sábado, março 28, 2015

Memorabilia diplomatica (XVII) - A poesia e o PIB


Morreu o prémio Nobel da literatura Tomas Transtromer, poeta sueco.

Recordo-me bem do dia em que Transtromer ganhou o Nobel. Não porque conhecesse a sua obra, mas precisamente pelo contrário, por nunca ter ouvido falar dele até esse mesmo dia e, numa curiosa coincidência, por ter tido nessa data um almoço com o meu colega embaixador sueco em Paris.

Fiquei a pensar se não conhecer tal poeta seria, ou não, uma imperdoável lacuna cultural da minha parte. E, pelo sim pelo não, durante o almoço, depois de o felicitar, perguntei ao meu colega sueco se acaso os nomes de António Ramos Rosa ou de Herberto Hélder lhe diziam alguma coisa. Disse-me que não e sosseguei. Também ele não conhecia dois génios da poesia portuguesa.

O meu sossego durou pouco, ao ouvi-lo dizer, logo de seguida, que, como poetas portugueses, apenas conhecia Fernando Pessoa e Camões. Ora eu não sabia o nome de nenhum poeta sueco (lembrei-me, depois, mas só lá cheguei com ajuda do Google, de um nome da respetiva literatura, mas não da poesia, de Lagerkvist)! O meu colega sueco ouvira falar de nomes da poesia portuguesa e eu, de literatura sueca, nicles!

Lembro-me de ter ido remoer o assunto, a caminho de casa. E, de súbito, aquietei o espírito com a reconfortante ideia de que, se isso acontece, é seguramente porque a nossa poesia é bem melhor do que a sueca. Deve ser isso! Pena é que ela não conte para o PIB...

(Fui recuperar esta historieta, aqui já publicada, neste dia em que morreu o poeta sueco)

4 comentários:

Aldema M M disse...

Sou assídua leitora de seu blog....que consta da lista de " meus favoritos"...
Tenho também um blog, com textos sobre viagens,e eu os concluo sempre com um poema de Fernando Pessoa. Gosto de Portugal, principalmente do Norte e nutro paixão pelos poetas portugueses.
Bom fim de semana.
Aldema ( www.correndomundo.blogspot.com )

Anónimo disse...

Caríssimo Chico

Palavra de honra que nem sabia quem era. Talvez por "incompetência cultural" pois, se calhar, deveria saber; mas não sabia.

Também não é coisa de espantar: da literatura sueca só conhecia autoras/es de livros policiais, que continuo a adorar.

Muito obrigado por me tirares desta escuridão; contigo fez-se a luz... sobre a literatura sueca. Deus, se é que existe, não é para aqui chamado.

Abç picante

Anónimo disse...

Sr. Embaixador, o colega sueco não terá ido, antes do almoço, fazer uma consulta rápida ao Google?
É que, da minha experiência, quase ninguém conhece os poetas portugueses, exceto os brasileiros que adoram Fernando Pessoa.

Mariana

Anónimo disse...

Tanta coisa que ignoramos.

Eu só há dois dias fiquei a conhecer este extraordinário poema de Herberto Helder (e foi preciso elemorrer):

"a última bilha de gás durou dois meses e três dias,
com o gás dos últimos dias podia ter-me suicidado,
mas eis que se foram os três dias e estou aqui…
e só tenho a dizer que não sei como arranjar dinheiro para
outra bilha,
se vendessem o gás a retalho comprava apenas o gás da
morte,
e mesmo assim tinha de comprá-lo fiado,
não sei o que vai ser da minha vida,
tão cara, Deus meu, que está a morte,
porque já me não fiam nada onde comprava tudo,
mesmo coisas rápidas,
se eu fosse judeu e se com um pouco de jeito isto por
aqui acabasse nazi,
já seria mais fácil,
como diria o outro: a minha vida longa por muito pouco,
uma bilha de gás,
a minha vida quotidiana e a eternidade que já ouvi dizer
que a habita e move,
não me queixo de nada no mundo senão do preço das
bilhas de gás,
ou então de já mas não venderem fiado
e a pagar um dia a conta toda por junto:
corpo e alma e bilhas de gás na eternidade
– e dizem-me que há tanto gás por esse mundo fora,
países inteiros cheios de gás por baixo!"


João Figueiredo

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...