Mão amiga, atenta ao meu último post, fez-me chegar a tradução de um telegrama há minutos enviado pelo embaixador da Bordúria em Portugal, dirigido às suas autoridades em Szohôd. Estou em crer que os leitores deste blogue não deixarão de compartilhar a discrição que me foi pedida na sua divulgação:
"De: Embaixada em Lisboa
Para: Ministério das Relações Exteriores
cc: nossa Embaixada em Washington
Guardo em minha posse a carta, chegada nesta mala diplomática, destinada ao chefe da diplomacia portuguesa, na qual Vexa transmitia ao seu homólogo o gosto que tinha tido em com ele trabalhar nos últimos dois anos, recordando, muito em especial, o entusiástico apoio que tem vindo a ser concedido por Lisboa à nossa pretensão de adesão à União Europeia, à NATO, à OMC e à UEFA. Um dia, com certeza, ocasião surgirá para poder entregar essa missiva de despedida.
Contrariamente ao que eu adiantara no meu 23, informação pela qual muito me penitencio, afinal acabou por não ter lugar aqui a anunciada remodelação governativa. (Fica assim sem efeito quanto eu pedira para ser transmitido, com urgência, à nossa embaixada em Washington.) Vexa perdoar-me-á o lapso cometido, mas fui induzido ao equívoco por uma comunicação ao país feita, no passado sábado, pelo chefe deste executivo, que tinha a seu lado o líder do segundo partido da coligação. Reconheço agora que não o deveria ter feito, porque, ao que tudo indica, deixou aqui de aplicar-se a máxima do antigo ditador Oliveira Salazar segundo a qual "em política, o que parece é".
Neste país, que hoje reconheço que tem muito mais de balcânico do que nós, as aparências não só iludem como frequentemente desiludem. Hoje, durante a manhã, num debate sobre o "estado da Nação", o chefe do executivo foi muito elucidativo, ao dizer que "o que aconteceu não devia ter acontecido, mas aconteceu". Veio-me à memória, nesta ocasião, a discussão teológica que, em tempos medievais, se processava em torno da questão sobre se Deus teria o poder de fazer deixar de acontecer o que já tinha acontecido. Depois de anteontem ter ouvido com atenção o chefe de Estado deste estimável país que tão generosamente me acolhe no seu seio, fico com a sensação que tal debate ainda se prolonga por aqui.
a) Kûrvi-Tasch"