Ainda antes do início do século, o então ministro grego dos Negócios Estrangeiros, Georgios Papandreou, organizava anualmente reuniões de reflexão e debate político-económico, para as quais convidava uma pessoa de cada um de cerca de trinta países. Durante vários anos, fui “o” português desse grupo, que reunia na Grécia, cabendo-me introduzir as temáticas europeias da atualidade.
Num desses encontros, um simpático economista, amigo americano de Papandreou, de quem eu não lera mais do que um ou dois artigos no “The New York Times”, fez uma apresentação que me marcou pelo seu brilhantismo. Mas que me deixou muito preocupado. O tema eram os efeitos assimétricos da globalização, quer nos países desenvolvidos, quer nas economias emergentes e em vias de desenvolvimento. Os impactos do fenómeno sobre a diversidade de tecidos económicos, à luz da experiência então já vivida, estavam, naturalmente, no eixo dessa reflexão.
Para um país como Portugal, que atravessava ainda um período de reconversão industrial muito duro, fruto da perda de mercados protegidos, com um aproveitamento das “novas fronteiras” abertas pelo acordos da UE com países terceiros que estava longe de ser compensatório, devido ao nível tecnológico de muita da nossa oferta, os impactos sobre o emprego e a balança exterior continuavam a ser sérios. O diagonóstico do economista americano estava longe de sossegar e, curiosamente, punha em questão a narrativa eufórica sobre o processo de abertura das economias que nos era “vendido” (e, sejamos honestos, imposto) pelo “mantra” oficioso que dominava a máquina de negociação comercial externa da Comissão europeia.
Para muitos dos que estávamos reunidos na Grécia, o debate servia também como útil base para a projeção, que então já se fazia de forma incipiente, sobre os eventuais efeitos da globalização na estabilidade dos modelos de representação política nas democracias ocidentais. Recordo-me, contudo, que, à época, a ideia de que os desequilíbrios provocados nas economias dos Estados-membros da União poderia ter consequências detrimentais na governança global do processo integrador era ainda um tema praticamente arredado do debate.
Voltei a encontrar o amigo americano de Papandreou em Nova Iorque. Ele tinha entretanto ganho o prémio Nobel da Economia e viria a publicar o seu famoso “A Globalização e os seus descontentes”. Organizei em casa um interesante jantar com ele e com Jorge Sampaio. O economista chama-se Joseph Stiglitz. As suas teses são hoje mais do que conhecidas, muito embora ao seu estudo, já com quase duas décadas, ele tenha vindo a aditar variáveis que então só eram intuídas, mas que são hoje bem mais evidentes.
Lembrei-me muito de Siglitz, por estes dias, numa conferência em que participei em Turim, a convite da Fundação Calouste Gulbenkian, sob o tema “Vencedores e derrotados da Globalização”. Foi interessante revisitar as teses tradicionais em confronto, desde os que recusam que possa haver “perdedores” do processo, até aos que, mais ou menos subtilmente, desenham argumentários para limitar a liberdade de circulação dos fatores, por vezes recorrendo a remédios de cariz protecionista, passando também por quantos apenas tentam encontrar mecanismos para atenuar os efeitos mais nefastos da globalização.
A diferença face ao debate, de há quase vinte anos, na Grécia é que, por estes dias, já vemos mais claro, com o euroceticismo e com o Brexit, com a subida da extrema-direita e com fenómenos de rejeição da abertura comercial como o protagonizado por Trump, onde estão e como atuam os “descontentes” da globalização. E onde e em quem votam. Nos nossos debates, a China esteve muito presente, vista cada vez mais como uma ameaça e já sem a aura de “bondade” ou inocuidade que, há uns anos, a conduziu à OMC. Mas também por ali se analisaram os efeitos, nos salários e no emprego, daquilo a que eu chamaria a “globalização de proximidade”, do contributo de algumas economias do Leste europeu para o processo de desequilíbrio dentro da própria União.
Estamos hoje mais conscientes dos problemas com que nos confrontamos, talvez mesmo dos remédios para algumas das disfunções que vivemos, mas julgo poder concluir dos debates a que assisti que, perante o recuo que vivemos no tratamento multilateral do processo de globalização, o indispensável corpo institucional regulatório está hoje diminuído. Isso não é uma boa notícia para os perdedores e só acredita que isto é um jogo de “win-win” quem é ingénuo ou cínico.
7 comentários:
Nunca foi um jogo de win-win e cada vez mais é um jogo de wong-wong.
A ideia, que não me parece tenha surgido antes na historia, que tudo são amizades neste mundo, que as conquistas cientificas de uns têm que ser partilhadas por quaisquer outros, é muito complicada. Pensar que foram sobretudo os americanos quem formou e forma ainda parte dos futuros grandes cientistas chineses é uma coisa que me escapa. Para quê? Qual foi o sentido?
Qual foi o sentido de abrir os mercados à China? umas bribezinhas ao dr Barroso e afins amigos do Luxemburgo, ou o quê?
Para que é que queremos imigrantes? para os ajudar porque no mundo deles a vida é de cão? mas porquê? a culpa é do tozé? ou a culpa dessas grandes assimetrias é do grande capital? porque é que o português(ou outro) tem que aceitar ajudar alguém que nada tem que ver connosco e com os qual não estamos em divida? Para minorar os efeitos da desgraça que o grande capital e a falta de tino fez em paises do terceiro mundo? Ja quase não ha mercearias portuguesas em Lisboa!, não é que os tipos não trabalhem, não é isso que digo, mas fazem-no por quanto? e ao mesmo tempo os preços das casas explodem, e o tuga não tem emprego qualificado vai trabalhar para à pt e afins (enquanto deus nosso senhor e afins protegerem a santa altice..) . Não entendo verdadeiramente esta logica de abertura, que não permitiu aos paises de se desenvolver, so os tornou mais precarios, e além disso vejo chegar uma tonelada de gente com modos de vida bem mais retrogados que os nossos (sobretudo os muçulmanos do bangladesh) que me fazem pensar num Portugal dos anos 30 ou assim impestado de matarruanos estrangeiros que os bem pensantes pensam que naturalmente se vão educar confrontados com o nosso modelo superior de educação... oh yeah...
mais uma guerrinha se faz favor que é para acolhermos mais uns desgraçados deste mundo e ficarmos mais "ricos"...
Abram mais umas lojas de produtos portugueses feitos na China comprados por turistas estrangeiros a empregados estrangeiros... Nada como defender o nosso bom nome... E na rua do benformoso, dos poemas do O'neill que ja portugueses não tem, tem miudas de véu... acolhamos toda a gente, sejamos gente de bem... pois, pois... que as culturas dos outros dissolvem-se nas nossas... sim,sim... perguntem aos arabes emancipados de França como é que eles vêm as redes islamistas e o modo dos europeus lidarem com elas e depois conversamos... Sim porque de certeza que ha portugueses a controlar o que dizem os pequenos salafistas do golfo de bengala que temos por ai (veja-se o peso do Daesh no Bangladesh e afins (até deixo o moderado Fareed Zakaria https://the-journal.com/articles/73602)
Mas viva a paz e o amor entre as nações, que eu vou-me divertir com a prima do Bin Salman ali ao fundo...
Realismo, foi o que disse?
Para acrescentar ao meu comentario de ha pouco
http://www.lefigaro.fr/vox/societe/2017/11/15/31003-20171115ARTFIG00372-zineb-el-rhazoui-les-collaborationnistes-du-fascisme-islamique-sont-nombreux-en-france.php?
E além do mais esta divisão integração imigração cria uma grandissima divisão na esquerda.
Nada como a China e Angola para ver a direita aderir aos de Outubro!... e nada como o Islão para ver a esquerda defender formas de vida medievais, e logo de seguida atacar as sotainas ... que tudo vai bem neste mundo esclarecido...
« Perante o recuo que vivemos no tratamento multilateral do processo de globalização, o indispensável corpo institucional regulatório está hoje diminuído. Isso não é uma boa notícia para os perdedores e só acredita que isto é um jogo de “win-win” quem é ingénuo ou cínico.”
Muito bem visto. A não ser que os perdedores… levantem a cabeça.
Não sei se os dominadores, certos da sua posição de força, do seu arsenal jurídico, e das forças de repressão eventuais, não compreendem a que ponto a revolta surda se faz sentir; a que ponto as classes dominantes e o sistema que sabiamente construíram está desacreditado e por vezes odiado.
Talvez mesmo que esqueceram que a impotência política na qual se encontram as vítimas da globalização triunfante só pode agravar o ressentimento e tornar imprevisíveis as reacções.
As classes dominantes não estariam a ultrapassar as marcas do admissível, da mistificação, e não estariam elas a queimar os seus navios?
Joseph Stiglitz,
Um atrasado mental com um PHD que divulge suas asneiras at Columbia, Ny. E paga he bem por isso. Como fruto dos drogados dos 60 s nao compressede que o Progresso e prosperidade e o resultado de um conjunto de ESFORCOS INDIVIDUAIS , GREED, EGOISMOS .
Quando o Estado se envolve em distribuir a riquesa , aldeia global, o forno collective, vai tudo para o menos.
Exemplos, Cuba,Venezuela, Angola, Zimbabwe......
A China e adnissao para WTO, Tirol o pais da miseria, agora abusam ou violar as regras do comercio e ninguem quer abanar o carro.
Misturas de Estado e privado, roubo de propriedade intellectual , desvalorizacao de moeda, dumping,etc......
OS indigentes intellectuais socialistas portugueses permitirem aos alemaes de pedirem capital a 1 por cento e emprestar a Portugal a 15 e 20, ?......".
Na longa caminhada que foi a que nos conduziu à situação atual sempre vi a política de relações externas a dizer que sim a tudo. Não me lembro de uma ideia ou de uma ação que contrariasse o caminho para o abismo, nada. Aliás, quando colocamos essa atividade no domínio da Estratégia, encontramos alguma coisa? Não me lembro de nada.
Para a "dor em baixa (ao alto, 23h13)", gostaria de recordar, é certo que por excepção: Timor.
Enviar um comentário