domingo, setembro 15, 2024

Bebinca


Ao final da tarde de sexta-feira, numa conversa em viagem entre Coimbra e Lisboa, falou-se de cozinha goesa. Sou pouco conhecedor do assunto, mas recordei uma extraordinária sobremesa da culinária indiana: a bebinca. Nem sei como o nome me veio à ideia! Há muitos anos que não como bebinca e, à despedida,  ficou encontrada uma solução para eu, proximamente, matar saudades desse doce. 

Cheguei a casa. Minutos depois, ao olhar net, vejo a notícia de que há um furacão a assolar as Filipinas. O nome do furacão? Bebinca.

Não há coincidências, mas sei lá!, para combinar títulos de dois livros de uma autora que já andou mais em moda.

Só para lembrar...


... que os dias de sol estão a acabar. 

Depois, não digam que não avisei! 

Jogos parisienses

Os jogos olímpicos e paralímpicos em Paris correram muito bem. E ainda bem! Mas fica a sensação de que os franceses estão a ir um pouco longe demais na exploração desse êxito. Caramba! Uma cidade como Paris não precisa de todo este "foguetório" à sua volta. "Ça suffit!"

sábado, setembro 14, 2024

Olivença - a simplicidade de uma questão complexa

Olivença é um território que, nos termos inequívocos de um tratado internacional de que Madrid foi livre subscritor, pertence a Portugal. Na sequência desse tratado, a Espanha deveria ter transferido o território, ainda no século XIX, para a soberania portuguesa e não o fez. 

O Estado português, em muitos, diversos e contrastantes ciclos políticos, fez questão de nunca abdicar formalmente dessa soberania. Mas, do mesmo modo, e nesses mesmos tempos políticos, optou por jamais suscitar a questão no terreno jurídico internacional. 

Por que razão não o fez? Porque Portugal entende, num juízo de meridiano bom senso, que encetar um contencioso internacional com Espanha a esse respeito, em particular num tempo em que em terras de Olivença se vive em democracia, de onde não emerge um qualquer surto significativo de vontade de reversão da atual soberania política, acarretaria um grave custo para a importante relação bilateral que desenvolve com o nosso único vizinho terrestre. E também porque Portugal teve sempre a consciência de que a possibilidade de vir a ter vencimento nessa questão era quase nula, por não haver plausivelmente um cenário prático de resolução - repito, prático - que lhe viesse a ser favorável. 

Foi essa a decisão, explícita ou implícita, dos sucessivos governos portugueses, que, no entanto, acabaram sempre por ir no sentido de não abdicar formalmente desse direito de soberania, nunca assumindo, aliás, atitudes que pudessem ser interpretadas como significando uma abdicação dele. 

Tive o gosto de fazer parte de um governo que, perante o interesse português e espanhol em levar a cabo uma obra pública na zona geográfica cuja soberania sofre contestação, soube encontrar com Madrid, com bom senso, imaginação e sem abdicação mínima de princípios, uma solução prática que satisfez ambas as partes.

No atual contexto europeu e internacional, ressuscitar a questão de Olivença pode ser um exercício com algum interesse académico. Contudo, ser um governante portuguêsa fazê-lo, ainda por cima alguém que tem a seu cargo uma pasta de soberania e no quadro de uma cerimónia militar, confessadamente a título meramente partidário e sem a menor coordenação no seio do executivo a que pertence, é um grosseiro ato de irresponsabilidade, que aliás o obrigou a uma retratação atabalhoada e humilhante. Para somar a tudo isso, basta apreciar o nível dos aplausos que a "boca" do ministro suscitou para se ficar com uma bela montra qualificadora do grau de seriedade da mesma.

Esta senhora faz hoje 80 anos!


Se acaso fosse verdade a existência de divindades, e se, nessa improvável circunstância, elas tivessem um mínimo de bom senso e bom gosto, nunca seria permitido que isto acontecesse. Por estas e por outras é que continuo ateu.

A Alemanha, a Ucrânia e uma nota sobre Gaza


Ver aqui.

sexta-feira, setembro 13, 2024

A boca do senhor ministro


Estou certo que o senhor presidente da República, o senhor primeiro-ministro e o senhor ministro dos Negócios Estrangeiros terão, neste momento, a consciência muito clara do caráter profundamente inconveniente das palavras que hoje foram proferidas pelo senhor ministro da Defesa, pessoa que, pelos vistos, não entende que uma coisa é ser membro do governo português e outra é ser eventual associado do grupo dos amigos de Olivença. 

Ou então, como já antes aconteceu, ele virá a terreiro dizer que falou "a título pessoal", embora tenha sido filmado a dizer o que disse num enquadramento de tropas e não num banho estival nas águas do Caia. 

Às palavras do dr. Nuno Melo faltou um mínimo de sentido de Estado e de respeito pelos delicados equilíbrios da nossa política externa, que o Estado português, através da sua diplomacia, demorou muito tempo a estabilizar e não podem ficar à mercê de impulsos patrioteiros, populistas e, também por isso, irresponsáveis.

(Em tempo: entretanto, o senhor ministro, como já se estava à espera, à luz de comportamentos anteriores, já veio dizer, depois de devidamente "apertado" por que tem responsabilidades e sentido das mesmas, que falou "como presidente do CDS, embora num contexto equívoco, porque presente numa cerimónia como ministro". Escrever "num contexto equívoco" é extraordinário! E, não fosse alguém suspeitar do contrário, logo acrescentou: "Como é óbvio, essa opinião não vincula o Governo". Também era só o que faltava! Da próxima vez, aposto que o dr. Nuno Melo, contra quem nada me move no plano pessoal mas tudo me move por via destas infantilidades em terreno sério dos interesses nacionais, ainda vai acabar por dizer que falou em nome do Sporting de Braga... Na verdade, o único "contexto equívoco" em tudo isto é aquele que permite que o dr. Nuno Melo continue ministro, depois de uma gafe destas.)

Le Pen aceita Barnier


Ver aqui.

"Sharing Knowledge"


Gostei muito do debate em que hoje participei, na Universidade de Coimbra, com Carlos Costa, antigo governador do Banco de Portugal. O tema foi a Europa atual e os seus desafios. 

Acolhidos pelo vice-reitor professor João Calvão da Silva, ambos ali procurámos estimular uma livre reflexão, que se prolongou por algumas horas. 

Maria Manuel Leitão Marques, Manuel Lopes Porto, António Tavares e Vital Moreira foram alguns dos intervenientes nesta animada jornada.

Sob o incansável estímulo de Jaime Quesado, que há anos dirige a iniciativa "Sharing Knowledge" - uma espécie de tertúlia aperiódica dedicada a trocar conhecimentos e a refletir, sem o menor sectarismo, sobre temáticas económicas e sociais de interesse geral - concluímos mais uma utilíssima jornada de troca de ideias.

Parabéns ao Jaime Quesado por mais esta bela iniciativa, que julgo enriqueceu todos quantos nela participaram.

O último debate?

 


Ver análise aqui.

Ainda há postais?


É que "fiz" agora um bilhete postal. 

O "basófias"

quinta-feira, setembro 12, 2024

Ninguém tem dúvidas de que uma mera "recomendação" do Ministério da Educação, para que seja limitado o uso dos telemóveis nas escolas, dando a cada uma a liberdade de decidir, vai ser resistido pela esmagadora maioria delas. Isto é cobardia no exercício da autoridade do Estado.

Não há coincidências? Que ideia!


A conversa durou quatro horas. Foi ontem, ao jantar, numa tasca da Baixa lisboeta. Não me perguntem por onde andou o diálogo, entre mim e o meu amigo José Ferreira Fernandes, esse mesmo!, o grande mestre da crónica jornalística. Falámos de imensas coisas, com a agenda bem cheia de coisas de quem não tem agenda. 

Acabámos a noite a passear naquele lugar onde os Restauradores afunilam, a caminho do Rossio. Falei-lhe então de um túnel que, no passado, levava os passageiros que chegavam à estação do Rossio diretamente para o Hotel Avenida Palace. A propósito de eu lembrar estarmos a dois passos do local onde, em "O Leão da Estrela", o António Silva andou desesperadamente à cata de um bilhete para o Porto-Sporting, o José Ferreira Fernandes contou-me que o autor do "script" do filme era um ferrenho benfiquista. E também me revelou algo que eu estava longe de saber: que "O Pátio das Cantigas" foi inteiramente filmado em Coimbra. Aproveitei para lhe contar que a Maria Paula, uma das atrizes do filme, tinha tido um bar perto da Artilharia 1, onde, aí por 1976, a ouvi cantar ao piano canções reacionaríssimas. O José Ferreira Fernandes disse-me que a Amália estivera para entrar no filme e que tinha sido por pressão do galã António Vilar que isso não tinha sucedido.

Nessa altura demos connosco a pensar quão decisivas e relevantes eram as informações que estávamos a trocar para o que importa ao mundo de hoje. Perguntámo-nos, aliás, sobre o que diriam, se inquiridos sobre esses assuntos, os muitos jovens com os quais por ali nos cruzávamos, nessa primeira hora de quinta-feira O mais certo é que achariam que aqueles cotas já se tinham passado de vez.

Na noite fresca que já entrava pelo dia seguinte, e não sei a propósito de quê, o José Ferreira Fernandes falou da Grande Guerra, da guerra 14/18. E referiu um livro que, há uns anos, tinha lido sobre o conflito e que muito o impressionara. À medida que descrevia episódios da obra, aquilo começou-me a soar a algo de familiar. Lembrei-lhe uma cena e a conclusão foi imediata: tínhamos ambos lido o mesmo livro.

Recordei então o título da obra: "Au revoir, là-haut", do escritor francês Pierre Lemaître. E contei que, há 10 anos, tinha sido eu quem apresentou a sua edição portuguesa, no que fui acompanhado pelo autor, no Centro Cultural Luso-Francês, ainda na sua antiga morada. A isso, recordava, tinha-se seguido um jantar com Miguel Sousa Tavares, na Tágide, Até aqui, nada de novo.

Então? Nesse ano de 2014, o contacto para eu vir a apresentar o livro fora feito por Eduardo Marçal Grilo. Ora, há poucas horas, exatamente ontem!, o Eduardo tinha-me telefonado, a propósito de outro assunto. E eu e o ele raramente falamos. Durante a mesma tarde, também ontem, recebi da responsável pela edição do livro, pessoa com quem eu já não me correspondia há mais de dez anos, um email a convidar-me para elaborar um prefácio para um outro trabalho que vão publicar. Ambas as coisas, repito, ocorram ontem.

Não há coincidências? Pois não!

quarta-feira, setembro 11, 2024

Direitos


Tenho de pagar direitos de imagem por fotografar as flores do vizinho?

10 milhões de visitantes


Acabo de notar que, há cerca de dois dias, este blogue passou de 10 milhões de visualizações. 

Assim, e em média, desde a data de 2 de fevereiro de 2009, em que publiquei por aqui o primeiro post, houve um número superior a 1757 visitantes diários. Ontem, por exemplo, foram 2.546.

Creio que, desde há uns anos, deixaram de se publicar estatísticas sobre os blogues portugueses. Por essa razão, não faço ideia se este número é muito ou pouco, para um blogue "unipessoal" que tem a rara caraterística de "sair" todos os dias. E foram 5.694 dias seguidos! 

Deixo um outro mapa, com a evolução das visitas, de 2009 a 2024.

6ª feira, 13

Boys and girls


Pensando bem, só há uma forma de acabar de vez com os "jobs for the boys": é nomear apenas "girls".

Depois do debate

Foi um debate estranho. Trump faz parte de um mundo assente um emoções simplórias, medos e mitos. A verdade ou a mentira são pormenores irrelevantes. Harris está próxima de outro mundo, mais racional, às vezes repetitivo nas fórmulas. Quem está no meio, como reagirá? A ver vamos.

Os moderadores mostraram-se, em alguns momentos, demasiado "biased" contra Trump. As contradições que procuraram em Harris foram sempre apresentadas com muito maior suavidade e simpatia. A aversão de Trump aos factos e à verdade terá ajudado a convocar essa atitude mais hostil.

Harris conseguiu provar, com à vontade, que está muito longe de ser a vice-presidente "flop" de que muita gente falava. Talvez Biden tenha deliberadamente contribuído para isso. O seu discurso é fluído, às vezes demasiado formatado, mas mostrou ser uma boa "performer".

Quem segue com alguma atenção a política americana não pode deixar de colocar-se uma questão, ao mesmo tempo simples e intrigante: o que é que aconteceu para o Partido Republicano ter chegado a este nível?

terça-feira, setembro 10, 2024

O debate


Daqui a umas horas, milhões de pessoas vão ficar presas aos écrans, a ver o debate entre Donald Trump e Kamala Harris.

Muitos desses milhões serão americanos. A menos que haja um pouco provável cataclismo, a esmagadora maioria dessas pessoas não mudará o sentido de voto que já fixou num dos candidatos. E, como é da lei da vida e das regras do sectarismo político, essas pessoas vão acabar por achar o "máximo" a prestação daquele em quem irão votar e irão considerar "péssima" a do candidato do outro lado. No meio, há ainda uma América hesitante, movida por questões muito diversas, temas de nicho, interesses e crenças próprias. São eles quem pode fazer a diferença. E é a eles que, essencialmente, este debate se dirige.

Convém, contudo, ter presente que um candidato pode, no final da eleição de 5 de novembro (quase dois meses!), vir a obter mais votos do que o real vencedor. Isso é fruto do sistema de colégio eleitoral, onde as contas dos votos podem não bater certo com os números do que sairá da vontade política apurada em cada Estado. É um sistema pouco democrático? Os Estados Unidos são isso mesmo, são fruto do entendimento entre estados que se uniram para desenhar um país e isso levou a compromissos que também se refletem sobre o seu sistema eleitoral. Ah! E lembremo-nos: nós não temos nada a ver com isso, essa é uma questão entre os americanos.

Comecei por dizer que haverá milhões a ver o debate. E que a maioria será, naturalmente, de nacionalidade americana. Mas há um mundo, fora da América, que vai estar muito atento ao debate. Desde logo, os países que detestam os EUA. Mas também aqueles que gostam mais de uma América do que de outra. Nós não votamos nas eleições americanas, mas, queiramos ou não, vamos sofrer as consequências do voto dos americanos. É também por aqui que se mede a importância e a força da América.

Três anos sem Jorge Sampaio

 

(Fot. João de Vallera)

segunda-feira, setembro 09, 2024

" High life"


Todos nos damos conta de que algumas coisas, que outros tempos admitiam como naturais, passaram a ser vistas, nos dias que correm, como ofensivas a novos padrões - hesitei em escrever valores, porque isso é mais discutível - que entretanto se ergueram e ganharam terreno, passando frequentemente a dominantes. 

Vemos isso em múltiplos aspetos da nossa vida, das relações pessoais à relutância na exposição pública de certas realidades, tidas como ofensivas por alguns. Atitudes e práticas que eram correntes passaram a ser desaconselhadas ou mesmo banidas. 

Em termos de evolução dos padrões geracionais, houve manifestamente um salto muito rápido no tempo, diferente das ruturas ocorridas no passado e, não por acaso, algumas dessas mudanças continuam a defrontar-se com alguma resistência. Setores das novas gerações absorvem as alterações comportamentais com maior facilidade, em alguns casos mesmo com adesão entusiástica, enquanto que pessoas mais velhas tendem resistir-lhes. Isto prende-se, em especial, com o tema da cultura que o mundo conservador qualifica como "woke", que está hoje no centro de um fortíssimo debate à escala global. 

Na sábado passado, por mero acaso, cruzei-me num restaurante com o meu amigo Pedro Correia, que recentemente escreveu "Tudo é tabu - cem casos de novas censuras". O livro, muito bem escrito e muito polémico, é sobre isso mesmo. No texto, o autor sublinha o que entende serem os exageros desta onda avassaladora de pressão para a adoção de novas atitudes. Estou a lê-lo aos poucos. Há coisas com que estou de acordo, outras bastante menos. Mas recomendo francamente a leitura. 

Curiosamente, eu tinha levado para esse meu almoço solitário, na "Imperial de Campo de Ourique", onde ia pelo bacalhau à minhota da dona Adelaide, um pequeno e bem antigo livro de um autor hoje quase maldito. Tinha-o descoberto há cerca de um ano num alfarrabista. O autor chama-se Taki e para os que costumam ler, com regularidade, a revista conservadora britânica "The Spectator", foi um velho conhecido, com a sua coluna "High Life". 

Escrevi "foi" porque, desde o ano passado, ele interrompeu por ali a sua colaboração de décadas. De que nos falava Taki? Em síntese, da vida dos muito ricos, dos "parties", dos jantares requintados, das estadas nas estâncias de turismo de neve na Suíça, dos veleiros dos magnates amigos, dos restaurantes, hotéis e vinhos mais caros, dos automóveis e viagens de hiper-luxo e de outras coisas assim. Ele próprio milionário, Taki abordava esses temas com uma sobranceria elitista tão radical, quase obscena na sua insuportável arrogância, que a coluna acabava por ganhar a sua graça, como exercício de estilo, em especial pela imensa qualidade que imprimia à sua escrita. 

Taki conhecia, e conhece, o "who's who" desse seu mundo e era temido por esse "social set" exclusivo em que se movimentava. De origem grega e americana, é um reacionário à antiga, e que não só nunca pediu desculpa por sê-lo como exagera deliberadamente, para chocar, no seu conservadorismo extremo. As desigualdades do mundo preocupavam-no muito pouco, os privilégios e a necessidade filosófica da sua preservação eram, para ele, um "fact of life". As suas crónicas, algumas vezes, passaram dos limites que o próprio "The Spectator" consentia. Taki, que em tempos chegou a estar preso e que se meteu em trapalhadas várias, saiu entretanto da revista britânica e, ao que parece, escreve hoje em publicações americanas de extrema-direita. 

Mas que graça pode ter ler um tipo tão fora do tempo como Taki?, estarão a perguntar-se alguns. Vou repetir o que já por aqui escrevi por diversas vezes: gosto imenso de ler aquilo com que, à partida, sei que não vou concordar, desde que isso me divirta, pela qualidade da escrita ou pela bizarria do estilo. Para pensar como eu, basto eu. 


(Fotografei um extrato do livro de Taki, onde a extrema sobranceria snob se soma a uma condescendência que roça a misogenia. Mas digam lá se o estilo não tem graça!)

domingo, setembro 08, 2024

Os factos são o que são


Temos direito às nossas opiniões, não temos direito aos nossos factos. Quantos manifestantes estiveram nas manifestações de ontem, em Paris? Os manifestantes dizem 300 mil, a polícia diz 26 mil. A democracia ideal será talvez o país onde, um dia, estas avaliações coincidam.

sábado, setembro 07, 2024

A América há 80 anos


Recomendo vivamente uma visita a esta mostra da América dos anos 40 do século passado, um conjunto de fotografias cuja cor foi recuperada de forma magnífica.

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França e Alemanha


Líderes têm razões para rir? 

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Ucrânia / Rússia


Um claro traumatismo ucraniano no orgulho russo.

Ver aqui.

"Déjà vu"


Por que será que ambientes como este me recordam sempre o "Watergate"? 

Foi hoje


O meu outono começa quando constato que tenho de ir buscar "une petite laine", como dizem os franceses.

"De Rodriguez"


Todos os espanhóis de uma certa idade sabem bem o que significa "estar de Rodriguez". Há mesmo um filme sobre isso. Trata-se da situação de um cidadão que permanece na capital enquanto a família passa férias de verão em outro local. Não faço ideia quem possa ter sido o "señor Rodriguez", mas a verdade é que ganhou o seu lugar no imaginário social madrileno e espanhol.

Na leitura clássica que consagrou a expressão, estar "de Rodriguez" pressupõe a potencial adoção de comportamentos, em termos de entretenimento pessoal por parte dos maridos, eventualmente algo disruptivos face àquilo que uma cultura matrimonial tradicional poderia recomendar. (Espero tenham apreciado o eufemismo da fórmula que acabam de ler. Deu trabalho a construir!)

Pois, para mim, no dia de hoje, o estatuto "de Rodriguez", como se vê pela imagem junta, levou-me simplesmente a ir às compras. Quanto gastei? Toda a virtude tem o seu preço.

Barnier

"Racista" e "sexista" são alguns dos qualificativos com que Michel Barnier foi hoje brindado em cartazes, nas manifestações contra a sua indigitação como primeiro-ministro de França. 

Ontem, no "Le Monde", um seu amigo, preocupado, dizia que Barnier, cujo percurso político passou sempre à margem de grandes polémicas, mesmo as que ocorreram na sua própria família política, talvez não estivesse bem consciente do nível da crispação que atravessa o mundo partidário com que agora terá que se confrontar.

Agora já sabe.

Cheney?!

O antigo vice-presidente de George W. Bush, Dick Cheney, anunciou o seu apoio a Kamala Harris. Na lógica de que "tudo o que vier à rede é peixe", isso pode ser considerada uma boa notícia para a candidatura. Mas, pensando bem, ter o apoio de uma das figuras mais sinistras da política americana, um dos pilares da criminosa invasão do Iraque em 2003, que provocou um incêndio ainda não extinto no Médio Oriente, causou milhões - sublinho, milhões - de mortos e proporcionou a emergência do Daesh, é uma óbvia e grave fragilidade moral para a campanha de Harris. Vale tudo para não ter Trump?

A França é de direita

A França é de direita, afirmava convictamente o antigo presidente Nicolas Sarkozy, depois de ter sido ouvido há dias no Eliseu. Pelo menos o poder, em França, é, de facto, de direita. Se se somar a extrema-direita de Le Pen, o grupo de Éric Ciotti que a ela se juntou depois de se cindir do Les Républicains, a ala maioritária deste mesmo partido e as três ou quatro componentes do campo macronista, está encontrada uma sólida maioria de direita em França. Mas as coisas não podem ser contabilizadas assim!, dirão alguns. Ai não? O que é Michel Barnier senão o símbolo e a prova provada dessa união das direitas francesas? Oriundo do Les Républicains, partido que estava afastado do poder macronista e do qual resistia a vir a ser um parceiro menor, formação de onde Macron tinha inicialmente "pilhado" quadros para a constituição do seu próprio grupo (e onde regularmente ia sacar trânsfugas benévolos para os seus governos, com Rachida Dati como último exemplo), Barnier tem hoje o natural aval do Les Républicains, com maiores ou menores reticências vai acabar por ter o apoio dos grupos macronistas e, como cereja no bolo, garantirá um "nihil obstat" das gentes de Le Pen e Ciotti. São momentos como este que acabam por provar que as diferenças entre as direitas - da direita envergonhada que se auto-intitula de "centro-direita" até à extrema-direita pura e dura - se atenuam e encontram sempre um lugar geométrico de entendimento quando se trata de isolar a esquerda. É que a esquerda é, como sempre foi, o grande inimigo da direita, como convem lembrar aos distraídos. E quando a esquerda, como agora aconteceu, se perde em erros táticos e embarca em algumas ilusões estratégicas, fragiliza-se e convoca de imediato contra si, com toda a naturalidade, a "frente direitista" de que Barnier é o expoente e Macron o indisfarçado promotor. O resto é conversa.

Israel. Palestina


Israel vive na ilegalidade internacional e não vai ter sobre si uma pressão americana para mudar de atitude. 

Ver aqui.

sexta-feira, setembro 06, 2024

Augusto M. Seabra


Eu tinha entrado por concurso público para as Necessidades em 1975. Há já uns anos que saíra do Instituto de Ciências Sociais e Políticas (até ao 25 de Abril, de "Ciências Sociais e Política Ultramarina"), cuja última cadeira do curso, depois de muitas atribulações, tinha terminado escassos meses depois da Revolução. 

Um dia, constou-me que no ISCSP havia sido criada uma nova licenciatura em Ciências Sociais e Políticas. Eram dois anos "complementares", com 15 cadeiras, um curso novo, com matérias muito interessantes.

O trabalho no MNE era pesado, mas achei graça, embora não precisasse disso rigorosamente para nada, tentar fazer também esse novo curso. Inscrevi-me como "voluntário" e, entre 1977 e 1978, por puro diletantismo, concluí essa licenciatura. Porque utilizei o chamado "regime militar", podendo, julgo que durante dois ou três anos, solicitar exames quando me considerasse preparado (mesmo que ainda não tivesse sido dada uma única aula de algumas das cadeiras, o que acontecia com todas as do segundo ano do curso), creio ter sido a primeira pessoa a concluir o novo curso.

Não foi fácil compatibilizar a profissão com o estudo e conclusão das disciplinas, mas quando se tem 30 anos parece que tudo é possível. Acresce que eu tinha, na altura, uma outra atividade profissional na Ciesa-NCK, um pouco "clandestina" e à margem do MNE, que me arredondava as contas.

O novo ISCSP tinha, entretanto, por qualquer razão, saído do velho e magnífico Palácio Burnay, na Junqueira. Dividia-se entre duas instalações do ISCEF (agora ISEG), no velho Quelhas e na rua de Buenos Aires. 

Num desses dias, em que tinha marcado um exame, comigo a ser dispensado do MNE para poder fazer a prova, entrei no edifício do Quelhas e dei de caras com o Salgueiro Maia (sim, esse mesmo !) que por ali também andava a acabar uma licenciatura, creio que em Antropologia. Conheciamo-nos das "guerras" do MFA, três anos antes. "Escusas de te apressar! Parece que há uma greve", disse-me. Eu não fazia a mais pequena ideia do tempo académico que se vivia no ISCSP, mas, claro, se havia uma greve associativa decretada, haveria que respeitá-la. Logo eu que, durante anos, tinha andado bem envolvido na agitação académica! E preparei-me para regressar ao MNE, onde tinha muita coisa para fazer. 

Íamos ambos de saída por um corredor, à conversa, quando surgiu o Augusto M. Seabra. O Salgueiro Maia sabia que ele era uma das figuras do associativismo universitário no ISCSP. Eu conhecia-o muito vagamente do MES e o seu mundo era - e iria continuar a ser, para sempre - muito distante do meu. O Maia perguntou-lhe se se confirmava a greve aos exames. "Vocês são "voluntários"? Vêm para os exames? Não, para vocês não há greve, foi feita uma exceção. A greve é só às aulas". 

Olhei para o Salgueiro Maia e ambos voltámos a encarar o Seabra: "Tens a certeza que isso é assim? Era só o que faltava nós os dois virmos a ser acusados de ser "fura-greves"! ". O Seabra riu-se: "Não! Foi feita uma exceção para quem trabalha. Podem fazer os vossos exames à vontade. Ninguém vos vai acusar de ser contra-revolucionários! Ninguém vai dizer isso do Salgueiro Maia!" Rimos os três e lá fomos os dois fazer umas provas escritas, sei lá bem de quê!

Desde essa data, há mais de 45 anos, só voltei a "ver" o Augusto M. Seabra por escrito. Tinha a consciência de que era um ecletico e severo crítico cultural, que quem me merecia respeito especializado sempre qualificava por genial, com forte propensão para a polémica. Morreu agora e o modo como convocou imensos elogios confirma que o país perdeu alguém de grande qualidade. 

quinta-feira, setembro 05, 2024

Michel Barnier


Barnier foi a agulha no palheiro descoberta por Macron: um nome que garanta que o primeiro governo francês pós-dissolução não será censurado de imediato à chegada à Assembleia Nacional. Com a esquerda fora de jogo, Barnier vai necessitar da "neutralidade colaborante" de Le Pen.

"A Arte da Guerra"


Regresso pós-vilegiatura de "A Arte da Guerra", o podcast do Jornal Económico sobre temas internacionais, em que falo com o jornalista António Freitas de Sousa sobre a situação política em França, a guerra na Ucrânia e o conflito Israel/Palestina. 

Ver clicando aqui.

Leitura


Várias pessoas têm-se-me queixado de que a letra dos textos deste blogue era de difícil leitura. Assim, "a pedido de várias famílias", passo a usar uma letra mais "reader's friendly". Espero que gostem!

quarta-feira, setembro 04, 2024

terça-feira, setembro 03, 2024

Édouard Philippe

Edouard Phillipe, o primeiro dos quatro primeiros-ministros de Macron, que diz de si próprio ser um "homme de droite" (vem do antigo UMP/LR, fação Juppé), anunciou que será candidato à Presidência. Estranho "timing"! Dentro de horas, quando for anunciado o próximo primeiro-ministro, este anúncio irá "morrer" nos media.

Realismo

Neste tempo em que muita gente acordou para a ausência de soluções para pôr cobro a certos conflitos internacionais, lembro que a História ensina que, muitas vezes, o máximo que se pode fazer é mantê-los num registo de baixa intensidade, minorando-lhes as consequências.

Ucrânia

Foi anunciado que Zelensky irá amanhã remodelar mais de metade do governo. A classe política ucraniana parece inesgotável! Será ser interessante perceber o eventual novo sentido da linha política futura de Zelensky, seguramente na decorrência do importante conjunto de consequências da operação em território russo.

As assinaturas da TAP

"PSD critica “timing” do relatório da IGF sobre a TAP após escolha de Maria Luís para comissária europeia", diz a imprensa. 

Pode-se imaginar o "pé-de-vento" que não teria sido, do lado laranja, se a IGF tivesse publicado o relatório há uma semana!

Castets


Lucie Castets, a cara que a esquerda francesa tentou, sem êxito, que Macron nomeasse PM, não tem história política passada e talvez a não tenha no futuro. Tal como muitos trabalhistas britânicos diziam de Dennis Healey, dir-se-á que ela foi "the best prime-minister we never had"?

França

Surge a dúvida sobre quais são as competências mínimas de um presidente francês, à luz da Constituição da V República. É simples: são as que a experiência provou que ele consegue preservar em caso de coabitação com uma maioria parlamentar hostil. O que não é o caso atual.

segunda-feira, setembro 02, 2024

Palestina

A razão pela qual Benjamin Netanyahu não aceita um cessar-fogo - já é quase irónico falar de cessar-fogo, depois de mais de 40 mil mortos em Gaza "and counting" - é muito simples: desde o início, ele sempre achou que arrasar o território e esmagar o Hamas valia bem a vida dos reféns. Pensou que a vitória total se conseguiria em muito menos tempo e, provavelmente, não contou que Israel fosse pagar um preço reputacional tão elevado. Mas a parada valia o desafio. E, para ele, ainda vale, tanto mais que o desequilibrar da Cisjordânia a favor dos colonos está no pacote final do problema palestino.

Tertúlia


Não me perguntem onde é, porque aquilo é fechado aos membros da tertúlia. Mas pensei que gostassem de saber.

TAP


Fernando Pinto pode ter cometido erros durante a sua gestão da TAP. Mas foi a sua visão, ao aproveitar a quebra do potencial brasileiro de transporte internacional, que veio a permitir à empresa dispor de um portfolio de ligações com a América Latina que é hoje o seu grande valor.

Über alles


Andam por aí uns e umas "europeístas do fogo-à-peça" muito entusiasmados com a viragem pró-armamentista alemã, que só não é maior porque a economia não está a ajudar. E se a extrema-direita chega por lá ao poder? Já pensaram nisso?

Rússia

A Rússia apostou, por muito tempo, no cenário de uma possível cessação provisória de hostilidades, congelamento das posições no terreno e discussão política do futuro, mas tendo como uma "realidade" o território ucraniano efetivamente ocupado. A surpreendente tomada de território russo pela Ucrânia muda por completo os termos da discussão: um congelamento de posições passou a ser-lhe desfavorável, porque implicaria ter de aceitar, mesmo que provisoriamente mas por tempo indeterminado, que a Ucrânia passasse a ocupar parte da Rússia. Nesse cenário de pausa negocial, a Rússia teria de admitir que a Ucrânia se mantivesse no seu território como entidade ocupante, sem reação militar de Moscovo. Essa é a razão pela qual a Rússia mudou de posição e diz que assim não aceita negociar. 

Péssimo gosto

 


Acho isto de péssimo gosto. Ainda se se tratasse do Charlie Hebdo! Mas o Libération?!

Pois é!

Dizer mal é a única coisa que algumas pessoas sabem fazer muito bem.

"Jobs for the boys"


Deve acabar de vez a hipocrisia e assumir abertamente: quando muda o vento político, há "jobs for the boys" para distribuir pelas máquinas partidárias do outro lado do "bloco central". Todos sabem quais são, pelo que as críticas do outro lado são sempre pífias e quase de rotina. É triste, mas é assim.

Leões em Benguela


Recordo ter chegado a uma varanda, onde estavam sentadas três pessoas, num fim de tarde, com o sol já a cair. Para tal, tinha atravessado toda a casa, mobilada e decorada com grande simplicidade, sem quaisquer luxos. Os tempos, que eram de guerra, não estavam para isso.

Sobre uma mesa, havia várias garrafas de cerveja Cuca, algumas já vazias, além de uma bela pratada de caju. Um rádio portátil, grande, de pilhas, daqueles com asa e lugar para cassetes, de onde saía um som forte e roufenho, dominava a cena. Ao lado, estava um exemplar, já com mais de uma semana, do jornal português, nessa altura trissemanário, "A Bola".

Era uma moradia de um só andar, numa rua de Benguela, no sul de Angola. Estávamos em 21 de março de 1984. Há mais de 40 anos. Já perceberão por que recordo a data.

Eu tinha ali arribado poucos minutos antes, no avião da tarde da TAAG, ido de Luanda. Pousara a mala na residência do nosso cônsul-geral, Fernando Coelho, que me tinha ido buscar ao aeroporto e que, de imediato, me convidou a ir beber umas cervejas a casa de umas pessoas.

O Fernando tinha chegado a Angola semanas antes de mim, dois anos antes. Num posto muito difícil, isolado, nas complexas condições de vida que eram então as de Angola, ele tinha sabido estruturar uma eficaz rede de contactos, rapidamente passou a movimentar-se com grande à-vontade na sociedade local e, o que era mais importante, transmitiu segurança à inquieta comunidade portuguesa. Assumia uma atitude humana de grande simplicidade, às vezes numa postura que eu vi como algo arriscada no modo aberto como se expunha, recusando a distância profissional a que alguns colegas recorrem, para desenharem uma bolha de importância à sua volta. O Fernando era uma joia de pessoa e criava amigos com muita facilidade.

Alguns desses seus amigos de Benguela estavam ali reunidos, um dos quais me foi indicado ser o proprietário da casa. Eram todos angolanos: dois mulatos e um negro. Cumprimentaram-me, embora sem me prestarem grande atenção, quando o Fernando me apresentou: um diplomata, seu colega, que vivia em Luanda, onde trabalhava na embaixada. Estavam todos muito fixados a ouvir o relato de um jogo de futebol.

Tendo já na mão uma cerveja que alguém me estendeu e com acesso livre ao cajú, refastelei-me numa cadeira de braços e apreciei a cena: acompanhavam, pela rádio, o jogo que o Benfica estava a disputar com o Liverpool, no estádio da Luz.

O ambiente estava pesado. O Benfica perdia, e já estava na segunda parte, por dois golos. Toda a sala era benfiquista, ferrenha. Bom, toda não: eu era sportinguista, mas o Fernando tivera o prudente cuidado de não começar por referir a quem ali me acolhia esse despiciendo pormenor.

O que era mais curioso no grupo era constatar o modo como seguiam o jogo, quase como se estivessem na Luz. O relato, pela rádio, era muito bem feito, vivo, cheio de notas que, para quem nele estivesse concentrado, criavam uma imagem muito impressiva sobre aquilo que se passava em Lisboa.

Eu sabia muito bem que, em Angola, um pouco como em todas as outras antigas colónias portuguesas, a fidelidade aos nossos principais clubes tinha sobrevivido, intocada, aos respetivos processos de independência. Era uma espécie de afetividade que se autonomizara, em absoluto, dos processos descolonizadores. Não deixava de ser interessante assistir ao sofrimento daqueles angolanos, fanáticos benfiquistas de Benguela, que, inclinados sobre a mesa, bebiam as palavras do locutor português.

Mais do que isso: que se pronunciavam, com firme opinião, sobre o andamento da partida, as prestações de cada um dos jogadores do Benfica, as opções técnicas que iam sendo feitas pelo treinador. "Este Eriksson hoje só faz asneiras", comentava, irado e agitado, o único negro na sala. "O Maniche já devia ter saído! O gajo não sobe bem pela esquerda! Devia meter o Filipović!".

Outro dos presentes, um mulato mais velho, recomendava, por uma qualquer razão tática, a entrada de Shéu, que estava no banco de suplentes. Resposta do terceiro membro do grupo, o dono da casa, com uma gargalhada: "Esse tipo é do lado de lá, não presta!", sublinhando a origem moçambicana do jogador. Toda a gente riu, mais por nervoso do que pela pertinência da graçola.

Eu não tinha uma opinião técnica definitiva sobre nada, até porque era de outra "freguesia" desportiva. Conhecia quase todos os jogadores do Benfica, claro, mas não fazia a menot ideia se uns eram melhores do que outros para "dar a volta àquilo", como se clamava pela sala. 

E assim tudo continuou até ao final do jogo, comigo relativamente silencioso, entretanto já revelado como sportinguista, mas a assumir publicamente uma discreta simpatia, embora talvez não muito entusiasta, pela desdita dos encarnados naquela noite. O Benfica acabaria, no final, por encaixar quatro golos, como o Nené a salvar a honra do convento da Luz. A carreira do Benfica na taça europeia que disputava tinha, nesse ano, chegado ao fim.

Encerrado o jogo, desligado o rádio, com alguns ligeiros impropérios e comentários sobre a partida ainda a pairarem na conversa, numa desilusão que os minutos iam diluindo, surgiu de lá de dentro, da cozinha, uma senhora, mulata, muito vistosa, aparentemente a dona da casa, até aí discretamente ausente. Trazia, com um sorriso agradável e um claro alheamento quanto à jornada desportiva que havia mobilizado a sua casa, alguma coisa para jantarmos. Já não recordo o que foi, pelo que não deve ter sido coisa gastronomicamente memorável. A senhora regressou logo à cozinha, não nos acompanhando na mesa. Eram assim as coisas, por ali.

A conversa alargou-se então a outros temas. Aquele núcleo de benfiquistas de Benguela continuava triste pelo desfecho do jogo, mas foram muito simpáticos, mesmo algo cerimoniosos, para com o intruso forasteiro que eu ali estava a ser. O Fernando Coelho, visivelmente muito bem integrado no grupo, do qual resultava ser íntimo, animava a mesa e os espíritos, com a alegria contagiante de homem bom que sempre foi. 

O jantar terminou entretanto e era tempo de regressarmos à residência do Fernando. Agradecendo a amabilidade do acolhimento, despedi-me daqueles meus novos e fugazes conhecimentos e fui caminhando para fora de casa, em direção ao carro do Fernando. Este ficou um pouco para trás. Despedia-se do dono da casa, a quem, num tom de voz baixa mas não deliberadamente audível por mim, ouvi dizer: "É simpático, esse seu amigo. Pena é ser lagarto!"

Eu já tinha contado esta história, no meu blogue, há uma década. Mas achei poder relembrá-la agora que o grande Eriksson morreu e o Benfica acaba de "pôr com dono" um outro treinador, naquilo que é a sina ingrata da única profissão do mundo em que, muitas vezes, o "patrão" ganha bastante menos dos que os mais talentosos "empregados".

domingo, setembro 01, 2024

Memória


A extrema-direita alemã teve alguns fortes ganhos eleitorais. Se acaso um dia vier a chegar ao poder federal pelo voto, não seria a primeira vez que tal aconteceria. Lembro que foi um governo alemão de extrema-direita - e mais ninguém, sublinho - o responsável pelo Holocausto.

Dos meus arquivos que não tenho


Porque é pura verdade, gabo-me sempre de não ter arquivos. Mas guardei papéis, que, em férias, acabo por descobrir nuns caixotes. São coisas soltas, não organizadas. Como creio que acontece a toda a gente, a cada uma dessas "revisões", há uma parte que vai para o lixo e outra que vai ficando. São notas, cartões, escassas cartas pessoais e algumas fotocópias. Algumas são do tempo do liceu, dos dias da rádio, da universidade, da tropa e quase nada do MNE.

Descobri há pouco este requerimento do general Galvão de Melo, de quem eu era assessor na Junta de Salvação Nacional, logo após ele ter saído daquele cargo.

Desarrumação


Hoje, ao arrumar papelada, encontrei uma folha solta com este belo texto. Pareceu-me ser, por uma pinta, do Mário-Henrique Leiria. Era. E lá me transferi eu para o sofá com os livros do homem. As arrumações pararam, claro. Que sina!

Communism


A história das ideias comunistas em Inglaterra é fascinante. Desde logo, pelo facto de Karl Marx lá ter escrito a esmagadora maioria da sua obra e de estar lá sepultado. Mas o fascínio pelo comunismo e pela própria União Soviética tem ali um historial notável. Até pela influência que isso teve no próprio Partido Trabalhista e nas "Trade Unions" que por muito tempo o controlaram.

Mas foi preciso deparar ontem com esta fotografia para constatar que os comunistas britânicos ainda existem. E verifiquei que ainda se publica o "Morning Star", que me lembro de ser um jornal da Grã-Bretanha bem pró-soviético.

Um país livre é isto mesmo.

Abraçada pela árvore


Ontem, deu-me para ir de Vidago a Chaves pela estrada de Loivos. Recordo que, há uns anos e por uns bons meses, havia necessidade de fazer esse percurso, por virtude de obras na EN2. E não é que, sem que alguém mo tivesse dito ou alertado, fui encontrar, à entrada de Loivos, esta expressão estranha da natureza? Uma placa de trânsito, colocada junto a uma árvore, a qual, com a passagem do tempo a "abraçou". Neste tempo em que se torna tão fácil duvidar de tudo, a colocação da fotografia nas redes sociais valeu-me uma série de acusações de "montagem", "fake news" e coisas assim. Pelos vistos, a verdade é muito difícil de vingar.

Essa coisa de viajar...


E não é que Miguel Esteves Cardoso é capaz de estar cheio de razão?

Bolas


Em matéria de futebol, para um sportinguista como eu, este sábado foi um pouco um banho escocês: ganhámos ao terceiro classificado do campeonato do ano passado, o que não foi mau, mas assistimos à saída do treinador do segundo classificado, que tão bom trabalho estava a fazer.

Setembro


... e agora cheira a setembro, como o outono sabe a vinho. (Ary dos Santos)

Bebinca

Ao final da tarde de sexta-feira, numa conversa em viagem entre Coimbra e Lisboa, falou-se de cozinha goesa. Sou pouco conhecedor do assunto...