Chega-me a notícia da morte do embaixador Paulouro das Neves, alguém que foi, sem o menor exagero, um dos mais brilhantes diplomatas portugueses das últimas décadas. Era, além disso, um grande homem de bem e de caráter.
Houve dois ou três nomes da carreira diplomática portuguesa - não mais! - sob cuja orientação gostaria de ter trabalhado, pela certeza antecipada de que, com eles, o que aprenderia me iria ajudar a ser um melhor profissional. José César Paulouro das Neves era um deles.
A boa "fama" de Paulouro - como as Necessidades o conheciam - precedeu o nosso primeiro encontro pessoal. Lia-lhe a excelente "telegrafia" (as comunicações que enviava ao ministério) e amigos falavam-me dessa figura suave, muito culta, com um sentido de equilíbrio que tornava as suas análises um modelo de bom-senso e rigor. Todos quantos com ele trabalhavam ficavam seus fãs, pela pedagogia não impositiva que sabia transmitir e pela humanidade que o seu trato revelava. E, naturalmente, já lhe conhecia a "linhagem" democrática, de quem estava ligado, pela família, ao histórico "Jornal do Fundão".
Tive as primeiras conversas com Paulouro das Neves em Moçambique, quando um dia por lá passei, em trabalho, nos anos 80. Cruzámo-nos depois, muitas vezes, ao longo do ciclo dos grandes postos que o seu excecional percurso profissional amplamente justificou: Madrid, representação junto da União Europeia, Paris e Roma. Em todo o lado, ficou a marca de um homem e de um profissional excecional - e quem me conhece sabe que afirmo isto há vários anos. Era também um excelente conversador, uma pessoa sorridente e amável, disponível e atento aos outros.
Depois da sua aposentação como embaixador, Paulouro das Neves colaborou com o presidente Jorge Sampaio e dedicou-se ao ensino universitário tendo, há três anos, publicado um livro notável sobre a diplomacia, que vivamente recomendo, e que, inexplicavelmente, passou sem grande nota pública: "Rituais de entendimento - teoria e prática diplomáticas". Há um ano, tive a honra de ser convidado a suceder-lhe na universidade onde lecionava.
Recordo que, um dia, numa casual passagem minha pela embaixada em Paris, que ele então chefiava e onde eu o fora cumprimentar, pressentiu-me a escrutinar o seu pequeno cabinete, aquele que então cabia ao embaixador, na geografia bizarra que sempre foi a daquela chancelaria: "Está surpreendido? O gabinete do embaixador em Paris é, de longe, o menos digno de todas as grandes embaixadas portuguesas. É uma pena, mas é assim mesmo!". E era pura verdade. Fiquei com isto na memória e, quando eu próprio fui embaixador em Paris, e aproveitando a crescente "desertificação" humana da casa, consegui levar a cabo as obras necessárias para dar ao representante diplomático português o espaço de trabalho e representação bem mais adequado de que hoje dispõe. Tive pena que ele nunca tivesse o ensejo de visitar esse novo espaço, de que seguramente teria gostado, ocasião que aproveitaria para lhe oferecer um almoço na "Brasserie Lipp", um ambiente que ele tanto apreciava e onde, por mais de uma vez, celebrámos a nossa amizade.
Paulouro das Neves esteve muito doente, há cerca de dois anos. Recuperou de forma notável, parecia renascido e, depois disso, com Jorge Sampaio e um pequeno grupo de amigos, organizámos com ele um simpático almoço em Sintra, de que guardo uma fotografia de comum boa disposição. Disposição que hoje perdi, ao saber do seu infeliz desaparecimento.
À sua família, deixo a expressão sentida do meu pesar.
Paulouro das Neves esteve muito doente, há cerca de dois anos. Recuperou de forma notável, parecia renascido e, depois disso, com Jorge Sampaio e um pequeno grupo de amigos, organizámos com ele um simpático almoço em Sintra, de que guardo uma fotografia de comum boa disposição. Disposição que hoje perdi, ao saber do seu infeliz desaparecimento.
À sua família, deixo a expressão sentida do meu pesar.