quarta-feira, junho 02, 2010

Rosa Coutinho (1926-2010)

Há figuras a que a História associa sempre a polémica. O almirante Rosa Coutinho, que agora desapareceu, era uma dessas figuras.

Rosa Coutinho era uma personalidade desconhecida do país quando, na noite de 25 de Abril de 1974, apareceu na televisão como um dos membros da Junta de Salvação Nacional. Recordo-me da curiosidade com que, nessa noite, nos estúdios da RTP, os oficiais milicianos que, como eu, se encontravam atrás das câmaras, olhavam essa figura sorridente, calva e calma, que a Marinha tinha escolhido como um dos seus dois representantes.

Vim a conhecê-lo pessoalmente mais tarde, nos corredores da Junta, onde eu exercia funções de assessor. Era uma pessoa muito cordial e agradável no trato. Com a crise que sobreveio no governo-geral de Angola, logo em Agosto de 1974, Rosa Coutinho seguiu para Luanda, para substituir o general Silvino Silvério Marques. Rapidamente a sua ação passou a ser contestada por setores portugueses locais, que colaram as suas opções de governo à estratégia do MPLA, considerando-o, em muitas dessas denúncias, como uma figura próxima dos comunistas portugueses.

No ano seguinte, em 11 de Março, depois da tentativa de golpe militar de António de Spínola, recordo bem uma cena tensa que se passou no Palácio de Belém, ao princípio da noite, durante a qual Rosa Coutinho apoiou a realização da famosa "assembleia selvagem" do MFA. Na longa madrugada que se seguiria, devo reconhecer que o almirante foi das vozes mais serenas, tendo então adiantado uma explicação para a aventura spinolista, que cito de memória: "Sabíamos que estavam a preparar qualquer coisa, assustaram-se e nós ficámos à espera que saltassem. E eles saltaram". Muito do que foi o 11 de Março pode aqui encontrar uma explicação. Mais tarde, em 25 de Novembro, dizem-me que terá tido um papel apaziguador e atenuador de tensões, se bem que não fizesse segredo do lado para o qual o seu coração pendia.

Desde sempre que a internet e as caixas informáticas de comentários dos jornais estão cheias de comentários insultuosos sobre Rosa Coutinho, talvez a personalidade mais vilipendiada de todas quantos intervieram no processo de descolonização. Com efeito, ele terá sido a principal "bête noire" de quantos sairam de África, num registo de tragédia, durante esse período. Só a História poderá julgar, com serenidade, o papel do almirante Rosa Coutinho em todo o processo do 25 de Abril.

27 comentários:

Anónimo disse...

Recordo-me ainda hoje de uma frase dele (publicada em alguns jornais da época), naquele período complicado algum tempo depois do 25 de Novembro, creio que lá pelo verão de 76, se a memória não me falha, a propósito de uma crítica forte que Sá Carneiro lhe tinha feito: “os frangos depeno-os à mão!”. O Almirante, com aquele ar imperturbável e sempre com aquele sorriso na boca, era por vezes capaz de uma causticidade inesperada. Na verdade, talvez pela sua (suposta) proximidade ao PCP daqueles tempos (com Álvaro Cunhal então como seu SG), ao que dizia, bem como aquilo que aqui se refere no Post sobre a sua actuação na Angola pré-independência, foi uma pessoa politicamente pouco grata para um largo número de portugueses. Concordo que nada melhor do que a distância da História para se fazer uma avaliação serena e imparcial da sua actuação, designadamente no processo revolucionário de Abril. Eu próprio reconheço-o, tenho ainda hoje uma certa desconfiança em relação a Rosa Coutinho. Se calhar sem fundamento. Ou se calhar com. Talvez quando passarem 50 anos após o 25 de Abril se esteja em melhor posição para avaliar os principais responsáveis e intervenientes naquele processo de libertação da Ditadura salazarista e se fique com uma ideia mais exacta e menos emocional de cada um, Rosa Coutinho incluído.
O que é curioso é que, passados 36 anos sobre o 25 de Abril, a figura do Almirante estava, há muito, afastada dos nossos pensamentos. E creio bem que algum do ódio que suscitou em determinados sectores políticos da ocasião, se terá entretanto igualmente esbatido, ficando apenas uma profunda antipatia, que não tem, convenhamos, a mesma carga emocional que o ódio.
Não sabia do seu desaparecimento.
P.Rufino

Anónimo disse...

Senhor Embaixador,

Creio que, à excepção dos sectores comunistas, o almirante RC dificilmente escapará à condenação da História como o homem que entregou Angola ao MPLA, sem cuidar (segundo alguns, mesmo desprezando) os interesses dos angolanos e dos portugueses que lá viviam. Não esqueça que, por muito tempo que decorra, figuras como Hitler ou Estaline nunca terão um juízo positivo da História, excepto nas franjas marginais que os admiram.

ipf.ammorais@ipf.pt disse...

Caro Anônimo

Um Homem ( ou mulher) que tem uma opinião IDENTIFICA-SE , sejam quais for as consequências.

Não vou comentar as suas linhas, repassadas de ódio, de erros históricos, e de, principalmente de falta de análise e posição pessoal.

Acho que o povo português já devia estar cansado de se esconder atrás de arautos de "verdades/mentiras?", que se escudam em nome de uma Historia (escrita com H grande mas que afinal é um h ínfimo...)sem a estudar, analisar , explicar ou , minimamente, saber entender esses meandros de "estórias" que fazem a a História.
Lamento, por todos nós, que estejamos a chegar a este nível ... mea culpa , também .

Um homem do 25 de Abril. Com cara , corpo e nome

António Manuel Morais

Helena Sacadura Cabral disse...

Senhor Embaixador
A sua/minha memótia de elefante tem destas vantagens. Conhecemos muita gente e não a esquecemos.
Julgo que se fala mais de Rosa Coutinho - não digo melhor - do que do outro representante da Marinha, homem de grande craveira que tive a sorte de conhecer através da Natália Correia. É pena.
Porque merecia não ser esquecido!

Unknown disse...

Ai que o 11 de março e o 11 de setembro ... Baralham.

Uma vida Cumprida!

V disse...

Quanto ao 25 de Novembro:

Não estive lá, mas por razões profissionais soube depois, de ciência certa, que Rosa Coutinho teve, com Martins Guerreiro, um papel decisivo na submissão dos fuzileiros do Alfeite, na noite 25/26, às ordens do PR, Gen. Costa Gomes.
As notícias que a contra-informação fazia então chegar ao Alfeite era a de que os Comandos da Amadora matavam a torto e a direito nas ruas de Lisboa e particularmente em Belém.
Tendo caído nessa armadilha, os fuzileiros estavam prestes a marchar sobre Belém, armados até aos dentes, para enfrentar os Comandos de Jaime Neves. Teria sido uma tragédia e provavelmente a guerra civil que Carlucci e os nesse momento "refugiados" no Porto haviam planeado.
Só a autoridade de Rosa Coutinho e Martins Guerreiro e a coragem com que enfrentaram uma tumultuosa assembleia de militares e civis sedentos de vingança evitaram, estou convencido, uma catástofre.
Estes factos estão profusamente documentados num processo-crime que, se não foi destruido, está nos arquivos do EMGFA.
V

Anónimo disse...

Referia-me, no comentário que fiz, a Vitor Crespo.

Helena Sacadura Cabral

Anónimo disse...

A História já julgou Rosa Coutinho. E deu-lhe um grande lugar. Não é preciso esperar mais tempo. Um lugar donde não sairá!
Outros é que vão precisar de tempo para se perceber melhor por que razão os puseram na história a ocupar lugares que não merecem.
CP

V disse...

Post Scriptum

Onde escrevo não posso consultar documentos, mas penso ter cometido um lapso. Quem acompanhava Rosa Coutinho na noite de 25/26 de Novembro era quase seguramente Almada Contreiras e não Martins Guerreiro.
É um mero pormenor que a consulta de qualquer livro, mesmo dos que falsificam o que então se passou, esclarece facilmente. Eu é que, neste momento, nem os livros tenho à mão.
V

Francisco Seixas da Costa disse...

Estava certo V: era Martins Guerreiro e nao Almada Contreiras.

D disse...

Obrigado, Caro Embaixador!
A idade começa a não perdoar. Ainda se fosse só a memória ...
V

V disse...

Até já troco o V pelo D.
V

ié-ié disse...

Almada Contreiras estava no COPCON. Fui disso testemunha. Ao telefone, desesperadamente, tentava a adesão dos fuzileiros. A única coisa que conseguiu foi uma força para a defesa do Forte do Alto do Duque.

Luís Pinheiro de Almeida

Anónimo disse...

Estava a ser um grande surpresa para mim o facto de não ter ainda aparecido a famosa "carta" de Rosa Coutinho a Agostinho Neto. Chegou hoje ao blogue, pela mão anónima de um corajoso comentarista.

Trata-se de um "documento" a que, um dia, o professor António Barreto deu inadvertidamente foros de credibilidade num seu texto, para, dias mais tarde, ter constatado - e denunciado - como tratando-se de um texto grosseiramente forjado. O tal "documento" é, aliás, de um primarismo quase pueril, mas naturalmente que, a partir da sua publicação nuns "sites" de ódio que por aí pululam, foi aproveitado por quem tem uma agenda política contra o almirante Rosa Coutinho.

Que fique claro: não se trata aqui de defender ou apoiar o antigo membro da Junta de Salvação Nacional, neste tempo da sua desaparição física. Cada um pode pensar de Rosa Coutinho o que muito bem entender: alguns odeiam-no, outros acham-no excelente. O que ninguém tem o direito é utilizar o anonimato para insídias assentes em mentiras. Para isso, devem usar os tais veículos informáticos que se alimentam do insulto e do ódio. E que lhes faça bom proveito!

Francisco Seixas da Costa

ernesto a. costa disse...

Meu caro,
Você cometeu um erro quando afirma: Muito do que foi o 11 de Setembro pode aqui encontrar uma explicação." Era bom que clarificasse o que quer dizer com isto, pois o leitor fica confundido. Está-se a referir ao 11 de Março, creio eu.
O mínimo que se pode dizer é que Rosa Coutinho é indubitavelmente uma figura controversa da nossa história contemporânea e, sem sombra para quaisquer dúvidas, um dos principais responsáveis (mas, obviamente, não o único) pelo processo de descolonização de Angola e, concomitantemente, pelo desvio "revolucionário", tão ao gosto da época, que está na razão directa do que por lá se passou e pela guerra civil que se arrastou por 25 anos. O mínimo que se pode dizer é que Rosa Coutinho foi uma figura politicamente comprometida com uma determinada facção que só emergiu e triunfou pela força que ele próprio lhe outorgou. Mas seremos nós, que vivemos tudo isso, testemunhas vivas desses tempos, que podemos objectivamente fazer a história? Seremos nós, aqui e agora, os grandes analistas da história contemporânea, faltando-nos o distanciamento, a circunspecção e a frieza de espírito para, de uma forma proba, imparcial e honesta, o fazermos?
Acho mal, Francisco Seixas da Costa, que mencione o assunto da maneira em que o fez. O caso não mereceria mais que uma nota de roda-pé. Morreu. Está bem morto. Enterre-se. Ponto final.

Marcos Pinto Basto disse...

A tal revolução dos cravos tem pormenores desconhecidos da grande maioria dos portugueses. Faltam livros com as memórias de participantes ativos no tal conselho da revolução. Mário Soares, já velho e cansado, não tem folêgo para contar o que sabe, no modo dele.
Rosa Coutinho virou um comunista de mão cheia, logo na marinha.
Recordo muito bem que os combates selvagens entre MPLA,FNLA e UNITA, multiplicaram-se depois que ele foi para Angola como representante do comando da revolução. Sequer recebia os aflitos cidadãos que lhe iam pedir proteção contra os numerosos tiroteios e bombardeamentos dentro da cidade de Luanda. A carta que publicaram como sendo de sua autoria é muito duvidosa, embora seu teor retrate muito bem como ele procedeu em Angola.
Sei que tinha uma aversão muito grande ao FNLA e ao Congo/Kinshaza porque certa vez a lancha que comandava foi aprisionada em águas daquele país. Uma história muito falha de pormenores.
Está morto e para onde foi, não existem promoções nem revoluções, mas a história nunca lhe dará lugar digno porque cometeu grande omissão criminosa em relação aos cidadãos que viviam em Angola como sua pátria, muito embora milhares deles tivessem nascido na metrópole.

Francisco Seixas da Costa disse...

Caro Niagara: está já provado que esse "documento", surgido na África do Sul em circunstâncias conhecidas, foi forjado e é falso. António Barreto, que inadvertidamente a ele se referiu um dia, já clarificou isso. Por isso, não o republico.

Gil Menezes disse...

Embora os líricos estejam à espera de algum conto que lhes ampare a alma, a verdade diz que este Rosa Coutinho foi um dos principais responsáveis por uma guerra civil que ceifou a vida de uma milhão de pessoas. A sua parcialidade escandalosa, a sua cegueira pró-comunista, a sua incompetência na previsão de cenários fê-lo ser um dos que entrou no jogo para o viciar.

Rita Graça disse...

Claro que é uma falsificação! É tudo falso! Os gulagues também eram\são falsos (Coreia do Norte, essa grande "democracia"). A verdade é que a seguir ao golpe de estado de 1974, os negros começaram a matar brancos. Coincidência? Quando os Brancos pediram ajuda, sabém o que esse facínora disse? "É tudo boatos". Coincidências? Eu vivi em Angola e vcs?

Correia da Silva disse...

Conheci este "militar" em Cabinda, após uma semana dos ataques a Massabi/Sala Bendje.
De operacional NADA se vislumbrava, na Dona Rosa(como era conhecido no meio militar).
Correia da Silva
Fur.Mil.Bat.Caç.4913

Correia da Silva disse...

Bardamerda para os ANÓNIMOS!
Porque não se assumem?
Cambada de cobardolas mentecaptos!
Falam de barriga cheia!!!!!!!!

Unknown disse...

Relativamente ao Sr. Correia da Silva (em Portugal não deve haver mais nenhum...) que manda à bardamerda os anónimos apenas lhe poderei deixar aqui dois ensinamentos:
O insulto é sempre a fuga para a frente dos covardes;
Não se consegue nem apagar nem reescrever a História.
Quer o Sr. Correia da Silva queira, quer o Sr. Correia da Silva não queira a guerra civil em Angola existiu e há responsáveis.
Joaquim REgo

Correia da Silva disse...

O lápis azul também se encontra aqui instalado!!!!!!

Correia da Silva disse...

Relativamente ao Senhor REgo( este sim, único e mui sui generis em Portugal), lembro o seguinte:
Correia da Silva/ Batalhão de Caçadores 4913, só existe um, identificado para todos os CAMARADAS (sem conotação política) D'ARMAS, bem como para o S.I.S, S.I.E.D. , M.D.N., Governo, E.M.G.F.A. , Liga dos Combatentes, e afins!!!!!!"
Não estou camuflado em nenhum pseudónimo!
Vª.Exa.Senhor REgo, tenha a ombridade de se assumir , e indicar o seu verdadeiro "curriculum", militar,e/ou civil.
Patrióticos cumprimentos.

Correia da Silva disse...

Hombridade , queria dizer .

Correia da Silva disse...

Post scriptum(comentário anterior).
EU SERVI A PÁTRIA.
O Senhor REgo deve pertencer à élite de VIP'S que se serviram(servem) da Pátria!!!!!!!!!

Correia da Silva disse...

Caríssima Dra. Helena Sacadura Cabral

Rosa Coutinho não serviu na Marinha , mas sim na ARMADA PORTUGUESA.
( a diferença é abismal )

Cordiais e Patrióticos cumprimentos.

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