Aquele ministro dos Negócios Estrangeiros, oriundo de um pequeno país europeu, levava-se muito a sério no exercício da Presidência rotativa que, naquele semestre, cabia ao seu país. O tempo era de crise política nos Balcãs, com o presidente Milosevic sob forte pressão internacional, em face das tensões que potenciava na Jugoslávia. Por virtude das quase ridículas contribuições que o Estado que representava poderia dar, em caso de eventuais ações militares em nome coletivo, o ministro tornava-se algo caricato, ao falar como se tivesse, atrás de si, umas forças armadas fortíssimas e, em especial, como se lhe fosse possível mobilizar os parceiros à escala da sua retórica.
Os "cornetos" sonoros dos jornalistas, em frente a um político, são afrodisíacos verbais. À porta de um hotel de uma capital europeia, com as câmaras e as luzes da ribalta a daram-lhe a importância de que precisava, o ministro fez uma declaração forte, afirmativa, tentando mostrar que estava "in charge". No termo do "statement", avisou, tonitruante e solene, de dedo espetado, para um distante Milosevic: "Quero daqui dizer ao senhor Milosevic, com toda a firmeza, que a Europa tem um limite para a sua paciência e que, se necessário, lhe dará uma resposta à altura das suas provocações". No ar, ficou um indelével cheiro a pólvora oral.
Os "cornetos" sonoros dos jornalistas, em frente a um político, são afrodisíacos verbais. À porta de um hotel de uma capital europeia, com as câmaras e as luzes da ribalta a daram-lhe a importância de que precisava, o ministro fez uma declaração forte, afirmativa, tentando mostrar que estava "in charge". No termo do "statement", avisou, tonitruante e solene, de dedo espetado, para um distante Milosevic: "Quero daqui dizer ao senhor Milosevic, com toda a firmeza, que a Europa tem um limite para a sua paciência e que, se necessário, lhe dará uma resposta à altura das suas provocações". No ar, ficou um indelével cheiro a pólvora oral.
Visivelmente "aos ombros de si próprio", o político recuou as suas tropas diplomáticas para o "lobby" do hotel, sob um ressoar de comentários aprovadores de assessores, que lhe asseguravam que tinha "saído muito bem". E lá foi, deliciado, de peito feito, com um esgar de satisfação, para um merecido copo no bar, depois do "aviso" a Milosevic, que deve ter ficado a tremer, lá pelo palacete em Dedinje. Cada um tem o seu "Bei de Tunis" (ainda haverá Bei, por lá?), mas o ministro não devia conhecer o nosso Eça.
Foi por essa altura que um funcionário português, ocasionalmente presente na delegação ministerial, de forma um pouco impertinente mas escolhendo as palavras, ousou dizer àquele chefe da diplomacia (e sou testemunha privilegiada disso): "O senhor ministro vai perdoar-me, mas, ao falar como falou, com as tropas que o seu país tem, fez-me irremediavelmente lembrar uma frase, que ficou famosa, do capelão do regimento de infantaria da minha terra, no início da guerra colonial, em África, em 1961. Ao discursar ao primeiro contingente que partia para Angola, terminou desta forma lapidar: 'Rapazes! Preparêmo-nos para a guerra! Ide!...'"
Apeteceu-me lembrar hoje esta historieta, quando se assinalam os 50 anos do início da "guerra do ultramar", para uns, da "guerra em África", para outros, e da guerra colonial, para a História.