quinta-feira, dezembro 09, 2010

Haia ?

Foi há menos de 10 anos, em Sarajevo, a martirizada capital da Bósnia-Herzegovina. Era um jantar a que estava presente, como convidado e amigo do nosso representante diplomático, um membro do governo daquele país.

O equilíbrio político na Bósnia-Herzegovina, um país resultante da fragmentação da antiga Jugoslávia, é muito difícil, dado que, do executivo, fazem obrigatoriamente parte representantes de três diferentes etnias, com um complexo historial de conflito entre si: bósnios, croatas e sérvios. Não quero recordar a qual dos grupos étnicos pertencia o convidado local dessa noite.

O jantar tinha um carater relativamente informal, no jardim da residência. Como não podia deixar de ser, a conversa cedo derivou para a política.

A certa altura, veio-me à memória que, anos antes, numa das minhas visitas a Sarajevo, nos anos 90, tinha conhecido um membro do governo da Bósnia-Herzegovina, pertencente a uma dessas minorias. Era um homem agradável e cordial, com quem eu havia criado uma forte relação de simpatia. Voltaria a encontrá-lo mais tarde, por duas vezes, na Grécia, onde ambos tínhamos ido a convite pessoal de Georgios Papandreou, atual primeiro-ministro, de quem éramos amigos. Perguntei por esse antigo ministro da Bósnia-Herzegovina.

Notei que o nosso convidado ficou um pouco embaraçado, mas respondeu:

- Está na Haia.

Ao meu lado, uma pessoa menos dada a interpretar, com a rapidez da nossa profissão, este tipo de informações, perguntou:

- Como embaixador?

Não sei se fui eu que me adiantei ou se foi o ministro que esclareceu que "estar na Haia" significava estar detido sob ordem do Tribunal Penal Internacional para a ex-Jugoslávia, que julga os crimes de guerra e que tem sede na capital dos Países Baixos.

Como dois diplomatas portugueses presentes bem se lembrarão, mudámos logo de conversa... 

8 comentários:

Anónimo disse...

Há de facto janelas de oportunidades
imprevistas ...De estar calado...
Também padeço, o pior é que receio não ter emenda...Ou será Melhor?!!!
Isabel Seixas

patricio branco disse...

"Ossos do ofício..."

Gil disse...

Conheci muito boa gente, na ex-Jugoslávia, para quem “estar na Haia” era uma espécie de atestado de civismo e heroicidade, um pouco como, em Portugal, era, depois do 25 de Abril, ter sido preso pela PIDE.
O que se passou durante a desagregação da Jugoslávis foi bastante mais complicado e complexo, como o Embaixador Seixas da Costa sabe, do que a “informação” dos “media”, quase sempre simplista e sempre maniqueísta, fosse qual fosse a perspectiva adoptada, deixava transparecer.
Muitos conhecem a “boutade” atribuída ao Embaixador José Cutileiro, convidado a resumir em três palavras a situação nos Balcãs, então em plena explosão.
Menos conhecida é a frase de Carla del Ponte, a mediatizada Procuradora do Tribunal Internacional para a ex-Jugoslávia, que, embora ela a atribua a terceiros, traduzia certamente o pensamento da terrível senhora: “The Serbs are bastards but the Croats are sneaky bastards”. Podemos, com grande segurança, incluir na apreciação bósnios, kosovares, montenegrinos e outras tribos da região.
Eram tempos interessantes, daqueles que os chineses desejam para os piores inimigos.

Francisco Seixas da Costa disse...

Com o conhecimento que tem da região - vá-se lá saber porquê... - quase que estranho que o nosso comentador Gil não tenha tido conhecimento, por algum amigo, do jantar a que me refiro neste post.

Gil disse...

Soube, de facto, desse almoço.
Mas, seguindo o exemplo dos convivas, prefiro mudar de assunto.

Francisco Seixas da Costa disse...

Caro Gil: como eu o percebo! É sempre desagradável comentar um almoço, a propósito de um jantar.

Helena Oneto disse...

"Sneaky" comments on a sneaky subject...

Gil disse...

Ooops...

Fora da História

Seria melhor um governo constituído por alguns nomes que foram aventados nos últimos dias mas que, afinal, acabaram por não integrar as esco...