sexta-feira, outubro 09, 2015

A solidão política


No domingo passado, o PS perdeu as eleições. Foi o segundo partido mais votado e foi derrotado por essa formação política chamada PSD/CDS. Esta formação, que havia governado os últimos quatro anos com maioria absoluta, perdeu no dia 4 esse privilégio. Daqui em diante, só poderá aprovar medidas com implicação legislativa se vier a contar com a abstenção ou o voto positivo do PS, partindo do princípio que tudo aquilo que o PS não aceitar também não será aceite pelo PCP ou pelo Bloco de Esquerda.

O PS ganhou assim, no futuro parlamento, um verdadeiro direito de veto, tornando-se o partido-charneira da política portuguesa. Porém, esse poder tem de ser gerido com grande habilidade e sentido da medida.

O PS está ciente de que corre o risco de ser chantageado pelo PSD/CDS, o qual, um dia, confortado por uma pressão conjuntural europeia, pode querer dramatizar a situação, alegar ingovernabilidade, ao não contar com uma pontual anuência ou neutralidade socialista, apresentar a demissão e obrigar a eleições antecipadas, em busca de uma nova maioria absoluta.

Mas os riscos não vêm só daí. No outro lado do espetro, o PS sabe que pode ser confrontado pelos partidos à sua esquerda com propostas irrealistas para combater a austeridade, sendo assim colocado em potencial contradição com os compromissos europeus que subscreveu, nomeadamente o Tratado Orçamental, pense-se o que se pensar da racionalidade deste.

O PS está assim “sozinho na praça”. Tem o seu programa, que foi aquilo que levou os seus eleitores a confiarem-lhe o seu voto. É à luz desse programa que o seu comportamento futuro será medido.

Não é sensato pensar que António Costa poderia, algum dia, vir a obter um mandato interno, num compromisso a prazo de uma legislatura, que desse ao PSD/CDS a possibilidade de executar políticas num sentido contrário àquilo que o PS defendeu durante a campanha.

Para o bem e para o mal, o PS não é o Syriza, não dá o dito por não dito, ao virar da esquina.

O PS sabe que não tem condições para impor o seu programa, mas tem plena legitimidade para decidir que tipo de medidas, que venham a surgir, à sua direita ou à sua esquerda, podem merecer a sua aprovação.

Repito o óbvio: o PS perdeu estas eleições. Por isso, estava e deve continuar na oposição, embora agora numa posição mais forte do que aquela que tinha. Um seu regresso ao governo só deve processar-se através de novas eleições, não por “maiorias” contranatura à sua direita, nem por alianças oportunistas, não menos bizarras, com o Bloco de Esquerda ou com o PCP. Porquê? Porque isso está fora da ordem natural das coisas para uma formação política com uma história ímpar de responsabilidade política no Portugal democrático. Não tenho dúvidas que António Costa sabe isto.

(Artigo que hoje publico no "Jornal de Notícias")

9 comentários:

Anónimo disse...

O PS se quiser salvar a sua honra alia-se à CDU e BE.

Se se aliar à direita perde toda a vergonha que possa ter.

Majo disse...

~~~
~~ Concordo, em absoluto.

~ A coligação vai ser obrigada,
'a priori', a controlar a sua tirania...
~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~

Manuel do Edmundo-Filho disse...

Um regresso do PS ao governo “só deve processar-se através de novas eleições”. Tendo a concordar. Não sei, é, se será este o pensamento de Costa. Mas se for, não lhe resta senão viabilizar através da abstenção um governo da coligação (e retirar-lhe o tapete um ou dois anos depois). Por que abriu então António Costa conversações à sua esquerda? E tendo aberto igualmente à sua direita, não foi inocente que a ronda se iniciasse à esquerda. Como observa Vital Moreira, a intenção poderá ser “a de manter pressão alta sobre as conversações que vão seguir-se com o PSD, no sentido de obter compromissos relevantes como contrapartida”. E eu adianto mais uma: internamente reduz qualquer “chance” de uma alternativa. Mas nesta táctica há um risco: as expectativas que se criaram no seio da larga maioria que vou contra Passos/Portas (e que subiram com as declarações de Costa e Jerónimo e… assustaram, de que maneira, a direita – e que gozo me está a dar!), para serem goradas daqui a uma semana ou duas, com óbvios custos, à esquerda, para o PS. Acabando Costa por ter que viabilizar um governo da coligação, não teria sido mais prudente ter dado prioridade negocial à sua direita…?

Antonio Lourenço disse...

"nem Aliança politica (bizarra) com o Pcp e Bloco porque isto está fora da ordem natural das coisas" Ó Sr. embaixador estes complexos de superioridade intelectual e paternalismo ficam-lhe muito mal, pretende talvez mudar para que tudo fique na mesma e dizem-se estas pessoas de esquerda.O situacionismo é mesmo bom.

Anónimo disse...

O anónimo das 08.45 tem toda a razão, assim como António Lourenço.
Mas, do seu Post fica a pergunta: então o que sugere o autor do Blogue, como solução?

Anónimo disse...

O PS é um partido, naturalmente, muito mais próximo do PSD do que é do PCP ou desse BE. Sempre assim foi. Sendo assim, será lógica a opção do PS em viabilizar um governo que resultou vencedor das eleições do que entrar num cenário não democrático e de possível coligação com partidos com os quais não partilha nem se identifica em questões fundamentais. Ao PS cabe-lhe um papel muito importante neste ciclo e, por isso mesmo, deve apresentar à coligação propostas sérias para se sentir presente e desenvolver um trabalho conjunto. É isso que esperam os eleitores que votaram no PS, muitos deles (talvez a maioria) em nada se identificam com o PCP ou BE.

Anónimo disse...

A opção quer propõe é 'PASOKAR' alegremente ...

Anónimo disse...

Concordo plenamente com o post, mas não creio que seja essa a posição de António Costa... O deslumbramento pelo poder está a "cegá-lò"!

Anónimo disse...

António Costa ficaria muito melhor no quadro se, em plena noite eleitoral, reconhecesse o falhanço total da sua campanha, da sua postura perante o «caso» Sócrates (se não estou em erro foi Ministro dele por duas ou três vezes...). Há ainda outros pormenores (como o convite a AJ Seguro para o almoço da Trindade e a descida do Chiado).
Não só não se demitiu, como toda a noite apareceu de grandes sorrisos para a Comunicação Social. A saída do hotel e entrada para o carro foi uma imagem surrealista. Rir de quê? Devia era ter vergonha dos resultados. Tão novo e tão sedento do poder, aconselhado não sei por que guru, entrou nesta farsa das reuniões com os outros partidos, uma cena deprimente. Sei que há gente, sobretudo arrependidos do PC, que o picam e dizem que esta é uma «oportunidade histórica» para a esquerda... Por alma de quem?
E o PS não tem mais ninguém para propor para Presidente da Assembleia da República do que o Dr. Ferro Rodrigues, ou o Dr. Alberto Martins, depois da tristíssima «performance» de um e outro, como líderes da bancada?

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...