Salazar é só apelido.
O que não faz sentido
É o sentido que tudo isto tem.


Este senhor Salazar
É feito de sal e azar.
Se um dia chove,
Água dissolve
O sal,
E sob o céu
Fica só azar, é natural.
Oh, c’os diabos!
Parece que já choveu...


Coitadinho
Do tiraninho!
Não bebe vinho.
Nem sequer sozinho...
Bebe a verdade
E a liberdade.
E com tal agrado
Que já começam
A escassear no mercado.


Coitadinho
Do tiraninho!
O meu vizinho
Está na Guiné
E o meu padrinho
No Limoeiro
Aqui ao pé.
Mas ninguém sabe porquê.


Mas afinal é
Certo e certeiro
Que isto consola
E nos dá fé.
Que o coitadinho
Do tiraninho
Não bebe vinho,
Nem até
Café.

Poema de Fernando Pessoa

quinta-feira, fevereiro 25, 2010

Eça

Há mais de três décadas, uma editora oficial que oferecia os livros que publicava (é verdade, havia disso!), chamada "Terra Livre", deu à estampa as "Imagens do Portugal Queirosiano", de um (até então) para mim desconhecido A. Campos Matos. Vim a saber tratar-se de um arquiteto que se dedicava ao estudo de Eça de Queirós (um "queirosiano", como de diz em Portugal, ou um "ecista", como se diz no Brasil). A partir daí, adquiri tudo quanto Campos Matos publicou, incluindo as duas edições e o suplemento do magnífico "Dicionário de Eça de Queirós", que coordenou.

Surge agora, editado em Paris, da autoria de A. Campos Matos, pela mão das "Editions de la Différence", com apoio da Fundação Calouste Gulbenkian, o livro "Vie et Oeuvre d'Eça de Queiroz". Trata-se não apenas da primeira das (até agora) oito biografia existentes do escritor que surge em língua francesa mas, igualmente, da primeira cuja edição original é aqui publicada.

Os interessados em adquirir o livro devem ter alguma calma. É que, segundo a Amazon, ele só estará disponível no dia 4 de Março. Perdoarão, no entanto, que este "colega" mais novo do antigo cônsul português em Paris usufrua o privilégio de já dispor de um exemplar...

Na impossibilidade de mostrar uma imagem razoável da capa do livro, fica, pelo menos, a clássica fotografia que a ilustra, onde o nosso Eça figura no seu jardim em Neuilly.

O outro 25

Se a manifestação dos 50 anos do 25 de Abril foi o que foi, nem quero pensar o que vai ser a enchente na Avenida da Liberdade no 25 de novem...