terça-feira, fevereiro 15, 2022

5-0

Aquele polícia de trânsito húngaro foi implacável. A multa, pelo excesso de velocidade, era mesmo para pagar. O recibo era constituído por uma espécie de bilhetes, agregados uns aos outros, tipo rifa, até perfazer o montante final. Recordo que nos rimos muito quando vimos surgir aquela longa papelada, o que causou estranheza aos cívicos. Mas não havia nada a fazer.

Estávamos em setembro de 1979. Por ali, era ainda o tempo do “socialismo real”, embora um dos mais “soft” de todos. Tínhamos decidido, nas nossas primeiras férias a partir de Oslo, onde eu fora colocado em maio e substituíra o embaixador durante o Verão, dar uma volta, no nosso refém-comprado Golf, durante três semanas, por alguma Europa. Não havia muito dinheiro, mas havia imensa vontade de conhecer mundo. E tinha sido assim que havíamos aportado à Hungria, depois de atravessar cinco países.

Sanado que foi, pelo desbaste na carteira, o incidente de trânsito, e porque o dia estava a declinar, pensámos que talvez valesse a pena dormir logo por ali. Era uma cidade de província, cujo nome nos dizia pouco, pelo que os escassos hotéis deviam ser baratos. E conseguimos alojar-nos, com facilidade e a bom preço. 

Chegados ao quarto do hotel, abri a janela. Vi então que havia um estádio de futebol, quase em frente. Na parede do estádio, estava um nome. Nesse instante, como dizem os brasileiros, “caiu a ficha”! Afinal, o nome da cidade era-me traumaticamente familiar e, mais do que isso, o clube também.

13 anos antes, o (meu) Sporting fora jogar por ali, para a Taça dos Campeões Europeus. A equipa era de luxo, parte dela vinda do Mundial desse ano, em Inglaterra. O treinador era um espanhol chamado Argila. Recordo muitíssimo bem - porque ouvi isso no relato da rádio e, depois, “escalpelizado” (como então se dizia muito) na “Bola” - que a tática do “mister” de além-Caia foi jogar com dois “liberos” (duplicando o “catenaccio” italiano) em frente ao guarda-redes, com uma “cortina” de quatro defesas, três jogadores a meio campo e, lá à frente, para “segurar” o adversário, a “jogar sem bola”, o pobre do Figueiredo, o “Altafini de Cernache”. 

A localidade chama-se Györ. (Belíssima cidade, onde já lá voltei. Falar-se-ia depois muito dela, porque foi por cá que morreu, um dia, fulminado em campo, Fehér, um jogador que lá havia nascido). O clube era o Vasas. O resultado foi uma derrota do Sporting por 5-0.

Ainda estou para perceber por que diabo me lembrei disto agora!

CorreçãoLeitores deste blogue chamaram-me entretanto a atenção para um erro crasso que figura no texto supra. Foi o Vasas de Budapest que derrotou o Sporting, por 5-0, em 1966. O clube de Györ, que mudou de nome 13 vezes desde a sua criação, chamou-se também Vasas Eto Györ. Era esse ainda o nome que figurava na parede do estádio, quando visitei a cidade. Daí a minha confusão. E este pedido de desculpas. Como alguém dizia: temos direito a ter as nossas opiniões, mas não temos direito a ter os nossos factos.

3 comentários:

Anónimo disse...

Mas, o Vasas é de Budapeste.
O clube de Györ é o ETO Györ.

Cumprimentos

Francisco Seixas da Costa disse...

Obrigado pelo comentário do Anónimo. Tem a parte mais importante da razão. De facto, eu estava equivocado: foi o Vasas de Budapeste que derrotou o Sporting por 5-0 em 1966. A minha confusão tem uma razão simples: o clube de Györ, desde a sua fundação em 1904, mudou várias vezes de nome, como pode ser visto consultando a sua história. Nos anos 60, chamou- se Vasas Györ. E quando eu fui a Györ era esse o nome que ainda figurava na parede do estádio. Ver aqui https://en.wikipedia.org/wiki/1964–65_European_Cup

Pereirinha disse...

Dois equívocos: o Sporting sofreu uma pesada derrota com o Vasas de Budapeste por 5-0; o ETO Gyor já se chamou Vasas no passado legitimando a confusão do Sr. Embaixador. De qualquer forma o que importa é a estória que é magnífica.

Cumprimentos,

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