segunda-feira, setembro 16, 2013

Bombeiros

Portugal vive, por estes dias, um tempo de rara solidariedade com os seus bombeiros. A chocante morte de muitos bombeiros, ocorrida neste verão, trouxe à ribalta conjuntural uma atividade que damos sempre por adquirida, em caso de necessidade, mas que, quase sempre, não valorizamos suficientemente.

Sendo uma atividade muito antiga, vale a pena lembrar que, a partir do século XIX, a participação nas corporações de bombeiros voluntários correspondia a uma espécie de prestação de contribuição à sociedade, assumida por filhos da pequena burguesia urbana, em especial por comerciantes e empregados de escritório. Ser bombeiro voluntário era algo que se afirmava com orgulho e que até qualificava socialmente as famílias. Recordo-me bem de ver, em muitas lojas, em vilas e cidades do norte do país, pendurados nas paredes, capacetes de bombeiros, testemunhando a qualidade de membro de uma corporação do proprietário da casa. Com os anos e a necessidade de mais quadros, bem como de uma crescente especialização, a atividade tornou-se mais popular, profissionalizou-se em parte e passou até a abranger outras funções, para além do tradicional combate a fogos. Mas, em muitas localidades, ser bombeiro continua a ser uma tarefa rodeada de uma aura de dignidade funcional.

Ontem, ao observar na televisão a campanha de recolha de fundos para os bombeiros portugueses, não pude deixar de recordar a ligação emocional que a cidade de Nova Iorque criou com os seus bombeiros, na sequência da tragédia em 11 de setembro de 2001. Muitos bombeiros morreram então nas "twin towers" quando, com uma imensa coragem, subiram pelas torres, para tentar travar o fogo, antes de serem apanhados pelo colapso dos edifícios. Nos tempos seguintes, os bombeiros novaiorquinos viriam a ser admirados como nunca, sendo frequente ver, pelas ruas, os cidadãos baterem palmas à sua passagem. Ainda hoje, eles continuam a ser "heróis" na memória da cidade.

A maior homenagem que os portugueses poderiam fazer aos seus bombeiros seria não se lembrarem deles apenas no verão. Seria levarem a cabo, no primeiro semestre de cada ano, as necessárias ações de prevenção nas zonas de maior risco, evitando que, alguns meses mais tarde, novas vítimas venham a lamentar-se. Mas, como sempre aconteceu, assim que chegadas as primeiras chuvas, esta memória emocionada vai, de imediato, esvair-se. E, tal como nos anos anteriores, e sob a complacência culposa dos municípios, que deveriam forçar à responsabilização dos proprietários das habitações e terrenos, tudo acabará por voltar ao mesmo. Enfim, é apenas o nosso fado.

9 comentários:

opjj disse...

Caríssimo o espectáculo do fogo continuará e tem um forte aliado,as TVs que o promovem durante 24h à falta de notícias.Mais, Enquanto não se sentarem todos à mesa, TVs e entidades... Aguardemos 2014. Comprei num leilão há muitos anos,um quadro de um conhecido pintor Moçambicano que simbolizava o fogo, era bonito mas ao mesmo tempo aterrador,por isso tive de vendê-lo.

Anónimo disse...

O que não podemos é esconder com uma árvore toda a Floresta nem esconder com a emoção a procura de responsabilidades...
Quando vejo, verão sim e verão sim, décadas a fio, as populações sem defesa a serem atacadas pelos incendios; quando vejo os "meios aéreos" a combaterem Frentes de fogo com um balde de água; quando vejo os Bombeiros de Valença a "chorarem" o quase único veiculo que tinham e que o fogo devorou; quando vejo os parcos meios de intervenção generalizados a todas as corporações de Bombeiros e a total ausencia de planeamento de acesso a extensivas áreas de Floresta; quando vejo com que infinita preocuação os orçamentos de Estado dão prioridade a estas questões... preferia que se evitasse a emoção e reforçasse as cordas sensiveis à revolta e exigência de responsabilidades.
José Barros

Unknown disse...

Senhor Embaixador,

Infelizmente essa é a verdade que tem acontecido todos os anos. Acabado o Verão vem o Natal e tudo o que gira à volta dos incêndios florestais fica esquecido. A partir do Ano Novo começa a preparação para a nova "campanha", sem que nada de essencial se altere, nomeadamente naquilo que não é fácil mas não pode deixar de se fazer: o cadastro, o ordenamento e o emparcelamento da floresta, as técnicas de fogo controlado, a sensibilização, etc., etc.
Um dado histórico: a primeira associação humanitária de bombeiros voluntários portuguesa foi criada em 1868 e ainda hoje existe lá no Largo Barão Quintela, junto à estátua de Eça de Queiroz. É a AHBV de Lisboa. A segunda mais antiga é a AHBV de Santarém.

Isabel Seixas disse...

Subscrevo na integra.

Aí está algo útil que se poderia fazer, ao invés das campanhas eleitorais a fundo pedagógico perdido e a fomentar o "alcoviteirismo" inócuo e sem fundo.
Sim senhor 15 dias livres mas a campanha eleitoral operacionalizada em atos tirados aos discursos ininputáveis e à leviandade do nunca devir e toca a limpar os terrenos com os candidatos na linha da frente e ou na vanguarda, (alguma liberdade estratégica)ao lado dos bombeiros a fazer serviço cívico antes de o anunciar com palavrinhas vãs...

Anónimo disse...

Não resta a dúvida de que os BOMBEIROS são heróis Nacionais. O estado tem o dever de lhes dar mais meios. Mas atenção! Os incêndios em Portugal cada vez serão mais enquanto houver empresas particulares, pagas pelo estado, para combater os incêndios. O dinheiro dos submarinos, imagine-se, se fosse para a prevenção dos incêndios? E o que estão a fazer os pilotos da nossa aviação militar a fazer nos quartéis? E os outros militares, que durante o período dos incêndios bem poderiam preveni-los? Pois é, o estado não deveria contratar empresas, mas sim tomar esse assunto com os seus militares e bombeiros.

Anónimo disse...

Ainda estou à espera que o venerando Chefe do Estado, a Senhora Presidente da Assembleia Nacional ( apesar de ambos estarem aposentados) e o Senhor Presidente do Conselho se desloquem a uma corporação de Bombeiros para lhes manifestarem o apoio do povo português. Mais uma vergonha.

Joaquim de Freitas disse...

A coragem não lhes falta. O espirito de sacrifício é patente em todas as intervenções. A solidariedade da nação devia consistir, ao menos, no que o Sr. José Barros escreve : Os meios técnicos para fazer frente ao desastre absoluto. Talvez fosse mais produtivo ter um submarino a menos e mais avioes para combater os incêndios. A indecência do pouco caso que as autoridades do executivo fazem do dom da vida destas mulheres e destes homens de boa vontade, é revoltante.
E que os manga de alpaca que povoam os ministérios não tenham implementado, ou talvez o tenham feito mas sem medidas coercitivas para serem respeitadas, as leis que obrigam à limpeza dos terrenos, verdadeiro carburante dos incêndios, é igualmente chocante.
E uma justiça célere e exemplar para os criminosos que ateiam os fogos.
Tudo isto reflete mais um dos atrasos de que padece o nosso Portugal.

António Nunes disse...

É certo que é nesta altura que os bombeiros andam nos noticiários, mas em muitas cidades e aldeias de província o seu prestígio dura o ano inteiro (falo principalmente das Beiras).

Ainda assim, confesse que o Benfica lhes fez uma bonita homenagem.

JRodrigues disse...

O que mais me chocou em relação aos bombeiros de Nova-Iorque foi o facto de, quando necessitaram de tratamentos caríssimos para os cancros e outras doenças que desenvolveram por terem combatido naquele inferno, os EUA os terem negado. Isso fez-me pensar na sorte que temos por vivermos num país com um Serviço Nacional de Saúde.

Poder é isto...

Na 4ª feira, em "A Arte da Guerra", o podcast semanal que desde há quatro anos faço no Jornal Económico com o jornalista António F...