sábado, maio 05, 2012

Justiças

O caso Madeleine McCann volta a ser citado na imprensa sensacionalista britânica. Do outro lado da Mancha, leem-se, no "The Sun" e em outras folhas de idêntico jaez, "farpas" sobre a qualidade da justiça e da polícia portuguesas, acusadas de ineficácia na investigação. 

Não tenho nenhuma opinião particular sobre este assunto, mas tenho, há muito, uma ideia bem formada de que existe, em alguns países do norte da Europa, um preconceito arraigado contra a justiça "do sul". Isso leva, por exemplo, a que, quase por sistema, quando um cidadão desses países é detido, em casos com algum reflexo mediático, num país desse mesmo "sul" (quando isso acontece em África ou na América Latina, é quase automático), sobre ele se abata, regularmente, uma espécie de presunção natural de inocência e se crie um clamor público a reclamar a sua libertação ou a contestar a duração das decisões judiciais (estou certo que, neste ponto, alguns lembrarão o caso Vale e Azevedo...). A imprensa, ecoando a reação natural das famílias e de grupos de amigos, torna-se então portadora de um juízo de diabolização do sistema judicial do Estado onde o incidente ocorreu, degradando com a sua imagem. Leia-se o que se diz no site britânico Prisioner's Abroad, para se perceber melhor o que acabo de notar.

Um dia, na primeira metade dos anos 90, uma criança inglesa apareceu morta no Algarve. A nossa embaixada em Londres foi então invadida por comunicações escritas e telegramas insultuosos, considerando Portugal "uma selva", um paraíso para os criminosos, um mundo de impunidade e irresponsabilidade. Com o tropismo a que acima fiz referência, a imprensa "tablóide" britânica ridicularizou Portugal e a polícia portuguesa. Deputados e lordes irados, mobilizados pelas suas "constituencies", escreveram e foram mesmo recebidos na embaixada, bradando contra o nosso sistema de justiça.

Poucas semanas mais tarde, a nossa polícia descobriu o criminoso: um cidadão britânico, amigo da familia. De um momento para o outro, a imprensa britânica silenciou. Passaram alguns meses. A medo, amigos do detido, começaram a reclamar, na mesma imprensa, contra as prisões portuguesas e sobre os riscos que o assassino nelas correria. É assim...

7 comentários:

Anónimo disse...

é ler um relatório como este e ver quantas pessoas desaparecem naquele país de perfeição:http://www.npia.police.uk/en/docs/Missing_Persons_Data_and_Analysis_2009-10.pdf

Isabel Seixas disse...

Uma excelente reflexão...
Bem substitutiva da missa de Domingo delineando o espaço para meditação ...
Costumo sempre personalizar, num exercício de autocritica e reconheço que aprendi muito aqui a ser menos primária e a saber esperar pela sedimentação da verdadeira verdade a menos emergente e a que exige tempo de superego.
Como enfermeira do ponto de vista da atitude terapêutica tenho o dever de acionar a minha capacidade técnica e cientifica da compreensão e utilização de empatia em todas as direções, logo, impedida de dar razão ou tomar partido, até pelo juramento que fiz com seriedade e espirito de missão de Florence Nightingale, mas de facto cada vez mais os meus lideres passam por Madre Teresa de Calcutá Dalai lama, Gandhi e por Si...

Anónimo disse...

Mais uma vez, caríssimo Embaixador amigo, tenho de “culpabilizá-lo” por, trazer à baila assuntos que também me afetaram e, por isso, a eles me refiro em nome pessoal. Tal como, e muito bem se refere, por experiência profissional, sobre o vitriolar da imprensa tabloide britânica (agora, e bem, devidamente escrutinada e denunciada na pessoa e títulos de Rupert Murdoch), limito-me a não abusar demasiadamente deste seu excelente espaço. Como muito bem sabe, veterano profissional dos media, no Reino Unido, mas especialmente como bom profissional e amante do seu país, que procura repôr os factos, mas mais, impulsionado pela revolta contra as habituais calúnias em relação às insitutições portuguesas, nomeadamente jurídicas e policiais. Mesmo antes do Caso McCann, que muito bem foca, e em que, como sabe, também estive muito envolvido, pelo que, para benefício dos seus muitos e ilustres leitores gostaria de citar, mas que não faço por exigências de espaço, fui solicitado, nessa altura (como no Caso McCann, muito depois, quer para a RTP, quer pela Sky, BBC rádio e TV e até emissoras internaciconais, nomeadamente uma australiana!) a intervir. Esta minha intervenção foi no agora extinto canal matinal de televisão GMTV . Refiro-me ao então caso dos alegados e exagerados ataques da polícia portuense aos adeptos mancúnios num jogo entre o FC Porto e o Manchester United para a “Champions”, aos quais, e mais uma vez, os tabloides britânicos se excederam. Os adeptos, representados por um casal, entrevistado a partir de Manchester, embora citando um episódio verídico de “encurralamento” dos adeptos mancúnios, mais por questões de segurança, aliás baseadas nas técnicas e aconselhamento da própria polícia britânica, então especializada em assuntos do triste “hooliganismo”, como habitual e emocionalmente concentrou-se, nalguns casos, exagerando até, o “tratamento” policial. A fim de prestar a versão não citada, esta dos factos, embora dando crédito àquela acusação, mas explicando os porquês, em prévio contacto telefónico com o chefe da polícia portuense, que me pôs ao corrente da situação real, graças a ele pude ir mais além revelando à audiência os desacatos provocados pelos indiscipinados mancúnios em vários pontos da cidade, incluindo a quebra de mobília de cafés, recusa em pagar contas de restaurante, etc. cujos proprietários, embora participando à polícia, não reagiram como deveriam, para reaver o seu dinheiro! A este, poderia, igualmente, citar outros casos, nomeadamente um que envolveu adeptos escoceses do Celtic, cujos desacatos os levaram à prisão no Algarve e que, por casualidade, envolveria o então Presidente Mario Soares em Edimburgo, quando suplicado pela mãe e namoradas para intervir para a sua libertação, durante a sua visita privada à capital escocesa, em 1993, em que também fui testemunha e solicitado a intervir. Aí, a imprensa escocesa, de novo a acusar os “abusos” da nossa policia para com os “inocentes” jovens, prendeu-os por “desconhecer ou não gostar dos saiotes escoceses que envergavam”! Esclareço ainda, que no capítulo dedicado quer à estúpida reação dos media, mas principalmente dos tabloides, aos alegados “atrasos terceiro-mundistas” das nossas instituições, nomeadamente durance o Caso McCann, não só me refiro ao crime do caso que cita, mas também a outros, nomeadamente ao abandono do bebé, carinhosamente recolhido pelo Abrigo Aboim Ascensão de Portimão, afinal triste ato de um jovem casal inglês, no meu livro POR TERRAS DE SUA MAJESTADE, atualmente no prelo. Mas quando o casal foi identificado, justiça seja feita, a imprensa britânica, deu eco não só à condenação do casal, mas especialmente à generosidade e ação das nossas institutições. O habitual abraço do, Gilberto Ferraz.
Bom domingo (com a noite ligada à televisão por causa das eleições!) e excelente semana!

Francisco Seixas da Costa disse...

Caro Gilberto: abuse à vontade. Estec espaço só fica beneficiado com estas suas memórias de prestigiado homem dos "media"

Anónimo disse...

há uma senhora americana que parece tenta ajudar a descobrir alguma coisa


http://patbrownprofiling.blogspot.pt/

Anónimo disse...

Caríssimo amigo. Grato pela sua amabilidade e sensibilizado pelo seu comentário! Obrigado. Como sabe, e como as memórias são muitas, particularmente neste capítulo sobre a ignorância, mas sobretudo arrogância britânica, principalmente daqueles que têm o dever - e a obrigação - de saber!, particularmente em relação a países como o nosso, o que muito tenho a dizer, resumo-o, o mais possível, no meu já citado livro. Mas se há criticas, também há elogios, como é o caso da solidariedade, em que o povo britânico, como bem sabe, é notável. A ela, como dever jornalístico, faço a devida referência na mesma obra. O habitual abraço e a renovada gratidão do,
Gilberto Ferraz

Anónimo disse...

A Justiça neste caso não foi cega, demasiadas pressões políticas e mediáticas forçaram o arquivamento do processo, e o afastamento de elementos da PJ. Os PJ's foram achincalhados, bem como as suas famílias e amigos, e a mesma potencia que fechou o processo tenta agora reabri-lo para limpar definitivamente a imagem do casal que deixou 5 noites seguidas as três crianças todas com menos de 4 anos sozinhas...

Os média ingleses são uma vergonha, sejam os do Murdoch ou do Dacre, pior vergonha são os constantes ataques feitos a Portugal e aos Portugueses desde 2007, em relação a este caso, sem que ninguém diga nada, faça nada.

Relembro o artigo de um Tony Parsons no Mirror em 2007, dirigido ao nosso embaixador em Londres - António Santana Carlos - que começava assim 'Oh, Up Yours Señor' e acabavava em "just keep your stupid, sardine-munching mouth shut". Bonito, não é?

um abraço, J.

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