sexta-feira, março 05, 2010

Nostalgia?

A publicação simultânea de vários livros sobre o general De Gaulle suscitou ontem um curioso debate televisivo entre os quatro autores. Nas diferenças que projetaram, ficou claro que todos entendem que se vive em França um tempo de nostalgia, para alguns de regresso a num ambiente de um certo "défaitisme", em que a invocação do general, pela direita e certos setores da esquerda, pode aparecer como um reflexo de uma crise de identidade que o país estará a atravessar, agravada pelo confronto que faz entre a realidade contemporânea e a ideia que sempre alimentou do seu papel no mundo. (Para um português, para quem o "sebastianismo" é identitário, foi uma sensação de "déjà-vu").

Para os autores, a algumas questões de raiz europeia, como a relação desigual que a França hoje sofre com a Alemanha unificada ou a deslocação do controlo normativo ("em inglês") para Bruxelas, somam-se agora tensões internas de natureza nova que levam à discussão da sua própria identidade, originando, cada vez mais, discursos nacionalistas de raiz protecionista e "autarcista", com crescentes laivos de rejeição de aberturas ao exterior.

Os escritores foram unânimes em considerar que, no fundo, esta "degaullo-nostalgia" pode ser lida como um implícito voto de desconfiança na capacidade dos políticos atuais. Valha a verdade que, cada um convocando os seus fantasmas históricos próprios, a maioria dos países europeus parece sofrerem de um "malaise" similar, face ao qual - e isso é indiscutível - a ideia europeia não tem constituído um bálsamo com um mínimo efeito atenuador. Bem pelo contrário.

4 comentários:

Alcipe disse...

"Écrire permet d'oublier la meute. C'est important."

(De Gaulle a Malraux

em "Les chênes qu'on abat", André Malraux, 1971)

Alcipe disse...

"Vous savez, les Français ont toujours eu du mal à se débrouiller entre leur désir de privilège et leur goût de l'égalité! Mais au milieu de tout ce joli monde, mon seul adversaire, celui de la France, n'a aucunement cessé d'être l'argent."

(De Gaulle a Malraux, "Les chênes qu'on abat", idem)

Helena Sacadura Cabral disse...

Senhor Embaixador este seu texto leva-me a sugerir-lhe que leia a última TIME, em que a Europa desaparece do mapa do mundo.
Nós ainda somos sebastiânicos. Mas segundo a revista, nem esse espírito salva o velho continente. Espero que o Dr. Barroso, em tempo de 20-20-20, não se esqueça de a ler...
Fiquei mesmo impressionada!

Helena Sacadura Cabral disse...

Goste-se ou não de Gaulle ele representa uma certa noção de pátria. E isso, a mim - que amo profundamente esta terra e não queria ter nascido em nenhuma outra -, comove-me!

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