Os adidos de embaixada, categoria que os ingressados na carreira diplomática têm durante os primeiros anos de serviço, frequentam, por alguns meses, um curso profissional, em que são docentes diplomatas mais velhos, em serviço ou já fora dele.
Aqui há já muitos anos, os novos adidos assistiam a uma palestra de um velho embaixador. Era um homem com uma carreira mediana, bem falante, bom contador das coisas da vida, que ilustrava as suas décadas de trabalho com o relato de episódios que entendia exemplares e dignos de nota.
Os adidos ouviam com atenção e apreço o seu discurso ameno, seduzidos pela coreografia verbal com que o velho diplomata envolvia as suas experiências pelo mundo, tidas como dignas de registo, para adubar a inexperiência dos auditores.
Era um mundo de pequenas aventuras, com cenários muito diversos daqueles que a sua vida até aí lhes proporcionara. Embora os tempos fossem naturalmente outros, não deixava de ser interessante ter acesso àquelas histórias, cujo somatório acaba por tecer uma cultura corporativa comum.
Naquele dia, o diplomata relatava um episódio passado na residência que, em tempos idos, ocupara numa capital africana, quando aí era encarregado de negócios, nos anos 60.
Explicava ele que se tratava de edifício isolado, com escassa segurança, na periferia da capital, rodeado de um amplo jardim,. Os riscos não eram muito elevados, porque a criminalidade local era então escassa, mas, apesar disso, já por mais de uma vez, houvera indícios de que a casa fora rondada por potenciais assaltantes.
Uma madrugada - contava ele - ouviu, distintamente, ruídos provindos do outro lado da casa, onde habitava sozinho. Pôs-se à escuta e percebeu uma sussurada conversa, no exterior do prédio, entre pessoas que, claramente, estavam já a tentar forçar uma porta ou uma janela.
A situação revelava-se complexa. Os empregados viviam noutro edifício, mais distante, e, claramente, não tinham ouvido chegar os assaltantes. Embora houvesse quem, em tempos, lhe tivesse recomendado que comprasse uma arma, o bom-senso do diplomata levara-o a não ir por esse perigoso caminho. Naquele instante, porém, perguntava-se sobre que opção tomar.
O relato tinha foros quase fílmicos. Os adidos olhavam, atentos, para o velho embaixador, que, para ilustrar a história, vagueava pela sala, frente a eles, de gesto largo e fácies grave.
A certo passo, estacou e inquiriu: "Alguém tem uma ideia do que eu fiz, na ocasião?". Fez-se um silêncio, apenas entrecortado por uns declinantes murmúrios, com opções de ação tão pouco ousadas ou imaginativas que não chegaram a ser formuladas em voz alta.
É, nesse instante, que, com um sorriso, o embaixador revelou a sua "defesa":
- Caros colegas, é muito fácil. Fui à casa de banho!
A sala estacou de espanto. À casa de banho?! Para quê?
- Meus amigos. É elementar! Puxei a autoclismo. Em África, no silêncio profundo da selva, o fragor de um autoclismo a descarregar tem a força explosiva do tiro de um canhão!
A sala escangalhou-se em gargalhadas e a história passou a fazer parte dos anais divertidos das Necessidades.
2 comentários:
Fica anotado.:)
Senhor embaixador
Gostei da sua história, tanto mais que , sem ser embaixador, com alguma frequência já me aconteceram situações parecidas. Mas o meu truque mais normal é outro: acordo.
MB
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