domingo, outubro 03, 2021

Desagravo da Bordúria


O embaixador Luís Filipe Castro Mendes publicou no Facebook o seguinte texto:

Aos nossos analistas e comentadores internacionais têm escapado completamente os graves conflitos que persistem na fronteira entre a Sildávia e a Bordúria. A paciência de Klow (que sabe que não pode contar com os seus aliados) contrapõe-se a arrogância com que a Bordúria continua a provocar incidentes e a ocupar territórios tradicionalmente sildavos. Francisco Seixas da Costa, de que estás à espera? Até quando esse silêncio cúmplice com o regime dos sucessores de Pleksy-Gladz, que mudaram o Partido Bigodista para Partido Patilhista, sem modificarem os seus métodos autoritários e arbitrários?

Respondi-lhe, naquela mesma prestigiada rede social:

É mesmo muito triste! Tenho uma vida de amizade com Luís Filipe Castro Mendes e nunca dele esperei uma coisa destas! Quando julgamos conhecer uma pessoa e críamos poder ter algumas certezas sobre a sua postura relativamente a grandes temáticas internacionais, somos surpreendidos, de chofre, por uma análise num tom e substância que só podemos qualificar por ligeiro, se não mesmo leviano. Luís Filipe Castro Mendes, ao acusar a Bordúria de atos agressivos contra a Sildávia, prestou-se a ser porta-voz de uma insinuação da maior gravidade. A Bordúria, saiba o embaixador Castro Mendes, é, como sempre foi, um Estado de bem, com uma reputação à prova de bala, como o ilustra o seu magnífico quadro de relações bilaterais, com a óbvia exceção da vizinhança pária que uma geografia madrasta lhe deixou como destino. Ou Luís Filipe Castro Mendes acha que uma entidade internacional com o prestígio da Abcásia, que desde sempre teve uma embaixada em Szohôd, brinca com essas coisas? Que outro país teve a coragem de estabelecer um consulado honorário em Stepanakert, cobrindo também a Transnístria? Quando o Bophuthatswana tentou reconhecimento internacional, foi, por acaso, bater às portas de Klow? É o vais! Que chancelaria foi procurada, como qualificado “honest broker”, dotado de uma diplomacia de fino recorte e provas dadas, para mediar o sangrento conflito entre San Théodoros e Nuevo Rico? Luís Castro Mendes, que firmou um nome na nossa diplomacia, a que seria desejável que se mantivesse fiel, devia evitar ser intoxicado pela nefasta propaganda sildava e, pior do que isso, deveria recusar-se a carrear para um espaço com o rigor e a seriedade do Facebook versões inquinadas de factos incontroversos. Ao que chegámos, meus senhores!

Este texto é ilustrado por uma clássica representação gráfica naïf da cidade de Szohôd, capital da Bordúria.

8 comentários:

carlos cardoso disse...

Gostei!
Num país com embaixadores com este sentido de humor ainda pode haver esperança. Eu diria mesmo mais, num país com embaixadores com este sentido de humor ainda pode haver esperança!

Flor disse...

Naïf ? Ligne Claire! ;)

António Nunes disse...

Alguém foi ver uma exposição na Gulbenkian.

Lúcio Ferro disse...

Protesto, protesto! É inegável que o militarismo Borduro tem de ser travado a todo custo! Os relatórios que chegam do consulado em Barcelona são atrozes! Todos sabemos que os Patilhistas não se ficarão pela Sildávia! É importante travá-los, enquanto ainda podemos. Hoje é a Sildávia, amanhã Portugal e depois o mundo!

Unknown disse...

Pois, senhor embaixador: estou em condicões, indesmentíveis de afirmar que a Sildávia não existe: eu próprio vivi lá.
MB

José Lopes disse...

Donde se prova que Hergé foi um dos génios do século 20. Quem é que não conhece um chato como o Serafim Lampião? uma egocêntrica como a Castafiore? os conflitos nas repúblicas das bananas como descritos em Tintim e os Pícaros? Um rabugento com coração de ouro como o capitão Hadok?
Como diz alguém no expresso desta semana, a propósito, com uma belíssima capa, Tintim é leitura para todos as idades, dos "7 as 77 anos", uma das definições mais felizes para a obra de Hergé.
E parabéns aos dois autores dos inspirados textos.

Eduardo disse...

Nao percebi nada dos textos, mas o do Francisco fez me lembrar algumas cartas que Eça escreveu a Pinheiro Chagas

José Figueiredo disse...

Não podem traduzir essa linguagem de pau?!...
José Figueiredo

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...