Não conhecia pessoalmente Rui Tavares. Ontem, ao final da tarde, tive o gosto de com ele discutir a temática da União Política europeia, durante mais de hora e meia, numa participada sessão na Culturgest.
Com uma formação intelectual que lhe permite situar, com profundidade e brilho, o atual debate europeu no percurso histórico do continente, Rui Tavares desenvolveu uma leitura, simultaneamente realista e generosa, das opções possíveis para a superação da crise, muito assente na busca de uma maior democratização do processo europeu, com vista a uma crescente legitimação do projeto integrador. Um discurso onde a exigência ética esteve sempre presente, na linha do que tem sido a sua ativa participação no processo parlamentar europeu.
Gostei de o ouvir sobre a possibilidade de a eleição do próximo presidente da Comissão Europeia poder vir a converter-se num debate entre diferentes perspetivas sobre as linhas que a política económica e financeira da Europa deve assumir perante a crise. Embora eu alimente sérias dúvidas de que o "centrão" europeu (PSE e PPE) venha a confrontar-se publicamente, de forma radical, em torno das saídas para a crise, pareceu-me interessante a ideia que desenvolveu sobre a importância de ver um futuro presidente da Comissão investido de uma legitimidade europeia própria, que poderia vir a dar origem a um potencial "choque" competitivo com os poderes do Conselho, com consequências interinstitucionais bastante curiosas. Quem sabe se isto, a ser possível, não poderia significar o início de um "big bang" institucional, que ajudasse a romper com o impasse em que nos encontramos.
No plano português, Rui Tavares defendeu a discussão de um "memorando de desenvolvimento" (em irónica oposição ao 'memorando de entendimento' com a "troika"), que possa ajudar a sociedade portuguesa a dotar-se de uma estratégia nacional clara, para um período de, pelo menos, uma década. Na sua visão, seria importante que Portugal pudesse refletir sobre a ineficácia do modelo que parece estar a servir de referência à organização sócio-económica do país, tributário do que pode entender-se como um acordo social implícito, gerado nos anos 70. E, saindo dele, procurasse discutir e consensualizar um novo paradigma, assente no conhecimento e na inovação, seguindo de perto as prioridades que a Europa está a adotar para as suas políticas comuns.
Julgo que, para todos quantos estiveram na Culturgest, foi muito estimulante ouvir, sobre a Europa, um olhar inteligente e culto, despido da ganga das velhas soluções. Algum idealismo e ousadia nunca fizeram mal ao debate europeu, antes pelo contrário.
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