domingo, outubro 21, 2012

Quatro notas

1. Por definição, a situação interna que se vive em países próximos e aliados deve merecer, da nossa parte, um tratamento muito prudente. E, por maioria de razão, quando se trata do nosso único vizinho terrestre, essa delicadeza aumenta. Mas maior é também, por esse mesmo motivo, a importância de que a Espanha se reveste para nós. Por isso, e ainda a montante do resultado das eleições que hoje têm lugar no País Basco e na Galiza, apenas gostava de deixar aqui expresso que a questão da "pulsão" independentista na Catalunha é um tema que, sendo espanhol, não nos pode ser indiferente. E quero afirmar aqui, como cidadão português e como amigo da Espanha, o meu desejo pessoal de que qualquer futuro do Estado espanhol passe pela preservação da unidade do país. É que julgo ser esse o interesse da Espanha e, muito em especial, tenho a certeza que esse é o interesse de Portugal.

2. Na Grécia, uma deputada do partido neo-nazi (curiosamente anti-alemão), com representação parlamentar, tratou os imigrantes no seu país como "sub-homens". Essa formação partidária defende, entre outras barbaridades, a expulsão dos hospitais gregos dos doentes imigrados estrangeiros, bem como os seus filhos das escolas. Nesta temática da xenofobia e do racismo, Portugal pode apresentar-se ao mundo como detentor de uma representação parlamentar onde, sem a menor exceção, os princípios da tolerância e do respeito pela diferença sempre foram observados com todo rigor. É um orgulho para a nossa diplomacia poder representar um país em que tais fenómenos não têm a menor expressão política organizada, sabendo-se, além do mais, que há um implícito e saudável consenso nacional no sentido de combater qualquer afloramento desse tipo de derivas.

3. O mortífero atentado que ontem teve lugar no Líbano veio demonstrar que o regime sírio, depois de ter conseguido "empatar" o jogo político-militar interno até às eleições americanas, demonstra que tem ainda força para poder ativar a influência de que sempre dispôs no xadrez político libanês, tentando assim aumentar a sua moeda de troca para o processo político que se vai seguir.  Diretamente ou através do Hezbollah, Damasco tenta agora sacudir do seu território a pressão militar de uma oposição interna cuja segmentação não facilita o apoio do mundo ocidental. As bombas de ontem são a prova de que a Síria não vai permitir que as fronteiras libanesas possam servir de apoio aos insurgentes. E é bom que o mundo comece a preparar-se para enfrentar a possibilidade de que uma nova guerra civil no Líbano esteja aí de novo, ao voltar da esquina.

4. Por razões óbvias, sobre temáticas europeias, tenho vindo a ser muito parco nas palavras que por aqui escrevo. Apenas gostava de notar que o último Conselho europeu, que sempre foi considerado como de natureza transitória, teve a virtualidade de acabar por não infirmar as orientações do anterior e, embora com visível entusiasmo diferenciado na vontade expressa pelos "major players" (que se reflete de forma interessante nas respetivas Conclusões), manteve uma linguagem que não fragiliza, no essencial, o calendário previsto para a "união bancária". Há que reconhecer que alguma maior serenidade que a vida europeia começa a mostrar - talvez pelo termo das ridículas cimeiras "históricas" a que uma certa coreografia nos vinha habituando - fica muito a dever à sabedoria do Banco Central Europeu, cuja firmeza e determinação terão sido responsáveis por uma relativa confiança que foi induzida nos mercados, como a evolução dos "spreads" obrigacionistas no mercado secundário bem demonstra. Só pode desejar-se que, ao invés do que vulgarmente tem sucedido, do lado de alguns governos europeus não haja a tentação, num tropismo de expressão mediática para consumo político interno, de "sair-se" com declarações incendiárias, que prejudiquem os delicados consensos já obtidos.

9 comentários:

Anónimo disse...

Só neste país (hoje, não resisto à expressão), é que se acha que quanto mais forte for o nosso único vizinho, rival e, até, predador, isso é bom para nós.

Quanto mais poder tiver o único país capaz de nos invadir, melhor!

Quanto mais forte for o país que controla os nossos quatro maiores rios, melhor!

Quanto mais projeção tiver o país cuja cultura "abafa" a nossa, melhor!

Quanto maior for o único país que se dá ao desplante de se apresentar como "a Ibéria", melhor!

Quanto mais músculo tiver o país que nos obriga a por em bicos de pés e andar metidos em tudo quanto é aventura militar "de paz" (claro), para que o mundo nos veja, melhor!

Quanto mais pujança económica tiver o único país que nos contesta águas e território, melhor!

Quanto mais Castelhano se falar na Galiza, melhor!

O mal é meu (vá lá, e de mais uns quantos), já se vê, que na nossa condição popularucha não percebemos porque razão devemos zelar pelo interesse dos outros contra o nosso. Se ao menos nos explicassem bem explicadinho... Como nunca ninguém o faz (nem aquela Maria que nos tempos do Independente defendeu que "quanto mais projeção tiver a cultura espanhola, melhor isso é para Portugal"), só nos resta continuar a ler História e ficar a pensar que tudo se trata de mais uma das idiossincrasias à tuga...

patricio branco disse...

Interessante isto das tendencias separatistas em autonomias.
o governo do ru accordou tranquilamente com o governo escocês a realização do referendo de 2014 sobre uma escocia independente. Acho que devia ser calmamente dado o direito à catalunha de organizar um referendo semelhante.
afinal portugal tambem já se separou do reino de castela há 9 seculos e os 2 cá vão andando pedindo resgates.
a checoslovaquia tambem se dividiu pacificamente. até de gaulle, homem controlado, gritou ousadamente lá mesmo viva o quebeque livre. isto vale caso a caso, uma coisa é a belgica, outra o alentejo e o algarve.o pior é quando um país já não é livre na sua totalidade.

Estranhamente, já há vozes que dizem que a grecia começou a curva ascendente vendo-se titulos de noticias como "os dirigentes europeus já não consideram a grecia como uma peça envenenada" ou que "a situação evolui favoravelmente" ou que os analistas do credit suisse declaram "o orçamento grego voltou a encarrilar em grande parte". isto mostra que o caso grego é diferente do português, como o irlandês e o islandês. e que boas noticias para a grécia podem não o ser para portugal.

José Sousa e Silva disse...

Bom dia, Senhor Embaixador !

Não sei se não estaremos a caminho de uma Europa das Nações em vez da Europa dos Estados (ou países).

Portugal está em vantagem porque é, e sempre foi, uma única Nação.

Deixo ao critério dos Comentadores.

Anónimo disse...

como dizem os catalaes ' lo qu'ens cal es una independencia com la de portugal'

vao la pedi-la ao mourinho!!!

Portugalredecouvertes disse...

Como o Catinga, também fiquei com pontos de interrogação sobre essa de um vizinho forte!

depois pensei que o Sr.Embaixador não disse de onde poderá vir o perigo: se para além ou seja de zonas a norte ou a leste do país vizinho, então será melhor o vizinho ser forte!

bom pensando no povo espanhol, é muito bom vê-los a visitar os nossos monumentos e a saborear os pratos portugueses nos restaurantes

também devo dizer que são acolhedores quando vamos visitar os deles

Anónimo disse...


"Nesta temática da xenofobia e do racismo, Portugal pode apresentar-se ao mundo como detentor de uma representação parlamentar onde, sem a menor exceção, os princípios da tolerância e do respeito pela diferença sempre foram observados com todo rigor."
Que alegria me dá a expressão deste sentimento.
José Barros      

Anónimo disse...

A preservação da unidade da Espanha pode ser do interesse dos portugueses ligados à política, mas não é certamente da maioria dos portugueses,
que continuam agradecidos à ajuda dada pelos catalães em 1640.

Anónimo disse...

Ó Patrício Branco: Portugal separou-se de Castela há nove séculos?! De Castela???!!! Que não haja boas Histórias de Portugal em Francês (para ler nos aviões), ainda vá lá, agora... em Português haverá concerteza...

patricio branco disse...

vejo um ru ou uma alemanha, holanda ou frança como melhores modelos de integração de estrangeiros imigrantes que portugal. Nesses países eles fazem parte importante do tecido económico, são empresarios grandes(e há milionários, em linguagem simples)ou pequenos, e tambem trabalhadores empregados, estão nos parlamentos,nos governos, municipios, na sociedade cultural (escritores, artistas plasticos, musicos, actores, etc), profissionais liberais, locutores de tv (veja-se a bbc ou a francesa), etc. Isto para mim é a verdadeira integração.

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