A visita oficial estava prestes a chegar ao fim. O jovem membro do Governo português tinha concretizado a sua primeira deslocação a África, a um país de expressão francesa. As coisas haviam corrido bastante bem e o embaixador havia decidido organizar um jantar final de “estadão”, para retirar legítimos dividendos do sucesso. Convidados para o repasto estavam, entre outras personalidades, todos os interlocutores do nosso político. Porém, a mais ansiada presença era a do homem poderoso do regime, o ministro das Finanças, com o qual não fora possível marcar um encontro, na agenda da visita. Ora a resolução de algumas questões bilaterais passava essencialmente por ele e, por essa razão, tê-lo à mesa seria muito importante.
Chegada a hora, os convidados lá foram aparecendo, alguns com a costumeira imprecisão temporal africana. Porém, mais de uma hora tinha já passado e o ministro das Finanças local não havia meio de aparecer. Comecei a detectar alguma inquietação no seio da delegação portuguesa, tanto mais que o jovem político era muito avesso a improvisos e a situações que saíam da rotina programada.
A certa altura, constatando o nervosismo crescente do nosso governante, já exausto das conversas preliminares com os seus interlocutores locais, recordo-me de ter dito ao embaixador que seria importante passarmos à mesa. “Mas falta ainda o ministro das Finanças!...”, retorquiu-me, embaraçado. Eu compreendia que era uma pena perdermos essa “cartada”, que ele preparara com tanto cuidado, mas tínhamos de acelerar as coisas, de uma vez por todas. “Vou telefonar ao ministro!”, disse. Ora aí estava uma excedente ideia. E lá desapareceu para uma sala anexa.
Regressou cinco minutos depois. Trazia na cara algum desânimo pontuado, contudo, por um sorriso enigmático. E anunciou que tínhamos de jantar sem o ministro das Finanças. O jovem político, pouco dado a absorver contrariedades, mostrou um inicial “carão”, mas era preciso ir em frente. E o jantar acabou por correr bem.
No final, despachados que foram todos os convidados, restando nos salões apenas a delegação portuguesa, alguém inquiriu: “E então por que diabo é que o ministro das Finanças não veio?”. E o nosso embaixador, já com um amplo sorriso, lá nos contou a sua conversa telefónica com o convidado faltoso.
No contacto, perguntou ao ministro se havia recebido o convite para o jantar dessa noite. A resposta foi logo surpreendente: que sim, que tinha recebido, que sabia que era para estar com um político português e que estava muito grato por ter sido convidado. Desconcertado, o embaixador perguntou-lhe: “Et à quelle heure vous avez l’intention d’arriver, M. le Ministre?”. A resposta foi magistral: « Ah!, mais non, M. l’Ambassadeur, je vais pas. Ce soir j’ai pas faim… »...