O Porto era uma
etapa invariável dos meus Natais de infância. Funcionário público “exilado"
em Vila Real, desde os anos 40, o meu pai rumava com a família para a sua Viana
do Castelo, uns dias antes do Natal. Não tínhamos carro, íamos de comboio.
Primeiro, até à
Régua, pela velha linha do Corgo, com bancos de "sumopau", as faúlhas
da máquina a entrarem-nos pelos olhos. Depois, o Douro ia ali ao lado, mas nós,
nessa época, quase não olhávamos para ele. Via o meu pai preocupado em conferir
ao minuto os atrasos, a tentar perceber se "dava tempo" para chegar a
Campanhã ou se tínhamos de mudar para a linha do Minho em Ermesinde. Era um
rebuliço de bagagens e gentes, nesses períodos de inevitável enchente dos
comboios.
A ceia da Consoada era
passada no casarão da minha avó paterna, no largo Vasco da Gama. Lembro-me claramente
do cheiro do armário de onde se tirava anualmente o presépio, dos carneiros e
músicos fanados pelo uso, do musgo que íamos buscar ao quintal, para colocar
sobre um papel forte, manchado. Com os meus primos, jogava pinhões ao rapa. Era
um tempo ainda sem televisão, com um gira-discos a alegrar, todos à conversa à volta
da minha velha avó e nós, os mais novos, a traquinar pela imensa casa.
No dia 25, depois da "roupa velha", partíamos para o Porto. Levava já prendas, embora, para meu silencioso desconsolo, algumas fossem sempre pacotes de meias, compradas no Eugénio Pinheiro, na Picota. Ficou-me uma imagem do meu pai, no comboio, a ler "O Comércio do Porto" (não era o “Notícias”, desculpem lá!), com as páginas coloridas de motivos natalícios. E da minha mãe entretida com a então famosa "Eva" do Natal, a revista que sorteava uma moradia. Nunca nos "saiu", diga-se, porque toda a sorte que tivemos na vida deu sempre muito trabalho.
A chegada a S. Bento, com fumarada, apitos e uma barulheira que eu achava então o máximo do cosmopolitismo, e que depois lembrei em alguns filmes, era um momento ansiado. Aguardavam-nos outros familiares, com os quais avançávamos, já de carro, para Vila Real. E lá íamos nós pelo Marquês e por Costa Cabral adiante, por Ermesinde (outra vez!), rumo às temíveis curvas do Marão.
No dia 25, depois da "roupa velha", partíamos para o Porto. Levava já prendas, embora, para meu silencioso desconsolo, algumas fossem sempre pacotes de meias, compradas no Eugénio Pinheiro, na Picota. Ficou-me uma imagem do meu pai, no comboio, a ler "O Comércio do Porto" (não era o “Notícias”, desculpem lá!), com as páginas coloridas de motivos natalícios. E da minha mãe entretida com a então famosa "Eva" do Natal, a revista que sorteava uma moradia. Nunca nos "saiu", diga-se, porque toda a sorte que tivemos na vida deu sempre muito trabalho.
A chegada a S. Bento, com fumarada, apitos e uma barulheira que eu achava então o máximo do cosmopolitismo, e que depois lembrei em alguns filmes, era um momento ansiado. Aguardavam-nos outros familiares, com os quais avançávamos, já de carro, para Vila Real. E lá íamos nós pelo Marquês e por Costa Cabral adiante, por Ermesinde (outra vez!), rumo às temíveis curvas do Marão.
A elas nos
abalançávamos depois de um "reforço" em Amarante, no Zé da Calçada, e
da doçaria na Lai-Lai, ao lado. Passada a Pousada e o esperado Alto de Espinho,
onde a curvaria amainava, as luzes de Vila Real, avistadas de Arrabães,
prenunciavam já a outra noite de Natal que aí vinha, desta vez em casa dos meus
avós maternos, com outros tios e outros primos. E com novas prendas, claro!
Tempos felizes!
3 comentários:
Evocação encantadora. Dias felizes!
Outros tempos!
Mas alguma aventura... e a alegria de ser jovem.
Gostei muito desta evocação.
Natais
Consoada
a traquinar
depois da "roupa velha"
silencioso desconsolo,
sempre pacotes de meias
"Eva" do Natal
deu sempre muito trabalho
novas prendas
temíveis curvas do Marão
Tempos felizes!
Pousada
claro!
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