sexta-feira, maio 01, 2015

1º de maio

Vivi o meu primeiro "Primeiro de maio" na segunda metade dos anos 60. Em sítios esconsos da faculdade apareceram colados uns papéis acastanhados com a expressão "Todos ao Rossio no 1º de maio", ou uma coisa assim. Creio que também havia a indicação de uma determinada hora, Com alguns amigos, muito por curiosidade, lá fui. Era um ambiente tenso, cheio de gente que se movia sem destino, olhando uns para os outros, alguns trocando sorrisos cúmplices. Vi-me a tentar perceber quem seriam os "pides" e os PSP à paisana, que sabíamos abundarem. Passaram uns bons minutos sobre a hora anunciada. De súbito, num dos cantos da praça, junto à estação, a caminho dos Restauradores, surgiu um burburinho qualquer, berros e gente a correr. Nos segundos seguintes, detrás no Teatro Nacional, saiu a polícia de choque, parte dela atrás da turbamulta que se agitara, a restante a "limpar" o largo de S. Domingos, em cuja esquina eu estava no momento. Do lado da "Casa da Sorte" criara-se uma outra onda de agitação, que caminhava na minha direção. A Ginjinha foi o meu local de refúgio. "Meu"? Devíamos ser aí uns vinte, alguns encavalitados sobre o mármore húmido do balcão, sem coragem de pedir "uma com elas", porque agora é que iam ser "elas"! Por detrás do balcão, os da casa não ousavam exigir consumo mínimo, tentando olhar o largo por cima de nós... Por maior naturalidade que tentássemos dar ao nosso ar, estar ali era uma coisa estranha. De repente, sair da Ginjinha tornou-se imperativo. Num instante, vi-me separado dos meus amigos, empurrado a caminho da praça da Figueira. Tentei não correr. Não cheguei à praça. Um bando de PSP de bastão, plantado na estratégica esquina traseira da Suíça, não estimulava continuar por esse caminho. Pensei entrar no "Braz & Braz", mas as portas tinham-se fechado. Voltar para trás era impensável, entrar na ruela à esquerda, a caminho do Hotel Mundial, era arriscado. Por alguma razão essa artéria estava deserta. Olhei à volta. O largo de S. Domingos estava pejado de uma boa dezena de polícias. Que podia fazer? Vi uma porta aberta, entrei num prédio e comecei a subir a escada, embora com a angustiante sensação de que estava a ficar cada vez mais encurralado. Ainda me perguntei: "Mas que tenho eu a temer? Não faço parte de nenhum grupo político, não tenho comigo mais do que uma pasta com sebentas". Mas logo me dei conta de que a racionalidade da situação era de difícil perceção por parte de um cívico de bastão de borracha preto com que viesse a cruzar-me. No primeiro andar, ao cimo da escada, abriu-se uma porta. Tive um baque. Era um homem dos seus cinquenta anos (provavelmente era mais novo, mas para mim tinha já alguma idade), com ar de escriturário ou coisa parecida. Ao olhar a ansiedade da minha cara, deve ter percebido tudo. "Venha para aqui. Deixe passar algum tempo. Isto depois acalma", disse, sem um sorriso, com um olhar neutro. Entrei, grato. Era um escritório, creio que de um despachante, mas já não estou seguro. Ainda devo ter balbuciado algumas palavras, mas rapidamente me dei conta de que o ambiente não estava para grandes conversas. Alguns iam, de quando em vez, por um corredor longo, até à janela num compartimento que dava para o Rossio. Achei que o meu estatuto de "asilado" não me dava o direito a partilhar esse "voyeurisme", pelo que me mantive sentado na cadeira que me tinham oferecido (nos dias de hoje, estaria a consultar o iPhone, pela certa). Não sei quanto tempo passou, pareceu-me muito, mas deve ter sido pouco mais de um quarto de hora. O meu hospedeiro, que manifestamente tinha um ascendente na sala, a qual, aliás, dava ares de estar prestes a encerrar, disse-me, a certa altura: "Acho que já pode ir. As coisas acalmaram". Agradeci e vi os outros ocupantes do escritório olharem para mim, com o que me pareceu ser uma completa indiferença. Ou seria outra coisa, não sei. Não houve sequer um sorriso, embora eu quisesse crer que era uma silenciosa cumplicidade. Porventura triste e resignada. A rua, de facto, estava livre. Já só se viam uns PSP em farda normal, de cor cinza. Cheguei ao Martim Moniz onde apanhei o elétrico até ao Chile e, depois, o "dez" para os Olivais. Terei contado a "aventura" em casa? Não sei. Tinha vindo para Lisboa para estudar, não para estas guerras.

Hoje é o "Primeiro de maio". Se calhar, vou beber uma ginjinha ao Rossio.

(Dedico este post, escrito depois da meia noite, ao Afonso Camões. Só ele percebe porquê)

quinta-feira, abril 30, 2015

Sampaio da Nóvoa

Sem surpresas. O lançamento da candidatura de Sampaio da Nóvoa correu bem e não trouxe a menor surpresa. O que é bom e é mau.

O candidato projeta serenidade e seriedade. Com facilidade, sabe-se ao que vem. Pressente-se aquilo a que, se for eleito, será sensível e atento. Fica evidente que, com ele, o país terá em Belém uma referência ética. Sampaio da Nóvoa é, por ora, o candidato de um país ultrajado com o descaso da governação que a (falta de) sorte nos trouxe em rifa. Pretende reconciliar o país com a política, embora para isso percorra a linha muito fina e arriscada do distanciamento dos partidos, que historicamente foi pasto para algumas derivas menos felizes. Mas é um homem que, não sendo ainda íntimo do país, oferece confiança. Falo por mim.

Do que não gostei no lançamento da candidatura? Dos presentes. Ter uma sala cheia de cabelos brancos ou coloridos, de reservistas da política, de "has-been", daqueles a quem as reformas foram cortadas, dos que sofrem as agruras das quebras do Serviço Nacional de Saúde, dos que se escandalizam e penam com as discricionaridades na justiça e no fisco, dos que assistem indignados ao caos na educação, dos que têm familiares desempregados ou emigrados, enfim, dos indignados com as "trapalhadas" - isso é demasiado fácil e não faz (ainda) uma candidatura. Estava ali muito do anti-cavaquismo, da revolta contra as manigâncias dos que se deliciaram para além da "troika", mas isso não chega. Gostava que o lançamento desta candidatura tivesse mobilizado gente mais nova, quadros em faixas etárias ativas, de uma sociedade civil que vá muito para além do (óbvio) serviço público. Enfim, gostava de ter visto Sampaio da Nóvoa mais ao lado do futuro do que de um presente indignado. Como é o meu caso.

Ah! E faltou Eanes, claro. Não é general para essas guerras. Estão lá Soares e Sampaio? Ele não, reservar-se-á para outros momentos. O único ex-presidente que o candidato escolheu como referente moral só emprestará as suas cinco estrelas a ocasiões especiais, onde o palco seja só seu. Mandatário nacional? Patético, mas também sem surpresas.

quarta-feira, abril 29, 2015

Varoufakis


Muitos se alegrarão, por essa Europa liberal, com a humilhação sofrida pelo ministro grego das Finanças, ao perder o papel de principal interlocutor do seu país nas negociações com as instituições europeias, embora não tenha ficado muito claro se deixará igualmente de o ser com o FMI. 

Acho triste ir-se por aí, como observo no gozo saloio de alguns comentadores domésticos. Para mim, Varoufakis continua a ser o ministro de um país em dificuldades e em sofrimento, de uma Grécia pela qual tenho o maior respeito e simpatia. A eleição do Siriza e o seu novo governo representam, muito simplesmente, uma escolha eleitoral de desespero por parte de quem se cansou de eleger rotativamente a Nova Democracia e o Pasok, que conduziram o país ao Estado a que chegou. Esses foram, durante muitos anos, os interlocutores privilegiados das instituições europeias - e viram-se os resultados... O eleitorado grego, farto dessa receita, tentou escolher uma outra filosofia, titulada - e é bom que isto se diga, porque poucos o têm feito - por quem tinha e tem as mãos limpas das negociatas que arruinaram o seu país.

Mas voltemos a Varoufakis. Ele arriscou muito e cometeu alguns erros graves, o principal dos quais terá sido o de não saber medir, com prudência, até onde a sua "coreografia" poderia acabar por prejudicar a própria capacidade negocial do seu país. É verdade que os seus colegas no Eurogrupo não facilitaram as coisas, isolando-o e conduzindo cada vez mais a uma radicalização da sua atitude. Na reunião de Riga parece que se terá passado o "point of no return". Mas um negociador tem de ter "nervos de aço" e não se deixar arrastar pelas provocações alheias, também sabendo medir até onde pode levar as suas.

No terreno diplomático, as pessoas representam um país ou uma instituição, assumindo a cara dos seus interesses. A experiência internacional ensina que é vital conseguir manter um terreno mínimo de entendimento pessoal, mesmo com os nossos maiores adversários e até com aquelas pessoas que somos levados a detestar e mesmo a desprezar. Varoufakis terá descurado essa vertente e, por exemplo, ao faltar ao jantar informal que reuniu os seus colegas, por muito ofendido que pudesse estar (leia-se o seu blogue, onde cita Roosevelt, dizendo que os colegas o "odeiam"), deixou que a dimensão pessoal suplantasse a razão pela qual estava ali: defender os interesses do seu país. Em diplomacia, "engole-se sapos" com muita frequência, e isso não é nada agradável - e sei bem do que falo. Mas, repito, não somos nós quem ali está, é o país que representamos. Não perceber isto e colocar o orgulho à frente do serviço público é um erro muito grave.

Dirão alguns que o "estilo" de Varoufakis fazia parte da sua estratégia negocial. Escrevi por aqui, há pouco tempo, que se acaso a tática negocial titulada pelo ministro grego viesse a ter sucesso eu reveria, com gosto, tudo quando quatro décadas de diplomacia, nomeadamente europeia, me tinham ensinado. Infelizmente, eu não estava enganado, como também me parecia óbvio, e aqui ficou escrito, que se estava a começar a criar um "gap" entre Varoufakis e o seu primeiro-ministro. Por uma razão muito comezinha: pela falta de resultados.

Varoufakis fez o que devia fazer - dirão alguns radicais caseiros, para quem é cómodo ser espetador à distância da tragédia grega. Não é verdade! Não fez o que lhe competia fazer, não obteve resultados e a prova provada é que foi agora substituído numa atividade central daquele que era o seu mandato. Como acontece com todos os diplomatas (e quem negoceia internacionalmente, mesmo sendo político, exerce diplomacia), quem não consegue os objetivos a que se propôs afasta-se de cena e dá lugar a outros, tanto mais que soluções muito diversas só podem ser assumidas por caras novas. 

Mas também posso imaginar que, em certos setores do Syriza, se acaso o compromisso que os novos negociadores vierem a obter for considerado insuficiente ou "recuado", Varoufakis passe a tornar-se um ídolo. Tal como já é um ícone sexual para algumas amigas minhas, sei lá bem porquê! 

terça-feira, abril 28, 2015

Memorabilia diplomatica (XXIX) - "Godfather-in-law"


97,7% dos votos é um resultado interessante. Foi quanto o presidente Nazarbayev obteve nas eleições presidenciais no Casaquistão neste domingo, permitindo-lhe prolongar-se até 2020 na chefia do Estado, que detém desde 1989. De assinalar a humildade que demonstrou, ao dizer que seria "antidemocrático" estar a apresentar um resultado menos esmagador, apenas para agradar às democracias ocidentais. Tem razão: seria um insulto à vontade popular tão inequívoca que o elegeu autorizar uma "retocagem" naquela cifra. E até me interrogo: como seria possível fazê-lo, num país que aplica (creio que é o único, mas não estou seguro) um original sistema de voto eletrónico criado pela Bielorrússia, outro bastião da democracia, quantas vezes também tão injustiçado pela comunidade internacional?

Há já algum tempo, estive uns dias no Casaquistão. Essa deslocação foi acompanhada pelo embaixador casaque Rakhat Aliyev, o qual, curiosamente, era nem mais nem menos do que o genro do presidente (neste tipo de países, o acesso à carreira diplomática tem caminhos sobre os quais é ocioso elaborar). Recordo que, entre a capital tradicional, Almati, e a nova capital, a "Brasília" local, Astana, viajámos no luxuosíssimo avião privado da família presidencial do Casaquistão, onde a (então) mulher do meu colega, filha de Nazarbayev, era uma das pessoas mais ricas - o que também é uma coincidência que pode sempre ocorrer, em particular num país tão ricamente marcado pela cultura mercantil da Rota da Seda que por lá passou. Hoje, não obstante as suas flutuações negativas, é o petróleo que continua a encher os cofres locais, públicos e privados. Aqui entre nós, devo dizer que, nunca como naqueles dias no Casaquistão, se me aplicou melhor o rótulo de "esquerda caviar" com que alguns amigos às vezes me mimoseiam, neste caso acompanhando com o magnífico "Snow Queen", um vodka local que, no meu modesto parecer, é um dos melhores do mundo.

Nunca esquecerei a experiência da subida à imensa torre no centro de Astana e a música do hino do país que soava quando, na sala do topo do edifício, colocávamos a nossa mão numa metálica "mão de Nazarbayev". Imagino que, num outro sentido, o meu colega casaque, genro do presidente, terá, alguns meses mais tarde, pressentido também a longa "mão" de Nazarbayev quando teve de se refugiar e entrar na clandestinidade no estrangeiro. É que as relações com o sogro ter-se-ão deteriorado ao ponto do genro correr perigo de vida - seguramente uma preocupação exagerada, embora não tivesse sido entendida como tal pelos serviços secretos ocidentais. A verdade é que para tal zanga não deve ter ajudado nada o facto do meu colega ter decidido publicar um livro que, embora travestido de novela, denunciava, com abundância de pormenores, as atrabiliariedades políticas do sogro. E este, coitado!, é capaz de ter ficado ofendido com o malandro (mas fantástico) título: "Godfather-in-law"*...

*para quem não for muito familiarizado com o inglês diga-se que "godfather" significa "padrinho", remetendo para a mafia, e que o título do livro consegue um trocadilho com "father-in-law", que significa "sogro". Mas, igualmente, a palavra "law" - "lei" - não deixa de poder também surgir propositada.

Diplomacia democrática


A diplomacia portuguesa, em tempos de democracia, tem sido bastante preservada das flutuações e dos ciclos políticos. Salvo casos pontuais, em que a titularidade das Necessidades foi raptada por baixas “vendettas”, a emergência de novos governos não conduz, em geral, à mudança de embaixadores ou de chefias nas Necessidades. Esta salutar prática, que muito nos prestigia perante o mundo, foi inaugurada por Mário Soares em 1974 e muito contribuiu para transformar a política externa numa verdadeira política de Estado, que tradicionalmente se situa para além das clivagens partidárias.

O cumprimento dos mandatos tornou-se, desta forma, uma regra habitual no nosso aparelho diplomático. Contudo, também não é de estranhar, que, chegado o momento em que haja que substituir as chefias que herdaram, os novos governos optem por colocar, em determinados postos mais estratégicos, figuras do quadro diplomático que entendam que melhor podem levar à prática as suas orientações. E, aqui ou ali, alguma proximidade pessoal, ou mesmo política, acaba frequentemente por se refletir nessas escolhas. Nunca esta orientação foi, aliás, posta em causa no passado.

A razão por que trago esta questão a terreiro prende-se com uma situação particular que se vive no Ministério dos Negócios Estrangeiros.

Anuncia-se, neste fim de mandato, um importante movimento de embaixadores, decidido pelo atual ministro. Não conheço, nem me interessa conhecer, as escolhas feitas, mas pergunto-me se não seria “fair” aguardar pelo governo que sairá das eleições de outubro para proceder a tais mudanças, tanto mais que não existe nenhum quadro temporal que obrigue a que essas alterações se façam necessariamente agora. Recordo que, no passado, isso foi feito, tendo o principal partido da oposição sido consultado quando houve lugar a nomeações próximas de atos eleitorais. Este problema, aliás, deveria preocupar o senhor presidente da República, que nesta matéria terá a última palavra.

Mas há ainda uma outra questão, de sentido similar, que me parece também muito preocupante. Ela prende-se com a hipótese deste governo poder ser tentado a intervir na recondução ou substituição de adidos e conselheiros técnicos que estão hoje colocados em missões multilaterais e em certas embaixadas. Trata-se, neste caso, de quadros que não pertencem à carreira diplomática, destacados de diversos departamentos ministeriais. Tomar agora decisões sobre o futuro desses técnicos significa privar os futuros titulares de ministérios de usufruírem da mesma liberdade de escolha dos seus antecessores.

Tenho o ministro Rui Machete por uma personalidade política respeitadora das regras da diplomacia democrática. Espanta-me que queira agora vir a subscrever mudanças de pessoal que sabe que vão repercutir-se fortemente num futuro que, em princípio, já não lhe caberá gerir.

A hipótese de uma alternância política obriga à observância de regras que, nem pelo facto de não estarem escritas, deixam de ser essenciais à convivência democrática. Preservar o equilíbrio e o respeito pelo espaço de afirmação decisória dos opositores faz parte do espírito essencial das instituições. E, já agora, do 25 de abril.

(Artigo que hoje publico no "Diário Económico")

segunda-feira, abril 27, 2015

Cansaço?



- Andas cansado do blogue?

- Por que é que perguntas? Nota-se muito?

- Claro que se nota! Vejo-te mais irritado, colocas coisas antigas, parece que estás cada vez mais sem paciência.

- Talvez tenhas razão. Tenho imenso que fazer e o blogue, em alguns dias, torna-se um pouco pesado.

- Por que não interrompes uns tempos? Ou não diminuis o ritmo? Tem mesmo de ser diário?

- Não tem de ser, mas habituei-me a isso, há mais de seis anos. É quase um vício!

- Pois é, mas há vícios maus, como sabes.

- Vou pensar nisso.

- Pensa mesmo, mas livra-te de suspender o blogue, ouviste?!

(Conversa com um amigo, ontem)

domingo, abril 26, 2015

"Evasões"


Nas últimas sextas-feiras de cada mês, escrevo na magnífica revista "Evasões", que é agora distribuída gratuitamente com o "Diário de Notícias" e o "Jornal de Notícias", uma página com apontamentos apreciativos sobre um restaurante. Nela assino como "gastrófilo", que é exatamente aquilo que sou e pretendo continuar a ser - alguém que aprecia uma boa refeição, sem necessariamente se reivindicar da qualificação de especialista na arte gastronómica, que deixo para quem verdadeiramente sabe.

É meu objetivo procurar destacar restaurantes que, não sendo "topo de gama", são excelentes "utilitários" e oferecem uma boa relação qualidade/preço, pelo que o trabalho dos seus proprietários e empregados merece ser sublinhado e apoiado. 

As crónicas podem ser acompanhadas no meu (errático) blogue "Ponto Come".

sábado, abril 25, 2015

Dia da Liberdade


Hoje, 25 de abril, dia da Liberdade, libertei-me pela primeira vez da "obrigação" de escrever diariamente neste blogue. Alguma vez havia de ser...*

* A menos que esta nota sirva de post...

sexta-feira, abril 24, 2015

O empregado

"Temos uma situação de mais emprego, melhor emprego e menos desemprego" mente um senhor que o Estado emprega como Secretário de Estado para o dito.

Abril no feminino

41 anos depois da Revolução, é muito triste verificar que só 31 mulheres acederem a cargos de ministro em Portugal. Os homens foram 498.

O machismo é uma nódoa neste abril.

Questões incómodas


É dos livros que o comentador dá a sua opinião, na esperança de convencer o leitor. Não é o caso deste texto. Tenho apenas duas questões. Aliás, incómodas.

Nos últimos dias, todos fomos abalados pela tragédia humanitária no Mediterrâneo. Assistimos aos esforços dos dirigentes europeus para montarem uma operação que, simultaneamente, abra as portas da Europa a um número limitado de migrantes que lhe chegam do norte de África, somada a medidas restritivas ao tráfico de pessoas que, praticamente todas as noites e desde há anos, tentam dar às costas do eldorado continental em que vivemos, para atravessar a fronteira da miséria.

De certo modo, é uma decisão “envergonhada”: procura evitar-se a repetição das tragédias mas, no fundo, o que se tenta é pôr cobro à entrada desses migrantes. Como “compensação”, cria-se uma espécie de quota, que sossega as consciências. É esta a solução possível? Haveria outra? Deixar entrar toda a gente? Não sei.

Se olharmos bem para a origem geográfica destas migrações, facilmente concluiremos que é a permissividade da costa da Líbia que hoje as favorece. Naquele país não existe algo a que possamos chamar um Estado, pelo que os cidadãos da África subsaariana que o atravessam têm bem melhores condições do que as que existiam no tempo de Kadhafi para se entregarem às mãos dos traficantes, para as suas sinistras jornadas marítimas. Recordo que fomos “nós”, a Europa, quem liquidou Khadafi.

Daqui decorre a segunda questão, a que também não sei responder.

A rejeição das barbáries de Saddam Hussein sobre o seu povo estiveram por detrás da justificação do seu derrube. Desaparecido o ditador, o Iraque e a região caíram num caos e, centenas de milhares de mortos depois, ali se abriram as portas para o sinistro Estado Islâmico.

No Egito, todos olhámos com esperança para a “primavera árabe” que emergiu da praça Tahrir, que derrubou Mubarak e possibilitou eleições. Depois, foi o que se viu: a experiência democrática levou os radicais islâmicos ao poder, os quais, de imediato, tentaram hegemonizá-lo. Regressaram os militares e o mundo ocidental parece hoje aceitar, embora de sobrolho democrático cerrado, o novo regime ditatorial.

Quem é que quer responder a esta questão? É preferível conviver com um ditador, por mais sinistro que seja, que preserve uma estabilidade nacional e regional pela força ou, por um proselitismo democrático, devemos arriscar abrir as portas ao caos?

Temo que, um destes dias, venhamos a ser tentados a repetir a frase de Franklin D. Roosevelt sobre o ditador nicaraguense Somoza: “Ele pode ser um filho da puta. Mas é o nosso filho da puta”.

(Artigo que hoje publico no "Jornal de Notícias")

quinta-feira, abril 23, 2015

Confiança

Ontem, ouvi na televisão o presidente do Montepio Geral afirmar, com plena e determinada convicção, que os respetivos depositantes podem, em absoluto, estar descansados quanto à possibilidade de terem os seus depósitos e aplicações garantidos.

Há uns anos, uma afirmação destas, feita com toda esta solenidade, dar-me-ia uma imensa garantia. Eu ficaria sossegado quanto aos riscos que estava a correr e, em especial, determinaria as minhas decisões fortemente ancorado nestas "rassurantes" declarações.

Porém, ao ouvi-las ontem, a minha primeira reação foi precisamente oposta: "se ele se sente na obrigação de vir a público dizer isto, é porque alguma coisa vai mal". 

Há uns meses, todos assistimos a declarações de importantes titulares de cargos políticos a dar garantias solenes de que o BES era uma entidade acima de toda a suspeita de insolvência. Depois, foi o que se viu.

Mais tarde, assistimos a afirmações perentórias a assegurar que os portugueses não gastariam "um único euro" com a solução dual mau/bom banco. Hoje já todos perceberam que, salvo um improvável "milagre das rosas", o contribuinte português vai ter de esportular algum para a fatura final daquela imaginativa "engenharia financeira".

Cada vez mais, os portugueses estão a habituar-se a olhar a realidade político-financeira como olham as declarações dos dirigentes do futebol sobre a estabilidade dos treinadores: está tudo bem, até ao dias em que esteja tudo mal.

Muitos olharão para isto com um sorriso irónico. Como se de uma inevitabilidade se tratasse. Eu acho que isto é uma imensa tragédia.

A Rússia em Bruxelas

Para o influente comentador do "Financial Times" Wolfgang Munchau, uma eventual saída da Grécia do euro, se viesse a ser acompanhada de uma ajuda financeira da Rússia ao país, traduzir-se-ia numa verdadeira "compra" por Moscovo de um lugar no Conselho Europeu. Sendo um cenário hipotético e longínquo, não deixa de suscitar a importante questão sobre o que poderá vir a suceder se um membro da União vier a criar dependências ou razões estratégicas para se colocar numa posição contra ou independente do "mainstream" das orientações comunitárias. A União Europeia ainda nos pode trazer muitas surpresas.

quarta-feira, abril 22, 2015

Pires de Miranda e a diplomacia económica


Era um cavalheiro urbano e elegante, com mundo, inteligente e sabedor das coisas económicas, com um sorriso social algo distante, mas de trato pessoal simpático. Pelo menos, foi essa a imagem que dele guardei do escasso tempo em que foi ministro dos Negócios estrangeiros, quando Cavaco Silva chefiava o governo, bem como dos poucos contactos anteriores e posteriores que com ele tive. Já antes havia sido ministro do Comércio e Indústria e presidente da Comissão de Integração europeia. Profundo conhecedor do mundo dos petróleos, havia também sido nomeado "embaixador político", para especificamente tratar dessa questão. Nasceu em 1928 e morreu ontem.
 
Na sua breve passagem pelas Necessidades (1985-87), deu sempre ares de estar sempre algo desconfortável no seu papel. Na gíria da casa, atendendo à sua formação, era conhecido como o "petroleiro", sendo então chamado "cacilheiro" ao seu secretário de Estado da Cooperação, o comandante (da Marinha) Eduardo Azevedo Soares.
 
Embora nunca tenha tido a certeza de quem foi o verdadeiro "pai" da ideia, foi com Pires de Miranda na chefia da diplomacia que se processou uma das mudanças estruturais mais polémicas que o MNE sofreu. Tratou-se da eliminação da Direção-geral dos Negócios económicos, que foi fundida com a Direção-geral dos Negócios políticos, para dar origem à Direção-geral dos Negócios político-económicos, de que viria a ser titular José Cutileiro, também "embaixador político". Esta reforma acabou por fazer desaparecer parte significativa da dimensão económica do MNE, que acabou por ser claramente ultrapassada pela dimensão política, numa casa onde, como costumo dizer (para desagrado de muitos), o tropismo natural é para "mais Kosovo e menos batatas". Só não esperava isto quem desconhecesse o MNE. Concedo que a ideia parecia teoricamente boa: dar maior coerência ao tratamento integrado dos espaços regionais. Mas falhou redondamente e a máquina diplomática portuguesa sofreu imenso com isso. 
 
Anos mais tarde, procurar-se-ia corrigir a medida com a criação do Gabinete de Assuntos Económicos (GAE) e, mais tarde, da Direção-geral dos Assuntos Técnico Económicos (DGATE). Com o governo que agora cessa funções, a machadada na dimensão económica do MNE seria definitiva: a DGATE foi extinta, a AICEP "pareceu" integrar o MNE por algum tempo, isto é, até ao momento que Paulo Portas, irrevogavelmente, a levou no seu bolso político para o palácio das Laranjeiras, como veículo para o seu saltitar entre aeroportos, na versão moderna do "Oliveira da Figueira", a promover os nossos produtos. Conjunturalmente pode ter sido um remendo útil, institucionalmente é mais um desastre.
 
Volto ao engenheiro Pedro Pires de Miranda (na foto, à direita, com Jacinto Nunes e Mota Pinto), para aqui deixar registada uma sentida nota de pesar pela sua desaparição.   

Os comentadores económicos

Com o debate que aí vai sobre o documento económico apresentado pelo PS, dei-me conta de que há dois grupos bem distintos de comentadores: aqueles que são "próximos dos socialistas" e os "independentes". 

Não faltará ninguém?

Memorabilia diplomatica (XXVIII) - Lei seca


Lembro-me como se fosse hoje, e já passaram cerca de quatro décadas. Levámos aquela delegação líbia a jantar ao "Faz Figura", que estava então muito na moda. À mesa, notámos que nenhum deles tocou em álcool, optando por sumos ou água mineral. Um grande contacto posterior com muçulmanos veio a ensinar-me que a leitura dos ensinamentos do Corão, no tocante às bebidas alcoólicas, é muito variável. Na Líbia, Mouammar Khadafi tinha proibido, em absoluto, a importação e o consumo de álcool. Por essa razão, não estranhei a atitude coletiva do grupo.

No dia seguinte, um dos motoristas que nos acompanhava na ronda de visitas empresariais e institucionais à delegação líbia, deixou cair: "Sabe que a noite de ontem foi longa, senhor doutor...".

Não percebi. Tínhamos saído do restaurante bastante cedo! Entre risos, ele explicou: "Os líbios sabem "da poda": pediram-nos logo para ir ao Tamila. Alguns saíram de lá "aos bordos"! E a festa continuou no hotel!" Não cuidei de saber mais pormenores.

Onde estarão hoje esses líbios?

Democracia(s)


Contado por um amigo alemão, num jantar na noite de ontem.

Falava ele com um militar e fez-lhe notar que era incoerente que um exército moderno mantivesse uma estrutura interna quase "ditatorial", com uma pressão hierárquica esmagadora e uma pressão psicológica sobre os soldados às portas da violência e da humilhação.

O militar foi muito claro: "Nós existimos para proteger a democracia, não para a praticar".

Ficou tudo dito!

terça-feira, abril 21, 2015

Os penduras

Este blogue está aberto à crítica, nela se incluindo, naturalmente, a expressão de posições contrárias àquelas que são defendidas nos seus posts. Espero, assim, poder continuar a acolher nos comentários as opiniões de quantos decidam exprimi-las.

O que este blogue não está aberto é a servir, no espaço para comentários, para mera colagem de extratos de sites, blogues ou outros veículos de opinião, aqui colocados por quem não diz o que pensa e se limita a "pendurar" as ideias dos outros.

Preconceitos

Devo confessar que sou um pouco preconceituoso: estava intimamente à espera que a maioria cessante viesse dizer mal das propostas económicas apresentadas pelo PS. É um defeito meu não acreditar num mínimo de abertura de espírito daquela gente. Reconheço isso! 

Em que posição é que eu ficaria se as propostas tivesse sido acolhidas como uma contribuição positiva e construtiva para o debate económico nacional? Qual seria a minha reação se os porta-vozes do poder de turno tivessem vindo a terreiro dizer que saudavam algumas das ideias agora propostas e, em especial, se se mostrassem dispostos a discuti-las e a encarar, à luz de uma serena abertura de espírito, uma revisão das suas próprias ideias? Nem quero pensar no que seria a minha cara de contumaz preconceituoso!

Felizmente, a maioria "arrasou", em poucos minutos, as propostas do PS! Se eu ainda fosse mais preconceituoso do que já sou, diria que mal tiveram tempo para ler o que foi divulgado. E, se o cúmulo do preconceito fosse mesmo o meu maior defeito, era capaz de afirmar que, fosse qual fosse o conteúdo das propostas, a reação desta ex-maioria que está de saída seria basicamente a mesma.

É o que dá ser preconceituoso! Nunca mais aprendo!

Olha!


Ontem, ao (re)ler o "Só", de António Nobre (para o que me dá!), deparei com este extrato do poema "A vida":

(...)

Olha essas rugas que têm certos diplomatas!
Olha esse olhar que têm os homens da política!
Olha um artista a ler, soluçando, uma crítica...
Olha esse que não tem talento e o julga ter
E aquele outro que o tem... mas não sabe escrever!

(...)

Paris, 1891

O outro 25

Se a manifestação dos 50 anos do 25 de Abril foi o que foi, nem quero pensar o que vai ser a enchente na Avenida da Liberdade no 25 de novem...