sábado, maio 26, 2012

João de Sá Coutinho (1929-2012)

Através de um amigo comum, acabo de tomar conhecimento da morte, no dia de hoje, do embaixador João de Sá Coutinho.

Para a minha geração no MNE, Sá Coutinho representava, de certo modo, a "carreira" que soubera transformar-se, com naturalidade democrática, num apoio à nova diplomacia pós-25 de abril. Alguns meios mais conservadores chamaram-lhe, por essa altura, o "conde vermelho", numa alusão ácida às suas origens aristocráticas, bem simbolizadas na sua magnífica casa em Ponte de Lima.

Conheci-o pessoalmente quando, como então era da praxe, me fui apresentar nas Necessidades, no final de 1985, regressado de Luanda. Eu saíra desse posto um pouco à pressa, motivado por um convite formal que recebera da hierarquia diplomática para vir a assumir um lugar de chefia intermédia em Lisboa, nas novas estruturas criadas para a nossa próxima entrada nas instituições europeias. Mas, entretanto, alguma coisa se tinha passado. Recordo o embaraço de Sá Coutinho, então secretário-geral do ministério, quando se viu obrigado a informar-me que, por ordens "de cima" a que era totalmente alheio, a "casa" já não contava comigo para ocupar essa chefia... Na sua impotência perante o inevitável, senti-o solidário. 

A vida não fez com que nos cruzássemos muito. Às vezes, nas minhas não raras passagens por Ponte de Lima, voltei a encontrá-lo pelas esplanadas do Largo de Camões, esguio e elegante, sempre com aquele sorriso algo irónico, que era a sua imagem de marca pessoal, com que acompanhava as graças que lhe saíam fáceis, de quem olhava a vida com olhos sábios e serenos.

Há meses, a propósito de uma historieta que por aqui contei, em que ele era a figura central, escreveu-me uma carta divertidíssima, fantasiando uma suposta colocação minha em Nouakchott, aliada à decisão excecional que, segundo me "informava", teria sido tomada no sentido de o enviar a ele para Paris, forçando a minha substituição. Pelo meio, dava-me conselhos deliciosos, como a compra de um camelo para serviço na nova embaixada, aconselhando-me também a planear fins-de-semana turísticos e gastronómicos em... Bissau.

João de Sá Coutinho, que, tal como o meu pai, era um orgulhoso minhoto de Ponte de Lima, foi um grande senhor da nossa diplomacia, um profissional distinto. Acima de tudo, era um homem de bem que soube servir e honrar o seu país. 

4 comentários:

Anónimo disse...

Ponte de Lima é uma vila de homens e mulheres ilustres. As sete mulheres do Minho de Zeca Afonso será uma homenagem secreta à sua mãe nativa dali.
José Barros 

Anónimo disse...

Um homem de bem, como diz. Inteiramente de acordo! E uma simpatia de pessoa. Um Diplomata de fino trato. Tenho, igualmente, uma boa recordação dele quando tomou a minha posição, por oposição à do D-G do Pessoal à época, sobre um determinado assunto. Com fina diplomacia, desmontou os argumentos do seu colega – sem o “magoar” nem, muito menos, o pôr em causa - e acabou por convencê-lo a adoptar a posição que (eu) propunha.
Acima de tudo, uma excelente pessoa. O que é aquilo que mais importa.
Rilvas

Anónimo disse...

Fico muito triste com esta notícia. Ainda há pouco tempo tive notícias dele e não apontavam para este desfecho já. Era um grande senhor.

Anónimo disse...

Era um Homem Bom. Fazia o bem e não contava a ninguém. Tinha uma ironia incomparável que lembro com muitas saudades. Detestava que à mesa se falassse de " quem é quem, irmão de , filho de " e de comida. Adorava-o.

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