segunda-feira, maio 12, 2025

Ucrânia ("à suivre")

1. A Rússia ignorou a iniciativa de cessar-fogo e propôs um encontro bilateral com a Ucrânia na Turquia, na quinta-feira. Na ocasião, não ficou claro se seria apenas um face-a-face ou se incluiria um mediador, neste caso a Turquia. A Rússia parece não querer perder o simbolismo de regressar à mesma mesa de onde a Ucrânia saiu, por pressão ocidental, quando estava prestes a assinar um acordo que equivaleria à sua parcial rendição, ainda em 2022. Na altura, com mediação turca, recorde-se.

2. Trump reagiu: "President Putin of Russia doesn't want to have a Cease Fire Agreement with Ukraine, but rather wants to meet on Thursday, in Turkey, to negotiate a possible end to the BLOODBATH. Ukraine should agree to this, IMMEDIATELY. At least they will be able to determine whether or not a deal is possible, and if it is not, European leaders, and the U.S., will know where everything stands, and can proceed accordingly! I'm starting to doubt that Ukraine will make a deal with Putin, who's too busy celebrating the Victory of World War ll, which could not have been won (not even close!) without the United States of America. HAVE THE MEETING, NOW!!!"

3. Este "tweet" de Trump (e, provavelmente, algo mais, em termos de pressão de Washington e dos "minders" europeus da Ucrânia), levou Zelensky a anunciar estar disposto a reunir-se pessoalmente com Putin em Istambul, sabendo perfeitamente que o líder russo nunca poderia estar disponível para isso - não era a um encontro de presidentes que Putin se referia. É curioso que parece estar ainda em vigor uma lei ucraniana que, em princípio, impede Zelensky de se encontrar com Putin, mas foi ignorada. A jogada de Zelensky é interessante, fazendo regressar a bola ao campo russo. Se Putin não for, e com toda a certeza não vai, a Istambul, abre-se a caixa de Pandora anunciada no "tweet" de Trump.

4. Note-se a ironia de Trump no "tweet", ao referir que Putin esteve "demasiado ocupado" nas celebrações do 9 de Maio - com uma "bicada" histórica suplementar sobre o papel dos EUA na Segunda guerra mundial. O tom de Trump face à Rússia está claramente a mudar. O efeito nisto do acordo assinado com Kiev sobre as "terras raras" é muito evidente e a "cimeira" comemorativa em Moscovo não lhe foi indiferente e deve ter soado aos seus ouvidos como um evento irritante. Se a isso se somar a luz verde entretanto dada ao envio de mais material militar para a Ucrânia, parece estar criado um "mood" em Washington cada vez menos simpático para Putin. Veremos agora como o presidente americano vai reagir à, mais do que provável, recusa de Putin de ir a Istambul.

5. O que mudou na atitude americana face à questão ucraniana? No início, havia a ideia de que Trump faria um "diktat" à Ucrânia, anunciando o congelamento da ajuda militar e impondo-lhe a aceitação de uma derrota (parcial) face à Rússia: perda de território (desde logo, a Crimeia), impossibilidade de entrada na NATO, eleições internas (com afastamento de Zelensky). Era o Trump "fazedor de paz"... em 48 horas. Putin esfregava as mãos de contente. Lentamente - porque foi algo lentamente - as coisas foram mudando. O efeito da imagem "Trump-está-no-bolso-de-Putin" deve ter-se começado a sentir naquele ego sem limite, tanto mais que o tempo de Moscovo era muito mais lento do que os sucessos rápidos que o presidente americano queria obter para dourar a sua imagem pública. A Zelensky, depois de o humilhar, Trump comprou o subsolo a preço de saldos. Com Putin, passou agora à fase do encosto à parede, com a cena do cessar-fogo a servir de pretexto. Não fosse isto trágico e teria a sua graça como jogo. É que não é evidente o "script" para as cenas dos próximos capítulos.

12 comentários:

Carlos Antunes disse...

Como sempre uma análise lúcida e equilibrada por parte do Senhor Embaixador que examina a situação das negociações entre a Ucrânia e a Rússia, com clareza e objectividade, considerando as diferentes perspectivas (Trump, Putin e Zelensky) e evitando a formação de conclusões precipitadas ou baseadas em emoções, como é habitual dos comentadores russófonos deste blogue, que não escondem a sua veneração com o regime autocrático e ditatorial de Putin!

Anónimo disse...

A questão é que todas as análises feitas à deriva nas televisões têm por bases premissas muito simplistas. Nem Putin é tolo, nem Trump é tolo. Consequentemente, nem Trump alterou o seu posicionamento porque Zelensky o bajulou, nem Putin o fez porque outros o atacaram. As coisas são mais sérias do que isto. E a seriedade reside no seguinte: há 3 anos, podia-se ter resolvido esta guerra, precisamente na Turquia, sem mortos, sem feridos, com dignidade. Hoje, 500 mil mortos depois, volta-se, aparentemente, ao lugar onde estavam. Com uma ligeira diferença: o mundo está pior, mas a Ucrânia consegue ainda estar mais.

Anónimo disse...

E como é habitual, e contrariamente aos supostos comentadores russófonos, neste e noutros blogs, os comentadores supostamente não russófonos, são perfeitamente lúcidos e isentos e nada hipócritas.
Aliás, na linha das supremas entidades que gerem a UE.

Anónimo disse...

Este Post deixou-me algumas interrogações (to say the least). Por exemplo, nunca houve uma proposta de iniciativa de cessar fogo - mas, um ultimato. Da co-autoria de uns tantos trastes belicistas, figuras menores e patéticas desta Europa decadente e fragilizada, como o Neoliberal Macron (o mesmo que recebeu de braços abertos o terrorista e degolador de cabeças, actual líder da Síria, que, até há pouco tempo tinha a cabeça a prémio pelos EUA, pela quantia de 10 milhões de USD e que se prestou a ir a Paris de fato e gravata, com vista a dar aquele ar civilizado para com as mentes conspurcadas ocidentais), o patético PM britânico, Starmer, o ex-agente e funcionário da Black Rock, o recém nomeado Chanceler alemão (que gostaria de ter armas nucleares, um dia, em território alemão – Deus nos livre de tal!) e essa figura histriónica que é o PM polaco. Naturalmente e compreensivelmente, Putin rejeitou semelhante ultimato. Aquilo que se desenhava em Istambul não era uma proposta de rendição parcial, mas, tão só a realidade dos factos. Seja como for, nunca chegou a saber-se como teriam terminado essas negociações, dado que o corrupto do Zelensky acabou, por pressão da Nato/UE de ter de abandonar as negociações. Quanto ao que Trump refere, não passa de um conjunto de imbecilidades e ignorância do que em boa verdade sucedeu durante a II Guerra Mundial. A então URSS perdeu cerca de 27 milhões de pessoas, entre civis e militares por ocasião da ofensiva Nazi e do contra ataque Soviético, ao ter de expulsar a canalha Nazi de solo Soviético.
Não foram, nunca, os EUA que salvaram a então URS (Rússia), mas eles próprios, pela sua coragem, perseverança e capacidade militar. Foram os Soviéticos que primeiro chegaram a Berlim e foram libertando os territórios e países por onde foram passando as suas tropas. E foi por essa razão que Adolf Hitler tomou a decisão de se suicidar, caso contrário cairia nas mãos dos Soviéticos.
Quanto às conclusões finais deste Post, respeito-as, embora faça outra leitura. Putin nunca deixará de manter as suas reivindicações, que são, sobejamente, conhecidas. Ou seja, 1) a Crimeia é território russo, 2) a Ucrânia nunca deverá fazer parte da Nato, 3) e os territórios conquistados (com vista à protecção das minorias russas ali a viver, que são a esmagadora maioria e foram objecto de sevícias e assassinatos no passado recente, por parte das forças armadas ucranianas, pro-nazis, ou seja, em particular do grupo Azov) deverão fazer parte da Rússia. Zelensky, ao aceitar ir a Istambul, não faz mais do que re-confirmar aquilo que todos já perceberam, ou seja, Zelensky é hoje tão só um boneco nas mãos de uns tantos trastes europeus e de Trump (como já era de Biden). O que implica a continuação do sacrifício do seu povo e dos seus militares. E, deste modo, com mais um impasse, o conflito vai perpectuar-se, com mais sangue, perante o gáudio europeu (e provavelmente dos EUA) e a indiferença de Zelensky. Entretanto, a uns milhares de klm da Ucrânia, um genocídio a céu aberto, diário, em Gaza, mantêm-se, perante as almas indiferentes, hipócritas e cínicas, da mesma Europa que verte lágrimas pela Ucrânia. Putin, fará muito bem em não ceder perante provocações e ultimatos. Quanto às sanções, curiosamente, de algum modo acabaram por servir de incentivo para que a economia russa se reforçasse e, até, se reinventasse. Esta Europa que apoia e acolhe o terrorista e actual líder da Síria e encolhe os ombros perante a carnificina em Gaza, merece-me o mais profundo desprezo. Em Istambul, Zelensky ou sairá humilhado, ou com uma mão cheia de nada. E os líderes (uns trastes) europeus de quem ele depende terão, uma vez mais, de adiar o alucinante projecto de enviarem tropas suas para solo ucraniano. E assim vai indo a Ucrânia, todos os dias com mais vítimas entre civis e militares, graças a esta Europa fétida.
a) P. Rufino

Luís Lavoura disse...

Se Putin não for a Istambul, abre-se a caixa de Pandora anunciada no "tweet" de Trump.

Pois. Mas em que é que consiste, concretamente, essa caixa de Pandora?

Não sabemos. Nem sabemos se a caixa de Pandora existe, nem se ela contém sanções tão más como se diz. Muito possivelmente, ou a caixa d Pandora não existe de todo, ou quase não contém nada.

Dificilmente os EUA podem impôr à Rússia quaisquer sanções sem causarem graves engulhos com terceiros países.

Luís Lavoura disse...

Do ponto de vista diplomático (como o Francisco pode confirmar), a proposta de Zelensky é completamente parva: nunca dois presidentes se encontram sem que anteriormente muitos seus adjuntos se tenham reunido, em longos e detalhados encontros, para ajustar aquilo que os dois presidentes irão assinar. Os presidentes só reúnem, trocam sorrisos e apertos de mão, e assinam algo quando esse algo já foi acordado anteriormente.

josé ricardo disse...

O anónimo das 14:52 sou eu, José Ricardo

Anónimo disse...

Provavelmente devo ser um dos russófonos só porque entendo, pelo que leio e ouço, que não há negociações entre a Rússia e a Ucrânia, donde todos os pontos de vista que assentam nessas hipotéticas negociações são falaciosos.
J. Carvalho

Lúcio Ferro disse...

Continuo a pensar que nada se alterou substancialmente. Até porque continua a não existir, por parte do Ocidente, qualquer plano. A princípio, o plano era relativamente simples mas, veio a verificar-se, totalmente irrealista, como tantos “russófonos” alertaram. O plano passava por vitórias militares da Ucrânia (dado que o seu exército era em 2022 um dos maiores do mundo e estava prestes a receber um influxo maciço de armas e de apoio tecnológico – satélites). O plano era complementado com sanções de “shock and awe” e com uma campanha internacional de diabolização russofóbica, tendo em vista encostar o Kremlin às cordas, rapidamente. Nada disso sucedeu.
Desde o ano passado eplo menos que a Ucrânia colecciona derrotas militares atrás de derrotas militares. Os stocks de armas esgotam-se e, pior, o material humano é cada vez mais escasso. Sim, é uma autêntica falácia julgar que os Russos perderam sequer metade dos homens que a Ucrânia perdeu. É muito simples, há uma total superioridade aérea, total superioridade em artilharia, agora até em drones e mesmo em termos de doutrina táctica existe superioridade. Repare-se, os Russos, quando têm de retirar, retiram. Os Ucranianos nunca o fazem, com consequências sempre dramáticas. Para a liderança de zelérias é tudo uma questão de media spin, nada tem contacto com a realidade dos factos e assim apressam a sua derrota, como aconteceu com a insana aventura de Kursk. Ninguém sabe as baixas reais quer de um lado quer do outro, mas é mais do que certo que Kiev está exangue e Moscovo não.
O regime, entretanto, aumentou a repressão sobre os próprios cidadãos, os mancebos em idade de combater escondem-se ou fogem. A liderança está totalmente manietada pelos elementos neo-nazis, para os quais falar em cedências é a anátema e por isso zelérias ensaia fugas teatrais para lado nenhum.
A outra componente do plano, a da campanha de propaganda de russofobia continua a ter muito eco, o problema é que esse eco resulta essencialmente nas opiniões públicas da UE, que foram e são completamente intoxicadas diariamente. Fora isso, como se viu a 9 de Maio, a Rússia está longe de isolada e a sua economia, apesar de alguns sinais de abrandamento, pior estará a UE. Da Ucrânia nem falar, permanece robusta.
Portanto, mantém-se a pergunta: qual o plano? Ameaçar com mais sanções e com mais armas? Que resultados deu isso até agora? Não há plano e daí serem tão ridículas as manobras de quem tem a guerra perdida e que acha que pode ditar as condições. Com toda a certeza, Moscovo preferiria que a Administração Trump cortasse a torneira a Kiev, mas se não o fizer, eles vão continuar e possivelmente mais tarde as condições vão ser ainda piores.
Enfim, uns há que preferem iludir-se com joguinhos palacianos, como quem diz agora é que vai ser, agora é que o outro está entalado. Mas estão loucos? Pensam que um comportamento de palhaço vai levar o lado vitorioso a aceitar tais tropelias? Meta-se isto na cabeça, também não tenho uma bola de cristal, mas é quase certo que quando isto acabar a Ucrânia vai ser muito mais pequena. Isso, meus amigos, não é culpa dos “russófonos”, é dos que estão tão virados para o seu próprio umbigo, tão intoxicados pela propaganda maniqueísta que não alcançam a fragilidade das suas posições. Seja como for, espero que cá estejamos para ver.

Anónimo disse...

Uma coisa já ganhou, sr embaixador, ter um blog onde se pode discutir com a abertura que falta na comunicação social onde quatro ou cinco comentadores não alinhados têm que bater-se não só com a informação já cozinhada como com a pressão para os forçar a dar as respostas “oficiais” . Uma lástima !

Arber disse...

Farto-me de ouvir falar do cessar-fogo objecto do ultimato dos belicistas europeus, mas pergunto-me e não consigo a resposta: mas cessar-fogo para quê?
Acompanhei as propostas de cessar-fogo da Rússia na época da Páscoa e agora para as comemorações do Dia da Vitória, e vi ali objectivos claros.
Mas os europeus querem impor cesar-fogo para quê?! Apenas para ameaçarem, com ultimato?
Palhaços idiotas!

caramelo disse...

Acho qualquer análise lógica ao que faz ou diz o Trump é inútil, a não ser que seja análise psiquiátrica. O homem é bipolar.

Com dedicatória

O anti-americanismo radical é a doença senil do pós-comunismo de alguns. Por princípio, são contra a América, o mau da fita. A arrogância po...