domingo, março 15, 2015

Incredulidade

Na passada quinta-feira, ouvi na rádio as primeiras informações sobre a medida governamental, anunciada nesse mesmo dia, relativa a novos apoios ao regresso de emigrantes. A síntese fornecida pareceu-me redutora, algo caricatural, pelo que, concluí, só podia ser uma apresentação fantasiosa. Desde logo, pela ousadia "keynesiana" que transpirava do projeto, completamente à revelia da fúria liberal que tem varrido o país. Por isso, decidi ir ver as coisas com mais calma.

Embora eu não navegue nas águas oficiais dominantes, um mínimo de rigor impõe-me a obrigação de atentar nas iniciativas legislativas da maioria cessante. Faço parte de quantos acham que um governo, lá porque não nos é simpático, não produz, sempre e necessariamente, coisas negativas. Algumas vezes há-de acertar, caramba!

Assim, e por esta pudica prudência, fui ler um pouco mais sobre a iniciativa. E não quis acreditar! É preciso um executivo estar num estado de estertor, de indigência de ideias, para conseguir produzir um projeto daqueles. O mais impressionante é, de longe, o seu grau de "ambição": 20 a 30 iniciativas para começar, podendo vir a atingir o número astronómico de 200 (!!!) pessoas. Tudo não quantificado, que isso de contas é para se fazer mais tarde...

Que arrojo! Pode aferir-se, desde logo, o impacto fortíssimo deste programa no crescimento do produto nacional. E, em especial, podemos imaginar o gáudio e o entusiasmo transbordante que esta iniciativa legislativa vai provocar nos quase 300 mil portugueses obrigados a sair do país nos últimos anos, ao saberem que, no limite máximo de abrangência do modelo, menos de um em cada 1000 dentre eles, terá à sua disposição verbas para lançar um negócio, num regresso estimulado à mãe pátria - uma barbearia, um café, quiçá uma tabacaria num vão de escada! Imagino-os, pelo mundo, prenhes de gratidão, embora talvez ligeiramente perplexos: porque este ainda é, aparentemente, o mesmo governo que os estimulou a saírem da "zona de conforto", isto é, que lançou as bases das políticas públicas negativas que hoje contribuem para o seu atual desconforto. Mas o que lá vai lá vai, não é? Amigos como dantes, especialmente em ano de eleições...

O eleitoralismo e o populismo são muito maus conselheiros. É que não deixa de ser irónico ter sido dado a este programa o acolhedor nome de "Vem", logo por parte de um governo que, com o empurrão benévolo deste tipo de genialidade legislativa, não tarda se vai.

7 comentários:

Isabel Seixas disse...

Oh que assim seja...
oh como esse ir peca por tardio.
No entanto mais vale tarde que nunca

Anónimo disse...

Provavelmente, o venerando Chefe do Estado irá manifestar o apoio mais entusiástico a esta brilhante medida já na sua próxima deslocação a Paris, onde terá um encontro com as força vivas da comunidade portuguesa.
JPGarcia

Ésse Gê (sectário-geral) disse...

Programa VEM: Ir à pesca sem água, sem cana, sem isco e sem anzol.

Um Jeito Manso disse...

Mas, ó Embaixador,

Que queria que saísse daquela cabecinha do Lombinha dos Briefings? Dali só sai anedotinha, brincadeirinha, tesourinho deprimente.

Não lhe parece que é até tocante que o Governo se dê ao trabalho de nos proporcionar momentos Monty Python no meio daquela indigência toda? Eu gosto. Farto-me de rir.

Um bom domingo!

Luís Costa Correia disse...

Demolidor.

ignatz disse...

acho que está a ver mal o problema. trata-se de mais uma iniciativa para beneficiar 30, extensível a 200, filhos de laranjólas em fim de erasmus ou com interrail a expirar.

Anónimo disse...

Subscrevo. Este governo, gritantemente demagogo, anti-social, de extrema-direita, não se enxerga e agoar deu numa de propagandista e manipulador de opinião. Perdeu, há muito, a vergonha!
Que gente mais miserável, sem uma qualidade que se aproveite!
E ainda faltam 6 meses para nos vermo-nos livres deles!

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...