Tenho uma grande admiração por Fernando Henrique Cardoso. (Embora a alguns isso pareça incongruente e incompatível, tenho também forte admiração por Lula da Silva, mas isso são outras histórias).
Desde o tempo em que fui embaixador no Brasil, FHC (é assim que o conhecem) foi sempre de uma extrema simpatia comigo. Tive gosto em ter sido ele e entregar-me o prémio "personalidade do ano" com que, em 2006, o mundo empresarial luso-brasileiro quis manifestar-me o seu apreço pelo apoio que a embaixada que chefiei lhe proporcionava. E guardo para memória futura uma longa conversa a dois, no restaurante Carlota, em São Paulo, onde falámos um pouco de tudo e muito de política brasileira. Temo-nos cruzado em Lisboa várias vezes, nos últimos anos.
Fernando Henrique Cardoso acaba de editar os seus "Diários da Presidência 1995-96", um volume de quase mil páginas com suculenta informação sobre a vida política interna do Brasil, que a mim me continua a interessar muito. O livro chegou-me há dois dias, oferta de um amigo brasileiro. Passei os olhos por ele e, de facto, é garantido que me vai acompanhar por algumas semanas.
Não é de estranhar que as escassas referências a Portugal tenham chamado a minha atenção prioritária.
Há algumas notas pessoais muito simpáticas sobre Mário Soares, Jorge Sampaio e António Guterres ("ele pensa do jeito que eu penso"), bem como um apontamento breve de um encontro com Ricardo Salgado, que foi informar FHC, para grande surpresa deste, de que o grupo Espírito Santo pretendia investir no Brasil. Também idêntica intenção da Caixa Geral de Depósitos é assinalada. Sobre uma conversa com Durão Barroso, a referência é curiosa: "Falei bastante com DB, nada de mais extraordinário a não ser que foi muito grato e muito cansativo" (sic)!
Há algumas notas pessoais muito simpáticas sobre Mário Soares, Jorge Sampaio e António Guterres ("ele pensa do jeito que eu penso"), bem como um apontamento breve de um encontro com Ricardo Salgado, que foi informar FHC, para grande surpresa deste, de que o grupo Espírito Santo pretendia investir no Brasil. Também idêntica intenção da Caixa Geral de Depósitos é assinalada. Sobre uma conversa com Durão Barroso, a referência é curiosa: "Falei bastante com DB, nada de mais extraordinário a não ser que foi muito grato e muito cansativo" (sic)!
(Um parêntesis para notar que o período coberto por este volume corresponde à chegada ao governo de António Guterres e à substituição de Mário Soares por Jorge Sampaio).
Sobre as relações luso-brasileiras, na ressaca da crise dos dentistas, diz FHC : "pela imprensa me parece que Portugal tem um certo ceticismo com relação ao Brasil, talvez até bem fundamentado. E não tem tanto entusiasmo quanto se pensa em relação às chamadas "relações especiais". A cúpula, o governo, todos os lados, mais a elite cultural, esses sim, mas não creio que isso tenha enraizamento maior na vida portuguesa propriamente dita, como não tem na vida brasileira". Interessante leitura.
O mais curioso destas referências a Portugal prende-se com a CPLP e a posição de José Aparecido de Oliveira, que havia sido embaixador brasileiro em Lisboa. Não estarei a revelar nenhum segredo se disser que, na percepção dos meios políticos portugueses (eu estava no governo nessa altura), ficou a sensação de que foi FHC quem se opôs a que José Aparecido de Oliveira fosse o primeiro secretário-executivo da organização. Ora o antigo presidente desmente essa versão nestes "Diários", e diz com clareza que a oposição foi do chefe da diplomacia brasileira: "O Luiz Filipe Lampreia não quer". Curiosamente, Lampreia não se refere a esta sua posição no livro "O Brasil e os ventos do mundo" (Rio, 2009), onde se limita a assinalar que a criação da CPLP se fez "por impulso do embaixador do Brasil em Lisboa, José Aparecido de Oliveira", encerrando com a brutal (mas muito verdadeira) constatação de que "no Brasil não existe nenhum entusiasmo com a instituição".