Já aconteceu a algum dos leitores deste blogue entrar numa refeição, com diversos convidados, e, dentre eles, vir a calhar a seu lado, precisamente, o autor do livro que na véspera começou a ler? Pois foi isso que me ocorreu, hoje, com Michel Houellebecq, autor do "La Carte et le Territoire", obra vencedora do prémio Goncourt de 2010. Como tive o azar da minha leitura andar ainda pelas páginas 50 e tal, quase não me atrevi a falar-lhe do livro...
Um dia, no Rio de Janeiro, numa das minhas frequentes visitas à Academia Brasileira de Letras, fui apresentado a um dos seus 40 "imortais", o escritor e jornalista Carlos Heitor Cony. Trata-se de um cronista fascinante, que uma ou duas vezes por semana escreve deliciosos textos no "Estado de S. Paulo". Ao tempo que vivia no Brasil, eu não perdia nenhum. Por coincidência, uma semana antes desse encontro, tinha acabado de ler uma sua autobiografia, intitulada "Quase memória". Disse-lho. O escritor, com o ar benevolente de quem acredita pouco que os diplomatas possam ler muito, retorquiu: "Ah! sim? Espero que tenha gostado..." E passou adiante. Aí eu insisti: "Diga-me uma coisa! Ao ler o livro fiquei com uma curiosidade: quando fala daquela falsa viagem do seu pai a Itália, para enganar os amigos, isso passou-se mesmo assim?". Cony abriu muito os olhos, "viu-me" pela primeira vez e exclamou: "Oh! Mas o embaixador leu mesmo o livro?!".
Quero ter a ingenuidade de pensar que, por esse instante, a profissão diplomática, em geral, me ficou a dever o favor de poder tê-la feito subir um pouco na consideração de um dos grandes das letras brasileiras.
Um dia, no Rio de Janeiro, numa das minhas frequentes visitas à Academia Brasileira de Letras, fui apresentado a um dos seus 40 "imortais", o escritor e jornalista Carlos Heitor Cony. Trata-se de um cronista fascinante, que uma ou duas vezes por semana escreve deliciosos textos no "Estado de S. Paulo". Ao tempo que vivia no Brasil, eu não perdia nenhum. Por coincidência, uma semana antes desse encontro, tinha acabado de ler uma sua autobiografia, intitulada "Quase memória". Disse-lho. O escritor, com o ar benevolente de quem acredita pouco que os diplomatas possam ler muito, retorquiu: "Ah! sim? Espero que tenha gostado..." E passou adiante. Aí eu insisti: "Diga-me uma coisa! Ao ler o livro fiquei com uma curiosidade: quando fala daquela falsa viagem do seu pai a Itália, para enganar os amigos, isso passou-se mesmo assim?". Cony abriu muito os olhos, "viu-me" pela primeira vez e exclamou: "Oh! Mas o embaixador leu mesmo o livro?!".
Quero ter a ingenuidade de pensar que, por esse instante, a profissão diplomática, em geral, me ficou a dever o favor de poder tê-la feito subir um pouco na consideração de um dos grandes das letras brasileiras.
14 comentários:
Os "bacorinhos" de Eça deviam substituir os diplomatas porque o país tinha "horror" a ser representado por homens inteligentes.
Para a alimentação,Eça propunha que se diminuisse o número de adidos e se aumentasse o dois bois: "menos títulos e mais bifes".
Sempre actual, o José Maria...
patricio branco deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Ainda os escritores":
o brasil tem magníficos cronistas, sempre teve, desde machado de assis. Nós tivemos o eça, ramalho, carlos malheiro dias. E alguns outros, mas cada vez menos. Actualmente, a. lobo antunes publica em jornais crónicas com real valor literário.
Fiquei com curiosidade de ler CHC e vou procurar crónicas dele (na internet).
No expresso, aparecem semanalmente crónicas do brasileiro luis fernando veríssimo, leitura que procuro não falhar pois faz rir e precisamos de rir nos tempos que correm. São pequenas histórias e crónicas cómicas, imaginativas (creio que ele é filho de erico veríssimo). É ler a cronica de ano novo "resoluções" (10 para 2011).
Entre os grandes cronistas internacionais estão g g marquez (que já não as publica) e mario vargas llosa. E alberto moravia, que publicava no corriere della sera.
Jornal diário ou semanal que se preze devia dar espaço à cronica e aos cronistas.
Quem conheça bons cronistas portugueses actuais a publicar, que o diga, pf
Anônimo deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Ainda os escritores":
Há embaixadores que lêem e haverá certamente os que, mesmo sabendo ler, o não fazem... Também porque já lhes vieram sinais de cima pouco motivadores como as declarações daquele politico que depois de declarar que não tinha tempo para ler foi eleito Presidente da Republica.
Sou, todavia, de opinião que se promova a leitura e os embaixadores que não sintam a imperiosa e intima necessidade de o fazer que esta tarefa lhes seja imposta...
cunha ribeiro deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Ainda os escritores":
Fui ler uma crónica. Senti que a li tarde demais...Estilo surpreendente; Só depois do saber se sabe escrever assim.
Anônimo deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Ainda os escritores":
Desconhecia esta expressão do Eça, mas confesso que achei imensa piada.
O nosso Eça tinha um sentido de humor notável!
Isabel BP
patricio branco deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Ainda os escritores":
li a biografia de CV de m f monica e até gostei, livro pequenino, lê se em 2 horas, mas vou folhear de novo para ver a tese do "esquecido".
O unico escritor com quem comi, e foi ao jantar, estava sentado do outro lado da mesa, mais ou menos à minha frente, umas 8 pessoas mais à mesa, jantar pesado, não a comida, dessa não me lembro, o ambiente quero dizer, foi com josé saramago e, a certa altura, lembrei-me de lhe perguntar algo para fazer conversa, tambem por curiosidade, talvez não tivesse sido a melhor pergunta mas já tinha lido que outros escritores trabalhavam assim, pois perguntei-lhe se ele tambem trabalhava e escrevia assim, ele olhou-me e disse, eu esperava uma resposta diferente, para ser sincero, mas não, ele disse que como era isso? não nunca tinha usado esse método, assim não faria nunca, que ideia! e eu não insisti na materia da pergunta, cada um trabalha à sua maneira, pensei, mas o método do outro escritor até era interessante e eu pensava que outros, incluindo o josé saramago, o podiam seguir, ao método, e o jantar continuou, foi a vez de outros fazerem perguntas, a minha editora em inglaterra é a harvill, respondeu ele a certa altura a uma das perguntas, saramago falava em francês, e eu acabei por não lhe falar no unico livro que até então tinha lido dele, o ano da morte de ricardo reis, e gostara do romance, podia-lhe ter dito. Tenho outra história doutro escritor para contar, mas fica para outra altura, não se deve dizer tudo duma vez e a história é muito diferente.
Passando à entrada do blogue, nunca li Houellebecq nem CHC, mas deste tenho em casa um romance há tempos e será altura do ler,agora que FSC me despertou o apetite com o que aqui diz.
patricio branco deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Ainda os escritores":
li a biografia de CV de m f monica e até gostei, livro pequenino, lê se em 2 horas, mas vou folhear de novo para ver a tese do "esquecido".
O unico escritor com quem comi, e foi ao jantar, estava sentado do outro lado da mesa, mais ou menos à minha frente, umas 8 pessoas mais à mesa, jantar pesado, não a comida, dessa não me lembro, o ambiente quero dizer, foi com josé saramago e, a certa altura, lembrei-me de lhe perguntar algo para fazer conversa, tambem por curiosidade, talvez não tivesse sido a melhor pergunta mas já tinha lido que outros escritores trabalhavam assim, pois perguntei-lhe se ele tambem trabalhava e escrevia assim, ele olhou-me e disse, eu esperava uma resposta diferente, para ser sincero, mas não, ele disse que como era isso? não nunca tinha usado esse método, assim não faria nunca, que ideia! e eu não insisti na materia da pergunta, cada um trabalha à sua maneira, pensei, mas o método do outro escritor até era interessante e eu pensava que outros, incluindo o josé saramago, o podiam seguir, ao método, e o jantar continuou, foi a vez de outros fazerem perguntas, a minha editora em inglaterra é a harvill, respondeu ele a certa altura a uma das perguntas, saramago falava em francês, e eu acabei por não lhe falar no unico livro que até então tinha lido dele, o ano da morte de ricardo reis, e gostara do romance, podia-lhe ter dito. Tenho outra história doutro escritor para contar, mas fica para outra altura, não se deve dizer tudo duma vez e a história é muito diferente.
Passando à entrada do blogue, nunca li Houellebecq nem CHC, mas deste tenho em casa um romance há tempos e será altura do ler,agora que FSC me despertou o apetite com o que aqui diz.
Alcipe deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Ainda os escritores":
Os embaixadores não são supostos ler : então a Dra Maria Filomena Mónica (eu sei que já disse isto antes) não quis demonstrar a sua fantástica tese de que "Cesário Verde era um poeta esquecido", alegando que tinha um amigo embaixador que nunca tinha ouvido falar em Cesário Verde?
Os embaixadores, dizia o Eça, podiam ser substituídos...por "bacorinhos do Alentejo"!
Groiiink!
Gil deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Ainda os escritores":
Aconselho vivamente um excelente livro que, há alguns anos, teve merecida, embora efémera, fama: "Comment parler des livres qu'on n'a pas lus", de Pierre Bayard.
Não se trata de um livro humoristíco - o autor é um sólido professor - e é particularmente útil a "eruditos" e bibliófagos.
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Helena Sacadura Cabral deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Ainda os escritores":
Senhor Embaixador, que post e comentários mais deliciosos!
Parti-me a rir com o de Patricio Branco - escrito, aliás, muito ao estilo de Saramago -, e com o de Alcipe.
Bem faço eu, que quando me chamam escritora, emendo logo para escrevinhadora, que é muito diferente...
Francisco Seixas da Costa deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Ainda os escritores":
Caro Patrício Branco: se puder, ainda no que toca a brasileiros, não perca o Nelson Rodrigues, o mais interessante dos escritores reacionários que alguma vez li (e, por masoquismo, leio muitos).
Anônimo deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Ainda os escritores":
Tenho a certeza que o "Escritor " ficou convencido que o Sr. Embaixador FSC é que lê muito...
Qual generalizações e construção de representação social de que os embaixadores "todos" leem muito...Pf...
O SR. ainda é de Bom tempo
Nem eu transmontana acredito...
Isabel Seixas
Gostei de saber o que são bacorinhos... que giro.
patricio branco deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Ainda os escritores":
Caro FSC, obrigado pela informação, tomei nota. Já li uma cronica de CHC num sitio de cronicas brasileiras que encontrei na net (blog "as melhores crónicas do brasil")
A HSC: sim, é um pastiche de JS mas cheio de boas intenções, uma diversão. e o episódio verdadeiro.
Gil deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Ainda os escritores":
Os "bacorinhos" de Eça deviam substituir os diplomatas porque o país tinha "horror" a ser representado por homens inteligentes.
Para a alimentação,Eça propunha que se diminuisse o número de adidos e se aumentasse o dois bois: "menos títulos e mais bifes".
Sempre actual, o José Maria...
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