Para um amigo do Brasil como eu sou, que por aí tive a experiência mais impressiva da minha carreira profissional, o que por lá se passa traz-me sentimentos contraditórios.
Por um lado, preocupa-me ver uma sociedade atravessada por uma tensão social muito forte, com a emergência de quase "dois Brasis", que prolongam a dualidade política pressentida na última eleição. Inquietam também os apelos populistas ao regresso da ordem militar, mesmo se todos percebem que as condições para esse estado autoritário de coisas estão muito longe de existirem. Mas que a memória desses tempos de chumbo se exiba sem vergonha é, pelo menos, triste.
Por outro lado, o Brasil que ainda ontem desceu às ruas demonstra a vitalidade de um país que começa a ter plena consciência da incompatibilidade de construir uma nação desenvolvida e moderna sob um sistema político marcado pela podridão, pelo patrimonialismo e pela sujeição a uma classe política sem escrúpulos e com fortes vícios incrustados.
Nas ruas que ontem se vestiram a verde e amarelo há de tudo: desde os ressabiados pela perda de poder, que os anos Lula haviam retirado legitimamente a quem mais beneficiava do forte contraste social, até uma nova classe média, ou com esperanças de o ser, que não aceita que o seu petróleo, do "Estado Petrobras", alimente bolsos corruptos, lado a lado com uma população condenada a transportes miseráveis, serviços de saúde indignos, rodovias em descalabro, em suma, políticas públicas fortemente ineficientes.
Nas ruas que ontem se vestiram a verde e amarelo há de tudo: desde os ressabiados pela perda de poder, que os anos Lula haviam retirado legitimamente a quem mais beneficiava do forte contraste social, até uma nova classe média, ou com esperanças de o ser, que não aceita que o seu petróleo, do "Estado Petrobras", alimente bolsos corruptos, lado a lado com uma população condenada a transportes miseráveis, serviços de saúde indignos, rodovias em descalabro, em suma, políticas públicas fortemente ineficientes.
Deve ser muito difícil gerir um país de 200 milhões de habitantes, dirigir uma administração que, para funcionar, tem de conseguir aliar sob o mesmo programa mais de uma dezena de partidos, acomodar os seus interesses, muitas vezes contraditórios, que se cruzam com as idiosincrasias dos equilíbrios políticos e sociais de 27 Estados. Em período de ciclo económico negativo, tudo se torna pior, porque as margens financeiras para um forte keynesianismo deixaram de existir. Em especial, deve ser muito complicado gerir as frustrações que se seguem às fortes esperanças criadas pelo anos Lula, desse tempo do Brasil-vedeta, que ombreava e era admirado pelos poderosos do mundo - o Brasil do sonho do biodiesel, do ouro do pré-sal, dos êxitos do Fome Zero, da explosão da educação para todos. Um tempo em que, para muitos, tudo ia ser possível, nesse otimismo que é a riqueza maior daquela terra.
Dilma Rousseff não parece ser a figura ideal para encarnar esse otimismo. Mas é a presidente que foi eleita e o "impeachment" de que muitos falam, e que teria consequências gravíssimas para a normalidade constitucional que o Brasil ganhou, não tem hipóteses de se concretizar, tanto mais que teria que ser desencadeado no âmbito de um Congresso desprestigiado e, ele próprio, com uma legitimidade muito fragilizada, depois dos recentes escândalos.
Resta a hipótese de Dilma Rousseff conseguir vir a interpretar a pressão popular e impor uma reforma política com reais consequências no sistema de poder. Conhecendo alguma coisa do Brasil político, alimento sérias dúvidas que isso seja possível. Mas, às vezes, os suicidas conseguem ter serenidade para se arrependerem e regressar à vida.
Resta a hipótese de Dilma Rousseff conseguir vir a interpretar a pressão popular e impor uma reforma política com reais consequências no sistema de poder. Conhecendo alguma coisa do Brasil político, alimento sérias dúvidas que isso seja possível. Mas, às vezes, os suicidas conseguem ter serenidade para se arrependerem e regressar à vida.
2 comentários:
à sua atenção.
https://youtu.be/Xc50ZM3VpXE
O eterno nó górdio entre o privado e o público que se corta sempre quando já é tarde demais.
Mas um tal mundo de corrupção é inimaginável. Quando os partidos políticos e os Estado se confundem num, são os cidadãos que pagam. Mas 4 mil milhões de dólares de financiamentos ocultos é obra!
Sobretudo se os mercados antecipam depreciações de activos da ordem de 10 a 20 mil milhões de dólares!
Une affaire d'Etat !
Não sei o que vale esta informação, mas o magazine EXAME apresenta três hipóteses ou cenários possíveis, nos próximos doze meses:
Cenário "optimista"
O preço do baril sobe a 110 $, Petrobras reconhece o sistema de corrupção dum valor de 5 mil milhões de reais. O "balance sheet" é aceitável, a acção ganha 60% e passa a 22 reais.
Cenário de "base"
O baril é a 95$, a corrupção custa 12 mil milhões de reais. A acção passa a 12 reais (-15%)
Cenário "pessimista"
O baril a 75$, a corrupção admitida é de 21 mil milhões de reais. A empresa não pode publicar o seu relatório financeiro, deve pagar 340 mil milhões de reais de multa. O Estado deve intervir.
Mas espero que não será o braço militar, como alguns exigem já. Já provaram disso no passado!
Enviar um comentário