Há dias, o presidente francês, Emmanuel Macron, deu uma longa entrevista televisiva, por ocasião do primeiro aniversário da sua eleição. Contrariamente a uma prática comum a muitos dos seus antecessores, que tinham quase sempre à sua frente interlocutores respeitosos, quando não dóceis, Macron aceitou que as questões lhe fossem colocadas por dois jornalistas que ele sabia, à partida, que lhe iriam ser muito incómodos. E foram. O programa chegou a ter momentos tensos, com o presidente a manter uma notável frieza. Ele, contudo, correu o risco. E ganhou.
Recordaria que Macron é um presidente de circunstância. Na primeira volta das presidenciais de 2017 teve 18% dos votos, tendo sido eleito pela lógica “tudo menos Le Pen”, que alguma direita e suficiente esquerda seguiu no segundo turno. Se François Fillon não se tivesse enredado em nepotismos, seria hoje o presidente francês. Quero com isto dizer que Macron, à época da sua eleição, não correspondeu a nenhuma “vaga de fundo” que tivesse varrido a França, numa onda avassaladora de entusiasmo em torno de uma figura providencial.
E, no entanto, Macron é, nos dias de hoje, uma surpresa.
Ainda o estou a ver, numa sala do Eliseu, em meados de 2012, a informar os embaixadores da UE das prioridades de François Hollande no seu primeiro Conselho Europeu. Era então secretário-geral adjunto da Presidência. Apresentou tudo com grande rigor, respondeu a uma ou duas perguntas nossas com precisão e assertividade. À saída, o meu colega sueco, Gunnar Lund, comentou, para gargalhada de alguns de nós: “podia perfeitamente ser assessor de Sarkozy”.
Macron viria a afirmar não ser muito sensível à distinção entre esquerda e direita, coisa que, em França (e não só), segundo o filósofo Alain, só é dita por alguém de direita. É um liberal, com experiência no setor privado, com um programa de “modernização” (outro eufemismo conservador para o desmantelamento do Estado) do setor público, no país europeu onde ele consome maior percentagem da riqueza.
A França vive um momento interessante. Com o Brexit, passará a ser o único poder nuclear europeu, o único país da UE com direito de veto no Conselho de Segurança da ONU, com as únicas forças armadas com capacidade significativa de projeção.
Para a Europa, Macron tem propostas ousadas de reforma, embora a palavra final alemã seja determinante. Mas a sua capacidade de iniciativa em certos domínios institucionais é evidente e, para sermos honestos, muito estimulante.
Há nele qualquer coisa de Valéry Giscard d’Estaing, entre alguma arrogância, manejo fácil dos dossiês económicos e um “look” kennediano.
Irá Macron ser um grande presidente, escorado na sua visível auto-confiança, na sua determinação? Até onde irá Macron?