domingo, maio 11, 2025

Um jogo de habilidades

Zelensky tinha sido hábil ao colar-se a um cessar-fogo que, nos moldes em que foi avançado, ele sabia que Putin nunca poderia aceitar. Com efeito, dar o seu acordo a uma suspensão de hostilidades sem ter garantida a cessação do fornecimento de armamento ocidental à Ucrânia seria um gesto suicida por parte de Moscovo. No final desse período, a Ucrânia estaria muito melhor equipada e a Rússia teria perdido toda a dinâmica ofensiva dos últimos meses, levada a cabo com fortes custos. Além disso, os aliados europeus da Ucrânia poderiam sentir-se tentados a levar à prática, ainda durante esse período, a sua intenção de colocar tropas no terreno ucraniano. Se isso acontecesse, e com as mãos atadas pelo cessar-fogo, a Rússia não teria condições para reagir a esse rápido desequilíbrio do poder militar ucraniano.

Mas Putin tem uma imensa preocupação: a absoluta necessidade de não dar um qualquer passo que possa alienar a boa vontade de Trump. O presidente americano, que acabou por perceber que afinal pôr termo à guerra não é uma coisa tão simples como pensava, por sua vez, tem também um crescente problema: não pode ser visto a arrastar os pés por muito mais tempo, sob pena de isso afetar a sua imagem de decisor-mor do mundo. Trump precisa de resultados e já dava sinais de começar a achar que Putin podia estar a tentar enganá-lo, prolongando as coisas para ter mais ganhos no terreno. À sua volta, parece haver gente a tentar convencê-lo disso.

Em face de tudo isto, a proposta de Putin de iniciar negociações a 15 de maio, na Turquia, parece ser uma escapatória bastante hábil. Com ela, pode dizer a Trump: não aceitamos o cessar-fogo nos termos propostos mas estamos de acordo para nos sentarmos já à mesa com a Ucrânia. 

A bola passou assim para o lado de Zelensky? Não é totalmente evidente, porque isso só seria assim se o presidente ucraniano deixasse cair a proposta de cessar-fogo. Zelensky pode vir a dizer que uma coisa não é incompatível com a outra, pelo contrário, até pode ser complementar: parar as hostilidades e começar negociar. Soa bem, não soa? Soa, mas, repito, a Rússia não pode aceitar esse cessar-fogo. Só se Putin fosse louco e já provou que não é.

Agora volta ao jogo Trump. Como olhará para a proposta russa? Deixará cair o cessar-fogo? As próximas horas dar-nos-ão a resposta. 

13 comentários:

Nuno Miguel Viveiros Pereira Dias disse...

A Rússia está aberta ao diálogo com a Ucrânia desde o primeiro dia da guerra, não há portanto aqui nada de novo. Os objectivos russos continuam a ser os mesmos, a saber: a desmilitarização da Ucrânia, a desnazificação da Ucrânia e o reconhecimento dos territórios capturados/reconquistados pela Rússia como sendo parte integral do território russo. A guerra não acaba sem que estes três objectivos principais sejam atingidos.

josé ricardo disse...

Aqui vai um palpite deste humilde especialista na arte das guerras: Trump vai aplaudir a proposta de Putin e encostar Zelensky (e os nossos extraordinários belicosos líderes europeus) à parede. E, no fundo, é isso que Putin está a fazer. Uma proposta para uma negociaçao "séria" (talvez a palavra mais importante nesta proposta) direta com o adversário terá sempre de ter resposta. O interessante é que não conseguimos imaginar Zelensky a responder autonomamente a esta proposta da Rússia, pois o presidente ucraniano esteve sempre, do princípio ao fim, manietado pelos seus fervorosos apoiantes anti-Putin e anti-Rússia. Neste sentido, a escolha da Turquia tem um significado óbvio: foi neste país que se iniciaram, em 2022, as primeiras negociações, que os aliados de Zelensky (Johnson, Biden...) conseguiram convencê-lo a "rasgar".

Anónimo disse...

Nada se alterou. A Ucrânia há semanas que anda a dizer: "cessar-fogo primeiro, negociações depois". E a Rússia há semanas que anda a dizer: "negociações primeiro, cessar-fogo (possivelmente) depois". Aquilo que é preciso saber é quem cederá primeiro.

Anónimo disse...

Nuno Pereira Dias diz a verdade: a Rússia sempre disse estar pronta a negociar, desde o primeiro dia da guerra. Foi a Ucrânia quem interrompeu as negociações que tiveram lugar em 2022 e quem, ainda em 2022, proibiu por lei qualquer político ucraniano de negociar com a Rússia enquanto Putin estiver no poder. Logo, se houver agora negociações, isso representará uma vitória para a Rússia e uma perda de face para a Ucrânia.

Lúcio Ferro disse...

O zelérias já deu lhe deu razão, Seixas da Costa, é previsível, o duende verde. Claro que isso não adianta nada, querem o zelérias e a coligação dos falhados trinta dias para rearmar, reorganizar e até pôr a famosa força anglo-francesa no terreno, são uns simples, se julgam que os outros vão nisso, é o que é. Entretanto, vieram e foram com um ultimato vazio. Mais ajuda militar? Com que armas? Mais sanções? A quê? Não, parece-me que a guerra está para durar. Zelérias sabe que lhe limpam o sebo se aceitar mesmo uma versão reduzida das condições Russas, quer um cessar fogo porque vê o chão a fugir no campo de batalha e a coligação dos falhados recusa-se a admitir perder a face, antes lutar até ao último ucraniano. Trump, no meio disto, não sei o que possa fazer, continuar a fornecer armas, satélites, etc? É possível, também não era isso que sempre fez o antecessor? A guerra corre bem aos Russos e no verão tudo indica que irá correr ainda melhor. Duvido muito que algo se altere.

Anónimo disse...

O que não percebo é a posição dos “líderes europeus”. Reunidos em Kiev, “avisam” a Rússia para aceitar o cessar-fogo, isto é, parar os ataques, tal como “exigem” desde o primeiro dia da invasão.
Ora, se nada negociaram com a Rússia, como podem “exigir” que Moscovo aceite o nada que esses “líderes europeus” lhe oferecem?
Já agora, o que será que os mesmos líderes europeus têm a exigir ao Governo de Israel? Que pare com o genocídio? Ou que o acelere?
J. Carvalho

Paulo Guerra disse...


Nesta fase já deviamos estar preocupados é com o que os "líderes europeus" vão exigir de nós! Totalmente manietados pela oligarquia financeira desde a falencia dos maiores bancos europeus provocada pelo crash do subprime nos US, que os contribuintes europeus foram obrigados a resgatar, com o cinto no ultimo buraco. Não detivessem eles também as agências de rating que determinam os juros das dívidas soberanas. E sem investimento público há mais de 20 anos e com o modelo economico alemão completamente esgotado, sem hipóptese de continuar a alimentar a piramide de Ponzi do defice americano ou competir economicamente com a China, a carta para cortar no modelo social europeu deve estar a chegar. Se é que ainda não chegou.

Parece que os alemães já começaram a converter algumas fábricas da VW em fábricas de armamento e depois de Hitler, todos nos deviamos lembrar onde conduz este “modelo económico” sustentado na indústria de armamento. Quando os armazens de munições voltarem a estar cheios é só começar a programar guerras. À semelhança das últimas decadas dos US. Finalmente enterramos definitivamente o pico da nossa civilização na Europa. Com o Keynesianismo militar de que Keynes - com toda a certeza – nem queria ouvir falar. Tal é o embuste de Bruxelas. Infelizmente a Russia também não concordou com os misseis dos US cada vez mais perto da sua fronteira e a NATO na UA. Muito menos com as Cimeiras na Europa para dividir a Russia e facilitar o acesso aos seus recursos naturais.

Anónimo disse...

J. Carvalho, bem observado. A política dos líderes europeus, e de Zelenski, é sempre a mesma: exigir tudo da Rússia e nada dar em troca. Só querem a rendição incondicional da Rússia. Não aceitam oferecer nada, absolutamente nada, em troca. Querem tudo e não dão nada.

Anónimo disse...

Enquanto a Ucrânia se afunda no desastre das perdas humanas e territoriais, da dependência e entrega da sua soberania vamos ouvindo por cá comentadores cantando vitórias ucranianas e medos russos. Não lhes interessam os ucranianos. Interessa é desfiar uma ladainha para salvar a sua face e os argumentos que vêm vendendo.

Anónimo disse...

O Putin está entalado. Não está em condições de aceitar nenhuma das propostas, nem o cessar fogo nem o encontro com Zelensky. Acho que vai ficar com a careca à mostra. E este Papa não vai ajudar nada.

Lúcio Ferro disse...

Patético. Este zelérias deve julgar que está no pátio do recreio da escolinha: anda cá pá, anda cá, mas primeiro larga o canivete, a flobber e o resto, anda cá se és homem, oubiste?!?. E ainda há gente que o leve a sério.

Anónimo disse...

Como resulta à evidência, o Zelensky, em matéria de hombridade, dá quinje a jero ao Putin, no recreio e fora dele.

Paulo Guerra disse...

Exacto. Nnguém se preocupa menos com a vida dos ucranianos e com os direitos humanos dos que são apanhados nas ruas e enviados como carne de canhão para o front todos os dias na maravilhosa democracia ucraniana. Muito menos com mais um golpe de estado da CIA e tudo o que foi entretanto revelado pela própria imprensa americana sobre a proxy war. Idem com os pobres palestinos. Porque só estão interessados em defender e combater algo e um mundo que já nem sequer existe.

E pior, não fazem a minima ideia onde está a Europa hoje. Porque já não é só a UE, totalmente dividida entre o norte e o sul, o leste e o oeste, que é totalmente irrelevante na actual conjuntura geopolitica, é a Europa - a viver definitivamente no passado. Sem energia, com um atraso tecnologico brutal, sem verdadeiros lideres politicos e agora sem os principais mercados, por razões diferentes, etc. Um autêntico desastre, infelizmente!

A mim também me custa a acreditar porque no fim do dia, a crise financeira também foi uma oportunidade perdida. Mas ainda vai aparecer algum génio a defender o turismo como a melhor solução - do 3º mundo - para 500 Milhões de europeus. Como em Portugal. Porque o maior problema da Europa hoje é que ninguém a defende e basta pensar como Biden ainda há pouco tempo impôs a Bruxelas uma série de medidas que só enfraqueceram ainda mais a economia europeia e o futuro dos europeus. Como o “decoupling China” e neste ponto hoje até apetece rir. Ou chorar, infelizmente. Absolutamente inacreditável. Um continente que foi o farol do mundo durante tanto tempo, hoje liderado por autênticos fantoches. Para dizer o mínimo.

Estão bem um para o outro

A História guarda algumas pérolas. A mensagem do SG na NATO para Trump merece uma tese de doutoramento em sabujice. Mas, aqui entre nós, a d...