sexta-feira, dezembro 24, 2010

A colher

O diplomata ia a sair do jantar, em casa de um amigo, no posto onde estava colocado. Já perto da porta, o empregado da casa, que ele conhecia de há muito, revelou-lhe a sua indignação: tinha acabado de ver um determinado convidado meter ao bolso uma colher de prata do serviço de café. Valia a pena dizer ao patrão, com o risco de ir criar um escândalo?

Não, não valia a pena, aconselhou o diplomata. E, para surpresa do empregado, pediu-lhe uma colher idêntica, meteu-a no bolso do casaco e regressou à sala, onde a festa  ainda ia animada.

A certo passo, aproximou-se do indivíduo que surripiara a colher e, em tom de cumplicidade, disse-lhe, mostrando discretamente a colher que acabara de meter ao bolso: "Meu caro, dizem-me que "eles" já sabem que fomos nós quem sacou as duas colheres que faltam. Vou pôr a "minha" discretamente naquela mesa ao fundo. Quer lá pôr a "sua" também?"

5 comentários:

Anónimo disse...

O cenário era a véspera de um Natal
A gota na tempora quase único sinal
Fuga, lacrimal lágrima denunciadora
Encontro anunciado com Ela, Senhora

Para Ela não estava lá mais Ninguém
Ele era o Mundo e era único Alguém
Sonho, realidade o tempo todo Natal
Presente do tempo Dele Sorte afinal

A colher o café o local um pretexto
Pelo menos Uma lealdade no contexto
Do amor com um amor com sem futuro

Momento simples de alento casmurro
Canteiro bosque seriedade o sorriso
Colher de candura perdição do juízo

Isabel Seixas


Feliz Natal a Todos

margarida disse...

Ena! Que GRANDE lição!
Tal-qual como se faz com as criancinhas.
Genial...
Imagino a surpresa do cleptómano...
Para não falar do espanto do serviçal, perdão, do empregado da casa.
Se um dia houver tempo e paciência para um volume deste género de memórias, seguramente que será um sucesso, de tão saborosos episódios destes 'flagrantes da vida real'.
:)

César Ramos disse...

Senhor Embaixador,

Podia ter lido, gostar, e ficar calado; mas não posso!... tenho de manifestar a minha reacção de agrado perante a sua iniciativa ímpar!

Até eu, que sou conhecido por muitas saídas idênticas, não teria tido a sua agilidade mental!

De génio!... de diplomata de corpo (e espírito) inteiro!

Cumprimentos
César Ramos

César Ramos disse...

(...) agradam-me estas coincidências! - Não é que passou pela minha cabeça a mesma ideia de 'Margarida'!?

Na verdade... os textos deste Blogue estão limitados a esta galáxia.
Urge publicá-los em livro [de papel! nada de E-books].

Lá fora, o grande público agradeceria uma obra desta natureza para prendas de Natal: isto é - Todos os Dias!

César

Helena Sacadura Cabral disse...

Senhor Embaixador
Que bela história neste tempo e nesta terra. Que humor subtil e que lição. E, sobretudo, que tolerância inteligente.

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...