segunda-feira, julho 19, 2021

A “roleta britânica”

Começa hoje a “roleta russa” britânica, suspendendo a maioria das precauções públicas no tocante à pandemia. Estarão certos? Prouvera que sim!

13 comentários:

Luís Lavoura disse...

Exatamente.
A sua experiência poderá iluminar as decisões posteriores de outros países.
Discordo porém da decisão de abrir discotecas e pubs. Ajuntamentos de muitas pessoas em ambientes potencialmente mal arejados são extremamente perigosos.

Luís Lavoura disse...

Porém, parece que as quarentenas continuam, pelo menos o próprio Boris Johnson está de quarentena.
As quarentenas obrigatórias são a principal das restrições sanitárias. Se elas não são eliminadas...

Jaime Santos disse...

Luís Lavoura, quando tudo aquilo lhes explodir na tromba (o próprio Governo britânico admite que é possível que se chegue aos 200.000 novos casos diários), não vai fazer qualquer diferença se isso acontece por causa da abertura das discotecas ou de outra coisa qualquer.

As pessoas continuam a não perceber o que é um crescimento exponencial. Nem você, que parece dispor de literacia numérica, muito embora pense, ao que parece, que são as estatísticas que geram os dados e não o contrário.

O Governo dos Países Baixos recuou no desconfinamento e o PM holandês pediu desculpas públicas quando a capacidade de testagem do País deixou de acompanhar o aumento de casos...

Eu faço-lhe um desenho se ainda não percebeu:

https://twitter.com/YorickB/status/1416070122226266115

E depois, não entendo muito bem o que tem contra as quarentenas obrigatórias. Estamos a lutar contra uma doença altamente contagiosa (o R0 da variante delta é 7, similar ao sarampo) que provoca morte ou doença grave numa pequena parte da população e efeitos debilitantes prolongados num conjunto mais alargado de pessoas, incluindo jovens, a faixa etária menos coberta pela vacinação.

A dita vacinação que, note-se, diminui significativamente estes riscos, mas não os elimina totalmente.

Pior, nenhum País, nem sequer o RU, atingiu ainda uma taxa de imunização que permita alcançar a tão desejada imunidade de grupo.

Para que ela seja atingida, é necessário que o número de pessoas suscetíveis à doença desça abaixo de 1/R0, o que quer dizer que é necessário que entre 85-90% da população esteja imunizada, seja por inoculação, seja por infeção e recuperação no caso da variante delta, agora dominante.

Isto implica que continuaremos a observar surtos com crescimento exponencial até que isso aconteça e que os serviços de saúde serão assoberbados por doentes covid19, mesmo que com doença menos grave (veja-se o que acontece nos surtos de gripe no Inverno).

Isto terá necessariamente consequências nos cuidados prestados a pacientes com outras patologias... Mais, com o crescimento das infeções, estaremos de novo a condenar muitos desses pacientes ao auto-isolamento, porque as vacinas não garantem, sobretudo a eles, imunidade absoluta...

https://www.theguardian.com/commentisfree/2021/jul/13/covid-numbers-england-freedom-day-dont-add-up-strain-nhs

Por isso, as medidas restritivas são, justamente com a vacinação, as armas de que dispomos para ir vivendo a nossa vida da forma mais normal possível, evitando condenar os elementos mais frágeis da nossa sociedade a um risco desnecessário.

Sim, porque existe uma coisa chamada Sociedade, mesmo se os Tories, pelo menos desde Thatcher, parecem ter-se esquecido disso, apesar da conversa de Johnson sobre o 'levelling-up' ou lá como aquela treta se chama...

Quanto a você, parece-me que foi coisa em que nunca acreditou...

maitemachado59 disse...

Jaime Santos

nao estou de acordo consigo: nao existe tal coisa "sociedade". esta pressupoe honogneidade, e onde e que se encontra?

Quanto a treta do Johnson "levelling up" e na realidade "levelling down".

maitemachado59

Jaime Santos disse...

Maité, mas desde quando é que uma sociedade tem que ser homogénea? Desde logo, não pensamos todos da mesma maneira. Os únicos sítios onde isso supostamente acontece são os 'paraísos' ditatoriais...

Depois, as sociedades são etnicamente diversas e vivem normalmente bem com isso (e às vezes não). Em Portugal tivemos cá fenícios, celtas, romanos, visigodos e suevos, mouros, judeus (desde o tempo dos romanos) e claro, os escravos negros trazidos pelos nossos navegadores (leia as queixas do Clenardo sobre isso) e os ciganos. Para onde pensa que esse sangue todo foi? Corre-nos nas veias, claro.

Evidentemente que a educação pública tem um efeito homogeneizador, e não há mal nisso, mas esse até é um fenómeno recente, particularmente entre nós...

E claro, temos as diferenças regionais, mas não me parece que um Madeirense se sinta menos Português que um Tripeiro como eu... Se calhar até se sente mais, porque o Porto é uma Naçon, como bem se sabe ;) ...

Luís Lavoura disse...

não vai fazer qualquer diferença se isso acontece por causa da abertura das discotecas ou de outra coisa qualquer

Faz diferença. Você quer determinar o que pode abrir e o que deve fechar. Quer-se fechar o menos possível. Neste sentido, é conveniente abrir de forma controlada, tentando evitar que se abra aquilo que é considerado mais perigoso.

não entendo muito bem o que tem contra as quarentenas obrigatórias

Elas sabotam completamente o funcionamento da economia. Um aluno é apanhado com o vírus, entra em quarentena e deixa de fazer um exame final. Uma oficina de automóveis tem dois ou três dos seus funcionários com o vírus, ficam todos de quarentena e a oficina tem que encerrar. E assim por diante.

Estamos a lutar contra uma doença altamente contagiosa

Não. O vírus é altamente contagioso, sim. Mas raramente provoca qualquer doença. Este é o facto crucial: embora o vírus infete montes de gente, pouquíssima dessa gente adoece.

Jaime Santos disse...

O seu 'facto crucial' está errado, Luís Lavoura. Se olharmos para os EUA, temos uma taxa de mortalidade de caso de cerca de 1,8% (daqui: https://covid.cdc.gov/covid-data-tracker/#cases_casesper100klast7days).

Mesmo que o número de infeções não-detetadas seja o dobro das detetadas, a taxa de mortalidade (0,6%) é ainda assim várias vezes a da gripe comum.

Os números de Portugal são muito semelhantes...

E devido ao efeito conjugado do alto contágio que reconhece e de uma taxa de mortalidade razoavelmente alta, o seu raramente, Luís Lavoura, já ocasionou mais de 17.000 mortos entre nós (mais de 600.000 nos EUA).

Mas recordo-lhe aliás que os Países que melhor conseguiram manter a Economia a funcionar foram aqueles que aplicaram regras mais duras o mais depressa possível, como a Austrália ou a Nova Zelândia.

Fazer-se aquilo que propõe obrigará a confinamentos gerais muito prolongados quando o número de casos submergir os sistemas de saúde.

A não ser, claro, que considere que a manutenção do funcionamento 'normal' da Economia vale mais uns milhares de vítimas. Funcionamento que não será nada normal, claro...

AV disse...

Vamos assistir a uma repetição do Verão passado, com um relaxamento súbito a dar origem a um Outono e Inverno problemáticos.
A vacinação - muito bem sucedida no Reino Unido - vai mitigar as sequelas mais duras, mas a ausência de precauções como a obrigatoriedade de usar máscaras em espaços fechados e pouco ventilados, vai ter as consequências que se prevêm.
Existe uma grande relutância nalguns sectores da sociedade britânica em aceitar a necessidade de precauções básicas. É uma questão muito divisiva, não só em termos de grupos etários, mas também, em parte, socio-económicos. O governo, que tem grandes traços populistas, parece não ser capaz de adoptar um meio termo equilibrado.
Nestes primeiros dias, já se podem ver muitas diferenças, por exemplo, em estabelecimentos comerciais na mesma zona - nalguns, os funcionários usam máscaras e mantêm o distanciamento social, noutros deixaram de existir quaisquer regras.
Receio bem que o sucesso da política de vacinação seja comprometido por esta abertura súbita com ausência de precauções mínimas.

Jaime Santos disse...

O número de internamentos em UCI e o número de mortes é provável que baixe, AV, dada a eficácia das vacinas. Mas o mesmo não se passará com a procura às urgências hospitalares, o que seguramente representará uma perda de qualidade do serviço para todos os que precisam dos hospitais e uma pressão inaceitável sobre os profissionais de saúde.

Johnson e comparsas já mostraram vezes sem conta que se estão nas tintas para o pessoal médico. É a atitude típica de libertários que acham que a sua liberdade (incluindo a de ganharem dinheiro) é mais importante que a vida e a saúde de todos os outros, sobretudo dos mais fracos, que serão aqueles que ficarão obrigados a restringir mais os seus movimentos face ao risco de contaminação.

Para um povo que se orgulha tanto da luta contra os nazis, esta predilecção pelo darwinismo social mostra bem que estamos conversados nessa matéria. Theresa May disse em tempos aos Tories que eles se arriscavam a ser vistos como o 'The Nasty Party'. Johnson parece ter resolvido o problema mobilizando uma maioria parlamentar de 'Nasty Voters'...

Claro, quando for preciso confinar e fazer regressar os apoios públicos, não serão só os mal comportados a pagar. Serão todos...

Felizmente que entre nós uma larga maioria parece defender a continuação das restrições, incluindo o uso de máscara na rua. Enfim, há quem não entenda que se pode e deve restringir os movimentos de alguém portador de uma doença altamente contagiosa (coisa que nem Johnson contesta :), afinal ele próprio teve que se auto-isolar, que remédio), mas estou como o outro, perdoa-lhes porque eles não sabem o que dizem...

Luís Lavoura disse...

Jaime Santos,

você é, sem dúvida, um socialista: prefere que se socialize o prejuízo. É essa sempre a atitude típica dos socialistas: havendo um grande prejuízo, deve ser a sociedade toda a arcar com ele, e não somente aquele(s) sobre o(s) qual(is) ele incide. Se uma doença incide somente sobre 1% da sociedade, então deve-se lixar o mais possível os restantes 99%, para que o 1% sofra um bocado menos, diz o socialista.

Eu, como liberal, prefiro que os prejuízos não sejam socializados. Chame-lhe "darwinismo social" se quiser. Eu tenho filhos e prefiro que os meus filhos sobrevivam de boa saúde (mental e financeira), mesmo que com prejuízo dos velhos (inclusive meu). Eles não têm culpa das fraquezas dos velhos e não devem ter que pagar por elas. O prejuízo dos velhos deve ser somente deles; não deve ser socializado.

Jaime Santos disse...

Não, Luís Lavoura, isso que define como liberalismo é só mesmo darwinismo social.

Isso nem sequer é utilitarismo, porque os utilitaristas (the greatest good for the greatest number) sabem bem que existe uma hierarquia de valores e que no topo dessa hierarquia está a vida humana.

Quem assim fala são apenas aqueles que conhecem o preço de tudo mas não conhecem o valor de nada.

Mais, o Liberalismo (com L grande) defende que as instituições (entre as quais o Mercado) servem o indivíduo e não o contrário. O Sábado fez-se para o Homem e não o contrário, conhece?

E isto nada tem por si de socialista, muito embora muitos socialistas o subscrevam.

Alguns, aliás, nem por isso, olhando para o incontável número de vítimas individuais que o socialismo real causou, supostamente em nome do bem coletivo e dos amanhãs que cantam.

Não muito longe dos disparates com que você gosta de 'épater les bourgeois', muito embora não o reconheça.

E depois, você fala em abstrato, tenho a certeza. Gostaria de saber o que pensaria um filho seu se perdesse o Pai ou um Avó para a Covid-19, quão boa ficaria a sua saúde mental, mesmo se porventura a financeira melhorasse...

Acha mesmo que vale a pena fazer tal sacrifício?

Embora, muito sinceramente, imagino que a sua posição social, olhando para o tempo que tem para postar em blogs (como eu, aliás), torna o dito sacrifício pouco provável... Não me parece que o Luís Lavoura faça turnos de limpeza no hospital ou no supermercado... Sabe o que se chama a alguém que não é capaz de aplicar a si próprio a bitola que aplica aos outros, não sabe?

Eu mandaria-o sacrificar-se para bem longe, mas como parece que há por aqui pessoas que interpretam isso de forma literal, mando-o antes para o arraial da IL atirar umas setinhas à efigie do Ministro Pedro Nuno Santos...

É capaz de encontrar 'like minded people' por lá... Daqueles para quem o liberalismo se reduz ao mercado livre, mesmo que seja preciso sacrificar valores liberais fundamentais, como a liberdade inidvidual e a vida das pessoas, para o manter...

Para terminar, eu não me considero nada um Socialista, quando muito um Social-Democrata bem liberal. Mas não tomo essa designação de todo como um insulto, muito embora pessoas como você considerem que o é, quando não sabem bem sequer o que é o Socialismo...

Jaime Santos disse...

Já agora, Luís Lavoura, outro aspeto curioso da sua definição de socialista é que ela faz de toda a nossa classe política, da Direita à Esquerda, um bando de socialistas :).

Que me lembre, ninguém contestou o salvamento dos bancos com dinheiros públicos (está claro que o anúncio dos pré-PàF de que a resolução do BES não iria custar um cêntimo aos contribuintes era mentira e eu pelo menos não acreditei nela desde o primeiro dia).

Os diferentes Partidos podem ter contestado a forma como eles foram intervencionados (acho que Rui Rio chegou a dizer que teria sido preferível nacionalizar o BES a vender o mono à Lone Star, e se calhar até tem alguma razão), mas não o princípio da intervenção.

Eu também defendo essa mesma intervenção dados os possíveis efeitos sistémicos da mesma (e depois tenho conta no BES ;) ). Sabemos da experiência com o Lehman Brothers, o tal a que as agências de rating davam triplo A até aquilo se desfazer como um castelo de cartas, que deixar cair bancos pode ter consequências devastadoras.

Deixar cair Países também, aliás. Se a Sra. Merkel e o Sr. Sarkozy tivessem afogado a dívida grega em euros, provavelmente isso teria ficado mais barato do que salvar a Grécia, a Irlanda, Portugal e ainda os bancos espanhóis...

Ora, esta capacidade de nos adaptarmos às circunstâncias e procurar soluções que mesmo que premeiem o infrator resultam numa minimização do prejuízo comum tem um nome, pragmatismo, ou pode mesmo vê-la como uma forma de utilitarismo.

Ou se quiser de Marxismo, mas da tendência Groucho :), 'estes são os meus princípios e se não gostarem deles, arranjo outros' que é melhor do que o Marxismo da tendência Chico, 'em que vais acreditar, em mim ou nos teus próprios olhos?', posição comum às pessoas nos extremos do espectro ideológico :) ...

Luís Lavoura disse...

Jaime Santos

tudo aquilo lhes explodir na tromba (o próprio Governo britânico admite que é possível que se chegue aos 200.000 novos casos diários)

Se observar a curva de evolução dos novos casos no Reino Unido, média a sete dias, verificará que essa curva tem estado a parar de aumentar, e ontem começou a diminuir. Por curiosidade, ontem aconteceu exatamente o mesmo (começou a diminuir) à curva de novos casos em Portugal.

Longe de mim prever o que irá acontecer a essa curva nos próximos dias. Mas a sua previsão da "explosão na tromba" talvez saia furada...

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