segunda-feira, fevereiro 07, 2022

Restaurantes


Porque a vida me tem dado essa facilidade, sou um regular frequentador de restaurantes, como constata quem por aqui me lê. Interrogo-me, por vezes, sobre se não será quase ofensivo o ato de escrever sobre as visitas a esses locais, num tempo de muitas dificuldades e de privações para tanta gente. Contudo, sempre considerei que, sendo os restaurantes uma fonte de legítimo negócio e de muito emprego, talvez fosse minha obrigação, como seu utente, em especial agora, nestes tempos de pandemia, ajudar a destacar quem se esforça profissionalmente nessa área.

Sei bem das dificuldades por que passaram alguns restaurantes nos últimos dois anos. Dei, a dezenas deles, provas concretas da minha solidariedade, pelas visitas ou encomendas que lhes fiz, pela publicidade (sempre gratuita, jamais com “borlas”, sem uma única exceção) que, por aqui e por jornais e revistas, lhes fui efetuando. E é minha intenção continuar a fazê-lo, na medida do possível e do que entender justo, sempre sob critérios de justiça, equidade e sem o menor “amiguismo”.

Dito isto, com toda a frontalidade e transparência, e reconhecendo bem os problemas que atravessam muitos restaurantes, sou hoje obrigado a uma triste constatação: está a haver um obsceno - sublinho, obsceno - e brutal agravamento de preços em algumas dessas casas, em muitos casos acompanhado de alguma visível degradação da qualidade do serviço (em especial, pela redução em termos de recursos humanos). Tem-me sido dada a justificação da forte subida de preços que estará a ocorrer em alguns produtos. Em alguns casos, posso aceitar essa explicação, mas deteto, para além disso, algum oportunismo circunstancial.

Acho, em particular, menos honesto - e meço bem o que digo - o escandaloso salto de preços que, quase de um momento para o outro, se verificou nos vinhos. Porque trabalho, já há quase uma década, numa empresa de distribuição de produtos alimentares, sei comparar os preços que me surgem nas listas dos restaurantes, não apenas com aqueles que se praticam nas grandes superfíceis (onde me abasteço como cliente) e os que os restaurantes obtêm, através dos distribuidores, em condições ainda mais favoráveis. Sei, por isso, que não há nenhuma justificação para o escandaloso exagero que está a ser praticado nos vinhos, em muita da nossa restauração. Procurar compensar perdas passadas com um brutal encargo sobre vinhos que são comprados (ou que, algumas vezes, já estavam em adega) a preços muito mais baixos é uma prática comercialmente muito pouco ética.

(Tenho um amigo, profundo conhecedor do setor da restauração e, há muitos anos, ele próprio produtor de vinhos de qualidade, que não se cansa de dizer: “Num país como Portugal, não há a menor justificação para que o preço médio de uma garrafa de vinho num restaurante ultrapasse o preço médio dos pratos”.)

A prosseguirem esta prática especulativa, alguns restaurantes, podendo ainda não o ter percebido, estarão  matar, a prazo, “a galinha dos ovos de ouro”: irão começar a perder rapidamente grande parte da sua clientela habitual, que tenderá a não voltar com tanta frequência, chocada com o “saldo” das visitas mais recentes. Pensem nisto!

10 comentários:

amadeu moura disse...

Subscrevo inteiramente! Num restaurante conhecido do Sotavento algarvio, a garrafa que veio para a mesa, tinha um acréscimo de 550% em relação ao preço de venda no supermercado!

Nunca mais pus lá os pés.

netus disse...

Muito bom dia.
Com a devida vénia assino por baixo.
Frequento alguns restaurantes, e considero também que muitos estão a perder a cabeça e, como bem refere, racionalidade é coisa que parece desconhecida. O resultado a curto prazo será porventura mau para muitos.
António Cabral

Luís Lavoura disse...

não há a menor justificação para que o preço médio de uma garrafa de vinho num restaurante ultrapasse o preço médio dos pratos

Saberá o Francisco que as drogas (e o álcool é uma droga) são um elemento muitíssimo importante na economia.

Não é por acaso que os primeiros produtos das Américas a serem exportados para a Europa foram açúcar, tabaco e rum - tudo drogas viciantes e adictivas.

Neste caso, uma pessoa quando se encontra já um pouco tocada, sobretudo num encontro de amigos, bem depressa mandará vir uma nova garrafa sem discutir o preço. Enquanto que uma pessoa já bem alimentada jamais mandará vir um novo prato de comida. Isso justifica o alto preço das garrafas em relação aos pratos.

Luís Lavoura disse...

Procurar compensar perdas passadas com um brutal encargo sobre vinhos [...] é uma prática comercialmente muito pouco ética.

As pessoas têm que compensar as perdas passadas - e presentes, muito presentes - de alguma forma. Se não fôr com um encargo sobre os vinhos, como sugere o Francisco que seja?

Um encargo sobre vinhos tem uma enorme vantagem: os clientes não são obrigados a suportá-lo. Podem abster-se de beber vinho, e prontos. É um encargo que somente o é para alguns. É como a taxa que o governo PS impôs - e muito bem! - sobre as bebidas açucaradas: só paga essa taxa quem quer.

José disse...

Pão (acabado de sair do forno)
Azeitonas (agradáveis)
0,5L de vinho tinto da casa (razoável)
Grelhada mista bem servida
Sobremesa
Café

Tudo juntinho à salamandra que aconchega a alma.

9 euros

Flor disse...

Quanto ao vinho para acompanhar a refeição poderão levar uma garrafa da garrafeira pessoal para o restaurante mas terão que pagar a "taxa da rolha" (23%).

Tony disse...

Fico a saber que o Sr. Luis Lavoura, é abstémio. Só bebe água da torneira. Fiquei, também a saber que sou um grandessíssimo drogado, pois não dispenso de um razoável tinto, à refeição. Sendo assim, vou passar a ir à cantina do Sr. José. Sempre se bebe, meia da casa, e almoço a preço muito razoável. É evidente, que os vinhos à carta, nos restaurantes, têm, na generalidade dos restaurantes, preços brutalmente especulativos, sem nenhuma razão de ser, pois, também os compro nos hipermercados.

Luís Lavoura disse...

Tony

Fico a saber que o Sr. Luis Lavoura, é abstémio.

Sabe mal, Tony. Todos os dias bebo vinho. Geralmente em casa, às vezes no restaurante. E também me queixo do preço. Mas sei que só o pago porque quero beber. Poderia perfeitamente não beber e não pagar. Trata-se de um luxo, opcional.

José disse...

Ó Tony, você no "meu" restaurante não consegue estar: as paredes estão pintadas de laranja.

Tony disse...

Oh José. Não seja mau para mim. Pra comer, bem e barato e no quentinho da salamandra, nem olhava para as paredes. Mas reconheço que a pintura é de mau gosto.

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