quinta-feira, outubro 15, 2015

Citações a preto e branco

Quando as mensagens que se tentam fazer passar num artigo têm alguma complexidade, o risco da sua simplificação se poder tornar caricatural é muito elevado.

Do artigo que hoje publiquei no "Diário de Notícias", um "site" retirou e titulou com a seguinte frase "O PSD/CDS ganhou as eleições e a ele compete formar governo". O leitor poderá, por aqui, deduzir muito?

O "site", ao qual convinha que esta fosse exatamente a mensagem, escusou-se de acrescentar que eu também dissera que o PSD/CDS, se o não fizer, "a responsabilidade será exclusivamente sua" e que "ao perder a maioria absoluta, deixou de ter condições para impor aos restantes partidos a integralidade do seu programa, tendo assim que fazer fortes cedências, se quiser continuar a governar".

E principalmente, esse "site" não ousou titular algo que eu também disse: "Percebo e partilho o desejo maioritário que prevalece no país de "ver-se livre" da desastrada governação PSD/CDS".

Como vêem, nos tempos que correm, a vida não está fácil para quem não vê o mundo a preto e branco.

11 comentários:

josé ricardo disse...

Compreendo o seu ponto de vista,caro sr embaixador. No entanto, deixe que lhe diga que a sua posição nesta contenda tem sido demasiada diplomática e pouco dada a um definitivo virar de página no que diz respeito às orientações políticas do país. Esclarecendo: tivemos, nos últimos quatro anos, um governo que fugiu notoriamente à matriz social democrata que faz parte do maior partido da coligação. Pode-se mesmo afirmar que Portugal foi governado por um governo de direita, o mais à direita da nossa democracia.
Posto isto, que resta ao PS? Acordos com esta gente? A questão resume-se, pois a uma verdadeira assunção política por parte do PS, como verdadeiro partido social democrata que é.

Um abraço,
José Ricardo

Fátima Diogo disse...

Caro embaixador, embora também sinta as suas dúvidas em relação ao PCP e ao BE, não posso deixar de dizer-lhe que este seu artigo no DN sofre de uma contradição fundamental: diz, e bem, que a PaF deve negociar com o PS, truncando e modificando o seu programa com vista a poder governar com aval do PS. Diz depois que os votantes não votaram pensando na possibilidade de um governo negociado entre as esquerdas, além de que a maioria dos votantes não votou no programa do PS.
Mas, caro embaixador, NINGUÊM votou num programa truncado e modificado do PSD - e a minoria que votou na PaF não o fez para esta negociar à esquerda, com o PS.

Alcipe disse...

1. Os votantes do PS queriam que o PS ganhasse as eleições

2. Logo, os votantes do PS não queriam nem a vitória do PSD/CDS nem uma coligação do PS com estes partidos

3. Muitos votantes do PS desejariam (ainda que na altura pudessem não a julgar possível) um acordo do PS à esquerda. Assim se explica muito voto útil vindo da esquerda.

4. Muitos votantes do PS, porém, não querem acordos do PS à sua esquerda. Mas o PS elegeu uma direção que está a tentar fazer esses acordos para construir uma alternativa de governo (a partir de um mandato claro e maioritário conferido pelos órgãos dirigentes do partido), sem abdicar dos princípios essenciais e inegociáveis do programa do PS (Europa, respeito pelos compromissos assumidos, "leitura inteligente" do Tratado Orçamental).

5. O Partido Socialista Europeu aceitou esta tentativa de viabilização de um governo estável em Portugal.

6. O pior para os mercados é a instabilidade. Um governo minoritário sem qualquer apoio no Parlamento é mais estável do que um governo com apoio numa maioria parlamentar? Que propõem os que recusam a negociação à esquerda? Tornar o PS no terceiro parceiro da coligação de direita? Os nossos resultados eleitorais em nada se assemelham aos da Alemanha...

6. Se o PS conseguir comprometer os partidos à sua esquerda (que tiveram já a lição do Syriza) a viabilizar um governo de esquerda, sem nunca abdicar dos seus compromissos europeus e internacionais, algo muda no cenário.

7. Estamos em 2015. Os bolcheviques morreram há muito.O Dr Cunhal foi o último bolchevique... Mas também morreu.

Assino, para que me não acusem de anonimato: Luís Filipe Castro Mendes, alcipe para os íntimos

António Azevedo disse...

Nestas hipóteses dos se(s) também se pode considerar a viabilização do governo da direita que ganhou com o apoio de alguns deputados do PS como já ouvi.
Em vez que colocarmos a imaginação ao serviço dos nossos desejos, deixemos que os trâmites burocráticos sigam o processo natural.
Se no fim do dia (neste caso serão semanas ou meses) não se entenderem, venham novos protagonistas para todos os partidos e novas eleições.
Proponho o Rui, o Francisco, vá lá, a Mariana Mortágua que tem muito perfume e, no CDS e PCP outros mas tanto me faz...
antónio pa

aamgvieira disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Isabel Seixas disse...

Bem Bem o Sr. está a ficar muito comercial...Essa é que é essa...
Qualquer dia os que o desdenham compram-no.
Eu sempre disse que o Sr. seria um ótimo Candidato, só lhe faltava este travo a apetência jornalistica...

Isabel Seixas disse...

Gostei muito do comentário do Sr. Embaixador Poeta.Uma análise idônea com a qual me identifico.

caramelo disse...

Senhor Embaixador, vai-me desculpar, mas é um fenómeno novo e divertido ver simpatizantes ou militantes do PS (até ex dirigentes, já vi), dizerem, candidamente, que é ao partido contrário que compete formar governo, porque ganhou as eleições. Sabendo-se, aliás, que a coisa é mais complexa do que isso. Ou o Presidente, no dia a seguir à eleições, teria logo nomeado governo. Juro que não entendo esta moda. É que, ainda por cima, logo de seguida diz:

"Percebo e partilho o desejo maioritário que prevalece no país de "ver-se livre" da desastrada governação PSD/CDS".

Bom, se é assim, deveria, digo eu, talvez, é só uma hipótese, defender que o seu partido formasse governo.

Finalmente, o senhor Embaixador irrita-se com o titulo do jornal. Ora, senhor embaixador, mas afinal não o disse? Queria um titulo com explicação do contexto e notas de rodapé?

Helena Sacadura Cabral disse...

Meu querido Alcipe
Uma única dúvida me levanta a sua brilhante análise.
Está mesmo convencido que o Cunhal foi o útimo bolchevique?
Só por ser poeta, pode ter esquecido tudo o que o PC fez ao PS, ao longo dos anos...

aamgvieira disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Alcipe disse...

Helena, Helena, os poetas não são esquecidos. Também não me esqueço de outras coisas, de que um dia falaremos num jantar em nossa casa, para o qual desde já eu e a Margarida a convidamos, quando eu estiver já reformado. 2017, combinado?

Seu amigo

a) Alcipe

PS Claro que nos veremos antes. Há é coisas que só lhe direi depois de me reformar...

João Miguel Tavares no "Público"