sexta-feira, abril 24, 2020

Posso ir à praia?


Leio que, devido à crise sanitária, é bem possível que o acesso às praias, este Verão, passe a ficar condicionado, para evitar aglomerações. Já estou a imaginar o que vão ser as filas matinais para inscrições!

Como eu só costumo ir para a praia cerca da quatro da tarde, estou curioso sobre como vai funcionar o esquema para “late risers”. Mas não é nada de que eu não tenha já alguma experiência.

Em 1980, vivendo na Noruega, deu-me para ir passar uma semana de férias em Ialta, no mar Negro. Vivia-se o tempo soviético, em todo o seu esplendor burocrático.

Na receção principal do hotel - escrevo “principal” porque, na URSS desse tempo, os hotéis tinham, além dessa, uma receção em cada andar, onde ficavam guardadas as chaves dos quartos - foi-nos entregue, à chegada, um boletim individual, com o nosso nome, com espaço para dois carimbos, por cada dia de estada: era a “autorização” para ir à praia. Na véspera, informávamos se queríamos ir de manhã ou de tarde e era colocado, no espaço próprio, um carimbo permitindo esse acesso. Achámos bizarríssima a ideia, mas, como logo aprendemos, não era mais do que a que tivéramos ao ter escolhido fazer férias soviéticas...

O nosso hotel era imenso, dando sobre a praia. Acedia-se a esta por um único elevador. À sua entrada, havia uma senhora a quem era necessário mostrar o tal boletim e que cuidadosamente, com cara patibular, verificava se, para o período do dia e data em que se estava, estávamos autorizados a descer até à praia. E que contava cuidadosamente o número de passageiros. Chegado o elevador ao nível da praia, à saida, lá estava outra senhora, a quem tínhamos de mostrar de novo o cartão e que, percebi, repetia a contagem. Já não recordo o procedimento de regresso.

Na primeira noite, ao jantar, inquiri da guia norueguesa que nos acompanhava o que é que aquilo significava: é que, a menos que tivesse “nascido” alguém no curso da descida, as pessoas que saíam do elevador eram exatamente as mesmas que nele tinham entrado, umas dezenas de metros mais acima.

A guia, que passou todas essas férias numa preocupação com os meus constantes protestos e observações, aculturada que já estava àquelas práticas, explicou-me: “É muito simples: a primeira funcionária é a responsável pelo número de passageiros que segue no elevador, e segunda faz o controlo sobre o trabalho da primeira, não vá ter ido gente a mais”. Creio, mas não estou certo, que não se riu ao dizer isto...

Agora que passam 150 anos sobre o nascimento de Lenine, constato que não notei se, no seu túmulo, na Praça Vermelha, em Moscovo, para ver o seu corpo embalsamado, é feita uma contagem dos visitantes à entrada e outra à saída. É que, na realidade, pode dar-se o caso de ficar lá por dentro alguém...

11 comentários:

Anónimo disse...

Uma história deliciosa e muito interessante senhor embaixador. Tanto mais que pode auxiliar a difícil equação de como “controlar” as idas dos portugueses à praia no verão que se avizinha. Será que somos, afinal tão cívicos como o primeiro ministro insiste em dizer...?, eu entendo a ideia mas julgo ser um erro que, mais uma vez ilude a realidade. Basta!

Luís Lavoura disse...

Como eu só costumo ir para a praia cerca da quatro da tarde, estou curioso sobre como vai funcionar o esquema

Eu também só chego à praia por volta das 4 da tarde, que é, aliás, a hora aconselhada para lá ir, para não se apanhar muitos ultravioletas.

Quanto a esta decisão de controlar as entradas (e saídas) das praias, só se trata de mais uma demonstração de que isto não é uma pandemia, é uma paranoia.

Anónimo disse...

Ora FSC, os controlos eram uma maneira que os comunas arranjaram de ter mais empregos para dar. Como a economia deles não era produtiva e competitiva, tinham de arranjar trabalhinhos desses para ocupar as pessoas.

Quanto ao acesso à praia, era uma forma de ser mais fácil para os comunas ir atrás de alguém que se fizesse ao mar para fugir ao "paraíso".

Agora, giro, giro, é o FSC lembrar-se destas historietas mas não ter nenhuma palavra para desancar no PCP pela apologia que ainda faz desses tempos. Consta que andam eufóricos com o aniversário do camarada Lenine. Ai... se alguém no CDS resolvesse ter uma palavra benigna sobre o Salazar... O que não seria!

Anónimo disse...

Toda a gente que o governo, qualquer governo português,organiza mal, seja o que for. Assim, em em vez de estarem a pôr em forma de lei todos os passinhos, publiquem uma lei com ou dois artigos para dar uma ideia do que fazer às autoridades marítimas e à PSP E GNR e vão ver eles vão executar, na prática, lindamente, de forma personalizada e eficiente. Às vezes é preciso dar às autoridades alguma margem de actuação, mesmo correndo o risco de algum abuso.

Anónimo disse...

"Ai... se alguém no CDS resolvesse ter uma palavra benigna sobre o Salazar... O que não seria!"
Então o chicão e os seus "pais" e "avós" não as proferem diariamente nas suas TVs, inclusivamente na RTP ?

Anónimo disse...

O meu critério para ir à praia este ano terá em conta outras questões "mais relevantes". Por exemplo, "a que horas do dia se podem ver mais umas tantas brasas em biquíni?" Uma vez fique inteirado deste importantíssimo aspecto, então irei inscrever-me para esse período do dia. O resto é treta! Quero lá saber se faz sol,sombra, se o mar está bravo, ou calmo, se está frio, ou aceitável, se está vento, ou demasiado calor. Quero é saber se as gajas estão por lá...e de biquíni, ou monoquini, ou seja como elas quiserem estar!
Enfim, são critérios. Cada um tem o seu. Este será o meu.
Continuação de bom confinamento!

Portugalredecouvertes disse...

Se já controlavam tanto, imagine Sr. Embaixador se eles já tivessem a Covid-19 por lá

Anónimo disse...


De vez em quando, o Sr. Embaixador tem de deixar escapulir o seu antisovietismo, o seu anticomunismo. E havia necessidade, Sr. Embaixador ?

João Pedrfo

Anónimo disse...

Afinal sabiam o que aí vinha

Anónimo disse...

Ó "24 de abril de 2020 às 15:23", e lembra-se do que aconteceu aos ditos? Até um teve de se demitir!

Irra, homem, em vez de palas, use óculos de sol.

Joaquim de Freitas disse...

O controle dos visitantes estrangeiros em França, ainda durante os anos em que o Sr. Embaixador andou pela URSS, 1980, existia em França, na mesma época. As fichas de polícia dos hotéis, chamadas fichas dos viajantes, nas quais tinham de ser registadas todas as menções de estatuto civil eram estabelecidas assim que o viajante chegou ao estabelecimento.

Paralelamente, quando uma empresa recebia um estrangeiro dos países de leste, e isso aconteceu-me várias vezes, recebia a visita no meu escritório de dois funcionários da DST, que entretanto mudou de nome, para me entrevistar sobre o motivo da visita, e todas informações eventuais sobre a firma e os indivíduos, que eu tinha visitado na URSS para tratar do problema técnico que nos submetiam , e que vinham por sua vez a França.

A data de chegada e partida era controlada devidamente e eu mesmo devia informar a DST do fim da missão dos visitantes. O interrogatório que se seguia era muito detalhado…

A ficha de hotel dos viajantes da mesma origem, simples turistas, foi abolida em Maio de 1975…

Recordo também, que foi um tempo em que a menção “partido político” constava da ficha de desembarque nos EUA…Eu preenchi muitas.

Cada um tem, com todo o direito, as suas fobias. Se fosse um cidadão da URSS, se o meu país tivesse sido invadido, destruído, reduzido a zero, sempre pelos mesmos, em três ou quatro gerações consecutivas, deixando no seu rastro, na ultima vez, 25 milhões de mortos, haveria de ver sempre os estrangeiros com uma certa distância.

Tenho um exemplo cá em casa, com a minha Esposa, vinda das terras disputadas da Lorraine , que ouviu falar dos vizinhos durante três gerações Sedan, 14/18 e 39/45. O Pai, meu sogro, foi piloto de caça, na gloriosa esquadrilha das Cegonhas, com Guynemer e outros. Até hoje, a minha Esposa nunca aceitou visitas de amigos alemães.

Aqueles que foram à Rússia, Ucrânia e Bielorrússia, sabem o quanto a Grande Guerra Patriótica está viva na consciência das pessoas. Está viva não como um eco distante da história, mas como parte do presente - com todos os horrores da guerra, mas também o orgulho de ter sido capaz de resistir nesta luta até à morte.

Quanto ao comunismo , é uma utopia que morreu à dezenas de anos, mas que ainda serve hoje de argumento aos reaccionàrios , como serviu ontem para criar Tarrafais e manter vivo o obscurantismo religioso, e o fascismo, que os Herois que sao celebrados hoje em Portugal derrubaram. Por isso o meu grito: VIVA O 25 DE ABRIL.

O futuro