segunda-feira, agosto 31, 2015

A idade na política


A maioria agora cessante prestou um péssimo serviço à imagem política das gerações mais novas. Naquilo que aparentemente procurou ser uma espécie de refrescamento etário, o governo que termina funções acabou enxameado de figuras sem um currículo político significativo, alguns saídos da blogosfera e da intriga nas redes sociais, outros de cenáculos de obsessão neoliberal e do deslumbre das academias estrangeiras, outros ainda do serralho dos gabinetes, como é sempre típico dos tempos de “seca” política. Algumas exceções pontuais de qualidade só ajudaram a melhor definir aquilo que foi uma triste regra nestes quatro anos.

Esta pretendida geração da “rutura”, fortemente marcada por uma ausência de experiência na gestão do Estado, havia mesmo sido aculturada no ódio à coisa pública: menos Estado, menor Estado e, como se viu... o que sobrar “para eles”! O “memorando de entendimento” foi a bíblia mais à mão, a qual, aliás, tentaram completar com a rápida passagem “a patacos” de tudo quanto tivessem à mão para privatizar, não fosse o Estado ter a “ousadia” de renascer após a sua passagem de Átila. O patético afã com que agora estão a delapidar, à última hora, o que ainda resta no domínio público envergonha e revolta até setores que lhes são próximos.

A máquina política tem necessidade permanente de ser rejuvenescida. Os “cabelos brancos” não são, em si mesmos, uma garantia de competência e de experiência com utilidade e, em especial, de capacidade de saber ler, com olhos de modernidade, as mudanças de orientação que os novos tempos exigem. Ter mais idade não é, necessariamente, uma garantia de maturidade com qualidade. Mas, naturalmente, como agora ficou patente, também o  voluntarismo cego no “jeunisme” não assegura, por si só, um desempenho eficaz.

Uma coisa é, contudo, clara. Por toda essa Europa, os membros dos governos são cada vez mais jovens e começa a ser evidente que a regra é fazer assentar na geração com 40/50 anos o essencial da responsabilidade política. Fora disso, e não obstante a maior longevidade dos quadros, é hoje bastante mais natural conferir funções governativas a jovens na casa dos 30 anos do que a figuras entradas na faixa dos 60. Algumas pessoas não gostarão de ler isto, mas esta é a realidade dos factos.

Por isso, um futuro governo PS deverá apostar na responsabilização de quadros políticos jovens, militantes ou independentes, que hajam dado provas ou deem garantias de um forte sentido de Estado, de devoção desinteressada pela vida cívica, de maturidade na ação política e na gestão da coisa pública, a somar a uma necessária formação académica e profissional, assente em currículos que passem para além das funções de “aparelho”. Urge preparar a geração de responsáveis políticos para os anos exigentes que aí vêm. Atribuir-lhes desde já responsabilidades, dar oportunidade a que usem os anos mais produtivos das suas vidas adultas ao serviço da comunidade, é uma aposta essencial para assegurar que o país poderá contar com quem assuma, com eficácia, a sua futura liderança.

(artigo hoje publicado no Acção Socialista digital)

8 comentários:

Jaime Santos disse...

Eu não deixo de concordar com o Sr. Embaixador, a política está a tornar-se a província das gerações mais jovens, e é desde já bom que estas comecem nesse tirocínio desde cedo. Mas devo repetir aquilo que já disse aqui: o País (e lá fora o Mundo) perde sempre com cada render da guarda. Os cabelos brancos não são sempre sinal de competência, mas são normalmente sinal de experiência e de uma certa sabedoria e capacidade de aceitar as derrotas e as desilusões e do saber esperar, mesmo para além da nossa breve existência, porque as Instituições, se sólidas, sobrevivem às Pessoas. Um dos melhores discursos políticos que já ouvi foi o discurso do ancião Helmut Schmidt ao congresso do SPD, em 2012, em que um velho numa cadeira de rodas foi capaz de falar durante mais de uma hora, dar uma lição de Vida, Política e Humanismo e depois de receber uma saraivada de palmas, terminar ainda esse discurso com o seu característico ar circunspecto e o seu proverbial cigarro (ver aqui para quem entender Alemão: https://www.youtube.com/watch?v=CHhu3zsGdWw).

Anónimo disse...

Caro Francisco,

" Il faut de tout pour faire un monde", dizem na minha outra terra, embora não exactamente com este significado. O ideal seria que se conseguisse levar para o governo os melhores das várias gerações. Mas quem quererá governar por três ou quatro mil euros por mês e submeter a vida privada ao escrutínio permanente dos media? Só quem for pobre e precisar de um trampolim para outra coisa, ou quem for rico e não estiver motivado senão para o que lhe convem. Em ambos os casos a competência não é critério prioritário. A conviccão também não. Seja qual for a idade. Passa-se isto com este poder. Espero que mude com o próximo. "Touchons du bois"!

JPGarcia

Anónimo disse...

"Instrução aos mais capazes, lugar aos mais competentes, trabalho a todos, eis o essencial."

Para quê inventar! Não venham dizer que a competência tem sido um critério usado e nesta conjuntura há ainda que antecipar a honestidade!

ECD disse...

Não façamos como António Horta Osório, PCA de Lloyds Bank, que na "universidade de verão" do PSD disse - ele que recebeu em 2014 mais 15 milhões de euros de salário e prémios do que em 2013- que os portugueses ... finalmente "estão "a viver dentro das suas posses". 3 ou 4 mil euros mensais é dinheiro, sobretudo se tivermos em conta que 552 mil portugueses - perto de 15% dos trabalhadores por conta de outrem - ganham menos de 419 €/mês.

Maria do Carmo Silva disse...

Três ou quatro mil euros mensais?!... Levanto já meu dedinho indicador.

J. Ricardo

Anónimo disse...

Estou a ver que tenho mesmo razão, a julgar pelos comentários precedentes.

JPGarcia

Anónimo disse...

Forneçam um IPAD a cada socialista !

Unknown disse...

Não entendo, como pessoas bem formadas, conseguem defender o manter o estado que temos, sem sentir que é impossível haver dinheiro , sem contrair mais dívida. E o que me entristece é que não encontro a explicação para o milagre.

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...