domingo, maio 13, 2018

Israel




Israel, para além de ter ganho ontem o festival da Eurovisão, está em infeliz evidência pela “luz verde” que claramente recebeu dos Estados Unidos para atuar como força “subcontratada” na guerra da Síria.

Porque, por estes tempos, Israel faz 70 anos - uma bela idade! -, decidi republicar aqui algo que escrevi há quatro anos, no saudoso “Diário Económico”.

Na altura em que publiquei este texto, a então embaixadora de Israel, pessoa que conhecia de outros postos onde ambos tínhamos trabalhado, ficou profundamente desagradada com o artigo e disse-mo de forma enfática. Relendo-o, não encontro razões para retirar uma linha ao que então escrevi - e até poderia acrescentar algo mais.

Aqui fica:

Na minha vida diplomática, dei-me conta de que criticar a ação internacional de Israel obrigava sempre a um "disclaimer", implícito ou explícito, sem o que se erguia o risco de cair, de imediato, na jurisdição dos atentos polícias do espírito: cuidar em não poder ser acusado de anti-semitismo e nunca deixar de referir que o povo judeu foi vítima da violência nazi. 

A ajudar a este temor reverencial soma-se, desde o primeiro momento, um racismo anti-árabe, que condicionou o discurso popular. Tutelados por regimes retrógrados, embrulhados em panejamentos que os indiciavam noutro patamar da civilização, os árabes são-nos mostrados como uma espécie de bárbaros, apenas desejosos de "deitar os judeus ao mar". Por isso, e porque não eram aceitáveis os métodos extremistas da Fatah ou o não são os das várias seitas em que a revolta palestiniana se balcaniza, aos olhos de muito mundo passou a "valer tudo" por parte de Israel, desde os assassinatos da Mossad ("extra-judicial killings", na linguagem eufemista das Nações Unidas) às incursões sem limite pelas terras vizinhas. Ninguém ousa lembrar que Israel se recusa a cumprir as resoluções que a ONU (já agora, sem oposição dos EUA) aprovou, muito embora se levante um escarcéu se outros países procederem de forma similar (desde logo, o Iraque).

Durante a "guerra fria", Israel estava do lado "de cá" e os árabes do "outro lado", embora se soubesse que as coisas não eram bem assim. Os judeus eram o povo perseguido, rodeado de "facínoras" que aproveitariam o seu menor descuido para o esmagar. Por isso, para o ocidente, era de regra apoiar, sem limites, tudo o que pudesse ser apresentado em favor desse "enclave" não árabe, que "dava jeito" quando era necessário (sem que ninguém tivesse de "sujar as mãos"), por exemplo, para dar uma lição às ambições nucleares iranianas ou ver-se livre de alguns terroristas, esquecendo leis. É que, neste "racismo nuclear" que por aí anda, o Irão não pode ter a arma atómica, mas Israel está aparentemente "isento" da observância do Tratado de não-proliferação.

Os EUA, mobilizados pelo lóbi judaico, neutralizam toda a atitude que possa limitar a liberdade do Estado israelita. A Europa, com o ferrete da guerra a marcar-lhe a memória, vive entre piedosos protestos perante os "exageros" de Telavive e os negócios com a constelação dos governos árabes. Estes, com os conflitos entre si a prevalecerem hoje sobre a sua acrimónia face a Israel, vivem mais preocupados em fazer sobreviver os seus heteróclitos regimes do que se sentem mobilizados para a causa palestiniana.

O absurdo de tudo isto é que, se alguém se atrever a afirmar que Israel tem o indeclinável direito de ver respeitadas as fronteiras que lhe foram consagradas pelas resoluções da ONU, é imediatamente acusado de ser inimigo jurado do Estado judaico. E se ousar dizer que, em troca da segurança desse território, garantida, por exemplo, pela colocação de forças internacionais de paz, protetoras dessas mesmas fronteiras, Israel deve prescindir de quaisquer ambições territoriais e recuar na construção de colonatos em territórios que ninguém reconhece como seus, de imediato fica crismado de anti-israelita, provavelmente de anti-semita e, ainda com alguma probabilidade, sei lá!, de simpatizante nazi. Dei-me conta que não falei de Gaza. Para quê?”

2 comentários:

Anónimo disse...

Israel é Europa! Como o são a Turquia, a Georgia, a Arménia e o Azerbeijão. E por que não o Libano e a Síria, e também o Cavaquistão.

Cazaquistão, perdão!

Gostava era de os ouvir cantar todos juntos, coisas para além de metralhadoras e afins.

Um interessante canal youtube com muitos videos e entrevistas de rua sobre as sociedades israelitas e palestinianas

https://www.youtube.com/user/coreygilshuster

Joaquim de Freitas disse...

NA SIRIA , COMO EM GAZA


O BANHO DE SANGUE DE GAZA PELOS SOBREVIVENTES DE AUSCHWITZ


A Embaixada dos EUA em Jerusalém, é o insulto ao direito internacional, antes de mais.

Desrespeito aos direitos do povo Palestino, não esquecendo o que ocorre em Gaza nestes dias, não se pode comentar de outro modo que não seja chamar a atenção para a enormidade da tragédia.

Trata-se, sem exagero, de um banho de sangue – e é preciso pausar e dar a estas palavras o seu verdadeiro sentido. Sobram as imagens, para ficar apenas com algumas, das crianças literalmente despedaçadas, e da vida que parece ter perdido qualquer significado à sua volta, as pessoas sendo engolidas por um buraco negro de desespero.

Esse tipo de festival da morte é periodicamente celebrado pela aviação israelita e servido aos palestinos. E agora aos Sirios.

Em Gaza esses são momentos de explosão do sofrimento que vem se somar à situação dramática, quotidiana e velha de vários anos, vivida naquele lugar pelos palestinos,
prisioneiros a céu aberto, cercados de todos os modos e por todos os lados.

Para cada uma dessas campanhas de bombardeio, acompanhado ou não de invasão terrestre, costuma-se escolher uma explicação, uma causa e muitas vezes uma justificaçao, que, no melhor dos casos, é apenas parcialmente verdadeira e, no mais das vezes, é mero pretexto.

A mensagem que se passa, ainda que possa ser apenas subliminar, é que a culpa da explosão é dos palestinos, sempre.

CULPADOS DE VIVEREM NESSA TERRA DESDE SEMPRE. Que o Sionismo quer eliminar completamente.

E em Gaza , como na Siria, não há exagero, do ponto de vista técnico, jurídico, em dizer que os israelitas cometem crimes de guerra e crimes contra a humanidade. Nós só não pensamos muito nisso porque as fontes onde estamos acostumados a buscar as nossas verdades não apontaram o dedo nessa direcção.

E a ONU é silenciosa.

João Miguel Tavares no "Público"