domingo, setembro 15, 2024

"Deixar África" (1974 - 1977)


Em 2013, apresentei no Porto o livro de Alexandra Marques "Segredos da Descolonização de Angola". 

Era um retrato muito frontal sobre o processo político-militar que envolveu a independência de Angola, com um polémico apontar de dedo a gente que, à época, teve responsabilidades nas decisões que, por ação ou omissão, marcaram muito daquilo que acabaria por suceder no terreno. 

Alexandra Marques, uma década depois, volta ao tema, alargando o âmbito geográfico do estudo, com "Deixar África" (1974-1977), subtitulado "O trauma dos portugueses de Angola e Moçambique" 

A autora, antiga jornalista entretanto doutorada, traz-nos agora uma recolha de testemunhos de imensa gente que, por esses dias, acabou atropelada pela História e, em grande parte sem a menor culpa no cartório histórico, sofreu a circunstância de estar no mau momento no lugar errado, vendo por essa razão as suas vidas voltadas do avesso. Soma a esses desabafos, cuja leitura é um filme desses dias de angústia, o teor de alguns relatórios oficiais, portugueses e não só, que nos aportam perspetivas diversas e interessantes. 

Ainda que descontado o pontual exagero emotivo de algumas leituras a quente, em particular de quem sofreu - na pele, nos bens e na família - esse complexo quotidiano, o retrato que resulta da leitura do livro oferece ampla matéria para que se continue a refletir sobre esse tempo traumático na vida do nosso país. 

Na forma como ocorreu, a descolonização foi o outro lado da moeda da Revolução libertadora do 25 de Abril. Melo Antunes disse, um dia, que a descolonização foi uma tragédia, como trágica havia sido a colonização. Sempre estive de acordo com essa dupla perspetiva. 

23 comentários:

netus disse...

Boa noite
Respeitosamente, bem lembrado.
Refiro-me ao último parágrafo, as duas tragédias.
Boa semana. Saúde.
António R. Cabral

Unknown disse...

Essa frase de Melo Antunes de que a "descolonização foi uma tragédia, como trágica havia sido a colonização" resume-se, em linguagem simples, a misturar alhos com bugalhos e a sacudir a água do capote. A primeira coisa (que não passa, aliás, de uma simplificação conveniente) não desculpa a outra. A descolonização foi uma tragédia não da responsabilidade da colonização mas da responsabilidade de quem detinha a direcção político-militar à epoca, que não tinha, obviamente, preparação nem competência para liderar uma descolonização decente. A descolonização foi uma tragédia. Ponto. E para a atenuar, não se diga que há "exagero emotivo". O que há, isso sim, é um varrer para debaixo do tapete da responsabilidade histórica dos nossos decisores políticos da altura. E só não os nomeio porque eles continuam a gozar de protecção nos mais variados foruns.

Anónimo disse...

Vivi dois anos em Lourenço Marques, de 1966 a 68, a frequentar os então chamados Estudos Gerais.
Tinha 22 anos e já tinha a certeza absoluta que aquilo ia acabar como tinha acabado em todo o outro lado.
Ninguém acreditava que aquela politica poderia levar a um efeito de ricochete.
Nem os "Velhos Colonos" nem mesmo os meus queridos colegas mais frelimistas.

Luís Lavoura disse...

Na forma como ocorreu, a descolonização foi o outro lado da moeda da Revolução libertadora do 25 de Abril.

Errado. A descolonização teria corrido sempre mal, com ou sem o 25 de Abril. Compare-se com a descolonização da Argélia, que também foi trágica embora em França não tivesse havido nenhum 25 de Abril. A descolonização de territórios que estavam em guerra e que só foram descolonizados "a mal" só podia ser trágica.

Luís Lavoura disse...

Recomendo o recente livro de David Martelo "Da guerra à paz na Argélia", que mostra que tudo aquilo que aconteceu em Angola e Moçambique era expetável e não foi o resultado de uma má descolonização, mas sim de uma muito tardia descolonização.

Lúcio Ferro disse...

Bem, no caso da minha família ficaram duas casas, três carros e uma embarcação de recreio em Moçambique. Só regressámos em Junho de 1976, porque os mais pais, sendo brancos, eram também frelimistas, inclusive o meu pai tinha relações pessoais com Samora Machel mas, por essa altura, a situação tinha-se degradado imenso. Não houve grande trauma, rapidamente recuperámos em Portugal. Para mim, criança, três momentos: O meu pai, após terminar de fazer a barba, deitar um molho de chaves na sanita; uma escala no aeroporto de Luanda, onde não havia água mas havia soldados pretos armados at~e aos dentes; a chegada a Portugal, uma alegria imensa porque os meus avós maternos e os meus tios nos aguardavam na Portela. Enfim, podia ter sido muito pior, seguramente foi para muitos outros, nós nunca nos considerámos "retornados", quer o meu pai quer a minha mãe tinham profissões muito bem remuneradas e procuradas na Metrópole, nem nunca houve rancor. Um bom dia.

Anónimo disse...

"... oferece ampla matéria para que se continue a refletir sobre esse tempo traumático na vida do nosso país."
DE BOAS REFLEXÕES ESTÁ O INFERNO CHEIO!
Tony Fedup

Isa disse...

Que uma multidão tenha acreditado na tosca propaganda da União Nacional e hoje continue a acreditar, isso é uma tragicomédia ...

Lúcio Ferro disse...

Vou deixar aqui um texto que escreve há 20 anos. Se achar por bem publique.

Estou em Luanda, tenho sete anos e um par de sapatos novos. São sapatos pretos de couro e são muito bonitos, embora me magoem os pés. Tenho fome, mas a minha mãe não tem nada para comermos. Mentira, tem um pacote de bolachas, só que mesmo com fome não gosto de bolachas, nunca gostei e na verdade nunca virei a gostar. Estamos aqui há uma data de tempo e sinto falta do meu amigo Biré, o qual nunca mais voltarei a ver.

Não sei porque estamos aqui. Só sei que estamos em Luanda porque ouvi dizer num altifalante e sei que o que se diz num altifalante é sempre verdade. Luanda, Julho de 1976. 23 de Julho de 1976. O Vôo para Lisboa está atrasado. E nós estamos aqui cheios de fome e o meu pai mandou um berro à minha mãe e o meu irmão quase acordou e eu fiquei cheio de medo porque há aqui uns pretos vestidos de verde com espingardas e com cicatrizes na cara que metem medo e falam aos berros com toda a gente – até com os outros pretos.

Lúcio Ferro disse...


Tudo tem sido muito estranho nos últimos dias. Estamos no aeroporto de Luanda e nunca aqui tínhamos estado. “Aeroporto”. É uma palavra nova que aprendi ontem, quando o meu pai acabou de fazer a barba e disse à minha mãe que tínhamos de ir para o “aeroporto”. Sei que é um aeroporto porque o meu pai disse. É um aeroporto azul, todo pintado de azul, mas não há água e há mais pretos do que no outro aeroporto, donde vimos, lá atrás, na minha terra, na nossa casa, em Lourenço Marques.

Estes pretos daqui são estranhos e feios e há alguns que devem de ser maus. Parece que nenhum deles gosta de mim, o que é muito estranho. Ainda agora mesmo uma preta falou mal para a minha mãe. E a minha mãe teve de se calar. O meu irmão até acordou e desde aí não pára de chorar. Estamos aqui há uma data de tempo e não há nada para comer a não ser bolachas e eu não gosto de bolachas.

Os meus sapatos são muito bonitos. São sapatos de homem, parecidos com os do meu pai. Ele está preocupado. Acho que nunca vi o meu pai tão preocupado. Nem naquele dia em que lhe tirei o isqueiro de ouro e o oferecei ao outro menino branco que morava no andar em frente ao nosso. O meu pai ficou muito chateado e disse que eu era um ladrão. Fiquei muito triste, não sei o que é um ladrão, mas sei que é mau ser um ladrão.

Os meus sapatos são realmente bonitos, têm uns furinhos que não são furos verdadeiros e brilham e reflectem a minha cara e quando bato com eles no chão fazem um barulho engraçado. Porque é que o meu irmão não se cala, isso é que não me sai da cabeça, estou a ficar farto do cheiro deste aeroporto e estou a ficar farto do choro dele.

O meu irmão nunca diz nada e só chora e a minha mãe não me liga nenhuma, só pensa nele e se calhar já não gosta de mim. O meu pai anda de um lado para o outro e também não me liga nada, também nunca ligou a não ser para dizer que eu era um ladrão, mas não gosto nada disto, não gosto daqueles pretos com espingardas, não gosto nada de nada e quero voltar para Moçambique, quero voltar para casa.

O que é que estamos a fazer aqui? Isto é Luanda, é África, mas já não é Portugal, mas isto é muito feio, não gosto deste azul, deste aeroporto pintado de azul e tenho sede e fome, mas não gosto de bolachas, nunca gostei. Há pouco uma preta que andava a varrer passou por mim e disse-lhe que tinha fome e ela riu-se de mim.


Não gostei e tive vontade de lhe dizer ”merda para si” mas havia um preto de espingarda ao lado e o meu pai disse que tinha de estar calado e eu calei-me e olhei para os meus sapatos e gostei do brilho deles e calei-me.

Os meus sapatos pretos são bonitos, mais bonitos do que a dentadura do preto da espingarda, são sapatos bonitos, pretos e brilhantes; sapatos de homem, mas tenho fome e tenho sede e estou farto de Luanda.

Quero ir embora, quero voltar para casa, andar no meu triciclo e brincar com os meus amigos, mas o pai diz que já não voltamos mais, o pai diz que Moçambique acabou, diz que vamos ter com os avós, lá em Portugal.

Gosto muito do meu avô e ainda mais da minha avó, dão-me montes de brinquedos e levam-me a montes de sítios muito giros e com pessoas ainda mais giras. Uma vez, fomos a um sítio, lá no norte, no Minho, em Vilar Formoso, e havia um senhor que era maestro eu não sabia bem o que isso é, chamava-se Vitorino de Almeida, e de repente a luz foi abaixo, e esse senhor sentou-se a um piano, só à luz de velas, e tocou uma música que encantou toda a gente e toda gente dançou e a minha avó deu-me beijos e eu gostei muito.

Voltámos para o Porto, e a minha avó comprou-me um tractor, da outra vez em que fui a Portugal, e eu e o meu primo brincámos lá na quinta, de tal maneira que um dia o tractor estava feito em pedaços, mas a minha avó não me bateu e até disse ao meu avô:

Lúcio Ferro disse...

“Vê lá tu, os rapazes desmontaram o brinquedo todo!”

Tenho a certeza de que os meus avós vão gostar dos meus sapatos novos. Vão dizer que sou um homem quando lhes mostrar os meus sapatos novos! E do meu fato novo, então, ah, nem imagino o que o meu avô vai dizer quando vir o meu fato novo. Vai dizer que sou um belo cavalheiro, sim, o meu avô vai dizer isso mesmo: “Estás um belo cavalheiro, rapaz!”

Saímos ontem de casa. Foi esquisito. O meu pai estava na casa de banho a fazer a barba e, quando terminou, pegou no molhe de chaves, deitou-o na sanita e puxou o autoclismo. Não percebi o que o meu pai fazia, o meu pai nunca deitava nada fora e andava sempre preocupado com as chaves, sempre à procura delas e foi esquisito ele fazer aquilo, mas até que achei piada e ri bastante e acho que foi das poucas vezes em que o meu pai se riu comigo. O meu pai deitava a sua vida na sanita e eu ria e ele teve a oportunidade de se rir comigo e pensando bem se calhar essa é uma das razões porque gosto dele.

Depois, a minha mãe vestiu-me e calçou-me os sapatos novos. Pretos. Estes sapatos de homem que calcei pela primeira vez. A última vez em que senti na pele o cheiro de Lourenço Marques. O caminho até ao aeroporto. O senhor preto que se tinha vindo a chorar despedir do meu pai e o meu irmão que dormia.

Estava triste a minha mãe, triste como no dia em que eu quase morrera afogado na piscina, lá naquela piscina do Hotel de Nampula, naquela piscina comprida, quando me deixei escorregar para dentro dela, quando fiquei sem pé, mas não me desconcertei porque não tinha idade para isso e fui caminhando na borda da piscina, sempre debaixo de água, sempre sem pé e à procura do ar, e, por fim, quando acordei, vomitava água pela boca e nariz, um senhor que nunca vira magoava-me o peito com as mãos rijas e a minha mãe chorava como nunca a tinha visto chorar.

Sim, os meus sapatos são muito bonitos e não há nada para beber ou comer aqui, nem percebo o que aqui estamos a fazer. Foi uma confusão. Nunca esquecerei, ao acordar da minha morte prematura, o suspiro de alívio da minha mãe. Amo-a, sem dúvida, e julgo mesmo que essa terá sido uma das minhas primeiras recordações, mas hoje isso não interessa nada.

O que interessa é que tenho uns sapatos bonitos e que quero ir para casa, ou, então, pelo menos, ver outra vez os meus avós. O sorriso da minha avó e o abraço do meu avô.

Lúcio Ferro disse...

Vamos embora. Até que enfim, até que enfim que vamos embora, até que enfim que vamos apanhar um pássaro de ferro – são bonitos estes pássaros de ferro. “É da TAP, é da ponte área”, diz um senhor no banco da frente, antes de cair exausto no seu assento. É branco e é um homem feio, deita ranho do nariz e tem aspecto de doente. Não gosto dele. Olho para os meus sapatos novos e tenho saudades dos meus amigos. Do Carlos, do Júlio e do Biré. Sobretudo do Biré. É o meu melhor amigo.

O homem vira-se para mim e ri-se, todo babado. Não compreendo a sua alegria, até porque eu, eu estou mesmo farto do choro do meu irmão. Mas o homem ri para mim e o meu irmão não pára de chorar e a minha mãe está cansada e eu estou cansado e o meu irmão não pára de chorar, quase como se fosse ele que tinha deitado a sua vida pela sanita, quase como e soubesse que o seu pai, a sua mãe e o seu irmão estivessem a morrer aos poucos naquele dia.

O homem do banco da frente, ou por pudor ou por cansaço, ensaiava calar-se. O meu irmão chorava e endoidecia toda a gente dentro do pássaro de ferro. Podia dormir e não fazer mais barulho, afinal ele não sabia nada de nada e eu nunca mais veria os meus amigos, mas nem por isso eu desatava a chorar como ele. Eu, eu era um homem.

Assim, a doer, à força, com o Biré a milhares de quilómetros de distância, lá longe, cada vez mais longe, só, longe de mim, de nós, num verão de 1976, perdido algures em África. E o homem branco do banco da frente, finalmente, saber-se-ia lá porquê, calara-se. O pássaro de ferro descolara e Luanda ficava para trás.

No dia seguinte, lembro-me como se fosse hoje, estava no aeroporto da Portela, os meus novos sapatos pretos brilhavam ao sol e os avós cobriam-nos a todos de beijos, até ao meu pai, que não era da família deles. Esse, sem dúvida, foi um dos dias mais felizes das nossas vidas.

Francisco de Sousa Rodrigues disse...

Exatamente, Luís Lavoura!

Figueiredo disse...

Os Retornados fazem-se de vítimas quando na verdade não o são, chegaram a Portugal e receberam subsídios, casas, e privilégios pagos com o dinheiro dos Portugueses que financiava o Orçamento do Estado (OE).

Depois da criminosa descolonização feita sem ouvirem em referendo os Povos Africanos naturais das Províncias Ultramarinas, os Retornados – com o bolso cheio de subsídios, e uma parte com equivalências profissionais e graus académicos que nunca tiveram, e bons tachos – desprezavam e desprezam os Ex-Combatentes do Ultramar e os Portugueses Continentais que os ajudaram quando precisaram.

A maioria dos Retornados eram criminosos a quem o Estado Novo dava duas hipóteses, ou cumpriam pena em Portugal ou então iam para a África Portuguesa; davam-lhes emprego e casa para lá ficarem.

A criminosa descolonização foi feita pelos liberais/maçonaria, no entanto, os Retornados passaram a ser militantes/apoiantes/votantes dos partidos que fizeram ou apoiavam o processo de descolonização.

Ficará para a história os documentos em branco com o respectivo selo, certificados de habilitações ou profissionais, e outros documentos falsificados, que eram comprados na praça pública ou usados pelos Retornados para obter títulos/categorias académicas e profissionais que nunca tiveram.

Unknown disse...

Depois de ler o Sr. Figueiredo, sinto-me desconfiado! Será que os meus pais foram deportados para África e lá tiveram emprego e casa garantidos? Será que eles, que tiraram os respectivos cursos aqui em Portugal Continental, andaram, mesmo assim, a falsificar habilitações? Porque é que eles, tendo recebido "subsídios, casas e privilégios" quando aqui chegaram, andaram tanto tempo a fingir que estavam a recomeçar do zero?
Já agora, por curiosidade, Sr. Figueiredo, acha que, tendo nascido eu na colónia e vivido lá mais de duas décadas, tinha direito também a votar no referendo, que se devia ter feito e não se fez?

manuel campos disse...

Figueiredo
Já todos nos demos conta por aqui da boa alma que tem e da empatia que lhe suscita o próximo por aqui.
Poupe-nos às suas generalizações disparatadas, é uma questão de sanidade mental (da sua, claro, que ninguém é obrigado a lê-lo).

Lúcio Ferro disse...

Post Scriptum: O meu pai foi médico pessoal de Samora Machel. Tirou o curso de medicina geral em Portugal. Fez a a especialização em Inglaterra e quando voltou a Portugal, 1968, tinha a PIDE à espera dele, guia de marcha para Moçambique. A minha Mãe era professora de Filosofia, hoje em dia é uma autora publicada. Foi com o marido para África. Ambos partilhavam dum ideário mais justo, menos racista e mais egualitário. Se a coisa por lá não correu bem, é porque não poderia ter corrido melhor.

C.Falcão disse...

Exatamente, Unknow (23.52)
O tema et os comentários mostram que a sociedade portuguesa ‘´peine encore’´ a sair da amnésia post-coloniale.

Nuno Figueiredo disse...

14:39 ...pelo amor da santa!

Joaquim de Freitas disse...

O senhor Figueiredo confunde a colonização de Moçambique, com a da Austrália. Sidney foi, no início, uma colónia penitenciária. O meu agente dizia ele mesmo ser descendente dum deportado da Sua Majestade Britânica …

O grande drama da descolonização foi idêntico noutras colónias. Já estava em França, quando a OAS começou a pôr bombas por todo o lado.

Albert Camus descreveu muito bem, o drama argelino, que podemos comparar ao nosso. Apelando à aproximação das comunidades argelinas, à sua federação, Camus não se encontra nem numa independência da Argélia que a feche sobre si mesma, nem na perpetuação da Argélia Francesa com a sua produção de desigualdades e miséria.

As aspirações nacionalistas da sociedade colonial que se formava nas colónias portuguesas, foram despertadas pelo ódio àqueles que chamavam “indígenas” aos nativos, ‘(não havia um “Ministério Indígena?) um nome desonroso, alternando com o de “pretalhada” para designar a população de origem, grupos étnicos centenários de África.

Antes de emigrar para França, estive dois anos em Moçambique, como viajante comercial duma indústria têxtil da minha terra de Guimarães.

Então não havia aqueles esposas de funcionários dos caminhos-de-ferro e outros, humildes trabalhadores, vindos lá do Portugal profundo, que tinham “ criados” para o serviço da casa, a quem chamavam “rapazes” mesmo quando eram pais e avôs, por vezes…Quantas vezes interceptei “olhares” furibundos “ de “rapazes” mais novos, que tinham sido escolarizados e eram tratados assim por analfabetas …brancas! Mas eram as “patroas”!

Na Argélia era ainda mais insultante…. Bougnoule, bicot, crouille, melão, raton: todos esses nomes foram, portanto, usados para designar desdenhosamente os norte-africanos...

E tudo isso se pagou!

Figueiredo disse...

Resposta ao dr. Unknow (15:20)

«...sinto-me desconfiado! Será que os meus pais foram deportados para África e lá tiveram emprego e casa garantidos? Será que eles, que tiraram os respectivos cursos aqui em Portugal Continental, andaram, mesmo assim, a falsificar habilitações?...»

Caro dr. Unknow, qual é a sua prespectiva com essas perguntas? É um problema seu se quer incluir a si ou à sua Família - mesmo que de forma figurativa e irónica - no rol dos criminosos.

«...Porque é que eles, tendo recebido "subsídios, casas e privilégios" quando aqui chegaram, andaram tanto tempo a fingir que estavam a recomeçar do zero?...»

Isto que você escreveu é uma autêntica patetice.

«...acha que, tendo nascido eu na colónia e vivido lá mais de duas décadas, tinha direito também a votar no referendo, que se devia ter feito e não se fez?...»

Não, um Português que nasce em África não é Africano, é Português, nasceu em África como podia ter nascido noutro lado qualquer, aqui exclui-se como óbvio o cruzamento entre Raças mas isso já é outra conversa.

Figueiredo disse...

Resposta ao dr. Joaquim de Freitas (08:31)

«...a colonização (...) Austrália (...) Sidney...»

Não estamos a escrever sobre a Austrália ou Sidney, isso é uma problema dos Ingleses não é dos Portugueses.

«...Argélia Francesa...»

Outra vez? Não estamos a escrever sobre a Argélia Francesa, isso é uma problema dos Franceses não é dos Portugueses.

«...E tudo isso se pagou!...»

A Guerra do Ultramar estava ganha, quem a provocou e manteve foi o regime da Inglaterra e os seus aliados, os líderes dos Movimentos de Libertação, Agostinho Neto, Amílcar Cabral, Samora Machel, disseram sempre que o seu objectivo não era a guerra contra Portugal, os Portugueses, nem contra a História e Cultura que uniam os seus Países com a Pátria Portuguesa, mas sim pelo direito à Auto-determinação conforme a Carta das Nações Unidas, por isso foram assassinados por aqueles que provocaram a guerra.

«...As aspirações nacionalistas da sociedade colonial que se formava nas colónias portuguesas, foram despertadas pelo ódio àqueles que chamavam “indígenas” aos nativos, ‘(não havia um “Ministério Indígena?) um nome desonroso, alternando com o de “pretalhada” para designar a população de origem...»

Isto faz-me lembrar os Retornados que após a criminosa descolonização diziam que se tinham tornado "comunistas" (militantes do PCP) ou de "esquerda" porque viam os brancos a bater nos pretinhos.

É algo que uma pessoa não sabe se há-de rir ou de chorar - neste último caso, chorar de pena com tanta imbecilidade - é que uma pessoa quando embarca numa ideologia fá-lo com base nos seus princípios e valores políticos, económicos, sociais, filosóficos, e culturais, e não porque viu alguém a bater neste ou naquele.

«...Então não havia aqueles esposas de funcionários dos caminhos-de-ferro e outros, humildes trabalhadores, vindos lá do Portugal profundo, que tinham “ criados” para o serviço da casa, a quem chamavam “rapazes” mesmo quando eram pais e avôs, por vezes…Quantas vezes interceptei “olhares” furibundos “ de “rapazes”...»

Sempre pensei que um Povo, um País, quando decide lutar e conquistar a sua independência o fizesse por uma questão de liberdade, justiça, desenvolvimento, auto-determinação, e para poder decidir o seu destino e modo de vida (no caso das antigas Províncias Ultramarinas tinha isso tudo, excepto a auto-determinação), mas afinal estava enganado, no caso Português foi o facto de alguém chamar rapazes aos Africanos que os levou à revolta.

Com o País a arder ao menos que haja boa disposição e umas gargalhadas que também fazem falta.

Joaquim de Freitas disse...

O senhor Figueiredo aparentemente, não conhece a palavra « racismo », que se manifestava nas colónias por vários modos de estigmatização (insultos, ameaças, exclusão (racismo institucional , onde o indígena não é cidadão)

O acesso a lugares públicos, com as suas tabuletas de “Black Only” ou “White only”, do outro lado da fronteira de Moçambique, o que era? E o que podia provocar senão a revolta?

O nacionalismo mais não foi que a reacção contra o imperialismo colonial, que permitia todos os comportamentos citados dominantes dos colonizadores, baseados na convicção da superioridade absoluta da “raça.
A extrema direita "chegana" tem belos dias à sua frente...

Respeito

A profunda revolta sentida pelo povo palestino, depois de décadas de injustiça e de hostilidade a que continua a ser submetido pelos governo...